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sexta-feira, 8 de junho de 2018

Ladrões de Bicicletas


Efabulação económica

Posted: 07 Jun 2018 02:04 PM PDT

Mário Centeno e Miguel Castro Coelho escreveram um artigo no Voxeu, o sítio de divulgação da economia convencional europeia, a louvar o seu trabalho na “viragem” da economia portuguesa. Algumas notas rápidas:
1. Atribuir a recuperação económica aos inegáveis avanços de décadas na educação em Portugal é só uma manifestação de fé. Como o próprio Centeno e Coelho afirmam, esses avanços vêm de trás e precedem a longa estagnação da economia portuguesa a partir de 2001. Se os avanços na educação são condição para uma economia diversificada e desenvolvida, eles não são suficientes, como o caso português bem mostra. Não basta investir do lado da oferta. A procura de qualificações e as políticas públicas que as promovam (por exemplo, através de uma política industrial e cambial) são o outro lado da moeda que tem faltado em Portugal. Nesta recente recuperação da economia, alimentada pelo turismo e imobiliário, com desinvestimento nos serviços públicos (onde a necessidade de qualificações se concentra), dificilmente se pode atribuir uma relação causal entre progresso educativo e crescimento económico.

2. O aumento da capacidade exportadora da economia portuguesa é celebrado, mas a palavra turismo não aparece uma única vez. Não é difícil perceber a razão por detrás. Dar relevância a este sector mina o argumento de que estamos num processo de reestruturação económica, em convergência com os países mais ricos, graças às “reformas estruturais” entretanto empreendidas.
3. Nem uma palavra crítica é dedicada à reforma laboral do anterior governo. Pelo contrário, as sucessivas reformas laborais e a "flexibilidade" gerada são, mais uma vez, celebradas: temos fluxos de trabalhadores entre emprego e desemprego parecidos com os dos EUA. Urra!? A experiência de oscilar entre os dois estados deve ser formidável para os trabalhadores... Nada que surpreenda vindo de quem sempre defendeu o recuo dos direitos do trabalho. Talvez fique mais claro a relutância deste governo em reverter uma reforma antes criticada pelo Partido Socialista.
4. Os dados do investimento usados no artigo são bem estranhos. O aumento de 9% em 2017 é sublinhado, mas não nos dizem qual é a base. Pelo contrário, oferecem-nos um gráfico com o rácio entre investimento (privado) e valor bruto acrescentado. Como o segundo também caiu, parece que estamos em linha com a restante UE. Portugal é um dos países europeus com mais baixo investimento na Europa e o país com mais baixo investimento público em percentagem do PIB.
5. Este artigo parece (mais) uma provocação aos partidos que suportam o governo.

Nuestros hermanos

Posted: 08 Jun 2018 01:32 AM PDT


¿Cómo nos vamos a extrañar de que cuando planificadamente se está deconstruyendo a los Estados europeos realmente existentes, renazcan o se revitalicen nacionalismos nuevos o viejos? ¿Cómo no entender que cuando la democracia como autogobierno de la ciudadanía pierde peso e influencia ante poderes económicos oligárquicos, o no democráticos como las instituciones europeas, renazcan demandas de soberanía, de identidad, de protección? ¿Cómo no comprender la desafección ante instituciones y partidos políticos tradicionales cuando se han ido rompiendo las reglas de un pacto implícito que ligaba capitalismo regulado con democracia política y derechos sociales? (…) Los que empleamos el término populista o populismo de izquierdas lo hacemos conscientemente. Usar la provocación como un puñetazo encima de la mesa para desvelar una realidad que se quiere negar con la descalificación de populista. Formenti lo dice claramente: el populismo es la forma de la lucha de clases hoy, aquí y ahora. Dicha la provocación y cargada de sentido, empezamos a discutir en serio de los problemas de nuestra sociedad desde el punto de vista de las clases trabajadoras.
Excertos do prefácio de Manuel Monereo, um deputado e ideólogo do Unidos Podemos (a renovada coligação eleitoral entre o Podemos, a Esquerda Unida e outras formações), à edição em castelhano do livro do italiano Carlo Formenti La variante populista – Lucha de clases en el neoliberalismo. Por uma vez, não sigo a regra do blogue e deixo a citação numa língua estrangeira que creio ser acessível a todos. Quando tiver acabado de ler, talvez teça por aqui ou por ali algumas considerações sobre o livro propriamente dito.
Entretanto, devo dizer que sou céptico em relação à ideia da portabilidade das soluções políticas, dado que estas nascem necessariamente de situações nacionais, ou plurinacionais no caso da Espanha, concretas e variadas, mas creio que as esquerdas que não desistem deste lado podem aprender alguma coisa com o Unidos Podemos, tal como esta aliança pode aprender alguma coisa com a limitada solução governativa deste lado da fronteira.
O que é que se pode então aprender? Deste lado, a colocar o desafio da unidade das esquerdas que não desistem de mudar a relação de forças face a uma social-democracia que, apesar de algumas aparências, continua sendo esvaziada pelo euro-liberalismo e face uma comunicação social que não desiste de acentuar o narcisismo das pequenas diferenças. Do outro lado, a possibilidade de encontrar articulações que pelo menos travem ou desacelerem a marcha do comboio rumo ao abismo, sem desistir de mudar a direcção, sabendo não só que o governo do PSOE é de pura aposta eleitoral, mas também que a viragem à esquerda é manifestamente exagerada: cá como lá, quem ocupa as pastas económico-financeiras manda; cá como lá, o consenso de Bruexlas-Frankfurt manda. Generalidades, portanto.
Buena suerte, hermanos.

