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terça-feira, 10 de abril de 2018

Cristas acusa Centeno de falta de ambição e diz que país está “menos competitivo”

9/4/2018, 22:28126

Depois de Mário Centeno ter escrito um artigo de opinião, publicado pelo Público, em que enumera os resultados positivos da economia portuguesa, Cristas disse que o ministro é pouco ambicioso.

MIGUEL A. LOPES/LUSA

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  • Agência Lusa
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A presidente do CDS-PP defendeu esta segunda-feira que o ministro das Finanças é pouco ambicioso e considerou que o país está “menos competitivo” que outros países europeus que atravessaram situações difíceis, pedindo comparações com o “tempo de pós-crise”.

Considero que o país poderia estar muito melhor do que está neste momento. É bom que não nos comparemos apenas com o tempo da crise, mas com aquilo que é um tempo de pós-crise com os outros países, nomeadamente, do espaço europeu, e percebermos que Portugal, afinal, não tem feito tanto quanto eventualmente poderia fazer”, defendeu Assunção Cristas, aos jornalistas.

A líder centrista comentava o artigo de opinião do ministro das Finanças, Mário Centeno, publicado neste no jornal Público, em que advertiu que Portugal não pode voltar a entrar em défice excessivo nem pôr em risco os resultados positivos alcançados na economia portuguesa.

“Basta olhar para outros países, até aqueles que estiveram em situações tão ou mais difíceis do que a nossa, por exemplo a Irlanda, para perceber que estamos menos competitivos, a crescer menos, que baixámos muito de posições nos rankings internacionais”, argumentou Assunção Cristas.

A presidente do CDS-PP, que falava à margem de um debate sobre Europa, com Adriano Moreira, na sede do partido, em Lisboa, disse ficar preocupada ao ver o ministro das Finanças “dizer que está tudo bem e não sentir uma vontade de ter um caminho mais ambicioso ao nível da competitividade, ao nível da criação de emprego qualificado, bem remunerado”.

“Obviamente quando nos comparamos com os tempos muito duros de uma troika chamada pelo PS com certeza que estamos muito melhor, isso é positivo e tenho-o dito muitas vezes”, ressalvou. “Porém, quando nos comparamos com os nossos parceiros europeus, quando olhamos para os números do crescimento económico e competitividade, percebemos que podíamos estar a fazer bastante mais”, sublinhou.

Num artigo de opinião publicado nete no jornal Público, o ministro das Finanças começa por enumerar os resultados positivos da economia portuguesa, destacando o cumprimento “na íntegra” dos compromissos assumidos em 2017.

“No final desta legislatura, face às condições iniciais que se caracterizaram por um sistema bancário em crise e em iminente resolução, em que imperava a falta de confiança, o pagamento de juros terá diminuído mais de 800 milhões de euros”, dá como exemplo. Segundo Mário Centeno, “não há nenhum indicador melhor do que este para sintetizar o sucesso da economia e da sociedade portuguesa, porque este é o único que chega mesmo a todos os portugueses”. “E, podem crer, não o vamos colocar em risco. Devemos isso a Portugal”, frisou o ministro.

Sporting. Marta Soares em reflexão, Holdimo pede AG da SAD, “oposição” já mexe mas Bruno de Carvalho não sai

9/4/2018, 23:30172

Bruno de Carvalho não sai, Marta Soares pondera solução, Holdimo pede AG urgente da SAD, "oposição" trabalha nos bastidores. Em cinco anos, o Sporting mudou. Cinco anos depois, há parecenças com 2013.

Bruno de Carvalho respondeu a Marta Soares, deixou mais críticas e encerrou a sua página no Facebook esta segunda-feira

LUSA

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Cinco anos depois, o Sporting mudou. Mudou, de forma radical, e voltou a aproximar-se daquilo que sempre foi até um período que teve como ponto mais baixo de crise a posição a meio da tabela classificativa na época de 2012/13. E mudou porque houve uma rutura total com o passado, quase numa espécie de fechar de ciclo geracional com aquilo que era visto como os últimos capítulos da era “Projeto Roquette”, que foi definhando com o passar dos anos, dos mandatos e da sucessão galopante de resultados negativos em termos futebolísticos e financeiros. De certa forma, todo esse período acabou por desviar o foco dos adeptos leoninos da génese desportiva da instituição. Cinco anos depois, vêem-se capítulos semelhantes ao que aconteceu em 2013:guerra aberta entre o presidente do Conselho Diretivo e o líder da Mesa da Assembleia Geral; assobios e manifestações de desagrado bem percetíveis para o número um; manobras preparatórias para outros cenários nos bastidores. Porquê?

“Bruno de Carvalho teve condições de governabilidade como mais ninguém teve nos últimos dez ou 15 anos, mas chegou a um ponto onde tudo o que fez no clube acaba por ser ultrapassado por tudo o que tem andado a dizer no Facebook e não só”, explica ao Observador um antigo dirigente verde e branco. Mas quer isso dizer que poderemos estar a falar de forma tão precoce em sucessão? “Não, nada disso. A dita oposição, como algo organizado para tentar chegar a esse ponto de fazer frente a Bruno de Carvalho, acha que existe mas na verdade pouco representa”. Se a troca de farpas entre o atual presidente da direção e Jaime Marta Soares, líder da Mesa da Assembleia Geral, se tornou num novelo onde é complicado encontrar a ponta, o futuro tem ainda muitos nós. O mais curioso é que, das muitas pessoas com quem o Observador foi falando ao longo do dia, houve uma ideia que se repetiu: a culpa deste choque é de Bruno de Carvalho… por ter na sua equipa Jaime Marta Soares.

Presidente da Câmara Municipal de Vila Nova de Poiares durante quase 40 anos, membro da Associação Nacional de Municípios e deputado da Assembleia da República durante sete legislaturas, Jaime Marta Soares chegou ao Sporting pela mão de Dias Ferreira em 2011, sendo um dos 50 eleitos para o Conselho Leonino num sufrágio para o órgão que teve um total de nove listas e 450 candidatos. O advogado acabou por ficar na terceira posição para o Conselho Diretivo, atrás de Godinho Lopes e Bruno de Carvalho e à frente de Pedro Baltazar e Sérgio Abrantes Mendes, mas o atual presidente da Liga de Bombeiros Portugueses integrou o órgão eleito por método de Hondt. Aí, segundo nos explicaram, Marta Soares teve sempre uma das posturas mais críticas em relação ao comportamento do atual presidente leonino no pós-eleições. Ainda assim, dois anos depois, Bruno de Carvalho deixou de contar com Eduardo Barroso e Daniel Sampaio nas suas listas (apesar de se manterem como apoiantes) e optou pelo antigo líder autárquico para a Mesa da Assembleia Geral, contra Tito Fontes (nome indicado por José Couceiro, o seu principal opositor em 2013) e Carlos Teixeira (candidato pela lista de Carlos Severino).

