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domingo, 11 de março de 2018

Quo vadis, UE?

Ladrões de Bicicletas


Posted: 10 Mar 2018 12:08 PM PST

Ainda há quem pense que as reformas da Zona Euro que estão a ser negociadas são o caminho para dar futuro a esta zona de protectorados da Alemanha. Neste vídeo explicamos que, ao contrário do que os media dizem, a aplicação destas propostas (mesmo que apenas algumas) vai agravar as contradições existentes, apertando o colete de forças sobre as economias e os povos.
A política orçamental continua a ser diabolizada e o faz-de-conta-que-não-sabem que o orçamento do Estado é um resultado do funcionamento global da economia, não dependendo apenas do governo, continua a marcar todas as novas ideias sobre o controlo do défice por via do controle da despesa. Continua o obscurantismo que faz crer aos cidadãos que só pode haver investimento público financiado por impostos, quando o BCE todos os meses cria imenso dinheiro para manter as taxas de juro baixas, apesar de não conseguir alcançar o objectivo de uma inflação perto dos 2%. Não lhes ocorre que o relançamento sustentado de uma economia que esteve em recessão não pode ser feito apenas através da política monetária. Segundo a ortodoxia, evidentemente, a política orçamental é ineficaz.
Propõe-se também uma limpeza de toda a dívida pública do balanço dos bancos, fazendo depender o financiamento de qualquer défice público da emissão de obrigações com um estatuto de maior risco relativamente a um novo tipo de obrigações, a emitir pela UE, garantidas por uma carteira de obrigações dos vários Estados. Repare-se que não é o BCE, como prestamista de último recurso, que garantiria essas novas obrigações. Toda uma engenharia destinada a evitar que os alemães não fiquem assustados com o risco de o BCE monetarizar qualquer défice. E tudo o mais que se propõe é simplesmente trágico. Esta zona euro é mesmo uma aberração histórica.
Tudo o que poderia dar um retoque algo mais progressista à Zona Euro não faz parte das reformas propostas. Felizmente, as eleições em Itália deram o tiro de partida para a fase terminal deste projecto moribundo. Infelizmente, dado que a esquerda entregou a bandeira da luta contra o euro à direita, o fim deste projecto bárbaro será liderado pela direita. Tal como nos anos trinta do século passado, no continente europeu, a esquerda faz haraquiri. Triste.

As 50 palavras mais caras da Língua Portuguesa

por admin

Há quem lhes chame palavras cultas. Mas são apenas palavras difíceis ou, pelo menos, um pouco mais difíceis do que o normal. Nós preferimos chamar-lhes palavras caras em homenagem às pessoas que assim lhes chamam quando não entendem o seu significado. A Língua Portuguesa está repleta de palavras pouco usadas no nosso quotidiano e, por isso, talvez mais difíceis de entender. A maioria destas palavras possui também sinónimos mais fáceis de memorizar ou de compreender. Algumas são palavras antigas e outras são apenas palavras engraçadas. Descubra as palavras mais difíceis (e os seus significados) da Língua Portuguesa.

1. Escaler

O navio não podia atracar na ilha. Quem quisesse ir a terra teria de embarcar num dos dois escaleres que já se viam no mar, indo e vindo, numa alegre e excitante azáfama.

2. Sainete

Nem tudo é desagradável no rosto dele! O sorriso luminoso e os dentes perfeitos são o seu sainete.

3. Bambúrrio

Ele não sabe nada de Geografia! Acertou e ganhou por mero acaso! Aquilo foi um bambúrrio e nada mais!

4. Alinhavo

Agora já podes coser a bainha à máquina, seguindo os alinhavos brancos; depois tiras os alinhavos, claro! É só puxar a linha com cuidado.

5. Pingarelho

Isto não funciona porque lhe falta aqui um pingarelho qualquer.

6. Crestar

O frio intenso e sobretudo a geada matinal acabaram por crestar completamente a relva e as plantas do jardim.

7. Apropinquar

Lá está ela a apropinquar-se daquele senhor de idade para lhe meter a mão no bolso e lhe roubar a carteira.

8. Lazeira

Não sei se era do calor, mas aquilo, por lá, era uma lazeira só! Grandes sestas, muita cerveja... Por isso é que a obra demorou tanto a acabar!

