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terça-feira, 5 de dezembro de 2017

A CAMBALHOTA DO CAG

por estatuadesal

(In Blog 77 Colinas, 04/12/2017)

cambalhota
- Boa noite, doutor Marques Mendes
- Boa noite, Clara.
- Está com um ar abatido.
- Acabo de dar uma valente cambalhota e aleijei-me.
- As melhoras. Há 10 meses atrás, disse que que a notícia de que Centeno tinha possibilidades de vir a ser o próximo presidente do Eurogrupo, era uma treta e que o ministro das finanças estava apenas a pôr-se em bicos de pés e a autopromover-se. Como avalia a atual situação?
- Em primeiro lugar, tenho de dar os parabéns ao Expresso porque acertou em cheio.
- E porque é que o senhor errou?
- A culpa é do Expresso.
- Como assim?
- Estamos habituados a seguir aquela norma de que, se dissermos o contrário do que o Expresso noticia, acertamos e desta vez eles acertaram e eu falhei.
- Doutor, eu pensava que isto era um programa de comentário político e não de previsões astrológicas.
- Claro, Clara. As minhas fontes é que deixaram de ser tão fidedignas, mas eu continuo a ser um CAG.
- Um quê?!!!
- CAG significa Comentador de Alto Gabarito.
- Bolas, que até me assustei.
- É apenas uma sigla. A minha esmerada educação não permitiria outra interpretação
- O que pensa da possível eleição de Centeno para presidente do Eurogrupo?
- É uma vitória de Centeno, do Governo e do país.
- O seu camarada de partido Rangel não pensa assim
- Camarada?!!!
- Desculpe, o seu corre…ligionário de partido.
- Não ligue, esse ainda é mais parvo que eu.
- Doutor Marques Mendes, o que é que o levou a dar tamanha cambalhota?
- FU
- Outra sigla? Explique lá o quer dizer.
- Essa não explico porque preciso deste tacho.

Não é que me importe muito com isso…

aventar_fb_header

por j. manuel cordeiro

... mas ver Centeno à frente do Eurogrupo tem a enorme graça de ver, novamente, o alcoviteiro Marques Mendes enganar-se redondamente. Nada de novo. Não aconteceu uma nem duas vezes. A parte que realmente espanta, ou nem por isso, é assistir à correia de transmissão pegar nas patralhas do gandanóia e delas fazer notícia. É o que tem religiosamente acontecido às segundas-feiras no Diário de Notícias e em mais alguns que, depois, re-noticiam a não notícia.

Ah e tal o jornalismo está em queda, queixam-se os jornaleiros. O facto é que, para mim, presentemente não há um único jornal nacional que mereça a moeda de euro e mais uns cobres para o comprar. Será defeito meu, certamente.

segunda-feira, 4 de dezembro de 2017

Alguma dúvida?

Posted: 03 Dec 2017 02:37 PM PST

Centeno no Eurogrupo é uma boa notícia para o país

Centeno no Eurogrupo é uma boa notícia para o país

por CGP

Socialista, permitindo reequilibrar as lideranças de orgãos da UE maioritariamente nas mãos do Partido Popular Europeu. De um país pequeno, como foram quase todos os presidentes do Eurogrupo e da Comissão Europeia neste século. Ambicioso, por isso disponível para agradar aos poderes que podem fazer com que esta presidência seja apenas um degrau na hierarquia da UE. E, provavelmente, disponível para ser o primeiro presidente a tempo inteiro do Eurogrupo depois das próximas legislativas. Terão sido estas as características que tornaram Centeno num candidato vencedor à frente do Ministro das Finanças luxemburguês.

Mas Centeno tem outros méritos. Centeno conseguiu perceber muito cedo que o eleitorado da esquerda importa-se bastante mais com os salários da Função Pública do que com a qualidade dos serviços públicos, especialmente do SNS (o eleitorado BE tem seguros de saúde e os funcionários públicos têm ADSE). Mesmo beneficiando de um ciclo económico positivo, teve o mérito de não agravar o défice estrutural. De certa forma, acabou por ser bastante mais liberal do que Vítor Gaspar ao aumentar o peso dos impostos indirectos e, ao deteriorar a qualidade do SNS e da escola pública, deu um incentivo importante aos sistemas de saúde privados e colégios não incluídos na rede pública. Mais do que isso, conseguiu colocar a esquerda em peso a congratular-se pela baixa do défice, contribuindo para que se torna-se consensual na política portuguesa a ideia de que o défice das contas públicas deve ser baixo. Hoje concordamos todos, do BE ao CDS, que há pouca vida política para além de um défice excessivo. Melhor do que isso, daqui para a frente, todas as decisões tomadas pelo Eurogrupo liderado por Centeno serão racionalizadas internamente pela máquina de comunicação da esquerda como sendo as melhores para o país e a UE. Um novo Varoufakis será demonizado e não idolatrado pela nossa esquerda. Ter um PS alinhado com o Eurogrupo é um excelente cenário para o país, principalmente se for acompanhado pelo BE e CDU. De certa forma, a eleição de Centeno para o Eurogrupo é ainda mais importante do que a de Guterres para a ONU. Em termos de resultados prácticos de políticas internas certamente será.