Coisas que doem*

Quinta Emenda

Tenho o direito de ficar calado. Mas não fico!

Eduardo Louro

  • 08.06.18

Resultado de imagem para emigração portuguesa

Foi conhecido por estes dias o mais recente Relatório de Envelhecimento da Comissão Europeia, que é publicado de três em três anos, segundo o qual Portugal será dos países europeus com maior redução de população nos próximos 50 anos, altura em que aqui no rectângulo seremos oito milhões de portugueses, praticamente ¾ da população actual. Pior, isto é, com maiores perdas de população, apenas dois países de leste - Roménia e Bulgária – e a Grécia, essa velha conhecida e companheira de rota das últimas décadas.

Claro, com esta panorâmica, o potencial de crescimento da economia portuguesa será o mais baixo da Europa. Porque, evidentemente, a economia é feita de pessoas, e são as pessoas que fazem a economia. Com menos pessoas, menos economia.

Mas nem é aí, no lado da economia, que está o lado mais dramático da realidade que está à vista de todos. Dramático é mesmo a percepção que, se o rumo não for invertido, no limite, o país tende a desaparecer. Dramática é essa ideia de falência colectiva para que fomos arrastados nas últimas décadas por elites míopes e sem estratégia.

Basta lembrarmo-nos que ainda há dois ou três anos tínhamos um primeiro-ministro que mandava os jovens emigrar, e um país rendido à irresponsável ideia da zona de conforto. Instalou-se na sociedade portuguesa uma espécie de convicção que, insistir em viver em Portugal, era recusar sair da zona de conforto. Que emigrar, sair da famigerada zona de conforto, era sinal de espírito empreendedor, na linha dos portugueses de quinhentos.

Não era. Não é. É a linha dos portugueses de 50 e de 60 que, a salto, fugiam do país para sobreviver.

É também por isso que estas notícias doem mais...

* A minha crónica de hoje na Cister FM

Em plena guerra comercial, Trump chega ao G7 “isolado” e vai sair de lá sozinho

HÁ UMA HORA

A reunião anual do G7 será marcada pela atual tensão entre os EUA e os países aos quais impôs tarifas comerciais. Entre estes conta-se a França e o Canadá, que formam uma frente contra Trump.

Donald Trump vai sair mais cedo da reunião anual do G7 para viajar até Singapura, onde vai decorrer a cimeira com a Coreia do Norte

Zach Gibson / POOL/EPA

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A reunião anual dos países do G7 começa esta sexta-feira no Quebeque, numa altura em que a tensão entre os seus diferentes intervenientes sobe em flecha. Na antecipação desta cimeira, alguns líderes mundiais fizeram saber que vão confrontar o Presidente dos EUA, Donald Trump, com a recente decisão de aumentar tarifas a países europeus e ao Canadá, o anfitrião da reunião do G7.

No final de maio, Donald Trump anunciou que os EUA vão impor uma tarifa a importações de aço e alumínio provenientes do Canadá, México e da União Europeia. No caso do aço, as tarifas são de 25% e no alumínio ficam-se pelos 10%. Uma das justificações referidas por Donald Trump para implementar esta medida foi que a “segurança nacional” dos EUA estaria em causa.

O G7 reúne-se uma vez por ano, sendo composto pelos EUA, França, Reino Unido, Alemanha, Canadá, Itália e Japão. Além disso, também a União Europeia estará representada naquela cimeira.