9. Lampinho

À primeira vista, ele não era um homem agradável: havia qualquer coisa de estranho e perturbador no seu rosto rosado e lampinho.

10. Imarcescível

Nunca se esgota o gesto nobre de render preito à glória imarcescível dos nossos heróis!

11. Prosápia

O tipo falava e actuava com uma enorme prosápia, mas aquilo tudo espremido não significava nada!

12. Silente

Falavam pouco, mal se tocavam, mas havia entre eles uma cumplicidade silente e firme que impressionava. Eram felizes.

13. Preito

Todos devemos um preito de amor e gratidão aos poetas, aos músicos, aos pintores, àqueles, enfim, que enchem de beleza as nossas vidas.

14. Deletério

O maior problema do cigarro não é o efeito adictício da nicotina, mas sim a ação deletéria de todos os seus outros componentes.

15. Estúrdio

De um estúrdio como tu, só se podia esperar uma atitude estúrdia como esta!

16. Camoeca

Ela parecia estar bem, mas, de repente, deu-lhe uma camoeca qualquer e desmaiou, em plena conferência.

17. Perfunctório

O pai detestava o espírito perfunctório e agitado que, no verão, se instalava na estância balnear! Não suportava tanta irrelevância, e desaparecia até à hora do jantar.

18. Pernóstico

Ele entrou na sala, tentando um grande estilo, meio ridículo com aquela capa de arminho pelos ombros, muito pernóstico como sempre foi.

19. Procrastrinar

Com a depressão, ele tornou-se perito em procrastinar o cumprimento dos seus deveres! Sofre com isso e faz sofrer toda a gente que dele depende.

20. Lépido

Nesse dia, ele saiu de casa a assobiar, lépido e esperançado, com a íntima certeza de que, por fim, encontraria trabalho. E assim foi!

21. Húbris

Toda a húbris da ciência médica vacilou ante a evidência do milagre. O tumor tinha desaparecido!

22. Menoscabar

O senhor não tem o direito de, com as suas pérfidas palavras, menoscabar a honra de uma pessoa proba e que, além do mais, está ausente desta discussão!

23. Diáfano

Os seus diáfanos olhos azuis não conseguiam ocultar nada: falavam sempre a verdade!

24. Veneta

Sei lá! Deu-lhe na veneta e arrancou para Paris!

25. Níveo

Envolta no seu níveo vestido de noiva, ela entrou na igreja com a leveza de uma nuvem num céu de primavera.

26. Sevandija

Bem, nem imaginas com quem ela vive agora! Com um tipo estranhíssimo, que ela diz que é artista plástico, mas que é uma autêntica sevandija a viver à custa dela!

27. Antanho

O avô nunca se desfez do seu velho gira-discos, nem dos discos de vinilo com “as mais belas canções de antanho”, como ele dizia.

28. Adejar

Ao fim da tarde, antes de recolher aos ninhos, os pássaros adejavam longamente sobre a eira, numa última aflição por encontrar alimento.

29. Bonomia

Da tia Inácia, recordo sobretudo a sua extraordinária bonomia, sempre disponível para ajudar toda a gente, a qualquer hora, com o mesmo sorriso claro e afável.

30. Azevieiro

Ninguém quer jogar às cartas com ele, porque tem fama de ser muito azevieiro, apesar da carinha de anjo que tem.

31. Lábil

Ela foi sempre muito lábil ante as tentações da boca: não resistia nem aos doces nem aos salgados!

32. Tálamo

Chegados ao quarto, depois da boda, Efigénia olhou de frente para o tálamo de sedas claras em que dormiria, por primeira vez, nos braços do seu amado.

33. Simonia

O tipo enriqueceu dedicado à simonia: assaltava igrejas, capelas, mausoléus e, segundo dizem, passava as coisas para Espanha, onde tinha clientes fixos. Enfim, um tipo simoníaco!

34. Dispepsia

Lembro-me de, noutros tempos, as pessoas dizerem, elegantemente, que sofriam de dispepsia. Afinal o que elas tinham eram indigestões, de tanto comerem e beberem!

35. Cerviz

O medo dominava a situação, mas, nesse dia, ninguém parecia disposto a dobrar a cerviz ante mais aquela arbitrariedade do ditador.