A relação nem sempre foi perfeita, com Bruno de Carvalho a não gostar do tom “paternal” que Marta Soares utilizava em algumas intervenções públicas e Marta Soares a não gostar de algumas decisões que lhe iam passando ao lado; contudo, assente no respeito institucional, era boa. Entre esses pequenos atritos, e até porque o único caso que teve algum abalo na vigência do atual líder verde e branco foi a guerra com Marco Silva em 2014/15, o primeiro grande choque surgiu apenas em 2018, na primeira Assembleia Geral que se realizou em fevereiro: logo no início, Bruno de Carvalho percebeu que a Mesa tinha falhado por completo a preparação logística de uma reunião magna que teria muito mais sócios do que habitual pelo tema em causa (alteração dos estatutos e novo regulamento disciplinar), chegando a “ajudar” na orientação de associados para a acreditação; depois, pela forma como deixou os trabalhos decorrerem com alegados insultos a membros do Conselho Diretivo antes da suspensão dos mesmos.

“Foram entregues à MAG três requerimentos para não serem votados os pontos 6 e 7. Disseram que necessitava de um amplo debate… O tal velho hábito do antigamente de ter de ir primeiro pedir autorização aos grupos e grupinhos do clube. Comigo isso não cola. Esses requerimentos deviam ter sido imediatamente recusados pela MAG, pois a AG foi devidamente marcada e cumpridos todos os preceitos legais, sem que essa decisão tivesse de ser votada. Mas erradamente colocaram a votos a decisão da MAG de recusar os requerimentos. Aqui começou o fim da AG”, disse Bruno de Carvalho, que criticou ainda o porquê da não expulsão de quem estava a insultar.

Jaime Marta Soares ficou incomodado com as críticas via Facebook mas acabou por admitir que as coisas podiam ter sido diferentes e desdobrou-se em reuniões para que tudo funcionasse na perfeição na Assembleia Geral seguinte, já em março, no Pavilhão João Rocha (e no Multidesportivo, aqui por vídeo-conferência, porque a lotação estava esgotada na nova casa das modalidades). Antes, durante e depois, elogiou Bruno de Carvalho e a sua liderança. Mas, no seguimento de uma crise iniciada pelas críticas do presidente leonino a alguns jogadores após a derrota da equipa verde e branca em Madrid, acabou por ter uma postura ziguezagueante, com o epílogo ainda por conhecer.

“Estou atento ao que se está a passar, estou a falar com muitas pessoas que são do Sporting e com responsabilidades. Quero ter uma conversa com o presidente, ao nível do que temos tido sempre nestes anos, uma conversa franca, leal e aberta, e depois tomarei a atitude que achar mais conveniente”, disse Marta Soares na sexta-feira. “Quero saudar os jogadores e a equipa técnica pelo sentido de responsabilidade que demonstraram em todo o processo e pela serenidade com que enfrentaram todo este problema em prol do Sporting.

Tivemos uma longa conversa e estou certo que vamos ultrapassar esta situação. Não mais permitirei que algo assim se repita”, atirou no sábado, sem mencionar a figura de Bruno de Carvalho que, apesar de tudo, levantou a suspensão dos jogadores que tinha anunciado na véspera. Sinal da quebra de ligação? Parecia que sim, mas o líder da Mesa da Assembleia Geral falou com Bruno de Carvalho e, entre conversas, nunca colocou em causa a legitimidade para prosseguir o seu mandato e aproveitou também para lhe desejar sorte no nascimento da filha. Ao final da noite, ficou na Tribuna a aplaudir de pé os jogadores enquanto os mesmos deram uma volta olímpica em Alvalade.

Um corte abrupto de relações, via Facebook e diretos na rádio

Perante este cenário, as declarações de Jaime Marte Soares à TSF esta manhã de segunda-feira, fazendo quase uma espécie de ultimato a Bruno de Carvalho, acabaram por ser uma “bomba” que, de acordo com as fontes contactadas, só se poderá perceber pelo desagrado após o comunicado publicado horas antes da receção ao P. Ferreira e que foi extensível a outros momentos dos órgãos sociais (Jorge Gaspar, vogal do Conselho Fiscal e Disciplinar, apresentou antes a demissão, mas outros dirigentes ponderaram renunciar aos seus lugares).

“Com Bruno de Carvalho não há paz no Sporting. Os sócios deram o sinal e disseram aquilo que querem. Os clubes ficam, as pessoas passam e o que têm a fazer é deixar história do seu passado, e Bruno de Carvalho deixa, mas isso não lhes dá o direito de pensarem que o clube é propriedade de alguém a não ser dos sócios. Ninguém pode pensar de outra forma, a partir do momento que se tem outra interpretação não se está a respeitar o que é o desejo de todos. Por isso, na minha opinião,estão esgotadas as hipóteses de manutenção da atual presidência, para o Sporting retomar a paz que se impõe e se deseja. O tempo urge, não há tempo a esperar, e espero que ele [Bruno de Carvalho] tenha consciência disso”, anunciou Jaime Marta Soares, numa espécie de “demita-se ou será demitido”.

“O Dr. Jaime Soares criou a maior confusão vista na história do Sporting, ao conduzir, de forma infantil e incompetente, uma AG. Com essa sua atuação, provocou a necessidade na Direção de fazer uma nova AG. E eu a vir a público defender um homem que não tem defesa possível. Este foco de problemas vem agora ameaçar-me. Tinha avisado que mais uma dele e quem pediria a sua saída seria eu e não apenas os sócios, como o fizeram, de forma esmagadora, só o mantendo porque eu o pedi. Escusa de reunir a MAG que, diga-se, nunca se reviu nele nem esteve a seu lado, pois serei eu a pedir novamente à Direção para se fazer uma AG para os sócios se voltarem a pronunciar sobre nós e, separadamente, sobre os presidentes da MAG e do CFD. Se os sócios não tiverem a memória curta, sairá pela porta pequena como em Poiares”, respondeu Bruno de Carvalho no Facebook.

