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quarta-feira, 14 de março de 2018

Ladrões de Bicicletas


Os motores do crescimento português

Posted: 12 Mar 2018 11:05 AM PDT

Ficámos recentemente a conhecer os dados preliminares das Contas Nacionais relativos a 2017. Esses dados permitem-nos fazer um primeiro balanço em relação a como evoluíram na primeira metade da actual legislatura as componentes do produto – consumo privado, consumo público, investimento, exportações e importações – e de que forma contribuíram para o crescimento nestes dois anos, que foi, em termos reais, de 1,6% em 2016 e 2,7% em 2017.
A este propósito, voltou a ganhar vigor um debate que vem grassando há algum tempo acerca de qual tem sido o verdadeiro motor do crescimento da economia portuguesa. Em causa está saber até que ponto é que o crescimento tem assentado mais na procura interna ou na procura externa, mais no consumo ou mais no investimento. A questão não é meramente analítica mas também claramente política: na impossibilidade de argumentar que a política económica deste governo não tem produzido bons resultados, uma parte da direita passou a afirmar que o sucesso verificado se deveu ao governo ter feito o contrário do que anunciara, seguindo uma política económica “de direita” e apostando no investimento e nas exportações em detrimento do consumo privado.
A controvérsia é alimentada adicionalmente por uma questão técnica. É que, das componentes que referi em cima, quatro contribuem positivamente para o PIB mas uma (as importações) contribui negativamente, não havendo consenso relativamente à forma mais correcta de considerar esta última. O INE, por exemplo, agrupa as importações juntamente com as exportações para calcular a procura externa líquida. Já o Banco de Portugal considera que o consumo público e privado, o investimento e as exportações têm todos uma parte importada e por esse motivo “distribui” as importações por cada uma das outras componentes, de modo a aferir o contributo líquido destas. É devido a esta diferença de metodologia que o INE pôde concluir, no Destaque recentemente distribuído e citado nos jornais, que a procura externa líquida teve um contributo negativo (-0,2%) para o crescimento do ano passado, ao passo que o Banco de Portugal, no mais recente Boletim Económico (Dezembro de 2017), projectava para 2017 contributos positivos da procura interna e externa de 1,1% e 1,5% respectivamente. E é também por isso que o Fórum para a Competitividade, um think tank de direita, tem criticado o INE por apresentar os dados do PIB “de forma enganadora, (...) levando os decisores políticos a cometer erros muito graves, de privilegiar a procura interna, quando a chave do crescimento está nas exportações”.

No que diz respeito à metodologia, neste caso são o Banco de Portugal e o Fórum para a Competitividade, e não o INE, quem tem mais razão. Não faz sentido imputar a totalidade das importações às exportações e concluir que a procura externa teve um contributo menor ou negativo para o crescimento, quando boa parte do aumento das importações se deveu à expansão da procura interna e não teve nada a ver com as exportações.
Mas a razão da direita fica-se por aqui. É que se alguma coisa os dados dos dois últimos anos mostram é que o crescimento robusto se deveu tanto à procura interna como às exportações, não havendo contradição ou rivalidade entre uma coisa e a outra. Olhando para os dados das contas nacionais agora disponibilizados, vemos que, no conjunto dos dois anos, o consumo e as exportações tiveram contributos brutos (isto é, não deduzindo as importações) relativamente idênticos para o crescimento verificado: 41% e 46%, respectivamente. Os restantes 13% vieram do investimento, principalmente em 2017. A questão técnica de como passar daqui para os contributos líquidos pode ser discutida, mas será sempre mais favorável à procura interna, visto que é geralmente reconhecido que as exportações têm um maior conteúdo importado do que as outras componentes. A conclusão é, portanto, que o crescimento dos dois últimos anos não teve um motor único, mas sim dois: a procura interna e a procura externa, com contributos relativamente semelhantes. Sem uma ou a outra, o crescimento teria sido muito menor do que foi.
Porém, ainda mais importante do que isso é a conclusão, inegável, que a política de valorização de salários e pensões não só não impediu o crescimento vigoroso do investimento e das exportações, como muito provavelmente foi decisiva para restaurar a confiança que impulsionou o investimento. A direita está errada quando alega que estes resultados validam a sua estratégia. É exactamente o contrário: são uma refutação categórica das ideias de desvalorização interna e austeridade expansionista que durante anos assombraram o debate público.