Numa conferência de imprensa conjunta em Ottawa entre o Presidente francês, Emmanuel Macron, e o primeiro-ministro do Canadá, Justin Trudeau, ficou bem patente que a dinâmica da cimeira que começa esta sexta-feira será de confronto com os EUA. Na sua intervenção, Emmanuel Macron colocou abertamente a possibilidade de os EUA serem colocados de lado, referindo até que Donald Trump parte para esta reunião “isolado”.

“Talvez tanto faça ao Presidente americano que esteja isolado, mas talvez para nós [os restantes seis países do G7] também seja indiferente, porque estes seis representam valores e um mercado económico que tem uma história forte e uma verdadeira força a nível internacional”, disse o Presidente francês. Emmanuel Macron disse ainda que terão de ser tomadas medidas “dentro do quadro internacional” por parte da União Europeia para reagir às novas tarifas aplicadas pelos EUA. “Temos de proteger as nossas indústrias, os nossos trabalhadores, as nossas economias, porque é isso que os nossos povos esperam de nós”, disse.

Mais tarde, Emmanuel Macron colocaria no Twitter a seguinte frase: “É preciso não esquecer que, sem os EUA, os 6 países do G7 representam um mercado maior do que o mercado americano”.

Emmanuel Macron

@EmmanuelMacron

Les 6 pays du G7 sans les États-Unis, c'est un marché plus grand que le marché américain. Il ne faut pas l'oublier. #G7Charlevoix

16:26 - 7 de jun de 2018

Informações e privacidade no Twitter Ads

Na mesma conferência de imprensa, Justin Trudeau reagiu à afirmação de Donald Trump que alegou questões de “segurança nacional” para aumentar as tarifas agora aplicadas ao aço e alumínio. “É risível sugerir que o Canadá, a França ou os europeus possam representar uma ameaça para a segurança nacional dos EUA, porque nós somos os melhores aliados que os EUA têm há muito tempo”, disse o primeiro-ministro do Canadá.

Em reação às afirmações dos dois líderes, Donald Trump acudiu ao Twitter para escrever: “Por favor, digam ao primeiro-ministro Trudeau e ao Presidente Macron que eles estão a cobrar aos EUA tarifas enormes e a criar barreiras não-monetárias. O excedente comercial da União Europeia com os EUA é de 151 mil milhões de dólares [128 mil milhões de euros] e o Canadá mantém os nossos agricultores, e não só, de fora. Aguardo encontrar-me com eles amanhã”.

Donald J. Trump

@realDonaldTrump

Please tell Prime Minister Trudeau and President Macron that they are charging the U.S. massive tariffs and create non-monetary barriers. The EU trade surplus with the U.S. is $151 Billion, and Canada keeps our farmers and others out. Look forward to seeing them tomorrow.

23:04 - 7 de jun de 2018

Informações e privacidade no Twitter Ads

Esta semana, o vice-presidente da Comissão Europeia Maros Sefcovic referiu que a União Europeia vai retaliar com novas tarifas às importações norte-americanas a partir de julho, referindo que será uma “resposta ponderada e proporcional à decisão unilateral e ilegal tomada pelos EUA”. Entre os produtos contemplados por essas novas tarifas, estarão o aço, bens agrícolas, uísque do tipo “bourbon”, manteiga de amendoim, arandos e sumo de laranja.

Do lado do Canadá, tal como por parte do México, houve logo no final de maio a resposta de impor aos EUA as mesmas tarifas aplicadas por parte de Washington D.C. aos produtos canadianos. Os três países fazem parte do acordo comercial NAFTA, em vigor desde 1994 e amplamente criticado por Donald Trump.

Outro tema quente desta cimeira do G7 deve ser o Acordo Nuclear com o Irão, do qual os EUA se retiraram no início de maio após decisão de Donald Trump. Entre os países do G7, há vários participantes daquele acordo, que desde então têm criticado o gesto dos EUA. Trata-se do Reino Unido, da França e da Alemanha.

Por parte da Alemanha, a chanceler Angela Merkel também já fez declarações onde antecipava uma cimeira difícil, mas sem entrar em pormenores ou em explicações mais alongadas, ao contrário dos seus homólogos francês e canadiano. “Toda a gente sabe que se esperam discussões difíceis”, disse no Parlamento Europeu esta quarta-feira. E no dia anterior, no parlamento alemão, disse: “É visível que temos aqui sérios problemas com acordos multilaterais, por isso vamos ter discussões contenciosas”.