De seguida, de novo através de uma rádio (de Poiares), Jaime Marta Soares respondeu à parte da publicação em que foi invocada a Câmara Municipal que liderou durante vários anos: “Meter o nome da minha terra no meio de uma situação destas… O Bruno de Carvalho pensava que era tudo à maneira dele e que ele é que mandava. Ontem [domingo] viu que não é assim, o Sporting está acima de todos. Vamos fazer aquilo que os estatutos definem. É isso que vamos respeitar”. De seguida, de novo através do Facebook, Bruno de Carvalho anunciou que fecharia a sua página mas acrescentou mais um ponto à novela: “A vida tem coisas engraçadas! Ontem [Domingo], o Jaime Soares dava-me palmadinhas nas costas, desejava-me as melhoras e que hoje fosse um dia muito bom para mim e para a ‘Joaninha’. De repente, o poder caiu na rua e já veio atraiçoar quem sempre o defendeu. E colocou em perigo coisas importantíssimas da SAD“.

Os opositores que falam e uma oposição que está nos bastidores

Bruno de Carvalho sabia do que falava quando disse que “a oposição de 10%”, que entretanto pode ser mais do que a oposição de 10%,fez um bom trabalho na receção do Sporting ao P. Ferreira em Alvalade. Inclusive, na conferência após o jogo, descreveu mesmo um grupinho na bancada nascente “que tem um estilo mais trauliteiro”. Durante o dia, circulou também uma foto de um adepto, devidamente equipado, a entregar lenços de papel na bancada. Mas a real dimensão dos sócios que poderão assumir-se contra Bruno de Carvalho mede-se a outro nível.

“Vejo com agrado que agora são muitos e cada vez mais os que dizem o que eu tenho dito há muito tempo… mas agora acabou o tempo das palavras e é hora de agir”, destacou Pedro Madeira Rodrigues,candidato derrotado em 2017. “O Sporting não pode ser gerido por um ditador e devia demitir-se para bem do clube. Que seja uma lição para os sócios. Em relação a Bruno de Carvalho, precisa de descansar e mostra-se nitidamente afetado”, comentou Carlos Severino, candidato que esteve nas eleições de 2013. “Bruno de Carvalho vai requerer a assembleia e vai outra vez chamar a guarda pretoriana, como é hábito, no sentido de não deixar que as coisas decorram na sua totalidade ordem pública. É isso que vai acontecer. Ele não vai abandonar, porque Bruno de Carvalho tem um problema de personalidade. É um homem que, neste momento, precisa de muita ajuda”, referiu Sérgio Abrantes Mendes, antigo presidente da Mesa da Assembleia Geral e ex-candidato nos sufrágios de 2006 e 2011.

Numa lógica diferente, de quem reconhece todo um trabalho feito durante cinco anos mas que nesta altura deve ter uma pausa (temporária ou definitiva?), Dias Ferreira, ex-presidente da Mesa da Assembleia Geral e ex-vice da direção que também foi candidato nas eleições de 2011, referiu que “existe algum autismo” por parte do presidente do Sporting. “Tenho alguma dificuldade em avaliar todo o problema. Neste momento não consigo compreender a intenção de Bruno de Carvalho. Estamos a assistir a um exemplo típico de uma coisa que leva muito tempo a construir e que em horas se destrói. Nada me levava a pensar numa situação destas”, defendeu.

Ainda assim, segundo foi sabendo o Observador, as maiores movimentações foram feitas nos bastidores e sem intervenções públicas, com uma série de reuniões e contactos para aferir a possibilidade de haver, ou não, um movimento capaz de poder colocar em causa o trabalho de Bruno de Carvalho nos últimos cinco anos. Ideias, todos têm. Candidato? Nem por isso. E por variadas razões, esse poderá ser o problema: encontrar alguém que não esteja muito ligado ao período que antecedeu à ascensão do atual presidente à liderança mas que, em paralelo, seja uma cara com o carisma e notoriedade suficientes para ter condições de lutar de forma real por um triunfo num cenário de eleições, sejam elas para já, daqui a um ano ou no final do atual mandato, em 2021.

Olhando meramente no plano teórico, sem que com isso queiram ou estejam a preparar uma eventual candidatura, existem alguns nomes sempre ventilados. Rogério Alves, antigo Bastonário da Ordem dos Advogados e presidente da Mesa da Assembleia Geral que mereceu reparos em relação à sua conduta na última Assembleia Geral (“Se quer ser candidato, que se assuma de uma vez”, disse o líder), costuma surgir sempre na órbita do universo verde e branco. Mais recentemente, sem que alguma vez tenha declarado que era sua intenção avançar com uma lista, João Benedito, antigo jogador e capitão de futsal durante duas décadas que acabou por tornar-se num símbolo leonino, também foi surgindo nas conversas. E existem sempre outros “grupos” ou movimentos que, com ou sem candidato, conseguem ter o seu peso, maior ou menos, em termos eleitorais (algo que não se viu em 2017 porque Pedro Madeira Rodrigues acabou por surgir de uma esfera distinta de todas as que foram supracitadas).

Num outro plano, neste caso mais focado na SAD e não no clube, mas sendo algo que “pressiona” mais Bruno de Carvalho, a Holdimo, principal acionista além do Sporting com cerca de 30% do capital social, estará a tentar marcar uma reunião de emergência entre os administradores da sociedade e uma Assembleia Geral para debater a atual crise que assola o futebol do Sporting. A ideia terá partido de Álvaro Sobrinho, empresário que esteve próximo do presidente verde e branco no início do seu primeiro mandato mas que, com o tempo, se foi distanciando, por divergências em torno de matérias como o aumento do capital social da SAD. Acrescente-se que uma coisa é a SAD e outra é o clube, pelo que, neste caso, a posição de Bruno de Carvalho no Sporting não mudava.

“É necessário debater e resolver os problemas internos do clube em sede de uma Assembleia Geral da SAD”, defendeu a Holdimo em comunicado, numa decisão assente “nas consequências financeiras e no potencial prejuízoda atual clivagem no clube para os ativos da sociedade”, entre outras.”As ações da Sporting SAD estão suspensas da negociação bolsista, pela segunda sessão consecutiva, em consequência de quebras de cotação superiores a 30 por cento (…) O debate público sobre questões internas tem contribuído para uma exposição que é absolutamente dispensável e atentatória da melhor tradição da marca Sporting. As relações humanas têm momentos de tensão que temos de saber gerir com a maior ponderação, discrição e bom senso”, explica a missiva.

