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terça-feira, 16 de outubro de 2018

Afirma Pereira, repete Pereira

Ladrões de Bicicletas


Posted: 15 Oct 2018 05:47 AM PDT

Voltamos às repetições: o Orçamento não é português, é estrangeiro, subordinado aos interesses dos nossos credores e às políticas que eles impõem, que não são “portuguesas” num aspecto fundamental — é que não servem o interesse nacional, nem as necessidades de desenvolvimento do país, mas apenas a submissão às políticas alemãs e à vulgata política da troika disfarçada de inevitabilidade económica. O Orçamento serve o pagamento da dívida transformado no alfa e no ómega de toda a política de défice zero. Há outras coisas sob o mesmo céu, mas aqui o sol não nasce para todos (...) Nestas matérias está-se como a “voz clamando no deserto”. O que se ouve de imediato como resposta é uma variante do discurso do ocupado que interioriza o discurso do ocupante, uma soma de argumentos ad terrorem, de que quem contesta o oito quer o 80, ou do desabar cataclísmico de tudo, à mais pequena contestação do estado de coisas (…) O PSD, o CDS e PS são partidos do Tratado Orçamental, o BE e o PCP por razão da “geringonça” não têm qualquer autonomia nesta matéria. À mais pequena crise de fora, vai desabar tudo. E depois queixem-se do populismo.
Excerto da crónica de José Pacheco Pereira no sábado passado no Público. Certamente por acaso, não teve qualquer destaque no sítio do jornal. Concordando no fundamental, tenho duas ou três observações vagamente críticas.
Em primeiro lugar, creio que Pacheco Pereira continua a enfatizar em demasia a dimensão informal do poder na UE, em detrimento da formal, quando as duas estão articuladas. Voltamos também às repetições:
A informalidade do Eurogrupo tem servido bem as grandes potências, em especial a Alemanha. A formalidade das restantes instituições europeias serve o pesado acervo de regras políticas que de forma explícita se destina a construir mercados mais amplos e que operem em cada vez mais esferas da vida, beneficiando os “povos dos mercados”, os ganhadores da integração. E isto à custa da soberania democrática de Estados nacionais desprovidos de instrumentos decentes de política, o que é pior para as periferias, que deles mais necessitam, e dentro destas para os “povos dos Estados”, a grande massa de perdedores. No fundo, a complexidade e opacidade institucional da União Europeia e da zona euro estão ao serviço de duas lógicas que não se articulam espontaneamente, mas que requerem instituições, formais e informais, para esse efeito: a da geopolítica, associada ao poder das grandes potências, e a de classe, associada à dominação do capital financeiro.
Em segundo lugar, não creio que as posições do PCP e do BE possam ser resumidas a uma “falta de autonomia”. Cada um à sua maneira, PCP e BE, nos quais creio que Pacheco Pereira até se revê em matéria europeia, não têm força suficiente ainda. Mas têm autonomamente sublinhado a sua discordância com a tralha europeia e os seus efeitos em termos de soberania democrática e de desenvolvimento nesta e noutras áreas. De qualquer forma, convém insistir mais nesta dimensão nacional, até em termos de investimento programático.
Em terceiro lugar, populismos, tal como nacionalismos, há mesmo muitos. De alguns, não devemos mesmo ter razões de queixa...

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