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sexta-feira, 4 de maio de 2018

Espelho meu, espelho meu, há alguém mais populista do que eu?

A corrupção é um flagelo que corrói as sociedades democráticas e afasta os cidadãos da participação cívica e política, na medida em que leva à desconfiança nas instituições e na democracia. Portugal não é um país de corruptos como provam os dados oficiais sobre acusações de casos de corrupção que chegam a tribunal.

  • 2 Maio, 2018

Estrela Serrano

Acresce que a diferença entre os casos que são objecto de inquérito e as acusações que deles resultam é enorme, sem contar com o facto de entre os que chegam a tribunal nem  todos serem condenados.


Porém, quem chegar a Portugal por estes dias e acompanhar as notícias pensará, no mínimo, que a classe política portuguesa é em geral corrupta e que nos partidos salvam-se apenas alguns que são os que nas televisões nos jornais e nas rádios exigem condenações ao minuto antes mesmo de os visados serem ouvidos na justiça  e nos inquéritos e audições para onde eles próprios os convocam.

Pressionados pelas vozes gritantes ou com medo de serem acusados de conivência e cumplicidade com os alegados corruptos,  alguns dirigentes partidários fazem declarações pomposas e impensadas que depois são exploradas pelos jornalistas que fazem delas tema de debate e de opinião.

A propósito dos casos Sócrates e Manuel Pinho, Ana Gomes declarou que o PS não pode continuar a ser “instrumento de corruptos e criminosos”  e Carlos César confessou-se “envergonhado” e “enraivecido”.

Trata-se em ambos os casos de declarações populistas que pretendem responder aos apelos para que o PS se pronunciasse. Mas se não as fizesse, sobretudo Carlos César, a pressão continuaria  e pouco faltaria para que o PS fosse arrastado para uma situação insustentável.

Mas convém atentar nas frases proferidas pela eurodeputada e pelo presidente do PS. Ana Gomes, tem-se distinguido na luta contra a corrupção e é um exemplo de persistência e competência enquanto eurodeputada em defesa de várias causas. Porém, ao  reprovar os factos atribuídos a Manuel Pinho e a José Sócrates usou uma frase infeliz, porque “ser “instrumento de corruptos e criminosos” significa  que o PS serviu conscientemente de meio ou de auxílio à realização de actos corruptos e criminosos. A frase é excelente para títulos de jornais mas contém uma acusação demagógica e populista. Ninguém se atreveu a interpretar o significado do que foi dito porque isso serviria para novas acusações de cumplicidade com os ditos corruptos.

Quanto a Carlos César, declarar-se “envergonhado” e “enraivecido” é um desabafo que só precisava de ser dito porque os media precisam de frases para citar. Não tem a força demolidora da frase de Ana Gomes mas serve o objectivo de dizer qualquer coisa.

Bastaria, e bastará, que o PS repita o que disse António Costa, quando era ainda apenas secretário-geral do PS, sobre a prisão de José Sócrates e que por maioria de razão se aplica ao caso Manuel Pinho:

“Nada disto penaliza e afeta as firmes convicções do PS quanto aos valores que são essenciais num Estado de direito democrático. A confiança nas instituições, a independência da justiça, a presunção da inocência, a prioridade ao combate à corrupção e a defesa da transparência são valores que não estão nem nunca estarão afetados na vida do Partido Socialista”

Fazem agora mais sentido os avisos do Presidente Marcelo contra a ascensão dos populismos. Quando os políticos, de direita e de esquerda, não são capazes de resistir aos apelos para comentarem tudo e todos a toda a hora em nome de uma alegada clarificação e demarcação de casos noticiados nos média, não estão a contribuir para o esclarecimento dos cidadãos mas sim a colaborar em julgamentos populares próprios de regimes populistas.

Exclusivo Tornado / VAI E VEM

No princípio era o Estado de Direito

A Lei era geral e abstracta e a sua aplicação era feita sem discriminar as convicções políticas, religiosas ou outras dos arguidos. A separação de Poderes garantia a independência de cada um e de todos eles face aos restantes.