Uma coisa é certa: ninguém irá fazer nada a não ser que exista um cenário mais ou menos definido em relação aos próximos capítulos. Um exemplo prático de algo que corre mal? Falar em nomes de jogadores em vésperas de eleições. Corre sempre mal, retira automaticamente capital aos olhos de quem vota: os sócios. Por isso, tudo será mantido em segredo e sem avanços. Até porque reconhecem que, no limite, tudo pode não passar de um momento conturbado.

Os sete anos que deram sete vidas a Bruno de Carvalho

Rui Rigueiro, que é comentador da Sporting TV, escreveu esta segunda-feira um texto que resume o sentimento de todos aqueles que mostraram o seu desagrado (porque também houve) pelas manifestações anti-Bruno de Carvalho no encontro com o P. Ferreira. E, em poucas linhas, resumiu o “capital” que, em termos internos, o atual presidente ainda beneficia. “Se ou quando Bruno de Carvalho deixar de ser presidente, quem vier a seguir encontrará o seguinte no clube: 170 mil sócios; um clube mais rico em património; um contrato de direitos televisivos superior a 500 milhões de euros e que entrou em vigor este ano; equilíbrio orçamental conseguido na diferença compras/vendas; 55 modalidades que precisam de ser bem tratadas e acarinhadas, sendo que na esmagadora maioria estamos na liderança; uma SAD com lucros sistemáticos e redução de passivo; um conjunto de lojas e pontos de venda comerciais para maior alcance da marca; um pavilhão que é apenas o maior e melhor dos clubes nacionais (…) Por isso, quem vier a seguir não terá um décimo do trabalho que Bruno de Carvalho teve”.

São poucos, pouquíssimos, os apoiantes de Bruno de Carvalho que não consideram ter havido precipitação por parte do presidente do Sporting na abordagem aos jogadores após a derrota de Madrid (da mesma forma como também não gostaram da forma como o plantel reagiu). E que até admitem que o líder tem revelado alguns sinais de desgaste nos últimos tempos que “ajudam” à construção da ideia de fim de ciclo. No entanto, acreditam que o atual líder tem todas as condições para continuar o seu projeto caso tome algumas medidas a breve e médio prazo. Uma, por exemplo, foi comunicada pelo próprio antes de ser pai: vai deixar de vez a sua página oficial de Facebook.

“Falei com ele há horas para saber se tinha nascido a filha e se estava tudo bem, porque há um ser humano, um homem que está a ser linchado e que está, como se diz em inglês, em burnout, num stress brutal. E disse-me que ia acabar com o Facebook para sempre. Disse-me que era definitivo e essa é a condição fundamental para conseguir ter condições para continuar a ser presidente do Sporting. Repugna-me que, quem não conseguiu ganhar as eleições, tem tempo de antena. Que não se aproveite este tempo para linchar o Bruno de Carvalho. Ele teve milhares e milhares de votos a favor. Quem me diz que ele não voltaria a ganhar com uma maioria larga? Estou a dar a cara por ele, mas não me sirvo desta crise para ir contra ele”, frisou Eduardo Barroso, à tarde, na SIC Notícias.

Numa espécie de introspeção a tudo o que se tem passado, Bruno de Carvalho, que foi pai de Leonor ao final da noite, considera que a imagem que passa na opinião pública e na comunicação social não reflete em nada o que se passa num possível contexto de Assembleia Geral ou de eleições. E está apostado em acabar o mandato, atingindo ainda alguns objetivos que lhe têm falado como a conquista do Campeonato de futebol. Por isso mesmo, é certo que não se vai demitir. E, caso exista mesmo uma reunião magna, defenderá todo o trabalho que tem para apresentar perante “a ingratidão e a memória curta”. “As Assembleias Gerais, os debates e o confronto trazem o melhor dele ao de cima”, diz-nos uma fonte próxima. No entanto, “é muito improvável que haja um Bruno de Carvalho como o Bruno de Carvalho até aqui”.

A certeza de que Bruno de Carvalho não se demitiria acabou por ser mais um dado tido em conta na reunião que houve esta segunda-feira em Alvalade entre os membros da Mesa da Assembleia Geral do clube. Pelo que soube o Observador, Jaime Marta Soares, que teve um dia de loucos face à “pressão” criada após as palavras que teve esta manhã na TSF, ainda quer amadurecer uma decisão final em relação aos caminhos a seguir nos próximos dias, com dois cenários em cima da mesa que ganharam força: ou a convocação de uma Assembleia Geral, seguindo aquilo que anunciara durante o dia, ou a hipótese de haver uma outra solução “provisória” durante esta fase.

Justiça. Até onde pode ir o sigilo e o que (realmente) está a proteger

10 Abril 2018

Nuno Gonçalo Poças

A violação do segredo de justiça tornou-se uma rotina. Mas que condições a podem legitimar? E quais são os seus limites? Este ensaio revê o que está em causa - e ajuda a colocar os pratos na balança.

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Os Ensaios do Observador juntam artigos de análise sobre as áreas mais importantes da sociedade portuguesa. O objetivo é debater — com factos e com números e sem complexos — qual a melhor forma de resolver alguns dos problemas que ameaçam o nosso desenvolvimento.

Foi a propósito do processo Casa Pia que começámos a ouvir falar em violações do segredo de justiça a uma escala mediática até então inédita. E tal decorreu, sobretudo, do envolvimento no caso de várias figuras públicas e políticas. O segredo de justiça ficou, desde essa altura, no centro de inúmeros debates, tornou-se alvo de sucessivas alterações legislativas e, regra geral, consolidou-se como um problema permanente e sem (aparente) resolução sempre que estão em causa os chamados processos mediáticos. Mas, tanto tempo depois, onde estamos em termos de discussão do segredo de justiça, quando a sua violação se converteu numa rotina da vida democrática?

Em boa verdade, são muitas as perguntas que permanecem há anos sem resposta. Para que serve realmente o segredo de justiça, se não é cumprido? Que enquadramentos existem noutros países e qual a sua eficácia? O problema está nos profissionais da justiça ou na comunicação social? O segredo visa proteger bens juridicamente mais relevantes do que a liberdade de imprensa ou não? Indo para além das queixas, que modelo queremos e precisamos? E, afinal, há mesmo como garantir que o segredo de justiça se cumpre?