(publicado originalmente no Expresso online em 08/03/2018)

Adenda - cálculos:


Os valores referidos em cima têm por base os dados anuais nominais das Contas Nacionais recentemente publicado pelo INE e disponíveis aqui (ficheiro A.1.2.5.1, o primeiro da lista). Neles verificamos que o consumo público e privado (C+G), o investimento (I), as exportações (X), as importações (M) e o PIB (C+G+I+X-M) apresentaram os seguintes valores em 2015, 2016 e 2017 (em milhões de Euros):

C+G

I

X

M

C+G+I+X

PIB (C+G+I+X-M)

2015

150,310.6

28,451.5

72,647.6

71,600.6

251,409.7

179,809.1

2016Po

154,697.8

28,718.1

74,436.3

72,358.3

257,852.3

185,494.0

2017Pe

159,685.1

31,471.0

83,227.2

81,261.4

274,383.3

193,121.9

A partir destes dados, podemos calcular a variação absoluta de cada uma destas componentes entre 2015-2016, 2016-2017 e no biénio 2015-2017:

C+G

I

X

M

C+G+I+X

PIB (C+G+I+X-M)

Variação 2015-2016

4,387.3

266.6

1,788.8

757.7

6,442.6

5,684.9

Variação 2016-2017

4,987.3

2,752.9

8,790.8

8,903.0

16,531.0

7,627.9

Variação 2015-2017

9,374.5

3,019.5

10,579.6

9,660.8

22,973.6

13,312.8

E a partir daqui calculamos o peso relativo da variação de (C+G), I e X, respectivamente, na variação total de C+G+I+X, i.e., nas componentes positivas do PIB. Não deduzir as importações equivale a distribuí-las proporcionalmente pelas componentes positivas, i.e., assumir que têm idênticos conteúdos importados em termos relativos, o que, quando muito, favorece as exportações, que habitualmente têm maior conteúdo importado. Os resultados são os seguintes:

C+G

I

X

C+G+I+X

Var. 2015-2016 (%)

68.1%

4.1%

27.8%

100.0%

Var. 2016-2017 (%)

30.2%

16.7%

53.2%

100.0%

Var. 2015-2017 (%)

40.8%

13.1%

46.1%

100.0%

De onde se conclui que o contributo do consumo para o crescimento durante os primeiros dois anos da legislatura foi de 41%, o do investimento foi de 13% e o das exportações foi de 46%, tal como referido no texto. Vemos também que as contribuições relativas se alteraram bastante do primeiro ano para o segundo, mas isso não se deveu ao consumo ter tido um contributo absoluto menor no segundo ano (se olharmos para a primeira coluna da segunda tabela, vemos que esse contributo foi até um pouco maior). O que aconteceu foi que em 2017 tanto as exportações como o investimento tiveram crescimentos extraordinários, que fizeram com que um crescimento semelhante do consumo tivesse um peso relativo menor. E o mais importante de tudo, como referi no texto, é que estes aumentos extraordinários das exportações e do investimento não só não foram impedidos pela devolução de rendimentos como, especialmente no caso do investimento, foram muito provavelmente impulsionados por ela.