Depois veio a ideia de criar uma nova tipologia de crime: o enriquecimento ilícito. Ao arrepio de séculos de Doutrina e de Jurisprudência, do desenvolvimento civilizacional no sentido do Humanismo e da protecção dos Cidadãos face ao Estado, esta legislação, mais não faz que compilar uma série de crimes pré-existentes num único crime onde quem acusa está dispensado de provar a acusação e é ao acusado que cabe provar a sua inocência.

Tal legislação seria, a ser aprovada, obviamente inconstitucional e anti-democrática. Revela tiques autoritários e traduz, na prática, uma trincheira de resistência do “dinheiro velho” contra o “dinheiro novo”. Viola princípios gerais de Direito, comuns em todas as democracias, e desrespeita a condição do indivíduo face ao Estado. Por isso não é democrática nem protege aqueles que, nesta relação, são a parte mais fraca. Como é óbvio não foi aprovada.

A esta Lei as forças do autoritarismo e do passado querem ainda acrescentar a delação premiada, permitindo a qualquer criminoso sem carácter sair em Liberdade através da denúncia, real ou fictícia, de alguém que, por toda a natureza de razões, o acusador queira caçar. Não necessariamente pelas melhores razões porque os acusadores são apenas humanos e como tal sujeitos a todas as tentações dessa condição que comungam com os restantes membros da espécie.

Com a ascensão do neoliberalismo, no domínio económico, assistimos a um retrocesso civilizacional que, em algumas áreas, é de séculos. O Direito não é excepção e a vocação totalitária está interessada em reforçar os poderes do Estado e, concomitantemente, reduzir as garantias dos cidadãos.

A doutrina da separação de poderes tende a ser atropelada pela vontade dos agentes do poder não eleito, não escrutinado, invadir a esfera do poder legislativo. Para tanto vai criando excepções, casos especiais, a difícil complexidade de investigação de alguns. Por falta de substância cria megaprocessos, impossíveis de julgar por quem tem essa missão e reduzindo as possibilidades da defesa.

Esta deriva antidemocrática aprendeu entretanto a usar as mudanças sociológicas e económicas a favor das suas pretensões. Quanto mais enfraquecido for o poder político mais fácil se torna para os agentes da Justiça invadir a sua esfera. A ideia peregrina de que “à política o que é da política e à justiça o que é da justiça” apenas favorece a invasão do espaço da primeira pela segunda. Aquela que ninguém elege ou escrutina, recorde-se.

Para tanto a direita aprendeu a servir-se, e usa-os, dos órgãos de comunicação social. As mudanças operadas na dimensão das empresas que os detêm, o desemprego, o medo e a concorrência facilitam a tarefa. A progressiva estupidificação das audiências e o combate feroz pela sua fatia leva a cedências cada vez maiores, a vender “sangue” e “intriga” onde antes havia informação e escrutínio dos diversos poderes. Sem os jornalistas esta tarefa não seria realizável.

O governo “de facto” dos Juízes… Judicialistas

É este o ponto da situação actual. Do Ministério Público sai uma “dica” para um jornalista amigo. Chama-se “plantar” uma notícia mas o jornalista chama-lhe “investigação” e publica. Os restantes órgãos de comunicação social, maxime as televisões, pegam nessa “pseudo-fuga”, que é na realidade uma notícia plantada, e citando-se entre si, vão criando o clima propício a uma condenação pela opinião pública.

Torna-se necessário ao acusado, leia-se à vítima, defender-se. E aí está a inversão do ónus da prova. Cabe agora ao acusado provar a sua inocência. Pelo caminho subverteram-se o espírito e a letra da Constituição e vários séculos de Civilização, Doutrina e Jurisprudência jurídicas e judiciais.