Todas estas questões carecem de resposta. Porque, por um lado, é como dizia Sophia de Mello Breyner: vemos, ouvimos e lemos, não podemos ignorar. Mas, por outro lado, em que medida é que isso é útil a quem investiga e acusa, a quem se defende ou até a quem aprendeu a olhar para os processos mediáticos como folhetins, muito mais como fonte de entretenimento do que de justiça? É, portanto, sobre essas questões que este ensaio se debruça – concluindo que a questão é mais cultural do que legislativa, mas que isso não é desculpa para não se melhorar a lei.

Com a complexidade a que a criminalidade chegou, sobretudo a económica, é essencial garantir que a investigação, nalguns casos, permanece sigilosa.

Letra morta: os pressupostos e como (supostamente) funciona

A Constituição de 1976 consagrou o processo penal com base acusatória e o princípio do contraditório na instrução e na fase de julgamento. O Código Penal de 1982 tipificou o crime de revelação de segredo de justiça, que seria, em termos sintéticos, a prática de publicação, no sentido de dar conhecimento público, de atos ou documentos processuais praticados antes da audiência de julgamento ou de despacho de arquivamento. Já se o processo estivesse em segredo de justiça, mesmo depois da audiência de julgamento só poderia tornar-se público com autorização da entidade competente. Na prática, é o espírito da revisão constitucional de 1982 na legislação penal a consagrar a independência do Ministério Público e o seu papel de condutor da investigação criminal.

Foi nessa senda que o Código de Processo Penal de 1987 veio determinar a existência das três fases processuais que ainda hoje conhecemos: 1) uma fase de investigação, secreta e conduzida pelo Ministério Público, auxiliado pelas forças policiais; 2) uma fase de instrução, de caráter facultativo, dirigida por um juiz; 3) o julgamento, dirigida por um juiz que não o da instrução e com uma audiência pública. Nesta altura, o segredo ainda era a regra na fase de investigação, mantendo-se um princípio inquisitório limitado, ao contrário do que acontecia em ditadura, pelo princípio da legalidade.

Em 1997, com a revisão constitucional desse ano, o segredo de justiça foi consagrado na Lei Fundamental, com o intuito de assegurar direitos fundamentais aos arguidos e também de garantir a eficácia da investigação, ficando, com o Código de Processo Penal de 1998, o segredo de justiça, também na fase de instrução, suscetível de tutelar os direitos do arguido. Só que, entretanto, caiu a tal bomba que foi o processo Casa Pia e tudo o que se lhe sucedeu em matéria de segredo de justiça e suas violações, não só naquele como noutros processos.

Em 2007, acontece uma nova reforma penal, antecedida pelo famoso Pacto da Justiça celebrado um ano antes entre PS e PSD. O Código Penal passou a prever que para haver violação do segredo de justiça não era necessário ter contacto direto com o processo, e o Código de Processo Penal avançou com novas regras inovadoras: 1) a publicidade interna e externa da fase de inquérito, salvo decisão do juiz de instrução que ordenasse o segredo externo do processo; 2) a publicidade da fase de instrução; 3) existindo segredo, todos aqueles que contactassem com o processo ficariam a ele vinculados, o que incluiria jornalistas.

São os próprios direitos do arguido que devem também ser protegidos através do segredo de justiça, nomeadamente o da presunção de inocência, evitando causar danos na maioria das vezes insanáveis ao seu bom nome e na sua dignidade.
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A verdade é que, desde 2007, a regra passou a ser a da publicidade do processo, incluindo a fase de inquérito, ainda que com algumas exceções. Esta publicidade tem uma vertente interna, relativa aos sujeitos processuais, e uma vertente externa, relativa a terceiros. Por um lado, tal acaba por garantir a tutela penal dos direitos do arguido, nomeadamente no que diz respeito ao conhecimento, por parte deste, da prova da acusação, mas também da vítima, já que lhe permite discutir a eventual contraprova do arguido. E, em teoria, a publicidade externa traria consigo maior eficácia à ação da justiça, ajudando a prevenir com mais sucesso quanto maior fosse a publicidade processual.

A publicidade, tendo passado a ser regra, não deixou de ser suscetível de afastamento, nomeadamente na fase de inquérito. E é precisamente nesses casos que se têm levantado problemas.

É verdade que a publicidade e um processo penal de matriz acusatória são essenciais a uma democracia, na medida em que é através desses princípios que se garantem os direitos dos arguidos. Mas, se a publicidade fosse absoluta, estaria em causa, em não raros casos, a descoberta da verdade, a permanência dos arguidos ao dispor da investigação, a facilidade de obtenção de provas. Com a complexidade a que a criminalidade chegou, sobretudo a económica, é essencial garantir que a investigação, nalguns casos, permanece sigilosa. Mas, por outro lado, é importante também garantir que os arguidos não são julgados por terceiros que não os tribunais.

Ou seja, o segredo de justiça existe, em teoria, para proteger a investigação criminal, para que a verdade seja descoberta sem interferências de terceiros, nomeadamente do próprio arguido, no cumprimento das atribuições e dos fins que um Estado de Direito deve ter. É uma forma possível de garantir que quem investiga tem condições para levar a bom porto a sua missão, preservando os meios de prova. Por outro lado, são os próprios direitos do arguido que devem também ser protegidos através do segredo de justiça, nomeadamente o da presunção de inocência, evitando causar danos na maioria das vezes insanáveis ao seu bom nome e na sua dignidade, bem como à da sua família, evitando decisões mediáticas antes das judiciais.

Mas com que fundamentos se determina, então, o segredo de justiça? O segredo pode ser requerido pelo próprio arguido, pelo assistente ou pelo ofendido, alegando que a publicidade do processo lhes é prejudicial, cabendo a decisão sobre tal pedido ao juiz de instrução criminal, depois de o Ministério Público se pronunciar. Mas pode também ser determinado pelo próprio Ministério Público, sujeito a validação do juiz de instrução, quando este entenda que a publicidade do processo atinge os direitos dos sujeitos processuais ou prejudique os interesses da investigação. Certo, certo, é que, uma vez em segredo de justiça, o mesmo só vigora durante o inquérito e termina pelo decurso do prazo deste ou pelo seu levantamento.

Por fim, a sanção: o Código Penal pune a violação do segredo de justiça, com pena de prisão até dois anos (o que dificilmente resultará numa pena de prisão efetiva) ou com multa até 240 dias, considerando-se que viola o conteúdo do segredo de justiça quem der conhecimento, total ou parcial, de ato processual protegido pelo segredo ou de um ato em cuja celebração não estivesse permitida a assistência de público em geral. Ora, como veremos adiante, tudo isto é letra morta.

