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quarta-feira, 21 de novembro de 2018

Educação: o preço do chumbo

Novo artigo em Aventar


por António Fernando Nabais

As retenções/reprovações/chumbos constituem um tema que, ciclicamente, regressa às parangonas dos jornais, à boleia de estudos. As críticas incluem sempre despesas astronómicas e referem-se sempre ao facto de que os alunos não melhoram.

Desta vez, até há uma diferença suficientemente abissal para que possa haver títulos sensacionalistas: um aluno retido/reprovado/chumbado custa 6 000 euros; ensinar a estudar implica um gasto de apenas 87 euros. O simplismo noticioso e político deixa clara, portanto, a ideia de que um aluno que chumba é um aluno que não foi ensinado a estudar.

Respigo, da reportagem do Público, dois excertos, vá lá, delirantes:

Ensinar a estudar, dando feedback aos alunos sobre o seu desempenho em relação aos objectivos de aprendizagem estabelecidos, é a medida que tem um efeito mais positivo.

Uma pessoa lê e pergunta-se como é que não há ninguém nas escolas que perceba isto. Nas escolas, ninguém ensina a estudar e ninguém informa os alunos (ou dá feedback, pronto) acerca do seu desempenho? Se sim, é vergonhoso! Ou então, estamos a falar, mais uma vez, do habitual fenómeno da “invenção da pólvora”.

Para a presidente do CNE, que considera a retenção uma medida “cara e inútil”, há um "facilitismo” associado ao acto de chumbar. De facto, “dá mais trabalho se formos ver onde estão as dificuldades, que outras maneiras existem de organizar as escolas e a aprendizagem”, comenta. “Reduzir as retenções obriga-nos a repensar a maneira de intervir.” 

O comentário de Maria Emília Brederode dos Santos faz parte das falácias do costume: chumbar é consequência do facilitismo dos professores. Infelizmente, a presidente do CNE, à semelhança dos muitos nefelibatas da Educação, não tem sustentação para fazer esta afirmação ou a contrária, mas esta é mais simples. No fundo, esta gente lê umas estatísticas estrangeiras e, longe da realidade das escolas, manda uns bitaites, atribuindo as culpas de uma questão social complexa aos professores e às escolas.

Em nenhum momento, estes alegados estudos se debruçam sobre os vários problemas que perturbam a actividade dos professores e das escolas, em prejuízo das aprendizagens dos alunos. Nada disso: basta dizer que as reprovações ficam muito caras e que se devem às insuficiências ou ao facilitismo de quem está no terreno.

Sem prejuízo das críticas feitas aos professores e às escolas, seria bom que o Conselho Nacional de Educação tivesse em conta que há vários anos, com realce para os últimos treze,

  • retiraram tempo de trabalho aos professores;
  • diminuíram o crédito de horas das escolas para apoio aos alunos e outras actividades;

  • aumentaram o número de alunos por turma;

  • despediram milhares de professores e mantêm os quadros fechados;

  • mantiveram o ritmo de alterações curriculares, administrativas e outras que fazem com que o sistema viva em constante desequilíbrio;

  • baixaram salários a uma grande maioria de portugueses, pais e professores incluídos (incluindo, até, imagine-se, os professores que também são pais);

  • cortaram apoios sociais;

  • etc.

E o eventualmente elevado número de retenções é da responsabilidade exclusiva das escolas e dos professores? O comentário mais meigo de que me lembro inclui actividades como lamber sabão!

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