A Lei do Enriquecimento ilícito passa a vigorar de facto sem ter sido sufragada no Parlamento por representantes legítimos, eleitos, dos cidadãos. O fenómeno é ampliado pelos dividendos que o MP retira para efeito de dilatação dos seus prazos. Quanto mais tempo os acusados estiverem a ser cozinhados em lume brando tanto melhor. Para todos os efeitos já estão a cumprir pena. A sua condenação é irrevogável e perpétua porque mesmo que venham a ser absolvidos tal facto nunca será tão divulgado com a mesma projecção, nem apagará os anos sob os holofotes da culpa.

O conúbio entre jornalistas e o Poder Judicial ameaça a Democracia

Este verdadeiro golpe palaciano, esta machadada na cidadania e no Estado de Direito só é possível com o silêncio ruidoso e cúmplice dos outros poderes. É inadmissível a Assembleia da República permitir esta usurpação de poderes, é inadmissível que o Presidente da República e os Partidos nada tenham a dizer sobre este processo de obter condenações.

O secretário-geral do PS, o autor da célebre frase, inconcebível num jurista, referida acima, navega no pântano da confusão que estabelece entre substância e forma e será, se tudo correr normalmente, vítima do seu sentido de oportunidade mais adiante. É falta de visão política não se dar conta que este é um ataque político ao seu partido e que só poderia ter uma resposta política: a defesa intransigente dos valores da Democracia, da Liberdade e do Estado de Direito. Costa preferiu optar pelo poder a qualquer custo.

Já os restantes partidos da actual maioria parlamentar colaboram nesta farsa procurando daí retirar dividendos eleitorais. Não se dão conta de que, uma vez arguidos, os cidadãos em causa têm direito ao silêncio e de que não podem responder a comissões parlamentares porque tudo o que vierem a dizer na esfera pública, antes de saberem de que são acusados, pode e virá a ser usado contra eles no processo judicial. No limite são obrigados pela pressão da opinião pública a auto incriminar-se, privando-os assim de um Direito Fundamental.

Triste momento este que a nossa Democracia atravessa.

RTP - O essencial

O Essencial

4 Maio, 2018

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Sérgio Alexandre
Jornalista
Sérgio Alexandre

Bem-vindo

Em cima da hora: Governo demite Diretora-Geral das Artes. Por “condenação sem julgamento”, José Sócrates abandona PS. A RTP mostra deputados que duvidosamente beneficiam de subsídios de deslocação pagos pelo parlamento. Procuradoria-Geral da República levanta segredo de Justiça sobre a auditoria da Protecção Civil aos incêndios de Pedrógão Grande. Morreu Afonso Dhlakama – viragem em Moçambique? Academia Sueca não atribui Noberl da Literatura em 2018.


Sócrates abandona PS

Sócrates abandona PS

José Sócrates pediu a desfiliação do Partido Socialista. O ex-primeiro-ministro não gostou das críticas emitidas por altas figuras do partido, a começar pelo presidente, Carlos César, que esta semana se confessou “envergonhado” com as suspeitas que recaem sobre Manuel Pinho e, “vergonha ainda maior”, no que diz respeito a José Sócrates, por se tratar de um antigo chefe de Governo. Num artigo no Jornal de Notícias, Sócrates resolve terminar o “embaraço mútuo”, revelando que vai sair do PS.


Sócrates tomou decisão de forma livre, diz o presidente do PS

Sócrates tomou decisão de forma livre, diz o presidente do PS

Carlos César já comentou a decisão de José Sócrates, afirmando que o ex-primeiro-ministro deixou o PS “de forma responsável, de forma livre”. Outras reações: Ana Gomes julga que, com o distanciamento face a Sócrates, o PS fez o que já devia ter feito há muito tempo, mas Manuel Alegre considera que o partido abriu uma “caixa de Pandora” com as “críticas avulsas” ao ex-chefe de Governo e agora vai ter de discutir o assunto no Congresso.