36. Torcionário

Por mil anos que passassem, não poderia esquecer o olhar impiedoso dos cinco torcionários que, durante mais de 24 horas, se revezaram para lhe fazer o primeiro interrogatório.

37. Arroubo

Em pleno aeroporto, num arroubo infantil inesperado, ela caiu de joelhos, agarrada às pernas dele, suplicando-lhe que não partisse, que não a deixasse ali desamparada!

38. Hausto

Nessa terra seca e hostil, sorvera Afonso o primeiro hausto de vida e foi nela também que exalou o seu último suspiro.

39. Feérico

Estava toda a gente maravilhada com o ambiente feérico criado para o espectáculo, com luzes filtradas por véus em movimento, ao ritmo suave de harpas e oboés.

40. Remir

Já te pedi desculpa mil vezes! Já te disse que tal não volta a acontecer! Não sei que mais hei de fazer para remir os meus pecados!

41. Vulpino

Ela era bonita, mas tinha um olhar inquietante, fugidio, vulpino. Era manhosa e acabou por lhe dar cabo da vida!

42. Concupiscência

Aquela era uma comunidade muito dada à concupiscência de todos os chamados pecados mortais.

43. Obnóxio

Ó, obnóxia e letárgica gente desta terra ingrata e estéril! Merecei-vos uma à outra, por nefastas e servis!

44. Probo

Ele era, reconhecidamente, um homem probo, respeitado e estimado por toda a gente.

45. Estiolado

Naquela casa escura, de persianas sempre fechadas, não entrava o sol nem a alegria. As próprias plantas eram fantasmagóricas: cresciam moles, cor de cinza, estioladas, buscando o chão.

46. Pane

Apesar do carro ser velho e a estrada estar em péssimo estado, conseguimos fazer a viagem toda sem panes.

47. Besnico

Fiquei parva, a olhar para o besnico, tão pequenino e já capaz de saltar por cima das grades da cama!

48. Vogar

Estava muito triste. Remou com força até perder de vista a praia e deixou, depois, vogar o barco ao sabor das ondas. Se morresse, morria.

49. Capiangar

Ela era conhecida por capiangar fruta nas bancas da praça! Uma vergonha!

50. Sedição

Os protestos pacíficos da população podem descambar rapidamente em sedição incontrolável.

O Amor em Visita

por estatuadesal

(Herberto Helder, in 'O Amor em Visita' )

herberto

(Publico este poema a pedido de uma leitura desta página que, argumentou, em certas alturas a política lhe causa tédio. E tem razão. Este fim de semana a Dona Cristas têm-nos enchido os horizontes do olhar, e o tédio surge; não por ela ser mulher, mas talvez por ela querer fazer política repetindo e mesmo amplificando todos os vícios que podem ser assacados aos homens. Por isso aqui fica Herberto e a mulher, essa com mulher com que muitos sonham mas que poucos almejam encontrar.

Estátua de Sal, 11/03/2018)


Dai-me uma jovem mulher com sua harpa de sombra
e seu arbusto de sangue. Com ela
encantarei a noite.
Dai-me uma folha viva de erva, uma mulher.
Seus ombros beijarei, a pedra pequena
do sorriso de um momento.
Mulher quase incriada, mas com a gravidade
de dois seios, com o peso lúbrico e triste
da boca. Seus ombros beijarei.

Cantar? Longamente cantar.
Uma mulher com quem beber e morrer.
Quando fora se abrir o instinto da noite e uma ave
o atravessar trespassada por um grito marítimo
e o pão for invadido pelas ondas -
seu corpo arderá mansamente sob os meus olhos palpitantes.
Ele - imagem vertiginosa e alta de um certo pensamento
de alegria e de impudor.
Seu corpo arderá para mim
sobre um lençol mordido por flores com água.

Em cada mulher existe uma morte silenciosa.
E enquanto o dorso imagina, sob os dedos,
os bordões da melodia,
a morte sobe pelos dedos, navega o sangue,
desfaz-se em embriaguez dentro do coração faminto.
- Oh cabra no vento e na urze, mulher nua sob
as mãos, mulher de ventre escarlate onde o sal põe o espírito,
mulher de pés no branco, transportadora
da morte e da alegria.