Um mundo à parte

Posted: 12 Mar 2018 09:12 AM PDT

Não há muitas notícias sobre a votação das moções no Congresso do CDS, do fim-de-semana passado. Nem no próprio sítio do CDS...
Sabe-se que as moções não foram debatidas em horário nobre ou que Cristas seixou cair a democracia-cristã. Parece que o essencial foi a votação para os órgãos nacionais do partido e que a moção de Assunção Cristas foi votada de braço no ar e já de madrugada, em alternativa à de Miguel Mattos Chaves.
E no entanto, as moções dizem muito do pensamento de quem está no CDS. Por exemplo, a moção de Mattos Chaves é uma moção estruturada e a pensar no futuro do país, enquanto a moção de Cristas parece um saco de vento, próxima do plafleto de uma arruada do CDS.
Mas se há um tema que não constou da esmagadora maioria das moções ao Congresso do CDS foi o mundo do Trabalho. Esse não é um tema do CDS. Os mais de cinco milhões de activos são um subproduto das pouco mais de 300 mil empresas portuguesas. A sua ideia - pouco moderna e mesmo arcaica - é de que "as empresas é que criam emprego" e por isso tudo lhes é devido.
No Congresso, apenas a moção dos Trabalhadores Democratas Cristãos chamava a atenção para aquilo que nenhum outro militante centrista pareceu sentir: a actual precariedade das relações laborais neste Portugal cada vez mais estagnado e que conduz ao envelhecimento da população."Deve, pois, o CDS atender aos novos pobres que trabalham e não chegam ao final do mês; aos jovens precários, tantos deles na comunidade científica, que adiam projetos familiares por terem trabalhos precários e mal remunerados".
E no entanto, para quem olhe para a opinião à direita, todos parecem embandeirar em arco com o "novo CDS". Helena Garrido na Antena 1 hoje de manhã, falava de um CDS jovem, liberal e não conservador  - apenas porque Adolfo Mesquina Nunes se assumiu como homosexual e esquecendo os casos em que autores de moção raiam o homofóbico ou o tom de conservadorismo, que nem os defensores pró-vida já assumem. No Observador, quem escreve sobre o CDS vai atrás desta onda criada pelo marketing... (aqui e aqui). Por que razão está a direita a apostar tanto no CDS? Apenas para impedir uma viragem à esquerda do PSD?
O CDS que saiu do Congresso é uma tentativa de tudo ser, sem que seja alguma coisa. E esse é a vantagem de nunca ser poder, senão por arrasto.
Senão é isso, o que dizem as moções ao Congresso do que poderia ser o programa de governo do CDS? Em primeiro lugar, o CDS apostaria numa forte contenção orçamental.  Algo que, a julgar pelo discurso de Assunção Cristas, se trata de uma ideia muito negativa, quando o partido se declara  muito preocupado com a situação nomeadamente da Saúde e Segurança. Ao mesmo tempo que se pugna por esse linhar de passo com a moeda única, outras moções mostram-se euro-cépticas com o rumo de federalização da Europa...

Duas das moções defendem o estrito cumprimento do Tratado Orçamental, com "cumprimento do limite de 60% do PIB, na dívida pública, consagrado nos tratados da União Europeia" (João Gonçalves Pereira). Ora, só essa obrigação implicará um corte drástico na despesa social do Estado. "Olhamos para o deficit e para a dívida pública, não como um problema conjuntural ou como um dogma contabilístico, mas como um problema estrutural que nos limita a esperança e nos rouba o futuro" (José Lino Ramos)."Cortes devem ser feitos não de forma cega em sectores fundamentais, mas “na melhoria da eficiência dos serviços da AP e na redução de gastos supérfluos", integrando o autor nesse capítulo a própria estruturação actual do Estado (Abel Matos Santos).
Mas depois, defende-se um Estado como um financiador das práticas básicas empresariais - concessão de crédito fiscal às empresas que reinvistam os lucros... (Luís Mattos Chaves) -, do apoio às empresas que contratem mulheres grávidas e mães/pais com crianças até 3 anos (!), apoios vários à natalidade, à conciliação entre trabalho e família, mas sem que isso passe por alterações ao Código do Trabalho (portanto, apenas mais dinheiro para pagar creches...).
Do ponto de vista do que seria a economia portuguesa, seria um misto de mais Turismo, mais Agricultura (sublinhando-se - e bem! - a actual dependência externa) e, sobretudo, mais Mar (sem se perceber bem o que seria).
Desse ponto de vista, a moção mais estruturado é a de Luís Mattos Chaves. Ele defende uma reindustrialização - "um dos estrangulamentos económicos do País ou, se preferirem, uma das razões do nosso fraco desenvolvimento das últimas décadas se deve à ausência de uma estratégia de industrialização, de médio e longo prazo, que sirva de guia aos agentes económicos" -; com um novo papel a CGD e um Banco de Fomento, planos de desenvolvimento na boa tradição dos Planos de Fomento.
É interessante notar que várias moções pugnam por um reforço da Defesa Nacional, com um aumento de verbas para o seu orçamento, o regresso ao Serviço Militar Obrigatório e uma maior participação na NATO.
Mas houve também moções "soberanistas" e euro-cépticas. Pedro Borges de Lemos: "Não podemos é perder de vista a lógica dos Estados soberanos, avessa ao sistema federalizado progressivamente mais tendencial. O combate aos choques assimétricos e a solidariedade com as nações mais desfavorecidas da União Europeia poderão concretizar-se nas ajudas obtidas através das receitas oriundas do incremento de uma taxa uniformizada sobre as transacções financeiras dos respetivos países membros". Ou de Miguel Mattos Chaves: "A actual ingerência da Comissão Europeia, órgão de poder central que não foi eleito por ninguém, que se arroga o direito de aceitar ou reprovar o Orçamento de Estado de Portugal e de outros Estados, é inadmissível e mesmo perigosa pois pode levar á Revolta Justa por parte dos Povos afectados. Cabe-nos colocar as coisas no seu sentido original, no sentido que a esmagadora maioria dos Pais Fundadores indicaram, para que os Países da Europa não se desunam".
O CDS ainda não encontrou o seu rumo. E o único rumo que se conhece é conquistar votos ao PSD e aparecer mais nos telejornais. Tão pobre. 