Theresa May modera o tom contra Trump, mas não consegue reunião com ele

Quem teve ainda mais reservas foi a primeira-ministra do Reino Unido, Theresa May. Com a saída da União Europeia agendada para março de 2019, a líder britânica tem procurado manter boas relações com o seu homólogo norte-americano na esperança de ali garantir trocas comerciais que possam compensar uma eventual queda com o restante mercado europeu pós-Brexit. Theresa May referiu-se ao G7 de 2017, o primeiro de Donald Trump, para assegurar a boa-fé do Presidente norte-americano. “Foi importante ter a América sentada à mesa para chegar a acordo connosco. Como consequência, conseguimos chegar a acordo e agir junto de empresas na América”, disse.

Sobre a resposta da União Europeia às tarifas dos EUA, Theresa May não se comprometeu com nenhum dos lados mas falou a favor do “mercado livre”, por oposição ao protecionismo de Donald Trump. “Obviamente, a União Europeia vai responder. Vamos garantir que trabalhamos com outros na União Europeia para assegurar que a resposta é proporcional e dentro das regras a Organização Mundial do Comércio”, disse Theresa May, que depois acrescentou: “Queremos ser grandes defensores do comércio livre em todo o mundo e é isso que vamos continuar a fazer”.

A tentativa de aproximação de Theresa May aos EUA de Donald Trump não valeu, ainda assim, uma reunião privada entre os dois líderes. De acordo com o The Independent, a primeira-ministra pediu uma reunião privada com o Presidente dos EUA — convite que este terá recusado. De acordo com o The Telegraph, que cita um antigo funcionário da Casa Branca que esteve presente em reuniões passadas entre os dois líderes, Donald Trump não apreciará o tom de Theresa May em privado. “Sem ofensa, mas ela é basicamente uma professora da escola. Não me parece que haja alguém que se dê bem com ela”, disse essa fonte.

Apesar de ser o centro de quase todas as atenções deste G7, Donald Trump, que participa pela segunda vez numa cimeira deste género, vai sair antes do final. De acordo com a assessora de imprensa da Casa Branca, o Presidente dos EUA vai sair mais cedo, no sábado às 10h30 locais (15h30 de Lisboa) para se deslocar para Singapura, onde vai decorrer a cimeira entre Donald Trump e Kim Jong-un, da Coreia do Norte.

Desta forma, Donald Trump não estará presente na fotografia de família nem na habitual conferência de imprensa conjunta no final da reunião do G7.

O que Mário Centeno (não) diz sobre os méritos da retoma da economia

07 Junho 2018

Edgar Caetano

Nuno Vinha

Mário Centeno escreveu um artigo num site especializado a contestar a contribuição da troika para a retoma em Portugal. Um resumo do que o ministro das Finanças diz (com anotações sobre o que não diz)

O ministro das Finanças, Mário Centeno, escreveu um artigo de análise a contestar “a visão convencional” de que foi a troika que veio resolver os problemas estruturais da economia portuguesa. No texto, publicado esta quarta-feira no VOX, um portal especializado que disponibiliza análises de alguns dos mais importantes responsáveis e decisores políticos, bem como economistas, Centeno defende que a retoma atual é fruto sobretudo de reformas feitas “nas últimas duas décadas”, “suplementadas” pela receita do atual governo.

No artigo “A reviravolta da economia portuguesa: duas décadas de mudanças estruturais”, Centeno concede que “houve elementos do programa de ajustamento que desempenharam papéis importantes”. Contudo, o ministro das Finanças escolhe vários indicadores económicos para responder aos críticos e minimizar o impacto das medidas da troika na recuperação, argumentando que estas “não foram a causa única da viragem em Portugal”.

Os números apresentados pelo ministro das Finanças, que contou com a ajuda do economista-chefe do Ministério das Finanças, Miguel Castro Coelho, dão suporte à visão que Mário Centeno quer transmitir, mas, em alguns pontos-chave, a inclusão de outros dados de contexto, políticos e económicos, permite tirar conclusões diferentes sobre os méritos da recuperação da economia (que, ainda assim, para alguns, como António Horta Osório, não deveria ser motivo de grande satisfação).

Retoma em 2014 e 2015 revelou-se sol de pouca dura?

Os sinais preliminares de recuperação em 2014 e 2015 acabaram por ser frágeis e de pouca duração.