Dai-me uma mulher tão nova como a resina
e o cheiro da terra.
Com uma flecha em meu flanco, cantarei.
E enquanto manar de minha carne uma videira de sangue,
cantarei seu sorriso ardendo,
suas mamas de pura substância,
a curva quente dos cabelos.
Beberei sua boca, para depois cantar a morte
e a alegria da morte.

Dai-me um torso dobrado pela música, um ligeiro
pescoço de planta,
onde uma chama comece a florir o espírito.
À tona da sua face se moverão as águas,
dentro da sua face estará a pedra da noite.
- Então cantarei a exaltante alegria da morte.

Nem sempre me incendeiam o acordar das ervas e a estrela
despenhada de sua órbita viva.
- Porém, tu sempre me incendeias.
Esqueço o arbusto impregnado de silêncio diurno, a noite
imagem pungente
com seu deus esmagado e ascendido.
- Porém, não te esquecem meus corações de sal e de brandura.
Entontece meu hálito com a sombra,
tua boca penetra a minha voz como a espada
se perde no arco.
E quando gela a mãe em sua distância amarga, a lua
estiola, a paisagem regressa ao ventre, o tempo
se desfibra - invento para ti a música, a loucura
e o mar.

Toco o peso da tua vida: a carne que fulge, o sorriso,
a inspiração.
E eu sei que cercaste os pensamentos com mesa e harpa.
Vou para ti com a beleza oculta,
o corpo iluminado pelas luzes longas.
Digo: eu sou a beleza, seu rosto e seu durar. Teus olhos
transfiguram-se, tuas mãos descobrem
a sombra da minha face. Agarro tua cabeça
áspera e luminosa, e digo: ouves, meu amor?, eu sou
aquilo que se espera para as coisas, para o tempo -
eu sou a beleza.
Inteira, tua vida o deseja. Para mim se erguem
teus olhos de longe. Tu própria me duras em minha velada
beleza.

Então sento-me à tua mesa. Porque é de ti
que me vem o fogo.
Não há gesto ou verdade onde não dormissem
tua noite e loucura, não há vindima ou água
em que não estivesses pousando o silêncio criador.
Digo: olha, é o mar e a ilha dos mitos
originais.
Tu dás-me a tua mesa, descerras na vastidão da terra
a carne transcendente. E em ti
principiam o mar e o mundo.

Minha memória perde em sua espuma
o sinal e a vinha.
Plantas, bichos, águas cresceram como religião
sobre a vida - e eu nisso demorei
meu frágil instante. Porém
teu silêncio de fogo e leite repõe a força
maternal, e tudo circula entre teu sopro
e teu amor. As coisas nascem de ti
como as luas nascem dos campos fecundos,
os instantes começam da tua oferenda
como as guitarras tiram seu início da música nocturna.

Mais inocente que as árvores, mais vasta
que a pedra e a morte,
a carne cresce em seu espírito cego e abstracto,
tinge a aurora pobre,
insiste de violência a imobilidade aquática.
E os astros quebram-se em luz
sobre as casas, a cidade arrebata-se,
os bichos erguem seus olhos dementes,
arde a madeira - para que tudo cante
pelo teu poder fechado.
Com minha face cheia de teu espanto e beleza,
eu sei quanto és o íntimo pudor
e a água inicial de outros sentidos.

Começa o tempo onde a mulher começa,
é sua carne que do minuto obscuro e morto
se devolve à luz.
Na morte referve o vinho, e a promessa tinge as pálpebras
com uma imagem.
Espero o tempo com a face espantada junto ao teu peito
de sal e de silêncio, concebo para minha serenidade
uma ideia de pedra e de brancura.
És tu que me aceitas em teu sorriso, que ouves,
que te alimentas de desejos puros.
E une-se ao vento o espírito, rarefaz-se a auréola,
a sombra canta baixo.

Começa o tempo onde a boca se desfaz na lua,
onde a beleza que transportas como um peso árduo
se quebra em glória junto ao meu flanco
martirizado e vivo.
- Para consagração da noite erguerei um violino,
beijarei tuas mãos fecundas, e à madrugada
darei minha voz confundida com a tua.
Oh teoria de instintos, dom de inocência,
taça para beber junto à perturbada intimidade
em que me acolhes.