Centeno, de mr. Hyde a dr. Jekyll do Eurogrupo

por estatuadesal

(Nicolau Santos, in Expresso Diário, 04/12/2017)

nicolau

Quando em 1 de Abril deste ano o Expresso colocou em manchete que Mário Centeno estava na corrida ao cargo de presidente do Eurogrupo, o ceticismo entre políticos e analistas foi geral e muita gente considerou que se tratava da nossa partida alusiva ao Dia das Mentiras. Como hoje, 4 de Dezembro, se comprova, era a mais pura das verdades. Mas será que esta eleição é boa para Portugal?

Bom, do ponto de vista do prestígio internacional, é indiscutível que este é um excelente resultado para Portugal. Um país que esteve sob resgate externo entre 2011 e 2015 consegue ter agora dois cidadãos em dois dos mais importantes postos internacionais: secretário geral das Nações Unidas e presidente do Eurogrupo. E se o primeiro tem bastante mais peso a nível mundial, o segundo é bem mais decisivo na Europa.

E é mais decisivo por duas razões: a primeira é que Mário Centeno foi olhado com bastante desconfiança quando se apresentou pela primeira vez numa reunião do Eurogrupo, sobretudo por ser o ministro das Finanças de uma solução governativa liderada por um partido de centro-esquerda apoiado por bloquistas e comunistas; e em segundo porque a política económica que desenvolveu foi, sob muitos pontos de vista, ao arrepio do pensamento dominante na União Europeia, nomeadamente a subida do salário mínimo, a reposição de salários e pensões, o fim de numerosos cortes que tinham sido impostos ao Estado social, a descida de impostos diretos.

É assim extraordinário que entre novembro de 2015 e Novembro de 2017, ou seja, em apenas dois anos, Centeno tenha passado de um ministro das Finanças marginal e olhado com desconfiança para uma quase unanimidade entre os seus pares, que o elegeram agora largamente para presidente do Eurogrupo. Tal só foi possível, como é evidente, porque o ano de 2017 provou por A+B que não havia só um caminho para lidar com a crise; pelo contrário, se houvesse crescimento (e em 2017 ele será de 2,5%, claramente acima dos 1,8% projetados) era possível compatibilizar a devolução de muito do que tinha sido tirado aos portugueses e ao Estado social entre 2011 e 2015 com a redução consistente e acima do esperado do défice e com a diminuição da dívida pública.

Foi isso que Comissão Europeia e FMI foram reconhecendo, corrigindo sempre em alta as suas previsões para a economia portuguesa ao longo do ano, o que culminou com saída do país do Procedimento por Défice Excessivo, para onde tinha caído há seis anos. E foi tudo isso que levou a agência de rating Standard & Poor’s a subir inesperadamente a notação da dívida portuguesa, retirando-a da classificação de “lixo” e levando a que provavelmente a Fitch ainda este ano e a Moody’s no início do próximo sigam o mesmo caminho. Foi ainda isso que permitiu a que, pela primeira vez na sua história, a República Portuguesa fizesse uma emissão de dívida a dez anos com uma taxa de juro inferior a 2%.

Dito isto, o que ganha o país com o facto de ter o presidente do Eurogrupo? Deve sublinhar-se que não houve uma mudança no pensamento neo-liberal que domina a Europa. Centeno chega ao cargo porque era necessário aliviar a pressão e o stress que se instalou entre os países do norte e do sul na sequência da crise das dívidas soberanas e dos programas de ajustamento que foram aplicados e que causaram enorme dor social. Também foi eleito porque o PPE tem representantes seus em quase todas as instituições europeias e era necessário que alguma delas ficasse nas mãos da família socialista. E foi ainda eleito porque não se apresentou nenhum candidato de peso, dos chamados grandes países, ao cargo.

Isso não retira mérito a Centeno e à diplomacia portuguesa mas não nos permite acalentar muitas ilusões. A ortodoxia dominante em matéria de pensamento económico é agora menos asfixiante mas não deixou de existir. Há, contudo, dois pontos onde Centeno pode ser determinante: é se decidir colocar em discussão entre os seus pares o debate sobre o défice estrutural, a sua falibilidade e a necessidade de o substituir por outro indicador bem mais preciso (por exemplo, o peso da despesa em percentagem do PIB); e o segundo é se conseguir colocar na agenda europeia o debate sobre a reestruturação das dívidas soberanas e a sua mutualização, algo para que o presidente francês Emanuel Macron se mostra disponível (embora para a frente e não para as dívidas que se acumularam até aqui) mas que depende da clarificação da situação política na Alemanha para que a discussão possa avançar.

Uma coisa, contudo, é certa: Mário Centeno chega a presidente do Eurogrupo porque demonstrou com resultados que era possível conciliar reposição de salários, pensões e apoios sociais, bem como o aumento do salário mínimo, com diminuição do défice e da dívida, crescimento económico e redução do desemprego. Tudo o que nos andaram a dizer desde 2011 que não era possível fazer.

E nesse aspeto, o Governo PSD/CDS teve o enorme respaldo do Eurogrupo, Comissão Europeia e FMI. Não se pense, pois, que só por Mário Centeno ter sido eleito estas ideias desapareceram ou deixaram de ser dominantes. E a pressão para Centeno actuar de acordo com elas vai ser enorme.

Internamente, o desafio também não será pequeno. Será que se Centeno já fosse presidente do Eurogrupo há dois anos teria conduzido a política económica que desenvolveu em Portugal? É esta a questão central que se vai colocar a Centeno nos dois próximos anos – porque não lhe será possível ser Dr. Jekyll cá por casa e Mr. Hyde no Eurogrupo.