Estes são os números em questão: Portugal teve taxas de crescimento negativas até ao terceiro trimestre de 2013, voltando aos indicadores positivos no último trimestre esse ano. Em 2014 obtiveram-se taxas de crescimento homólogo, em base trimestral, a oscilar entre os 0,7% e os 1% na altura em que a troika estava a sair de Portugal (maio de 2014). No ano seguinte — 2015 — os três primeiros trimestres tiveram taxas de crescimento ainda maiores — de 1,9% — abrandando depois para 1,6% no último trimestre desse ano. A desaceleração continuaria a verificar-se sobretudo nos primeiros meses de 2016 (1,1% no primeiro trimestre e 0,9%), voltando à região dos 2% a partir de meados de 2016.

Esta evolução leva Mário Centeno a considerar que o abrandamento que se registou a partir da segunda metade de 2015 mostrou que a recuperação que estava a verificar-se até essa altura seria sempre sol de pouca dura, devido às fragilidades que existiam na economia. Ora, o que não merece uma referência no texto é que a segunda metade de 2015 ficou marcada pelas eleições legislativas, em outubro, um acontecimento que, de certo modo, parou o país a partir do momento em que as sondagens apontavam para a dificuldade que quer Passos Coelho quer António Costa teriam em formar um governo maioritário e estável.

O resultado das eleições acabou por ditar um período de grande incerteza em que, pelo país fora, vários investimentos foram congelados à espera de perceber se o país iria mudar de rumo. Os últimos meses foram marcados por avisos duros por parte das agências de rating. E, no início de 2016, o confronto público entre o governo e a Comissão Europeia levaram a agência de rating que era, na altura, decisiva para Portugal — a canadiana DBRS — a avisar que poderia cortar também a sua notação para Portugal para lixo. O que significaria que Portugal deixaria de ter pelo menos um rating positivo que permitisse aceder às compras de dívida pelo Banco Central Europeu e colocaria os bancos em situação ainda mais precária — um novo resgate poderia, provavelmente, seguir-se.

Até que houve entendimento com as autoridades europeias sobre os planos orçamentais, a incerteza que se viveu terá contribuído para o soluço que se viveu na retoma. Isto significa que a economia portuguesa teria continuado a crescer se não tivesse havido mudança de governo ou se o Partido Socialista tivesse obtido uma maioria absoluta com uma agenda claramente europeísta, sem precisar das “posições conjuntas” que assinou com os partidos à esquerda? É impossível responder a essa questão — mas pode salientar-se que a economia espanhola, por exemplo, nunca teve taxas de crescimento abaixo de 3% nesses anos, não sentindo qualquer “soluço” em 2016.

A contradição de Centeno: a política económica das últimas duas décadas

A recuperação firme, sólida, que se está a verificar na economia portuguesa está, com efeito, fundamentada nas reformas estruturais duradouras nas qualificações, investimento, orientação das exportações e no mercado laboral, ao longo das últimas duas décadas. (…) Na sequência da adoção do euro, foram canalizados fluxos abundantes de capitais para projetos relativamente improdutivos do setor não-transacionável. (…) O peso total das exportações no PIB aumentou 16 pontos percentuais, para 43%, entre 2005 e 2017“.

Em dois pontos do texto, Mário Centeno faz uma análise contraditória sobre a política económica das últimas duas décadas, basicamente o período em que a zona euro começou (a primeira década de 2000) e o período da troika (a partir de 2010, em traços gerais).

Uma das mensagens principais do texto é rebater a tese de que a política económica da primeira década de 2000 foi errada e a troika é que veio resolver os problemas que o país tinha com o seu programa de ajustamento económico. Ora, na primeira frase citada, Mário Centeno elogia as “reformas estruturais duradouras” que foram feitas ao longo das últimas duas décadas — incluindo, portanto, também os primeiros 10 anos da moeda única, antes do resgate. O ministro das Finanças fala, designadamente, de dois pontos: o investimento e as exportações.

Mas, depois, o texto faz duas análises negativas — e estruturantes — à política económica desse período, tanto num ponto como no outro. Em primeiro lugar, partilha o diagnóstico frequente que é feito à economia portuguesa de que houve uma aposta demasiado forte nos bens não-transacionáveis (exemplo mais mediático: as auto-estradas) e não houve uma orientação mais clara da política económica e do investimento na produção de bens transacionáveis nos mercados internacionais.

Relacionado com isso está a análise de Mário Centeno sobre as exportações. Se nessa primeira parte do texto o ministro das Finanças elogia as “reformas estruturais duradouras” designadamente no que diz respeito às exportações, feitas “ao longo das últimas duas décadas”, mais tarde o mesmo texto critica o facto de em 2005 as exportações serem pouco mais de 25% do PIB. Em 2017 já eram 43% do PIB.