Começa o tempo na insuportável ternura
com que te adivinho, o tempo onde
a vária dor envolve o barro e a estrela, onde
o encanto liga a ave ao trevo. E em sua medida
ingénua e cara, o que pressente o coração
engasta seu contorno de lume ao longe.
Bom será o tempo, bom será o espírito,
boa será nossa carne presa e morosa.
- Começa o tempo onde se une a vida
à nossa vida breve.

Estás profundamente na pedra e a pedra em mim, ó urna
salina, imagem fechada em sua força e pungência.
E o que se perde de ti, como espírito de música estiolado
em torno das violas, a morte que não beijo,
a erva incendiada que se derrama na íntima noite
- o que se perde de ti, minha voz o renova
num estilo de prata viva.

Quando o fruto empolga um instante a eternidade
inteira, eu estou no fruto como sol
e desfeita pedra, e tu és o silêncio, a cerrada
matriz de sumo e vivo gosto.
- E as aves morrem para nós, os luminosos cálices
das nuvens florescem, a resina tinge
a estrela, o aroma distancia o barro vermelho da manhã.
E estás em mim como a flor na ideia
e o livro no espaço triste.

Se te aprendessem minhas mãos, forma do vento
a cevada pura, de ti viriam cheias
minhas mãos sem nada. Se uma vida dormisses
em minha espuma,
que frescura indecisa ficaria no meu sorriso?
- No entanto és tu que te moverás na matéria
da minha boca, e serás uma árvore
dormindo e acordando onde existe o meu sangue.

Beijar teus olhos será morrer pela esperança.
Ver no aro de fogo de uma entrega
tua carne de vinho roçada pelo espírito de Deus
será criar-te para luz dos meus pulsos e instante
do meu perpétuo instante.
- Eu devo rasgar minha face para que a tua face
se encha de um minuto sobrenatural,
devo murmurar cada coisa do mundo
até que sejas o incêndio da minha voz.

As águas que um dia nasceram onde marcaste o peso
jovem da carne aspiram longamente
a nossa vida. As sombras que rodeiam
o êxtase, os bichos que levam ao fim do instinto
seu bárbaro fulgor, o rosto divino
impresso no lodo, a casa morta, a montanha
inspirada, o mar, os centauros
do crepúsculo
- aspiram longamente a nossa vida.

Por isso é que estamos morrendo na boca
um do outro. Por isso é que
nos desfazemos no arco do verão, no pensamento
da brisa, no sorriso, no peixe,
no cubo, no linho,
no mosto aberto
- no amor mais terrível do que a vida.

Beijo o degrau e o espaço. O meu desejo traz
o perfume da tua noite.
Murmuro os teus cabelos e o teu ventre, ó mais nua
e branca das mulheres. Correm em mim o lacre
e a cânfora, descubro tuas mãos, ergue-se tua boca
ao círculo de meu ardente pensamento.
Onde está o mar? Aves bêbedas e puras que voam
sobre o teu sorriso imenso.
Em cada espasmo eu morrerei contigo.

E peço ao vento: traz do espaço a luz inocente
das urzes, um silêncio, uma palavra;
traz da montanha um pássaro de resina, uma lua
vermelha.
Oh amados cavalos com flor de giesta nos olhos novos,
casa de madeira do planalto,
rios imaginados,
espadas, danças, superstições, cânticos, coisas
maravilhosas da noite. Ó meu amor,
em cada espasmo eu morrerei contigo.

De meu recente coração a vida inteira sobe,
o povo renasce,
o tempo ganha a alma. Meu desejo devora
a flor do vinho, envolve tuas ancas com uma espuma
de crepúsculos e crateras.
Ó pensada corola de linho, mulher que a fome
encanta pela noite equilibrada, imponderável -
em cada espasmo eu morrerei contigo.

E à alegria diurna descerro as mãos. Perde-se
entre a nuvem e o arbusto o cheiro acre e puro
da tua entrega. Bichos inclinam-se
para dentro do sono, levantam-se rosas respirando
contra o ar. Tua voz canta
o horto e a água - e eu caminho pelas ruas frias com
o lento desejo do teu corpo.
Beijarei em ti a vida enorme, e em cada espasmo
eu morrerei contigo.