Cabe sempre mais um político

Novo artigo em Aventar


por João Mendes

E

via Expresso

Quando decidir retirar-se da política, António Costa poderá encontrar uma porta aberta no grupo Jerónimo Martins. Pelo menos a julgar pela admiração de Pedro Soares dos Santos pelos skills negociais do primeiro-ministro. E porque dá sempre jeito ter um político influente em qualquer conselho de administração. Os conselhos de administração da maioria das grandes empresas portuguesas recordam-me, por vezes, algumas universidades deste país: cabe sempre mais um político.

Entre as brumas da memória


12.03.1959 – O falhado «Golpe da Sé»

Posted: 12 Mar 2018 10:30 AM PDT

Estava prevista para a madrugada de 12 de Março de 1959 uma revolta contra o salazarismo, com o país ainda agitado pelo malogro das eleições presidenciais do ano anterior, quando a candidatura de Humberto Delgado abalou fortemente os alicerces do regime. Tratou-se do falhado «Golpe da Sé», assim denominado porque era na catedral de Lisboa que os participantes se reuniam, contando com a cumplicidade do respectivo prior, o padre João Perestrelo de Vasconcelos.

Um grande grupo de militares, cuja figura principal era o capitão Almeida Santos, mas onde apareciam nomes como Varela Gomes e Vasco Gonçalves, e de civis sobretudo católicos liderados por Manuel Serra, propunha-se realizar um verdadeiro golpe de Estado, tendo previsto o controle de meios de comunicação, transportes, fornecimento de electricidade, etc., etc.

Tudo fracassou devido a fugas de informação e foram detidas mais de 40 pessoas, incluindo o padre Perestrelo e Manuel Serra. Dos detidos, distribuídos pelas prisões de Caxias, Aljube, Trafaria e Elvas, cerca de metade foi julgada. Dois evadiram-se de Elvas e um deles, o capitão Almeida Santos, foi assassinado – episódio que deu origem ao romance de José Cardoso Pires, A Balada da Praia dos Cães. Quanto a Manuel Serra, a páginas tantas hospitalizado no Curry Cabral, conseguiu fugir, vestido de padre, e seguiu directamente para a embaixada de Cuba em Lisboa onde pediu asilo político. Alguns meses mais tarde, utilizando outro estratagema (cortou rapidamente a barba e o cabelo), fugiu de novo, dessa vez para a Embaixada do Brasil, já que o seu objectivo era juntar-se a Humberto Delgado naquele país, o que veio a acontecer.

N.B. – Merecem ser lidos três testemunhos de participantes no Golpe da Sé, compilados pelo Fórum Abel Varzim.

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«Se eu chorasse mostrava o ponto exacto onde eles podiam enterrar a faca»

Posted: 12 Mar 2018 08:45 AM PDT

Uma belíssima entrevista a Maria Teresa Horta! A não perder.
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A desigualdade

Posted: 12 Mar 2018 04:10 AM PDT

«A investigação do ISCTE sobre a trajectória de um grupo de pessoas em situação de pobreza, em Lisboa, desde 2011, é lapidar: não é por trabalharem que as pessoas acompanhadas deixaram de ser pobres. A actual transformação de Lisboa, e o mesmo tem acontecido no Porto, com os processos de gentrificação e de especulação imobiliária, traduz-se em novos empregos, mas de baixa remuneração, e em dificuldades acrescidas de arrendamento a preços comportáveis.

Daí que essa transformação não possa ser reduzida a uma rápida reabilitação urbana e a uma economia mais pujante: este processo afasta para a periferia quem não consegue acompanhar a escalada dos preços das rendas e destrói as redes de vizinhança que ainda sobrevivem. Pior: as pensões que fecham e que reabrem como hostels retiram à Segurança Social a possibilidade de responder às necessidades de quem procura abrigo, como se tem verificado no Porto, onde estes casos se tornaram mais visíveis. A acumulação de riqueza num grupo mais pequeno distribui a pobreza por um grupo maior.

