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terça-feira, 21 de abril de 2020

Bolsonaro diz que é a Constituição – não é!

Antonio Cruz/Agência Brasil

O capitão-presidente tenta justificar a participação no ato golpista de domingo, mas seu isolamento é grande e visível.

L’État c’est moi – O Estado sou eu – esta frase, atribuída ao absolutista rei Luís XIV, da França (que governou de 1638 a 1715), é semelhante à dita pelo capitão-presidente Jair Bolsonaro para tentar justificar sua participação no ato público golpista ocorrido em Brasília neste domingo (19). “Eu sou a Constituição”, disse – e enfatizou: “Eu sou realmente a Constituição”.

É alarmante: a emenda piorou muito o soneto, se é que pode ser assim designada a péssima trama ocorrida em Brasília no domingo.

Ação que deixou ainda mais visível o isolamento de Bolsonaro. Embora exista, é preciso reconhecer, uma fatia do eleitorado que acompanha sua insânia e quer fechar instituições democráticas e implantar a ditadura. Essa fatia envolve, talvez, no máximo 20% do eleitorado – algo como 28 milhões dos 146,6 milhões de eleitores brasileiros, diz o TSE. O número é grande, mas absolutamente minoritário ante os demais cerca de 118 milhões de cidadãos aptos a votar, e que apoiam a democracia.

Eles são a retaguarda das instituições – Congresso Nacional, TSE e governos estaduais – e organizações – como a Ordem dos Advogados do Brasil e outras da sociedade civil, como as centrais sindicais e as organizações estudantis, populares, de artistas, intelectuais, religiosos e demais democratas – que rejeitam os atentados ao Estado Democrático de Direito praticados por Bolsonaro e sua gang. São os que respaldam também manifestações de generais – inclusive que participam de seu governo, diz “O Estado de S. Paulo” – que encararam com “enorme desconforto”, como uma saia justa, as ações do capitão-presidente. E, sem se identificar (os militares não podem pela lei manifestar opiniões políticas) condenaram aquelas ações antidemocráticas e as condenaram, lembrando, diz o jornal paulista – que ouviu sete oficiais-generais: cinco do Exército, um da Aeronáutica e um da Marinha – que as Forças Armadas servem ao “Estado brasileiro, e não a um governo”.

Todos eles preocupados com a “verdadeira guerra” contra o vírus que o país vive, não podendo por isso gastar energia com alvos diferentes. Na segunda-feira (20), Bolsonaro tentou desdizer o que insinuou no domingo, quando vociferou contra as instituições e disse que não há o que negociar com nenhuma delas. Mas a manchete de “O Estado de S. Paulo” refletiu o clima – e o isolamento de Bolsonaro – entre os generais: “Recuo de Bolsonaro após participar de ato foi pedido por militares”, que o teriam alertado, diz o jornal, de que sua participação no ato de domingo expôs as Forças Armadas a uma situação constrangedora.

Bolsonaro tenta construir o caminho do golpe. Seu constante “morde e sopra” sonda o terreno com balões de ensaio para ver como o país reage – ele busca o momento que julga mais adequado para seu pretendido ataque às instituições e à democracia.

Neste momento está isolado – não consegue aprovar no Congresso todas as maldades ultraliberais que pretende (a carteira “vede-e-amarela”, por exemplo, foi agora rejeitada), e suas ações políticas o colocam em grande isolamento (como a demissão do ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta, no dia 16, e sua intervenção no ato golpista, no dia 19).

Mas ele insiste, como mostra sua imitação involuntária de Luís XIV. E comete outro abuso ao dizer que “eu sou a Constituição”. Não é. A Constituição é a Lei Maior, a Carta Magna que subordina todos os brasileiros, e por todos deve ser obedecida. A começar pelo presidente da República, que, no ato de sua posse em 1° de janeiro de 2019 jurou mantê-la, defendê-la  cumpri-la, observando as leis, promovendo o bem geral do povo brasileiro, sustentando a união, integridade e independência do Brasil – obrigações que estão em falta na presidência da República em nossos dias.

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