É certo que as empresas não conquistam clientes internacionais de um dia para o outro, e as reformas demoram alguns anos a surtir efeito, mas não deixa de haver uma contradição entre o elogio de Centeno às políticas para a exportação (também) na primeira década de 2000 e o facto de só a partir de 2009 as exportações terem começado a ter um peso maior na economia (até porque a contribuição de tudo o resto, nomeadamente a procura interna, baixou e a recessão levou a que o denominador — o PIB — também descesse).

O investimento cresce 9% em 2017 (mas comparando com um mau 2016)

A crise teve o seu impacto sobre o investimento, mas existem sinais claros de que este está a recuperar bem. A formação bruta de capital fixo [vulgo, o investimento] aumentou 9% em termos reais em 2017. O investimento empresarial está, novamente, a crescer a um ritmo superior ao da média da União Europeia.

Mário Centeno não dá novidade alguma quando lembra que a crise que levou ao pedido de resgate “teve o seu impacto sobre o investimento”. Este chegou a cair quase 20% no pico da crise, entre finais de 2011 e 2012. Numa análise mais fina, contudo, o discurso de Mário Centeno e do economista-chefe do Ministério das Finanças têm uma fragilidade — que está relacionada com o primeiro ponto sobre a importância do pós-eleições de 2015 e a instabilidade de 2016.

Quando Mário Centeno escreve que o investimento aumentou 9% em 2017 está a omitir que esse é um indicador homólogo e que, portanto, compara com um ano de 2016 em que o desempenho da economia e o investimento foram penalizados por fatores que foram exclusivos de Portugal — designadamente a incerteza em torno da formação de Governo e das políticas que seriam seguidas por uma maioria parlamentar do Partido Socialista apoiada nos partidos à sua esquerda.

Em poucas palavras, quando existe um ano muito difícil a servir de comparável é mais fácil ter uma variação positiva mais expressiva. Não obstante essa observação, Mário Centeno tem razão ao afirmar que o investimento está a subir mais em Portugal do que na média europeia (4,7% contra 3%). Isso fica demonstrado no gráfico abaixo (um gráfico que também mostra como a descida do investimento em 2015 e início de 2016 não foi um reflexo do que se passava no resto da Europa).

[Clique no gráfico para ver a imagem ampliada]

Fonte: Banco de Portugal

Mercado de trabalho mais flexível. Mas por quanto tempo?

Múltiplas reformas visaram uma maior flexibilidade interna das empresas, tais como o ajustamento das horas de trabalho, do subsídio de desemprego, das restrições ao despedimento e a possibilidade de fazer contratos temporários, tornando o mercado laboral mais flexível e adaptável aos choques.

Mário Centeno está correto quando diz que as alterações à lei laboral nos últimos anos visaram uma maior flexibilidade interna nas empresas, referindo especificamente “o ajustamento nas horas de trabalho” e “a possibilidade de fazer contratos temporários”. O que o ministro das Finanças não refere é a última proposta de alteração ao Código Laboral – aprovada na Concertação Social no final de maio, mas fruto de um trabalho anterior do Executivo – que inclui medidas que potencialmente reduzem a flexibilidade, sobretudo a flexibilidade interna das empresas.

Entre as medidas propostas pelo Governo aos parceiros contam-se a eliminação a prazo do banco de horas individual — uma das modalidades de gestão do tempo de trabalho mais usadas pelas micro empresas, as que têm até nove trabalhadores e constituem o grosso do tecido empresarial português.

Para estas empresas, a modalidade do banco de horas individual é convertido em bancos de horas grupais, definidos por convenção coletiva (votação secreta dos trabalhadores, com supervisão da Autoridade para as Condições de Trabalho).

A proposta que saiu da concertação (e que mereceu o “chumbo” da central sindical CGTP) também penaliza as empresas que mais recorrem a contratos a termo, fazendo com que tenham de fazer contribuições adicionais para a Segurança Social. Também se propõe a limitação do prazo de contratação a termo e a eliminação de alguns motivos anteriormente aceites como fundamento para este tipo de contratos (até aqui, por exemplo, em caso de primeiro emprego e de desempregados de longa duração).

Todas estas são medidas que atalham o caminho que Portugal estava a fazer rumo à flexibilidade laboral e salarial elogiada por Centeno no artigo: “O mercado laboral português ostenta níveis de flexibilidade salarial similares a outras economias avançadas”.