Treslendo o semanário de Balsemão

por estatuadesal

(Por Jorge Rocha, in Blog Ventos Semeados, 10/03/2018)

cristas_zinco

  1. Semana a semana Angela Silva continua-nos a dar conta dos estados de alma de Marcelo Rebelo de Sousa, que já terá reunido o seu staff em Belém para implementar o plano alternativo ao de não ver Rui Rio a ser bem sucedido como líder da oposição. Na edição de hoje do «Expresso», a voz oficiosa do presidente confidencia a intenção de, tão só constatada a incapacidade para o seu partido subir nas sondagens e obstar à maioria absoluta dos socialistas, e ei-lo numa espécie de tournée pelo país fora para mostrar aos apreciadores de selfies e de abraços o quanto de menos bom possa ser empolado na governação de António Costa. E já tem como primeiro alvo a Saúde, apesar de saber quanto já aumentou o investimento no setor e os sucessivos records alcançados em números de consultas e tratamentos no SNS. Afiança-se no texto que “a calma de Rio deixa Marcelo ansioso” nestes dias em que equaciona o sucesso ou insucesso da sua estratégia de devolver o país aos novos donos disto tudo.
  2. Martim Silva, diretor-executivo do semanário de Balsemão, vem-se responsabilizando pela rubrica de Altos & Baixos na segunda página há já algum tempo. Embora tenha desta feita de reconhecer o sucesso de António Costa por ter conseguido que a Comissão Europeia retirasse o país da lista dos países com desequilíbrios macroeconómicos excessivos, optou, viperinamente, de o fazer acompanhar de outro «socialista» - Sérgio Sousa Pinto - por ter aprovado a contratação de Passos Coelho para o ISCSP. Para Martim e outros que tais no mesmo jornal, um bom socialista é aquele que se porta de forma absurda e a contrario de quase todos os seus camaradas.
  3. A entrevista de duas páginas com Assunção Cristas seria completamente olvidável se ela não se considerasse com potencial político para vir a ser primeira-ministra. Alguém a quem nenhuma sondagem dá perspetivas de votação acima do solitário digito e se julga capaz de, por um passe de mágica, vê-lo no mínimo quintuplicado, ou é tonta, ou repete a perspetiva goebbelsiana de repetir milhentas vezes algo, a ver se o transforma numa improvável verdade. Para já ficámos a saber que conta com a colaboração da brasileira de Pedrógão Grande e com Pedro Mexia para lhe carpinteirarem o programa eleitoral e que se sente como o Calimero na forma como se vê tratada nos debates parlamentares por António Costa, atribuindo a causa ao facto de ser … mulher. Esquece-se, obviamente, que quem vai à guerra de argumentos com má educação, recebe o trato que merece…
  4. Embora discordando quase sempre de Miguel Sousa Tavares compreende-se o seu espanto com o facto de uma enorme maioria de italianos não quererem sair da União Europeia, nem do euro, mas terem votado em duas forças políticas, que dela fizeram o saco de boxe da sua campanha. Tanto mais que, não fosse a intervenção do BCE e o seu sistema bancário teria ruído como um castelo de cartas. E que, mostrando-se desconfiados com os partidos e com o governo, 78% reconheçam-se satisfeitos com a vida que têm. Não sendo a minha posição, há algo de pertinente na proposta para a União Europeia com que conclui a sua crónica: “avançar apenas com quem quiser ficar dentro sem reticências e expulsar os outros sem apelo. Nem que, para ultrapassar os problemas jurídicos, tenha de fazer as duas coisas sucessivamente: primeiro extingue-se, depois cria-se nova organização com os que querem continuar a defender os valores europeus.” Uma coisa se conclui: nos seus dois mandatos Durão Barroso foi o principal responsável por condenar a União ao estado comatoso de que dificilmente recuperará.
  1. Em dia de Congresso do CDS Pedro Adão e Silva assina uma crónica em que, distâncias ideológicas à parte, encontra perturbantes similitudes entre o partido de Cristas e o Bloco de Esquerda. Para ele ambos“têm hoje uma enorme plasticidade, que lhes permite alicerçarem a sua ação quotidiana mais em torno do ciclo mediático e menos em causas.” E, de facto, tem sido, no mínimo estranho, que se encontrem tão frequentemente coligados em votações parlamentares contra o governo ou a competirem por chamar ministros a São Bento para se explicarem quanto ao que os jornais dizem estar a correr mal.
  2. Conclua-se com a crónica, sempre imperdível, de Daniel Oliveira, que começa por lembrar como Matteo Renzi anunciara o suicídio do Labour de Jeremy Corbyn há três anos, e se viu empurrado para o caixote do lixo da História enquanto o político inglês tem fortes possibilidades de vir a ser o próximo ocupante do 10 de Downing Street. A incapacidade das democracias ocidentais responderem com inteligência ao fenómeno da globalização está a empurrá-las para sucessivas implosões. Torna-se evidente que os únicos sítios onde as esquerdas conseguem o apoio dos eleitorados para as suas propostas são aqueles onde elas não enjeitam os seus valores ideológicos mais consistentes.