A justiça não tem menor dignidade, até constitucional, do que a imprensa. Daí ao conflito, vai o salto de uma pulga.
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Perceber o problema: as fronteiras entre o que é da comunicação social e o que é da justiça

Ninguém se atreve, hoje em dia, a colocar em causa a liberdade de informação, o direito a informar e a ser informado. E é evidente que a grande missão da comunicação social é dar publicidade (i.e., tornar público) o que é de interesse para a comunidade. Mas a justiça não tem menor dignidade, até constitucional, do que a imprensa. Daí ao conflito, vai o salto de uma pulga.

A justiça, por um lado, tem o seu tempo, as suas complexidades, os seus métodos de apuramento da verdade. A comunicação social, cada vez mais rápida, conseguiu competir com a justiça, ultrapassando-a na obtenção de meios de prova, na investigação em geral, e, naturalmente, na acusação e na condenação. Pergunta: se a justiça não consegue cumprir os prazos da lei (nomeadamente os do inquérito, importaria noutra fase discutir o sentido dos mesmos) e tem à sua frente grandes obstáculos quanto aos meios de prova, como pode competir com a anarquia processual de uma redação jornalística?

O desafio está em traçar os limites e as compatibilidades. Parece cínico que se diga, por um lado, que a justiça quer impedir a liberdade de informação como, por outro, que a imprensa quer impedir a justiça de atuar. É fatal como o destino: ambas, justiça e comunicação social, terão de se compatibilizar e arranjar uma forma de garantir o direito à informação e a tutela dos direitos dos arguidos e da investigação.

Esse entendimento deve começar num diagnóstico correto do problema, evitando confusões. Por exemplo: não há qualquer violação do segredo de justiça quando a comunicação social se antecipa à investigação judicial e divulga factos, com melhor ou pior prova, que não fazem parte do processo e que, como tal, não estão sujeitos a segredo. O problema não é a investigação jornalística. O problema é quando se passa o risco, isto é quando há transcrição de escutas nos jornais, existência de buscas acompanhadas pelas objetivas dos repórteres, ou os diretos televisivos das detenções – porque se percebe que houve violação do segredo de justiça e se permitiu a interferência de um no trabalho dos outros.

Não há qualquer violação do segredo de justiça quando a comunicação social se antecipa à investigação judicial e divulga factos, com melhor ou pior prova, que não fazem parte do processo.
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Os dados sobre Portugal: quem e quando se viola o segredo de justiça?

Talvez seja interessante perceber de onde vêm afinal as violações do segredo de justiça – mesmo sabendo que não é por aí que se resolve alguma coisa. Dos arguidos, que pretendem descredibilizar a investigação? Dos advogados, que pretendem o mesmo? Dos juízes? Do Ministério Público, que pretende o reconhecimento do seu sucesso ou a justificação da sua ineficácia? Dos funcionários judiciais? E os jornalistas, confrontados com a informação que obtiveram, seja por que meio for, o que devem fazer com ela – publicar, esconder, aguardar?

Em 2014, a Procuradoria Geral da República publicou o relatório de uma auditoria, tendo por objeto os processos que, estando em segredo de justiça, foram violados em 2011 e 2012. Dos 1.310.609 processos registados, o segredo de justiça vigorou apenas em 6.354 e houve suspeitas de violação do segredo de justiça em 92 casos (1,5% dos processos em segredo de justiça). Destes dados resultou a abertura de 83 inquéritos, que redundaram em nove acusações, maioritariamente a jornalistas, e apenas um julgamento – que até resultou em absolvição. Ou seja, fica claro que a legislação em vigor é, de facto, ineficaz.

Os números dão que pensar. Mas, mais do que acumular lamentos, interessará perceber o que fazer com as violações do segredo de justiça. A lei, como acontece muito em Portugal, tem respostas teóricas, mas o sistema não dá garantias de cumprimento na prática. Razão tinha o advogado Paulo Saragoça da Matta quando dizia, em 2017, que “esta lei é totalmente desadequada à realidade, já que manifesta um princípio e uma proibição que são, na prática, uma completa letra morta. De duas uma: ou cessa o regime de segredo de justiça, passando todos os processos a ser integralmente públicos, ou, se se deseja manter a possibilidade de sujeitar os inquéritos a segredo de justiça, ter-se-á de responsabilizar quem viola a lei reiteradamente. De momento, são normas meramente para inglês ver!”.

Razão tinha o advogado Paulo Saragoça da Matta quando dizia, em 2017, que "esta lei é totalmente desadequada à realidade, já que manifesta um princípio e uma proibição que são, na prática, uma completa letra morta".
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O que existe lá fora?

Que modelos existem e com quem nos podemos comparar? A Fundação Francisco Manuel dos Santos publicou um ensaio de Fernando Gascón Inchausti, professor na Universidade Complutense de Madrid, que oferece uma visão muito completa das várias realidades em matéria de segredo de justiça. A partir dele, é possível compreender os modelos que outros países implementaram.

Espanha. No sistema espanhol, atendendo ao que estabelece a lei processual, dir-se-ia que se estava perante um ordenamento com um apertado grau de segredo na investigação criminal. De facto, tanto o segredo externo como o interno são previstos, mas é na proteção do segredo externo que o modelo cai no ridículo.

A violação do segredo externo, se praticada por advogado ou procurador de uma das partes, tem como sanção uma quantia de 250 a 2.500 pesetas (algures entre 1,25 euros e 12,50 euros), um valor que não é atualizado desde 1955; se for praticada por um funcionário público, incorre numa pena de 12 a 18 meses de multa e interdição de funções públicas de um a três anos, ou, causando especial dano a terceiros ou à causa pública, pena de prisão de um a três anos e interdição de 3 a 5 anos. Significa isto que só os funcionários públicos se consideram legalmente dissuadidos de revelar segredos da investigação criminal, neles se incluindo os juízes, procuradores, órgãos de polícia criminal, funcionários judiciais ou peritos. Já as partes e os seus advogados nada têm a temer, dado o ridículo da sanção que lhes é aplicada por difundir, nomeadamente à comunicação social, segredos do processo.

O segredo interno e a sua violação têm uma moldura penal mais dura, incluindo para os advogados, o que faz com que os juízes tenham, não raras vezes, de determinar o segredo interno do processo para garantir o sucesso da investigação e a tutela dos direitos dos arguidos. Caso contrário, isto é, se apenas for decretado o segredo externo (em que o processo apenas se torna sigiloso para terceiros, nomeadamente a comunicação social), o que acontece é que, com um custo muito baixo para os advogados e para as partes, os processos rapidamente perdem o sigilo pretendido.

