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quarta-feira, 22 de abril de 2020

O verão do nosso descontentamento

Curto

Joana Pereira Bastos

Joana Pereira Bastos

Editora de Sociedade

22 ABRIL 2020

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"Aqui nesta praia onde
Não há nenhum vestígio de impureza,
Aqui onde há somente
Ondas tombando ininterruptamente,
Puro espaço e lúcida unidade,
Aqui o tempo apaixonadamente
Encontra a própria liberdade."

Sophia de Mello Breyner Andresen
Bom dia,
Poucas coisas conferem uma tão grande sensação de liberdade como caminhar na praia ou dar um mergulho no mar. Depois de tantas semanas de reclusão forçada, nunca a praia nos foi tão apetecível. Mas neste que é o ano do nosso descontentamento nem aí conseguiremos plenamente recuperar a liberdade que a pandemia nos roubou.
Sabemos pela evolução da covid-19 em países de tempo quente, como o Brasil, que o calor não trava a doença. Neste verão não haverá, portanto, praias sem “vestígio de impureza”. Sobre todas pairará a sombra do vírus. Por isso, já é sabido que haverá restrições. Na entrevista ao Expresso publicada no último sábado, António Costa revelou que, mesmo a banhos, “vamos ter de manter as medidas de afastamento social” e que a “aglomeração não vai poder existir”.
Em concreto, as limitações a impor nas praias deverão começar a desenhar-se hoje, numa reunião convocada pela Agência Portuguesa do Ambiente e que juntará a Direção-Geral da Saúde, a Autoridade Marítima Nacional, o Instituto de Socorros a Náufragos e a Associação Bandeira Azul, entre outras entidades. No encontro, que será realizado por videoconferência, será decidida, por exemplo, a data de início da época balnear - que poderá ser mais tarde do que o habitual - e as condições em que se vai realizar.
A questão é controversa e está a ganhar atualidade. Há exatamente dez dias, a presidente da Comissão Europeia desaconselhou os europeus de fazerem planos para o verão por ser impossível “fazer previsões confiáveis para julho e agosto”. Esta semana, no entanto, Ursula Von der Leyen mostrou-se mais otimista, acreditando que serão encontradas “soluções inteligentes” para fazer praia, “com medidas de higiene e distância social”.
São essas soluções que estão agora a ser pensadas nos países europeus mais conhecidos pelas suas praias. Em Espanha, os governos das regiões autónomas já começaram a estudar medidas, enquanto se aguardam orientações nacionais. A Junta da Andaluzia, por exemplo, propôs ontem que os quase mil quilómetros de costa sejam abertos apenas a partir de julho e com limitação de capacidade por forma a manter distâncias de segurança de “vários metros”, com fiscalização policial. “Uma vez esgotada a capacidade da praia, ninguém mais poderá entrar”, explicou o presidente da junta da Andaluzia, Juanma Moreno.
Também em Itália estão a ser estudadas as limitações a impor. Na ilha de Albarella, um resort muito procurado na costa norte do Adriático, já foi elaborado um plano de reabertura das praias que impõe uma área mínima de 40 m2 para cada chapéu de sol, desinfeção de passadiços e espreguiçadeiras e uso obrigatório de chinelos e máscara no acesso ao areal.
Mas há soluções mais radicais. Uma empresa italiana projetou para uma praia da Riviera Romagnola a criação de caixas de acrílico com 4,5 por 4,5 metros de largura para isolar cada par de espreguiçadeiras – uma espécie de barraquinhas de praia, versão covid-19. A empresa garante já ter recebido, entretanto, pedidos de muitos concessionários e o projeto está a ser estudado em várias regiões do país. Resta saber se será possível suportar o calor no confinamento de uma caixa de plástico à torreira do sol.

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