Demitida a Diretora-Geral das Artes

Demitida a Diretora-Geral das Artes

Em cima da hora de fecho desta newsletter, surgiu a notícia de que o ministro da Cultura demitiu a Diretora-Geral das Artes, por “perda de confiança política”, depois de ter tido conhecimento de factos que tornam “incompatível a manutenção de Paula Varanda no cargo”. A decisão surge na sequência de uma investigação jornalística do Sexta às 9, da RTP, que detetou que desde que foi nomeada alta dirigente do Estado, em regime de substituição, em maio de 2016, Paula Varanda nunca deixou de ser diretora artística de uma associação em Mértola, financiada pela própria Direção-Geral das Artes.


Dinheiro fácil

Dinheiro fácil

Elza Pais (PS), Duarte Pacheco e Clara Marques Mendes (PSD) e Heitor Soares (BE) são os exemplos aqui avançados pela jornalista Sandra Machado Soares para mostrar que há muitos deputados à Assembleia da República que, tendo residência em Lisboa, declaram morada oficial em outros pontos do país, mais longínquos, e com isso são beneficiados pelas ajudas de custo que o parlamento atribui. Isto porque os abonos de deslocação têm por base de cálculo a distância a que morada oficial do deputado fica da Assembleia da República. Com isto, o ordenado mensal sai engordado em muitas centenas ou mesmo milhares de euros. Dinheiro que sai dos nossos bolsos.


Procuradoria "liberta" auditoria sobre Pedrógão Grande

Procuradoria

Depois das notícias que esta semana se fizeram sobre o caso, o Governo considerou não haver inconveniente no levantamento do segredo de Justiça imposto sobre a auditoria da Proteção Civil aos incêndios de Pedrógão Grande, na qual se conclui que documentos-chave sobre os trabalhos de combate ao fogo foram “apagados” ou “destruídos”. A Procuradoria-Geral da República teve a mesma opinião e decidiu divulgar publicamente o relatório.


Greve dos não docentes fecha escolas

Greve dos não docentes fecha escolas

O grau superlativo absoluto sintético não é, por enquanto, acompanhado por valores concretos, mas o líder da Federação Nacional da Educação não hesita em qualificar de “fortíssima” a participação na greve de trabalhadores não docentes que, segundo João Dias da Silva, se está a traduzir em escolas fechadas em todo o país. Os trabalhadores em protesto exigem “a integração dos vínculos precários, uma carreira específica e meios suficientes assegurar para o bom funcionamento das escolas”.


Afonso Dhlakama (1953-2018)

Afonso Dhlakama (1953-2018)

Aos 65 anos, morreu o líder histórico da RENAMO, o principal partido da oposição em Moçambique. Com um estado de saúde fragilizado, Afonso Dhlakama terá sido vitimado por uma crise cardíaca, revelando-se infrutíferas as tentativas para o transferir por via aérea para receber assistência médica na África do Sul. Dhlakama foi figura principal no movimento de guerrilha contra a FRELIMO, desde a independência moçambicana, em 1975. Após o fim da guerra civil, candidatou-se pela RENAMO a cinco eleições presidenciais, a última em 2014, e foi sempre vencido. Não reconheceu a derrota em nenhuma delas, acusando o regime de falta de transparência e ameaçando o regresso à luta armada. Desde dezembro de 2017 que vigora uma declaração de tréguas que perdura até hoje. A morte de Afonso Dhlakama poderá significar um ponto de viragem para Moçambique, mas há vários pontos de interrogação que lançam uma sombra de dúvida sobre o futuro do país, comenta na RTP o jornalista Paulo Dentinho.


Nobel interruptus

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É notícia em todos os principais órgãos de Comunicação Social do Mundo: este ano, pela primeira vez desde a II Grande Guerra, não vai ser atribuído o Nobel da Literatura. Desta vez, os motivos para a interrupção são bem mais prosaicos e prendem-se com um escãndalo sexual que provocou suspeitas, acusações e demissões no júri do prémio. Perante isto, a Academia Sueca considerou “necessário investir tempo em restabelecer a confiança do público na Academia, antes que possa ser anunciado o próximo laureado” com o Nobel da Literatura


Cosby e Polanski expulsos da Academia dos Óscares

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A Academia de Artes e Ciências Cinematográficas, que atribui os Óscares, “não é lugar para pessoas que abusam dos seus estatutos, poder ou influência de uma forma que viola os padrões da decência”. O código de conduta adotado após o terramoto Harvey Weinstein levou à expulsão de outros dois pesos pesados de Hollywood. O Conselho de Governadores da Academia decidiu que o ator americano Bill Cosby e o realizador franco-polaco Roman Polanski vão ser irradiados da poderosa Academia dos Óscares. Saiba aqui porquê.