A gestão da dívida pública. Poupanças/prudência ou cativações/BCE?

Portugal tem demonstrado uma grande resiliência na forma como se empenhou e perseverou no regresso ao equilíbrio das finanças públicas, através de reformas concebidas para promover uma consolidação orçamental estrutural”.

Mário Centeno escreve, antes da conclusão do texto, que “a crise provocou efeitos nas finanças públicas, que se juntaram aos problemas que se vinham acumulando desde os anos 2000” (mais uma vez, uma consideração que contrasta com os elogios que Centeno faz às políticas que foram promovidas nos anos “pós-euro pré-troika“). Ora, o ministro das Finanças argumenta que a estratégia do “governo atual”  “é apoiada numa gestão rigorosa e prudente das finanças públicas”.

Na argumentação do ministro das Finanças, refere-se que “o Governo tem estado a fazer uma análise aprofundada da despesa para ajudar os ministérios a gerar ganhos de eficiência genuínos e duradouros”. O primeiro aspeto que está ausente desta análise é a importância que as cativações têm tido para a execução orçamental nos últimos anos, o que se pode argumentar ser o tipo mais “genuíno” e “duradouro” de fazer poupanças orçamentais.

O segundo aspeto é a importância do fator “poupança com juros da dívida“, que é, antes de mais, um reflexo direto da política extraordinária de intervenção do Banco Central Europeu (BCE) nos mercados de dívida pública. Ainda recentemente a Unidade Técnica de Apoio Orçamental (UTAO) veio dizer que o esforço orçamental previsto pelo Governo para os últimos três dos quatros anos da atual legislatura (entre 2017 e 2019), deve-se totalmente à redução da despesa com juros. Os técnicos do Parlamento disseram que não está prevista nenhuma medida de consolidação orçamental de caráter permanente de dimensão significativa para os próximos anos.

Entre as brumas da memória


Dica (767)

Posted: 07 Jun 2018 12:11 PM PDT

Italy’s Crisis: Democracy And The Euro (Andrea Lorenzo Capussela)

«So, to state the obvious conclusion, the main roots of Italy’s malaise are domestic. The country may have met the Maastricht criteria for joining the euro but it failed to shift onto a fairer and more efficient equilibrium. Hence her need to see political alternatives better than the present ones arise.

These observations invite one last remark on those confident critiques, rapidly relayed across the web. Italy’s stability hangs on the delicate balance of powerful opposing forces. It can be compared to a china shop with too few customers, whose bankruptcy could ruin the whole neighbourhood. The elephants that entered it last Monday might, upon reflection, have spoken more advisedly.»

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Sporting

Posted: 07 Jun 2018 12:37 PM PDT

Mesmo que não se queira, o Sporting «invade-nos».
Parece que Mário Machado, (ex-líder da Frente Nacional e que está agora numa coisa chamada «Nova Ordem Social»), quer substituir alguém que dá pelo nome de Mustafá. Ainda bem que moro no outro extremo da segunda circular.

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China: quase um Portugal para entrar nas universidades

Posted: 07 Jun 2018 07:19 AM PDT

Mais de 9 milhões de alunos chineses participam do vestibular nacional.

Cerca de 9,75 milhões de estudantes devem participar do exame para se candidatarem às vagas nas universidades. Dentro de poucos anos, serão, pelo menos, dez vezes mais.

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O “bloco central da agonia"

Posted: 07 Jun 2018 03:09 AM PDT

Conjecturas sobre o nosso futuro próximo, com as quais apenas concordo parcialmente, mas que ajudam a pensar.

«1. Parece claro que o PS não sofreu o mesmo destino dos seus congéneres da Europa do Sul. Ao contrário do Pasok grego, do PSOE espanhol, do PSF francês e do centro-esquerda italiano, o PS continua de boa saúde e recomenda-se. As explicações dividem-se entre a tese do “pedro-nunismo” (deve-se à “gerigonça” de António Costa) e de Vital Moreira (foi a direita a aplicar o programa de ajustamento e o PS conseguiu descolar da bancarrota de 2011). Creio que ambos têm razão. Se tomarmos os 20% do PSOE nas últimas sondagens (antes dos acontecimentos da semana passada), podemos sugerir que a diferença entre esses 20% e os 32% das legislativas de 2015 é o “efeito austeridade” (em muito devido à estratégia de António José Seguro, que, muito provavelmente, salvou o PS do declínio e a quem o partido insiste em não agradecer) e dos 32% de 2015 aos cerca de 40% das sondagens atuais temos o “efeito geringonça” (tenho muitas dúvidas que o PS passe dos dois milhões de votos em 2019, se isso são 40% ou menos, depende da abstenção; pode até gerar uma maioria absoluta de mandatos, caso haja um enorme aumento da abstenção acompanhado de uma assinalável dispersão de votos em brancos, nulos e pequenos partidos sem representação parlamentar).