A pobreza sempre foi encarada em Portugal como uma espécie de fatalidade, à qual se respondia com comiseração e misericórdia, para culpabilização do próprio pobre. A evolução do país nestas quatro décadas de democracia, com a criação de novas políticas de combate à pobreza, não foi ainda suficiente para diminuir de forma considerável os seus índices. As prestações sociais do Estado, sejam elas pensões ou rendimentos de inserção para os casos mais extremos, também são insuficientes para fazer com que os idosos ou desempregados de longa duração deixem de fazer parte dos 18,3% de portugueses em situação de carência. Como diz Sérgio Aires, do Observatório de Luta contra a Pobreza na Cidade de Lisboa, as políticas públicas são positivas e surtem efeito até um certo ponto. Mas quem é pobre não consegue sair desse patamar aonde chegou, como se conclui da análise daquele grupo ao longo dos últimos sete anos. Estudos deste tipo, que nos traçam o percurso de um conjunto de pessoas, permitem perceber os solavancos da oferta de trabalho e a articulação, ou a falta dela, entre os serviços públicos do emprego e da Segurança Social. E uma das ilações possíveis é a de termos de ponderar novos tipos de respostas sociais, se quisermos deixar este patamar.

Combater as desigualdades, sejam elas quais forem, é função da política; é função de um Estado. E essa terá de ser sempre a primeira opção.»

Amílcar Correia

Dica (734)

Posted: 11 Mar 2018 03:25 PM PDT

Desocultar o desemprego real (Sandra Monteiro)

«Apetece perguntar o que ficaríamos a saber sobre os dados do desemprego na Europa se em todos os países houvesse investigação científica independente, idealmente concertada nas suas metodologias para efeitos de comparação, que alargasse e redimensionasse a taxa de desemprego que depois serviria de instrumento para políticas públicas. Talvez isso contribuísse para desocultar formas de vulnerabilidade laboral e social que seriam consideradas insuportáveis em sociedades decentes.»

Marcelo, o pastor

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por Autor Convidado
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Isaac Pereira

Em Oliveira do Hospital, Marcelo Rebelo de Sousa comprou uma ovelha, e negra, ainda por cima. Chamou-lhe Oliveirinha. Depois abraçou um pastor rosado que lhe disse do alto do bigode:
- Morreram-me vinte e cinco cabeças. A vida de pastor é dura.
O presidente dos afectos abraçou-o, como não poderia deixar-se ser, e disse, afagando-lhe o pêlo:
- Eu sei. Eu sei.
E foi nesse momento que fiquei a saber que Marcelo já foi pastor.

Tratar com justiça a Justiça

por estatuadesal

(Valupi, in Blog Aspirina B, 12/03/2018)

pinto_mizé

O último Expresso da Meia-Noite foi fértil em informações com proveito público. Eis algumas:

– Que os jornalistas responsáveis pelo programa, presentes em estúdio, promovem entusiasmados o tal slogan do “acabou a impunidade”, criado por uma ministra da Justiça que o usou para atacar adversários políticos a partir de matérias judiciais, e o qual voltou a ter gasto caudaloso para continuar a usar a Justiça para a luta política tendo Joana Marques Vidal como arma de arremesso contra o PS.

– Que o juiz convidado, acumulando com ser secretário-geral da Associação Sindical dos Juízes Portugueses, declarou ser-lhe inconcebível que Pinto Monteiro tenha impedido ou condicionado qualquer investigação no Ministério Público dada a sua estrutura e procedimentos.

– Que o mano Costa reagiu como um alarve quando Maria José Morgado lhe disse que ele fez um trabalho jornalístico deturpado no processo Melancia.

– Que Marinho e Pinto foi o único a relacionar o aparecimento dos casos mais mediáticos na Justiça com as alterações legislativas que deram mais poderes à investigação (é ver quem e quando esteve na origem dessas novas leis), não sendo o efeito de um qualquer voluntarismo, ou santidade, de fulano ou beltrana.

– Que Marinho e Pinto foi o único a relacionar a violação do segredo de justiça e o uso da comunicação social como estratégia para influenciar e pressionar magistrados e penas.

– Que Marinho e Pinto foi o único a lembrar os actos suspeitos de Cavaco na sua relação com a SLN como exemplo de duplo critério no Ministério Público quando comparado com a “Operação Marquês”.

– Que Marinho e Pinto foi o único a denunciar a perseguição judicial (ou seja, política) a Sócrates por ter sido detido e preso para ser investigado, não havendo ao tempo qualquer ideia acerca dos actos de eventual corrupção que pudessem estar em causa.

– Que Maria José Morgado é uma figura fascinante, na exacta medida do que diz e do que cala.

Quem sabe, talvez um dia a Justiça consiga ser tratada na imprensa com o rigor e a coragem que merece.