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Rumo a Marte (outra vez)

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Amanhã, se as condições meteorológicas o permitirem, a Agência Espacial norte-americana lança mais uma expedição ao Planeta Vermelho. A Mars InSight tem por objetivo estudar a estrutura do subsolo marciano e a sua sismologi. Deve tocar a superfície do quarto planeta em 28 de novembro. Os passados primordiais da Terra e de Marte são semelhantes e a Mars InSight poderá fornecer dados que ajudem a explicar a formação dos planetas rochosos, dentro e fora do nosso sistema solar. O New York Times fez um trabalho sobre esta nova missãoe também fala das anteriores 18 que já atravessaram o espaço rumo ao nosso vizinho sideral.


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Donald Trump nomeado para Nobel da Paz

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Isabel Patrício19 horas atrás

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Pode o homem que se orgulhava de ter o "maior" botão para o armamento nuclear receber o Nobel da Paz? Dezoito congressistas republicanos pensam que sim, tendo nomeado Donald Trump para essa distinção.

Depois de Moon Jae-in ter defendido que deverá ser Donald Trump o próximo a receber o Prémio Nobel da Paz, dezoito congressistas republicanos acabam de formalizar a nomeação do Presidente norte-americano para essa distinção. Numa carta enviada ao comité norueguês, os legisladores salientam que o empresário nova-iorquino deve ser reconhecido pelo seu contributo para “o fim da Guerra da Coreia, a desnuclearização dessa península e para a paz dessa região”.

De acordo com as regras dos Prémios Nobel, apenas membros dos órgãos legislativos nacionais, professores universitários e laureados podem nomear candidatos a esta distinção, recorda o The Guardian.

No ano passado, o prémio em causa foi entregue à Campanha Internacional para Abolir Armas Nucleares. O vencedor deste ano será anunciado em dezembro.

A nomeação de Donald Trump é particularmente curiosa, já que, durante meses, o líder norte-americano entrou em confrontos diretos, através do Twitter e da comunicação social, com o líder norte-coreano, a quem apelidou de “little rocket man” (numa tradução livre, pequeno homem do foguetão).

A concretizar-se o desejo dos congressistas, o homem que uma vez disse “ter um botão maior e mais poderoso para o armamento nuclear” do que Kimreceberá um prémio pelo seu trabalho no desarmamento nuclear desse regime.

A Coreia do Norte e a Coreia do Sul reuniram-se no final do mês passado, tendo acordado a desnuclearização da península e a transformação do armistício num tratado de paz que porá, por fim, um ponto final definitivo na Guerra da Coreia. Agora Kim Jong-un deverá encontrar-se com Donald Trump para discutir as relações entre essas duas potências.

Recorde-se que o anterior Presidente norte-americano, Barack Obama, recebeu, em 2009, a distinção pelos seus “esforços extraordinários para fortalecer a diplomacia a cooperação entre os povos”.

As 42 horas de críticas que fizeram Sócrates deixar o PS

3/5/2018, 23:53

Socialistas começaram a condenar silêncio de Pinho e acabaram a admitir "vergonha" caso se confirmem factos de Sócrates. O que foi dito nas 42 horas para levar José Sócrates a abandonar o PS?