Além do mais, é muito curiosa a nota que Fernando Inchausti faz no seu ensaio a propósito do que tem sido a política do Consejo General del Poder Judicial, o órgão máximo do governo do poder judicial espanhol: “o que realmente lhe interessa é manter uma boa relação com os meios de comunicação, em claro detrimento dos valores que subjazem e justificam o segredo da investigação penal – e também em claro detrimento da independência judicial em relação ao poder mediático. Penso que não são necessários mais comentários.”

Para facilitar a comparação com os sistemas políticos, pode dizer-se que na Alemanha funciona um modelo de segredo interno da investigação: significa que o arguido não participa na fase das diligências da investigação, que cabe ao Ministério Público.
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França. Também os franceses têm um regime que contempla o segredo externo e o segredo interno. Em relação às partes processuais, desde 1897 que o processo é público, embora com algumas restrições ou condicionantes. Já em relação a terceiros, a regra é a de que os atos da investigação são secretos, o que abrange os advogados na medida do seu vínculo ao sigilo profissional.

Claro que o que tem preocupado o mundo judiciário em França é exatamente o mesmo que preocupa todos os outros países: a relação entre a comunicação social e o segredo da investigação. Por isso, além de algumas sanções específicas aplicáveis a advogados que violem o segredo de justiça, a lei de liberdade de imprensa pune, com multas que vão de 3.500 a 15 mil euros, quem publique determinados atos ou informações processuais. Além destas sanções impostas a advogados e jornalistas, o ordenamento francês faz ainda aplicar penas de prisão de um ano e 15 mil euros de multa quando estejam em causa pessoas obrigadas pelo segredo da investigação.

Itália. Ao contrário de França e Espanha, a legislação italiana não tem especial preocupação em distinguir o segredo externo do interno. Em Itália, existe apenas uma categoria de atos secretos: aqueles que o são para o indagato, isto é, o suspeito, já que a regra é a de que os atos de investigação levados a cabo pela Polícia e pelo Ministério Público são secretos. O que significa, muito resumidamente, que o que os italianos consideram relevante no seu processo penal é o êxito da investigação criminal e fazer com que esta não seja contaminada, no que diz respeito à prova, pelo arguido. Porém, este secretismo dos atos está limitado no tempo, não se mantendo o segredo depois de encerrada a fase de investigação (equivalente, em Portugal, ao inquérito). Em todo o caso, a regra geral de segredo de justiça apresenta uma série de exceções.

Quem revelar informações secretas relativas a um processo penal é punido com pena de prisão até um ano. Se o infrator não assistiu ao ato, mas veio a conhecê-lo por razões profissionais, poderá ser punido com pena de prisão de seis meses a três anos. Já para quem publicar atos ou documentos de um processo penal cuja publicação esteja proibida por lei, tem pela frente uma pena de prisão até 30 dias ou uma multa entre 51 e 258 euros – o que tem sido apontado como manifestamente escasso no que ao efeito dissuasor da pena diz respeito.

Alemanha. Fernando Inchausti diz, muito acertadamente, que os modelos latinos são especialmente bons a regular, em extensão e pormenor, e péssimos a fazer cumprir. Já na Alemanha a regulação normativa é praticamente inexistente, mas a realidade demonstra um respeito generalizado para com o segredo da investigação penal. Isso tem-se manifestado na forma como os próprios meios de comunicação têm feito uso do seu poder de autocontrolo: a omissão dos nomes dos arguidos, aquando da informação sobre atuações penais, a menos que se trate de pessoas que já tenham tido relevância pública, é notável. Na Alemanha, durante a fase da investigação, ninguém saberia quem era Manuel Palito, Pedro Dias, Leonor Cipriano ou Carlos Silvino.

Se quisermos usar como referência os sistemas latinos, para facilitar a comparação, pode dizer-se que na Alemanha funciona um modelo de segredo interno da investigação. Significa isto que o arguido não participa na fase das diligências da investigação, que cabe ao Ministério Público. No entanto, a duração da investigação não é indefinida, o que, entendem os alemães, colidiria com os direitos de defesa. Nesse sentido, o arguido deve poder conhecer dos factos que lhe são imputados, sendo que a jurisprudência constitucional tem considerado que deve receber essa informação antes do seu interrogatório, o que sucede antes do termo formal da investigação.

Considerando estes factos, o modelo alemão acaba por não ter um regime sancionatório ao estilo dos países latinos para a violação do segredo de justiça. Além disso, existe uma relação próxima entre o Ministério Público e a comunicação social, já que existe na Alemanha uma estrutura de gabinetes de imprensa ligada aquele e aos tribunais que torna transparente a relação existente e necessária entre as partes.

Inglaterra. Abandonados os modelos continentais, o que está em causa na matriz inglesa não é a proteção da investigação, mas evitar que os meios de comunicação social possam interferir na correta administração da justiça e no direito do arguido a um fair trial. Porém, mesmo entre os modelos anglo-saxónicos existem diferenças: os ingleses dão preferência à tutela do processo, os americanos preferem a liberdade de imprensa.

Ao contrário dos modelos latinos e continentais, o sistema inglês não chega a considerar a fase de investigação como uma verdadeira fase da estrutura processual penal. A investigação é levada a cabo pelas entidades policiais e só dão lugar a um efetivo processo judicial com a detenção ou com a autorização por um juiz para a realização de buscas ou escutas telefónicas. Daí que não se possa falar de uma fase de investigação, nem do seu eventual secretismo.

Além disso, a imprensa britânica, apesar do seu conhecido sensacionalismo, tem mostrado, na maior parte das vezes, um grande respeito pelos processos judiciais, num regime que apela muito à sua autolimitação, nomeadamente através da figura genérica do contempt of court e, em particular, do contempt of court by publication. O que está em causa, para os ingleses, não é a tutela da presunção de inocência do arguido tal como ela é entendida entre nós, mas a proteção que se deve dar ao arguido de que não vai ser julgado por um tribunal que não tenha uma mente aberta em relação ao processo por causa do que foi veiculado nos órgãos de comunicação social. Isto confere, na prática, algum secretismo ao processo penal inglês, o que tem sido confirmado com a aplicação de algumas penas de prisão a quem já pôs em causa estes princípios que se enunciaram.