3 X 9 = 27.º Congresso do CDS

por estatuadesal

(Por Carlos Esperança, in Facebook, 10/03/2018)

CRISTAS_DIABO

Nascida no dia de S. Venceslau, na cidade de São Paulo de Nossa Senhora da Assunção de Luanda, e do fracassado golpe contrarrevolucionário spinolista contra o 25 de Abril, traz no nome a santidade do topónimo onde nasceu e, no espírito, a fantasia da alegada maioria silenciosa, derrotada, em Portugal, no dia do seu nascimento.

A azougada líder CDS, a hesitar entre o estilo miguelista e o de estadista, ora chamando mentiroso ao primeiro-ministro, ora mantendo a compostura civilizada, usou o vazio do poder no PSD até a chegada de Rui Rio. Este, com aura de honestidade e competência, que não assinaria a resolução do BES, ignorando o significado e as consequências, põe em causa a sua ambição.

Enquanto o PSD andou a reboque do ressabiado Passos Coelho, convencido de que era ainda PM, e, depois, graças à luta interna e à desorientação da comunicação social afeta ao PSD, a líder do CDS sonhou voos que nem o seu antecessor, mais preparado, ousou.

A Dr.ª Assunção andou por canais televisivos, emissoras de rádio, feiras, praias, jornais, revistas e romarias, sem concorrência, e, como a rã da fábula, quis ser boi, pensando que a vitória sobre o PSD, nas eleições municipais de Lisboa, era o barómetro do País.

A liderança da direita civilizada e europeia, tarefa de que Passos Coelho era incapaz por inépcia e convicção, está ainda menos ao alcance de Assunção Cristas, que não define a ideologia do seu partido, se acaso a tem, assumindo a opção do liberalismo que derrotou o Governo que integrou ou a da democracia-cristã, desaparecida com a morte de Amaro da Costa e o afastamento de Freitas do Amaral.

Deslumbrada com o vedetismo, a chegada de Rui Rio à liderança do PSD, com cuidada formação académica e experiência política fora das madrassas da JSD, fê-la ver que está condenada a muleta do maior partido da direita, agora com rosto humano e ar civilizado.

Pode continuar o frenesim mediático, dizer uma coisa e o seu contrário, apresentar «18 medidas para salvar o SNS», como se o País ignorasse que o CDS votou, assim como o PSD, contra a sua criação. É difícil exibir os inimigos do SNS como seus salvadores.

Assunção Cristas, que se declara católica praticante, julgando que é de catequistas que o País precisa, à medida que a comunicação social regressa à defesa do PSD, vai perdendo a fé e confessa-se a O Diabo: “…naturalmente, trabalhamos para ser a primeira escolha dos eleitores”, sabendo que leva o CDS de regresso ao 5.º lugar nas próximas eleições.

Por mais que grite que o seu combate é contra o que designa por Governo das esquerdas unidas, é do PSD que quer os votos que a salvem de ser substituída por Nuno Melo.

Neste fim-de-semana, em Lamego, o seu segundo Congresso será pacífico, com a moção ‘CDS – Um passo à frente’, a recordar Lenine na resposta a Rosa Luxemburgo, ‘Um Passo em Frente, Dois Passos Atrás’, na certeza de que não há Kautsky que recuse publicar-lhe a moção. Em relação a Lenine, só o desejo de liderança a une.

Vade retro, Assunção!