Vítor Rios / Global Imagens

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O tiro de partida para a mudança de discurso oficial no PS não foi dado esta semana — foi dado a 24 de abril à noite, quando Carlos César comentou na SIC-Notícias o caso Manuel Pinho e disse que “o país tem razões, neste caso como em outros que se comprovem, para se envergonhar com determinadas condutas“. Na altura, quase ninguém o ouviu; e a referência a “outros” casos “que se comprovem” (código para Sócrates) passou despercebida. Ao fim de oito dias, César voltaria a repetir a frase e, dessa vez, daria início a uma sequência de declarações dos mais destacados dirigentes do partido que deixaram definitivamente para trás três anos e meio daquela espécie de mantra que o então recém-eleito líder António Costa impôs ao partido (por SMS) no dia em que Sócrates foi detido: “À justiça o que é da justiça, à política o que é da política”.

Para José Sócrates, o novo discurso do PS foi insustentável: ao fim de 42 horas de críticas, decidiu entregar o cartão de militante e abandonar o PS. Numa carta publicada esta sexta-feira pelo JN, o antigo líder socialista acusa os agora ex-camaradas de lhe terem feito “uma espécie de condenação sem julgamento”. E afasta-se: “É chegado o momento de pôr fim a este embaraço mútuo”.

O que mudou no PS para a mudança de discurso que foi clara nas últimas horas? Duas coisas: o aparecimento de mais um caso a ir direito aos tempos da governação do ex-líder Sócrates; e o silêncio a que se remeteu Manuel Pinho perante as suspeitas. “A situação era insustentável”, comentou um deputado do partido ao Observador.

A proximidade de um congresso do partido no fim deste mês (o último antes das próximas legislativas) — que nenhum socialista quer voltar a ver marcado pelo fantasma de Sócrates e de casos judiciais — fez o resto. “O PS já tinha encontrado o ponto certo na relação com Sócrates. O caso de Pinho veio reavivar estas matérias e adensou o nível de intolerância. Tornou-se quase impossível que alguém dissesse alguma coisa sobre o assunto”, comenta ao Observador um outro deputado deputado do partido. O “alguém” que tomou a dianteira foi o presidente e líder parlamentar do partido, Carlos César.

Vindo de uma semana negra, com o caso das viagens dos deputados das ilhas a trazer à tona questões de ética política, Carlos César aproveitou, logo a 24 de abril, a participação no programa da SIC-Notícias, frente a Santana Lopes, para falar precisamente na ética exigida a quem tem “responsabilidades políticas qualificadas”. Não era sobre si ou sobre os restantes deputados das regiões autónomas que falava, mas sim sobre Manuel Pinho. E não só.

Nessa noite, César disparou logo sobre a situação do ex-ministro da Economia para a classificar de “incompreensível e lamentável”: “Não sou eu o juiz, não o posso condenar, mas o país tem razões, nesse caso como em outros que se comprovem, de se envergonhar com determinadas condutas”. Quanto às decisões, deixava-as para os tribunais, mas o posicionamento político estava lançado. “Quem é responsável político e tem responsabilidades políticas qualificadas, ao adotar determinadas condutas, tem responsabilidade agravada e isso não deve ser descurado em nenhum momento, nem no da análise nem no das conclusões”, acrescentou logo nessa noite.

“Não houve uma reação organizada, mas foi um clique“, diz ao Observador outro deputado socialista quando justifica a mudança do discurso do PS a partir daqui. Quando o assunto voltou a estar em cima da mesa — e não mais parou de aí estar — foram mais de 40 horas de declarações quase sucessivas, todas no mesmo sentido, que acabaram com a do líder do PS e primeiro-ministro. Repetiram-se palavras como “vergonha”, “envergonhado”, “perplexo” e “inadmissível”, fosse a pergunta sobre Pinho ou incluísse também José Sócrates. Sempre com o condicional “a confirmar-se”.

A defesa socialista fez-se notar a partir de terça-feira, dia 1 de maio, com Fernando Medina a começar por condenar o silêncio de Manuel Pinho — havia de ser seguido nas horas seguintes por outros socialistas noutros locais. Mas se no início só se falava de Pinho, rapidamente o caso passou a casos de corrupção a envolverem outros governantes socialistas. Ou em duas palavras: José Sócrates.

