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terça-feira, 3 de julho de 2018

Acordo entre Merkel e Seehofer adia crise política na Alemanha

Andreia Martins - RTP03 Jul, 2018, 11:51 / atualizado em 03 Jul, 2018, 12:16 | Mundo

Acordo entre Merkel e Seehofer adia crise política na Alemanha

O acordo entre a CDU e a CSU prevê a rejeição de requerentes de asilo que estejam registados noutro país da União Europeia. | Hannibal Hanschke - Reuters

A chanceler alemã e o líder bávaro alcançaram um entendimento sobre as políticas migratórias que prevê a criação de “centros de trânsito” para conter a migração secundária. O documento tenta salvar a coligação de Governo e impede para já a demissão do ministro alemão do Interior, mas a sua aprovação depende agora da palavra final do SPD e de um novo acordo com os vizinhos austríacos.

É uma aparante cedência por parte da chanceler alemã que evita um cenário imediato de crise política no executivo alemão. Depois de várias semanas de confronto, Angela Merkel, da CDU (União Democrática Cristã), e Horst Seehofer, líder da CSU (União Social Cristã), chegaram a um entendimento sobre a questão migratória.

Os detalhes ainda não são totalmente conhecidos, mas sabe-se que este inclui a criação de “centros de trânsito”, à imagem de zonas de segurança em aeroportos internacionais onde se faz o controlo alfandegário e de passaportes. Na prática, estes centros não serão considerados território alemão, o que fará com que seja mais fácil deportar migrantes, refere a agência Reuters.

O acordo prevê também recusar a entrada de requerentes de asilo junto à fronteira com a Áustria caso estes estejam registados noutro país da União Europeia. 

As medidas pretendem, desta forma, conter as “migrações secundárias”, ou seja, o movimento de migrantes dentro do Espaço Schengen, uma vez que muitos chegam a outros países europeus acabam por escolher a Alemanha como destino. 

O entendimento chegou cinco horas depois de uma reunião realizada esta segunda-feira, em que Angela Merkel, no poder há mais de 12 anos, tentou evitar a demissão iminente do seu ministro do Interior. Horst Seehofer chegou mesmo a ameaçar bater com a porta no último domingo, dando três dias à chanceler para propor novas medidas satisfatórias. Ao fim de 24 horas, havia um acordo selado entre os dois líderes. 

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“O espírito de parceria na União Europeia é preservado e, ao mesmo tempo, estamos a dar um passo importante para impor ordem e controlar a migração secundária. Encontrámos um bom compromisso após duras negociações e dias difíceis”, disse a chanceler aos jornalistas.

Por sua vez, o ministro do Interior, que ocupa igualmente a liderança da CSU – partido bávaro aliado da CDU há quase 70 anos – assumiu estar satisfeito com um “acordo claro” que visa “conter a imigração ilegal na fronteira entre a Alemanha e a Áustria”.

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A questão migratória foi um ponto de enorme tensão nas últimas semanas entre as duas forças políticas irmãs que não concorrem uma contra a outra em eleições desde 1949 e chegou a colocar em risco a estabilidade do Governo de Angela Merkel.

Vários responsáveis da CSU arrastaram o tema da migração para o topo da agenda mediática, assumindo perante o seu eleitorado uma posição bastante mais rígida sobre os migrantes, quando faltam menos de quatro meses para as eleições na Baviera, onde a AfD (Alternativa para a Alemanha, partido de extrema-direita) tem registado um crescimento significativo em sondagens recentes que ameaça a maioria absoluta dos conservadores aliados de Merkel. 

Enquanto o ministro do Interior defende, desde o início do mandato, em março deste ano, a rejeição de migrantes registados noutros países europeus junto das fronteiras alemãs, a chanceler tem optado por dar prioridade a uma solução ao nível europeu no âmbito das questões migratórias, como a que foi alcançada na última sexta-feira, durante a recente cimeira europeia.

O que diz o SPD?

Com este novo acordo, Angela Merkel cede à agenda do ministro para garantir a sobrevivência do Governo. Mas há outro parceiro nesta equação que poderá não facilitar a nova posição conjunta da CDU e CSU. Os social-democratas do SPD, que também fazem parte da “grande coligação” que governa a Alemanha, querem ver esclarecidos vários pontos deste acordo.

“Ainda há muitas questões que precisam de ser clarificadas. Vamos demorar o tempo que precisarmos para tomar uma decisão”, disse esta terça-feira a presidente do partido, Andrea Nahles, citada pela imprensa alemã.

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Até que seja dado o aval pelo SPD, o Governo de Merkel continua em risco de colapso, uma vez que os social-democratas assumem uma posição bastante mais flexível na temática das migrações. 

No domingo, o partido tinha delineado um plano em cinco pontos para fazer face à questão migratória, onde se opõe a qualquer “ação unilateral para recusar pessoas em fronteiras nacionais, dentro da União Europeia”. 

Independentemente da direção escolhida pelo SPD, a revista Der Spiegelconsidera, em editorial, que o que se passou na noite de domingo, com a ameaça de demissão de Hosrt Seehofer, deixou marcas irreparáveis na política alemã. Para a publicação germânica, a chanceler conseguiu o que era exigido pela CSU na cimeira europeia, e a insistência na questão migratória por parte do ministro do Interior pode ter consequências para o país em termos políticos. 

Na decisão do SPD, a ser conhecida nas próximas horas após reunião com os restantes parceiros de coligação, poderá pesar o comportamento do partido nas mais recentes sondagens, uma vez que a recusa do acordo entre CDU e CSU poderá precipitar a queda do Governo. 

Os dados mais recentes não são animadores perante um cenário eventual de eleições federais antecipadas, até porque as sondagens continuam a colocar os social-democratas abaixo dos 20 por cento, muito próximo da AfD, que ultrapassa nesta altura os 16 por cento.

E a Europa?

Pelo que já se sabe do acordo celebrado na segunda-feira entre Merkel e Seehofer, a abertura de “centros de trânsito” nas fronteiras alemãs poderá ter repercussões imediatas para outros países circundantes.  

Ao final da manhã, o presidente da Comissão Europeia afirmava que o acordo vai ser analisado por peritos europeus, mas que "à primeira vista" parecia estar em linha com as leis europeias.

"Ainda não estudei po acordo em detalhe. (...) Pedi aos serviços jurídicos que o analisem, mas parece-me estar alinhado com a lei", disse Jean-Claude Juncker numa declaração aos jornalistas em Estrasburgo.

Quem também já está a escrutinar este entendimento é a Áustria. O país vizinho, que faz fronteira com a região sul da Alemanha, disse esta manhã que está “pronto” a proteger as suas próprias fronteiras, caso o acordo firmado entre a CDU e a CSU seja implementado. 

“Se este acordo se tornar na posição oficial do Governo alemão, vamos tomar medidas para prevenir as consequências negativas para a Áustria e para a sua população”, frisou o chanceler austríaco, Sebastian Kurz, numa declaração conhecida esta manhã. 

Viena pede ao Governo de Merkel que “esclareça a sua posição”, mas garante que “o Governo está pronto para tomar as medidas necessárias para proteger as nossas fronteiras”, refere o comunicado conjunto do executivo austríaco citado pelas agências internacionais.

O acordo firmado entre CDU e CSU prevê que o Governo alemão procure um entendimento bilateral com a Áustria sobre o que fazer no caso de outros países da União Europeia se recusarem a aceitar de volta os requerentes de asilo registados nos seus países.

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