(São José Almeida, in Público, 27/07/2019)
(O comentariado da direita - ou seja, quase tudo quanto é gato que opina no espaço público -, anda em pânico. Ele é o Júdice, o Marques Lopes, o outro Lopes - o Pedro -, a Ferreira Alves, o Xavier, e tudo quanto é tarólogo e escriba de serviço.
Parece que o Passos tinha razão: vem mesmo aí o diabo. Só que vem vestido de cor de rosa, num coche também cor de rosa conduzido a toda a brida pelo mafarrico do Costa.
Eu, por mim, ando divertido à brava a saborear estes achaques de quedas na tensão arterial de tão insignes personagens. E se os eleitores se comportarem, como se está a antever, em Outubro, ainda me vou divertir mais.
Afinal quem é que dizia que o verão era a silly season onde que não se passa nada? Este verão, pelo menos, parece-me que vai ser uma ópera bufa pautada pelas cenas pícaras de uns e o ranger de dentes de outros.
Comentário da Estátua, 27/07/2019)
O que se passa com a direita em Portugal? Está em transformação ou apenas em descalabro? A mutação no universo partidário à direita é uma realidade em vários países da Europa, mas a aceleração da crise no PSD e no CDS ameaça levar estes partidos para um patamar de irrelevância eleitoral que pode ter consequências sobre o próprio sistema partidário português.
O resultado das europeias, depois do das autárquicas, foi um sinal claro de que pode estar a caminho uma espécie de mexicanização do regime centrado no PS, como Poiares Maduro defendia em entrevista ao PÚBLICO na sexta-feira. Mas, em vez de arrepiarem caminho e reagirem, os líderes do PSD e do CDS aparentam estar desorientados, perdidos, sem norte. Rui Rio surge errático e enrolado numa série de episódios entre o dramático e o cómico, que transmitem instabilidade e desnorte.
Assunção Cristas desapareceu em combate. O CDS limita-se a ir debitando propostas eleitorais a conta-gotas. Depois de uma estratégia comunicacional frenética, Cristas esconde-se. Aparece nas redes sociais disfarçada com cabeleiras – terá a líder do CDS consciência do machismo que encerra aquela pergunta sobre preferência de penteados?
Segundo as últimas sondagens, PSD e CDS juntos ficam pelos 28%. Recorde-se que, em 2005, Pedro Santana Lopes conseguiu 28,77% para o PSD, o CDS de Paulo Portas teve 7,24%, e mesmo assim o PS de José Sócrates conquistou a maioria absoluta com 45,03%. Estão Rio e Cristas a contribuir para que o PS de António Costa atinja a maioria absoluta?
Rio decidiu esta semana dizer ao país que não acredita em sondagens – curiosamente acreditava nelas quando foi pela primeira vez candidato à Câmara do Porto. No momento em que devia estar a conquistar espaço público e visibilidade para divulgar o seu projecto de governação, decidiu criar ruído na comunicação política do PSD, desvalorizando as sondagens.
Fê-lo atacando jornalistas de forma vaga, não personalizada e estigmatizante (terá falta de coragem ou estava a inventar?) com uma frase colocada no Twitter: “Tenho, na minha ingenuidade, reparado que nestes cirúrgicos dias que antecedem o conselho nacional para a escolha dos deputados, alguns cirúrgicos jornalistas tidos como ligados à maçonaria dão mais cirúrgica importância às cirúrgicas sondagens da Pitagórica do que às outras.” Não ficámos a saber de quem falava, mas deu para entender que para o líder do PSD alguém ser da maçonaria é algo parecido com ter peçonha. Resultado: uma vez mais, Rio foi notícia por más razões e ninguém ouviu a mensagem política do PSD.
A semana ficou marcada também por mais um conflito interno em torno de personalidades do PSD. Depois do seu vice-presidente Manuel Castro Almeida se ter demitido, o que foi uma importante perda de massa crítica da direcção, Rio recusou a proposta do PSD de Setúbal de inclusão de Maria Luís Albuquerque na lista do distrito, que encabeçou há quatro anos. É certo que já esta legislatura Maria Luís Albuquerque teve um problema de incompatibilidade ao aceitar um cargo numa empresa que opera na área que tutelou como ministra. Mas Rio não alegou ser essa a razão do afastamento.
E a verdade é que, primeiro como secretária de Estado, a partir de 2013 como ministra das Finanças que sucedeu a Vítor Gaspar, Maria Luís Albuquerque foi responsável por ajudar a descer o défice orçamental de mais de 11% para 2,9%, o que permitiu a saída de Portugal do procedimento por défice excessivo. Goste-se ou não da personalidade, concorde-se ou não com a sua gestão das contas públicas, Maria Luís Albuquerque é uma figura que marcou a história do PSD e faz parte do património político do partido.
É verdade que após o Governo de Passos Coelho e Paulo Portas e da actuação brutal que adoptaram para cumprir os compromissos com a Comissão Europeia, de forma a fazer o ajustamento orçamental que reduziu o défice para o limite de 3% imposto pelo tratado orçamental, era imenso o caminho das pedras que PSD e CDS tinham de fazer para recuperar a confiança do eleitorado.
Evidente é também que, ao contrário de Portas, que percebeu a situação e saiu imediatamente de cena, Passos não compreendeu o que significava a formação de uma maioria de esquerda no Parlamento, nascida dos acordos do PS com o BE e o PCP. Continuou a acreditar que não havia alternativa à sua política. Preferiu visionar a chegada do diabo e acabou por se queimar no inferno das autárquicas, depois de se arrastar no Parlamento com o estatuto de primeiro-ministro defenestrado por António Costa.
Mas Rio é líder desde Janeiro de 2018. E o PSD continua sem norte. Pior: parece cada vez mais afogado no seu próprio tumulto interno. O que quer de facto Rio? Para onde está o presidente do PSD a levar um partido que até hoje foi estruturante da democracia portuguesa?
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