Olhámos para as últimas horas e reunimos aqui as declarações mais importantes, onde é possível ver como se foram alinhando palavras e posições nos principais dirigentes do PS. Começou na condenação do silêncio de Pinho, passou ao ataque ao PSD que também tem casos na justiça, deu uma volta na admissão da “vergonha” se os factos se confirmarem (tanto no caso de Pinho como no de Sócrates), passou ainda pela garantia de que os políticos não são todos iguais. E só parou (por agora) noutro fuso horário, com António Costa a falar no Canadá.

1 de maio, 22h10. Na TVI 24, Fernando Medina dizia que “Manuel Pinho já devia ter respondido à pergunta sobre se ‘é verdade ou não'” que recebia dinheiro do BES.  E considerava a situação “muito prejudicialpara a imagem dos políticos e da vida pública”: “A suspeita de que alguém no governo, com responsabilidades de ministro, foi pago por uma empresa privada é insustentável. É insustentável que ainda não tenha sido esclarecido e ainda é mais insustentável que se venha a provar que tenha acontecido”. Mas aqui a reação era apenas sobre Pinho.

2 de maio, 12h00. O mesmo Medina repetia, na Renascença, que“este silêncio e a forma como [Pinho] está a remeter explicações para depois do processo é perniciosa do ponto de vista político”. O presidente da Câmara de Lisboa evitou, no entanto, contágios ao PS, falando já em mais do que este caso concreto: “O que não aceito é a extrapolação política genérica sobre casos de corrupção”. Ainda assim, acrescentou que “devemos ser implacáveis do ponto de vista ético com quem está em altas funções públicas”: “O Ministério Público e as instâncias judiciais devem ser implacáveis na aferição da legalidade dos actos. Deve ser tão ou mais rigorosa quanto mais elevado o cargo de quem está na vida pública”. Com Paulo Rangel, nesse frente-a-frente na Renascença, a ligar os casos ao PS, o socialista ainda acrescentou que nos últimos anos houve  pessoas indiciadas e acusadas de todos os partidos políticos: “Não me passava pela cabeça vir acusar o PSD e extrapolar para os outros membros do partido ou até colegas de governo”. Não havia de ser o único a usar o mesmo argumento neste dia.

Fernando Medina: “O Ministério Público e as instâncias judiciais devem ser implacáveis”

13 horas. No programa da TSF “Almoços grátis”, Carlos César dava conta do incómodo dos socialistas face ao casos de corrupção que afetam o partido. “Ficamos entristecidos. Ficamos até enraivecidos com pessoas que se aproveitam dos partidos políticos, e designadamente do nosso, [para ter] comportamentos desta dimensão e desta natureza. Ficamos revoltados com tudo isto”. Falava do caso Pinho, mas quando foi questionado concretamente sobre Sócrates assumiu: “A vergonha até é maior porque era primeiro-ministro”. O flanco estava aberto.

18h30. Na ilha Terceira, Carlos César voltou a ser confrontado com as declarações que tinha feito à TSF e que estavam já a marcar a atualidade política, pela referência clara a Sócrates. Não retirou o que disse à hora de almoço, mas acrescentou um aviso para o PSD. “O PS sente-se assim como os outros partidos se sentiram quando tiveram inúmeros casos ao longo destas décadas de democracia”. Os casos, assegura, são “transversais e mais frequentes nos partidos que exercem funções de poder e de Governo”: “É natural que tenham acontecido alguns casos com o PS , como também foram frequentes casos em que a responsabilidade era atribuída ao PSD”. E dizia ainda que os casos que surgem “constituem uma minoria”. “Era muito importante que os portugueses soubessem que os seus políticos são pessoas sérias”, argumentou.

Carlos César: “A vergonha até é maior porque era primeiro-ministro”

21h20. Na TVI24, a secretária-geral Adjunta do PS, Ana Catarina Mendes, era questionada por Luís Montenegro, do PSD, e admitia o desconforto com o “silêncio ensurdecedor de Manuel Pinho às acusações conhecidas”. E considerava que o ex-ministro de um Governo PS devia “responder já”. Também falou no “momento político com que estamos a ser confrontados”, para dizer que, “a ser verdade, é lamentável e envergonha-nos a todos”. Voltava às origens — “a justiça julgará o que tiver para julgar” –, mas logo a seguir regressava a Pinho para dizer que o ex-ministro “deve uma explicação ao país”.