2. António Costa é o hábil estratego do "efeito geringonça”. Se o PS tivesse dado ouvidos a Assis, Sousa Pinto e outros, hoje seria uma muleta da direita e dificilmente estaria agora nos 40%. Muito provavelmente estaria mais perto dos 20% do PSOE. Evidentemente que a solução encontrada permitiu a Costa ser primeiro-ministro. Mas, para além do óbvio interesse pessoal, há um elemento estratégico fundamental. Como disse ao Expresso uns dias depois das eleições de 2015, “só engolido o BE, o PS pode ganhar eleições”. E acrescentava: “Há diversas formas de engolir: ou os 500 mil [votos] voltam para o PS, ou fazem uma coligação, ou este traz o BE para dentro, à semelhança do que o SPD fez na Alemanha com os Verdes.” E foi o que Costa fez.

3. Com a experiência da “geringonça”, e pela sua própria sobrevivência, o PS não pode dispensar o BE. Ou melhor: poder, pode. Mas arrisca-se a que o BE se torne um Syriza ou um Podemos, comendo uma enorme fatia do eleitorado socialista, que, por exemplo, não compra a nova campanha do ADN anticorrupção e da transparência. Uma (muito improvável) maioria absoluta do PS seria um horizonte de crescimento para o BE a prazo. E, sem maioria absoluta, o PS não pode trocar o BE pelo “bloco central dos interesses” sem arriscar uma “pasokização” quase imediata.

4. A relação entre o PS e o BE é agora, pois, absolutamente umbilical. Já a relação com o PCP não é. Primeiro, até ao momento, não há constância de grandes transferências de votos do PS para o PCP (a existirem, foram em sentido contrário, como parece ter sido o caso nas autárquicas). Segundo, o PCP não pode integrar um Governo, sob pena de se diluir e sofrer o destino dos eurocomunistas (não por acaso, o PCP não sofreu o destino dos comunistas espanhóis, franceses e italianos). Logo, a quebra da ligação entre o PS e o PCP é provável e até desejável do ponto de vista de ambos. A transformação do BE num Verdes alemão também facilita um Governo PS/BE sem o temor do PCP, como já vemos na autarquia de Lisboa.

5. Mas, se o PS não pode largar o BE, também não pode largar o PSD e Rui Rio. Porque, quando um cair, cai o outro. O PSOE afundou-se, mas o PP também. No novo sistema partidário espanhol, segundo as sondagens, ambos vão ser partidos secundários (por isso, fogem de eleições). O PSF desapareceu, mas o LR está a ponto de entrar em colapso. Ambos são agora atores muito pouco relevantes num novo sistema dominado pelo partido de Macron, FN e La France Insoumise. Na Itália, o centro-esquerda e o centro-direita estão a minguar para o M5S e Lega Nord, respetivamente. Mesmo na Grécia, onde a implosão do Pasok não contagiou (ainda) a Nova Democracia, temos de recordar dois aspetos cruciais. A reorganização do centro em curso (Kinima Allagis, ao qual se juntou o To Potami e os restos do Pasok) pode prejudicar seriamente a Nova Democracia nas próximas eleições. E a própria Nova Democracia, após crise interna do seu baronato profundamente corrupto, foi buscar Samaras em 2009, um personagem sempre pouco amado no partido e com um percurso muito curioso (fundou o seu próprio partido, Politiki Anixi, onde militou entre 1993 e 2004). Este trouxe consigo uma nova geração que, de alguma forma, refundou o partido.

PUB 6. A solução para esta geometria é complexa. O PS e o PSD não podem amarrar-se um ao outro, porque isso leva ao crescimento dos extremos, deixando o BE à solta (em muito menor medida, o CDS, pois, não acredito que consiga mobilizar abstencionistas). Mas o PS e o PSD dependem um do outro para manter o atual sistema partidário intacto, coisa única na Europa do Sul (quase mesmo em toda a Europa). Resta o “bloco central da agonia”: um PS que finge que governa enquanto faz a espargata entre o PSD e o BE. Veremos se aguenta toda a próxima legislatura assim.»

Nuno Garoupa