Translate

sexta-feira, 11 de janeiro de 2019

Entre as brumas da memória


Vistos Gold?

Posted: 10 Jan 2019 12:15 PM PST

.

França: força contra a violência?

Posted: 10 Jan 2019 09:14 AM PST

La force contre la violence, le mauvais remède à la crise des gilets jaunes.

«Incapable d’articuler une réponse politique sans abandonner son projet de libéralisation de la société et de l’Etat, le gouvernement s’apprête à redoubler l’arsenal répressif. Mais les classes populaires qui se sont intégrées à la démocratie contemporaine grâce à l’institutionnalisation de l’Etat social ne peuvent se résigner à la défaite et à l’acceptation pure et simple d’un modèle économique, social et politique qui leur est imposé. Le gouvernement invoque l’état de droit et la démocratie représentative. Or, il rétrécit le droit autant qu’il étend l’espace de ce qui est illégal. Il risque de nuire à la légitimité de la loi, d’éroder la légitimité d’exercice de la force publique, d’instrumenter la police en corps de défense de l’ordre.»

.

90 é uma bela idade

Posted: 10 Jan 2019 07:40 AM PST

Parabéns, Tintim!

.

Democracia racial e outra "estórias" que o Brasil gosta de contar a si mesmo

Posted: 10 Jan 2019 03:28 AM PST

«O caso brasileiro, com a eleição de Bolsonaro, de que pretendo falar, comporta uma dimensão de transformação ideológica e social tremenda, nem sempre devidamente alcançado pela imprensa e comentadores políticos. Se na Europa e Estados Unidos, com a crise económica de 2008 e as crises sociais que ali foram fervilhadas, quando o "outro", representado, sobretudo, pelos imigrantes, mas também pelas minorias que se concebem como privilegiadas, os chamados “descamisados da globalização” começaram a verbalizar o seu mal-estar e, num contexto de crise de representação por parte dos partidos políticos mainstream, aderem a movimentos extremistas clássicos, agora reformados pelas agendas do novo milénio, no contexto brasileiro o cenário é ainda mais complexo do que isso, porque coloca em questão a própria construção da brasilidade, expondo as fragilidades de uma nação imaginada sob falácias ideológicas.

Ora, uma dessas primeiras e mais decisivas falácias, ou de outra forma, uma das estórias que o Brasil gosta de contar a si mesmo, é o da democracia racial. Enquanto base ideológica, o mito da democracia racial propagou-se entre todas as camadas sociais brasileiras permitindo fabricar perceções sociais em que a raça não operava na mobilidade e composição sociais, virando o olhar da descriminação para categorias sociais diferentes, como o "pobre", a "mulher", o "nordestino", o "veado" (homossexual).

Quando devidamente analisada, a questão racial no Brasil revela que para além dessa narrativa que serviu interesses geopolíticos, nada mais sobra que os traços grossos da mitologia. Em rigor, o Brasil não só não superou a questão racial, como jamais superou a escravatura, simplesmente transformando a condição de escravo na condição da segregação racial. Com a abolição da escravatura e com o projeto de desenvolvimentismo e embranquecimento social (interligados), ao negro, outrora escravo, reservou-se a condição de marginalidade social, empurrado para fora do traçado urbano, preservando as disposições ideológicas e legais nas quais negro, poluição étnica, ética e religiosa andavam entrelaçadas. Ao produzir a marginalização do negro, o Brasil criou as condições segregacionais adequadas para imaginar a democracia racial.