21h30. Quase em simultâneo, o socialista João Galamba estava na SIC-Notícias, frente a Duarte Marques, do PSD, e o tema dos primeiros minutos de debate já foi além do caso Pinho e centrou-se sobretudo em José Sócrates. Tendo ascendido no partido no tempo do ex-líder socialista, Galamba foi confrontado com a frase de César da hora de almoço e admitiu que “obviamente é algo que envergonha qualquer socialista, sobretudo se as matérias de que é acusado se vierem a confirmar”. O deputado do PS defendeu que “estes casos se resolvem antes de mais na justiça”, mas voltava a admitir: “Agora, se me perguntam se fico satisfeito por um ex-secretário-geral do PS, que foi antigo primeiro-ministro, estar formalmente acusado, obviamente que não”. Também falou de Pinho, para dizer que os socialistas estão “sobretudo perplexos com a revelação pública de que houve um ministro de um governo socialista que recebia mensalmente verbas, quando disse publicamente que tinha cessado toda e qualquer ligação com o BES. (…) É um caso verdadeiramente insólito se for verdadeiro”.

22h40. Também na SIC-Notícias, Augusto Santos Silva era entrevistado e confrontado com o caso Pinho, dizendo que “as suspeitas são sobre comportamentos que, a terem existido, significam crimes gravíssimos”. Dizia também ouvir as notícias sobre o homem com quem se sentou na mesma mesa do Conselho de Ministros com “enorme perplexidade”, mas admitindo ter “prezado” o desempenho de Pinho na Economia. Depois acrescentava, de forma mais genérica, que “se se verificar que algum dos meus colegas cometeu um crime no exercício de funções sentir-me-ei enganado. E, mais importante que isso, sentiria que a confiança que as pessoas depositaram em fulano, beltrano e sicrano tinha sido traída”. Apesar de, sobre Sócrates, elogiar depois a “a forma exemplar” como reagiu “ao desenvolvimento do processo dizendo que era uma questão de justiça e não de política”.

23h05. O secretário de Estado da Energia, Jorge Seguro Sanches, arrancava a sua entrevista no Negócios da Semana, na SIC Notícias, logo com uma condenação: “A confirmar-se, são situações absolutamente inaceitáveis. O que esperamos é que haja esclarecimentos sobre estas questões que, a serem verdade, são absolutamente inaceitáveis”.

António Costa: “Se essas ilegalidades se vierem a confirmar, serão certamente uma desonra para a nossa democracia”

3 de maio, 18h00. António Costa era o socialista que faltava ouvir e falou a partir do Canadá, onde está numa visita oficial. Ao lado do primeiro-ministro Justin Trudeau, foi confrontado com os casos judiciais que envolvem o antigo ministro Manuel Pinho e o antigo líder socialista e disse muito mais do que naquele SMS de novembro de 2014. Quando Sócrates foi detido, Costa dirigiu-se aos socialistas nos seguintes termos: “Caras e caros camaradas, estamos todos por certo chocados com a notícia da detenção de José Sócrates. Os sentimentos de solidariedade e amizade pessoais não devem confundir a ação política do PS, que é essencial preservar, envolvendo o partido na apreciação de um processo que, como é próprio de um Estado de Direito, só à justiça cabe conduzir com plena independência, que respeitamos”. Agora, perante este mesmo caso (com acusação deduzida em outubro passado) e um novo (o de Pinho), António Costa mantém que “é preciso não confundir as questões no domínio da justiça com a política”. Mas já lhe acrescenta um decisivo “se”: “Se essas ilegalidades se vierem a confirmar, serão certamente uma desonra para a nossa democracia”.

Artigo atualizado à 1h20 com a informação sobre a saída de José Sócrates do PS na sequência das críticas de destacados dirigentes socialistas