Estados Unidos da América. Como se disse, apesar da matriz inglesa, os americanos desenvolveram o seu processo penal num sentido muito diferente, dando muita relevância à liberdade de imprensa consagrada na Primeira Emenda da sua Constituição. Também aqui não existe a figura latina do segredo da investigação, sendo que a única regra é a publicidade das atuações judiciais e o reconhecimento de que existe um interesse legítimo dos meios de comunicação social em informar.

O caso de Bernard Madoff, em 2009, abalou Wall Street e o mundo financeiro global e tem sido referenciado como um exemplo recente do modo de funcionamento do sistema judicial norte-americano (TIMOTHY A. CLARY/AFP/Getty Images)

Apesar de manterem a figura do contempt of court, os americanos foram afastando, ao longo dos anos, a britânica figura do contempt by publication. Porém, o ordenamento americano mantém uma série de instrumentos que visam garantir um julgamento justo aos arguidos. O presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público português, em alusão ao caso Madoff, dizia que a investigação americana assenta na informalidade, na liberdade de atuação do Ministério Público, na inexistência de prazos de inquérito, ao contrário do sistema português, em que o inquérito funciona com diário de bordo, funcionando com um excesso de garantias conferidas ao arguido que têm como fundamento a reação às práticas autoritárias do Estado Novo. Teria razão nalguns aspetos, não teria em muitos. Talvez os Estados Unidos não sejam exatamente o modelo judicial que será mais comparável ao português, nem se encontra, como o nosso, isento de críticas.

O modelo na Alemanha parece ser o mais equilibrado. Mas os casos de autorregulação só operam com facilidade em países em que exista um tecido social que possua um elevado grau de respeito pelo ordenamento jurídico.

Três conclusões (com a dimensão cultural a sobressair)

Primeira conclusão. O grande problema que se levanta com o segredo de justiça é o da sua violação pelos meios de comunicação social. É assim em Portugal como em muitos outros países. Nos modelos latinos, a regra é a de que os sistemas estão bem construídos, mas sem consequências. A exceção é o caso francês que, apesar das suas falhas, tem sancionado as violações do segredo de justiça, incluindo jornalistas. O modelo existente na Alemanha parece, nesse domínio, ser o mais equilibrado. Mas estes casos de autorregulação só operam com facilidade em países em que exista um tecido social que possua um elevado grau de respeito pelo ordenamento jurídico – algo que, mostra a nossa realidade, não parece ser o caso português. É por isso que, em Portugal, seria fundamental que as normas fossem poucas, mas muito precisas, sem grandes margens para interpretações e malabarismos jurídicos que advogados e juristas de todos os sectores de atividade tanto apreciam. Por outro lado, um regime incapaz de fazer aplicar sanções a quem viola o segredo de justiça – seja ele sujeito processual, advogado, funcionário judicial, juiz, procurador ou jornalista – é um regime que não se respeita a si próprio e que, como tal, não faz por ser respeitado.

Segunda conclusão. Era também importante definir se faz ou não sentido continuar a atribuir ao Ministério Público a condução da investigação criminal ou se, como no sistema inglês, ao poder judicial deve caber a tutela dessa investigação, controlando e fiscalizando a sua legalidade. E, quanto a este aspeto, seria também fundamental discutir os meios de que dispõe a polícia e o próprio Ministério Público. Por outro lado, não há discussão sobre o segredo de justiça sem se discutir a razoabilidade dos prazos de inquérito e os mecanismos que possibilitam uma justiça penal célere e eficaz. Quando se compara o caso Madoff com os nossos processos de natureza financeiro-criminal, esquece-se muitas vezes que a natureza dos regimes jurídicos é que possibilitou respostas diferentes a cenários idênticos.

A terceira (e grande) conclusão é, de facto, que o respeito pelo ordenamento e a confiança no sistema judicial é mais cultural que normativo. Mas, num país como o nosso, a legislação tem que responder por si. A escolha pode passar por eliminar de uma vez o segredo de justiça – com as consequências que isso traz aos arguidos e, em bom rigor, a cada um de nós enquanto cidadãos suscetíveis de ser investigados por algum motivo, e presumivelmente inocentes até prova em contrário. Mas também pode passar por fazer aplicar efetivas sanções penais e profissionais a quem infringir o segredo de justiça. Seja qual for o caminho, certo é que ficar como está é insustentável.

Nuno Gonçalo Poças é advogado e foi assessor no XIX Governo. Escreve no Observador sobre o sistema político e a justiça

RTP - O Essencial

O Essencial

10 Abril, 2018

Sérgio Alexandre
Jornalista
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Endividamento das famílias: até o FMI reconhece o seu impacto perverso!

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Posted: 09 Apr 2018 01:11 PM PDT

O FMI acaba de publicar um estudo intitulado «Compreender o impacto macro-financeiro do endividamento das famílias: Uma perspectiva global», da autoria de Adrian Alter, Alan Xiaochen Feng e Nico Valckx que estuda, a partir de dados de 80 economias avançadas e emergentes para o período 1950-2016, a relação entre o endividamento das famílias e o crescimento do PIB e encontra evidência empírica da relação inversa que existe entre a dívida das famílias e crescimento económico.
Esta correlação negativa deve-se a três mecanismos complementares:

i) O endividamento das famílias enfraquece o seu consumo, com implicações significativas sobre a procura agregada quando os choques negativos ocorrem;

ii) O sobreendividamento das famílias aumenta a probabilidade de crises bancárias ocorrerem, o que afecta significativamente a intermediação financeira;

iii) O risco de colapso é sistematicamente negligenciado devido às expectativas superoptimistas dos investidores que sustentam a expansão do endividamento.

Vários factores institucionais, como regime de taxas de câmbios flexíveis (que a zona euro não tem mas necessita para a periferia) ou um maior grau de desenvolvimento e inclusão financeira, podem mitigar o impacto negativo sobre o crescimento. Por outro lado, os países em que o peso dívida pertencente a famílias de baixos rendimentos é mais significativo, indício de sobreendividamento, sofrem uma maior penalização sobre o crescimento do PIB.
Em termos de magnitude, um aumento de um desvio padrão do rácio de endividamento familiar está associado, em média, a uma redução do crescimento do produto nos três anos seguintes de 1.2 pontos percentuais. Aspecto que é mais significativo nas economias avançadas onde existe um maior grau de endividamento das famílias de rendimentos mais baixos.
Ainda acha que não precisamos de provisão pública do direito à habitação e que este despovoamento do centro da cidade para dar lugar a magotes de touristas, alugueres de curta duração, cafés hipster e lojas gourmet é indício de desenvolvimento económico sustentável?