Com efeito, entre a queda do mito da democracia racial – graças às ciências sociais e aos movimentos negros – e as políticas de ação afirmativa empreendidas pelos governos do PT, ocorre a reação dos setores historicamente favorecidos, que viram os seus privilégios raciais e de classe ameaçados. Manifestações contra negros nas universidades, contra as cotas raciais, contra os direitos das domésticas, entre outros, fizeram um périplo que abriu caminho para a ascensão de uma figura próxima à de Trump, sabendo que a classe média e alta brasileira tem uma representação social de si mesma de base norte-americana. Assim, graças a uma estratégia de coligação de forças conservadoras ligadas aos media, uma campanha bem montada de fake newsvia whatsapp, o apoio massivo das principais indústrias brasileiras, em particular os interesses do gado, aliadas a um discurso populista capaz de cativar largas franjas sociais, a eleição de Jair Bolsonaro tornou-se numa realidade, passando, à imagem da sua grande referência, Donald Trump, do candidato-comédia ao presidente eleito. Quando excluído o impacto das fake news, a realidade revelada expressa a dimensão moral do Brasil: um país profundamente marcado pela homofobia, pela misoginia, pela demarcação racial e de classe. Este cenário é agudizado pela circunstância histórico-ideológico-moral que o país vive, com a revolução evangélica em curso.

O crescimento e a conquista do poder por parte das igrejas evangélicas são um dado sociológico e político já devidamente analisado pela academia brasileira. O poder político da designada bancada evangélica é, apenas, parte da realidade brasileira, onde o controlo dos media permite uma onda de fanatismo sem par no Ocidente, que se tem traduzido numa verdadeira guerra santa contra as religiões afro-brasileiras, concebidas como espaços de culto demoníaco e de albergue dos “caídos em desgraça”, como os homossexuais, travestis, e outros membros da comunidade LGBTI. Ora tais igrejas, com taxas de crescimento incomparáveis, revelam-se espaços especiais de doutrinação político-ideológica, tendo feito, na sua larga maioria, intensa, ainda que ilegal, campanha pró-Bolsonaro, ungido como Salvador da Pátria e o Messias que conduzirá o país à restauração da ordem, da moral e dos bons costumes. Esse programa ideológico em curso é evidente na composição ministerial. Olhando, por exemplo, para a ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos, Damares Alves, vemos plasmado todo o programa revolucionário evangélico em curso. Nas suas palavras: “É uma nova era no Brasil: menino veste azul e menina veste rosa”, ou “o Estado é laico, mas esta ministra é terrivelmente cristã”. Estas afirmações, proferidas no dia da tomada de posse, continuam uma narrativa particularmente preocupante perante a pasta que assume. Damares Alves que, um mês antes, afirmava que o “modelo ideal de sociedade é com mulheres apenas em casa”.

Em suma, o programa de governo de Bolsonaro configura uma total inversão da marcha civilizacional dos últimos governos, procurando implementar uma agenda que concentra a ideologia da ditadura militar, do ultraconservadorismo económico, do alinhamento das relações internacionais quase exclusivamente com os Estados Unidos (de Trump, concretamente), e da moral cristã-evangélica ultraconservadora, messiânica, de combate ao demónio representado noutras religiões e na sociedade da diversidade. De forma abreviada, a agenda do governo que agora começa funções é a da coabitação entre o plano ideológico da ditadura militar e o plano da ditadura moral. A eleição de Bolsonaro traduz uma disposição social alargada que não se revia no caminho encetado pelo PT. As classes historicamente favorecidas, caraterizadas por um manual ético e moral extremamente conservador, quando beliscadas no seu status quo, i.e., quando viram a “senzala” avançar em direção à “casa grande”, reclamando a partilha de privilégios e a conquista de direitos que lhes foram historicamente negados, reagiram, alinhando-se não ao centro-direita, mas à extrema-direita brasileira, a única capaz de reverter em tempo recorde todos os “privilégios” dados aos indesejáveis. A esta minoria juntou-se a demograficamente expressiva “nação” evangélica. Assim, depois de ter contado a si mesmo a estória da democracia racial, o Brasil contou a estória da democratização social. Tudo para não ter de contar a história do racismo, da exclusão social e da propensão autoritária.»

João Ferreira Dias

Sem comentários:

Enviar um comentário