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sexta-feira, 20 de julho de 2018

PCP não rejeita “geringonça II”. “A questão decisiva é saber com que força o PCP sairá das eleições”

João Oliveira já não coloca a questão sobre se a atual solução governativa é repetível, mas sim na importância "decisiva" do reforço do peso do PCP num quadro semelhante ao de 2015.


JOÃO SEGURO/OBSERVADOR

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João Oliveira coloca a decisão sobre a repetição da atual solução governativa depois das próximas legislativas nas mãos do PS e na votação que o PCP terá. Numa entrevista ao Público, o líder parlamentar comunista foi questionado sobre o que fará o PCP, num cenário pós-eleitoral semelhante ao de 2015, e a sua resposta foi até aos governos minoritários de Guterres, para dizer que “não foi por falta do PCP” que não se encontraram outras soluções de governação. “Nunca será por falta do PCP que as condições de vida e de trabalho dos portugueses deixam de avançar”, rematou.

Na entrevista, o comunista nunca descarta a hipótese de uma “geringonça II” e “sabendo que as próximas legislativas colocam de facto esse quadro [PS sem maioria e esquerda mais votada] com uma grande clareza, a questão decisiva é que” o PCP saia “dessas eleições com mais força e mais capacidade de influenciar as decisões nacionais“. A questão, para os comunistas — que no último debate quinzenal já questionaram diretamente o líder do PS António Costa sobre o futuro da “geringonça” — não é sobre se pode repetir-se a solução, mas sim o peso que terão nessa solução: “Naturalmente se tivermos mais força se houver uma outra correlação de forças, ainda mais favorável aos trabalhadores com mais força da CDU, nós estaremos em melhores condições de influenciar mais”.

Quanto à maioria que se constituiu em 2015 e que já aprovou três Orçamentos do Estado, João Oliveira diz que o PCP tem estado “mais limitado” na “capacidade” de fazer “avançar as condições de vida e de trabalho dos portugueses”.

Já sobre a negociação maior que ainda falta fazer até ao final da legislatura — o Orçamento do Estado para 2019–, João Oliveira avisa que “o PCP não é pressionável, nem chantangeável”, quando fala nas declarações do primeiro-ministro sobre o eventual chumbo do próximo Orçamento. Numa entrevista em maio ao Diário de Notícias, Costa disse que “o chumbo do Orçamento de 2019 tinha como consequência inevitável a queda do governo”. O comunista queixa-se mesmo que, “tem havido, aqui e ali, a tentativa de colocar a questão do Orçamento num plano mais abstrato do que propriamente preocupado com questões concretas”. E, neste capítulo, diz que ainda estão coisas da posição conjunta assinada com o PCP em 2015 por cumprir: legislação para deficiente e o descongelamento de carreiras.

“O descongelamento de carreiras continua a ser uma matéria que está por resolver“, avança João Oliveira que continua a colocar a questão da contagem de todo o tempo congelado também nas carreiras que têm regras próprias, caso dos professores, militares, ou forças de segurança. Os comunistas não cedem na posição: “O OE2018 fixou o critério de que todo o tempo de serviço prestado tem de ser considerado para efeitos de progressão na carreira. Aquilo que o Governo tem de discutir é o modo e o prazo em que vai pagar a valorização remuneratória que resulta dessa progressão na carreira”. E quanto à justificação de Costa, que disse que “não há dinheiro” para satisfazer esta reivindicação da esquerda, responde que é preciso “saber se é prioritário resolver os problemas do país ou satisfazer Bruxelas em relação às metas do Orçamento”.

Há, no entanto, mais batalhas que os comunistas alinham para a negociação do último Orçamento da legislatura, como um novo aumento das pensões (não se comprometendo ainda com valores), mas também com um novo aumento do salário mínimo nacional que em 2019 João Oliveira diz que “devia ser fixado em 650 euros”.

Uma coisa fica também certa, o PCP não fará depender a aprovação do Orçamento da negociação com o Governo sobre a legislação laboral. “São duas matérias completamente distintas. Nós não misturamos uma coisa com a outra, nem faríamos agora aquilo que nunca aceitámos fazer, utilizar umas coisas como moeda de troca para as outras, aceitar uma má legislação laboral em torno do Orçamento assim ou assado”.

A ocasião faz o ladrão*

Quinta Emenda

Tenho o direito de ficar calado. Mas não fico!

  • Eduardo Louro
  • 20.07.18

Resultado de imagem para solidariedade nacional incêndios

O assunto vinha sendo falado entre dentes, mas agora é já à boca cheia, a ponto de se dizer que até já chegou ao Ministério Público. Refiro-me a esquemas de aproveitamento fraudulento dos fundos para a reconstrução de casas nas zonas atingidas pelos trágicos incêndios de Pedrógão Grande, há pouco mais de um ano.

Já se falou de desvios de fundos disponibilizados pela gigantesca onda de solidariedade nacional, de valores que nunca apareceram, de outros que ficaram retidos nas malhas da burocracia e até dos que acabam consumidos nos meandros da sua própria gestão, quase sempre autofágica.

Agora sabe-se que, depois de 17 de Junho do ano passado, depois dos incêndios, houve gente que alterou a morada fiscal para garantir o acesso aos fundos de reconstrução. Que há casas que nem casas eram, e casas ardidas que nem sequer arderam. Que vale tudo para enganar todos!

Dir-se-ia que é notável como somos capazes de ser tão generosos e, ao mesmo tempo, tão gananciosos. Como somos capazes do melhor e do pior, de tudo e do seu contrário. Como somos capazes de dar e de roubar. Como somos capazes de responder como ninguém à desgraça alheia, mas também, como ninguém, de nos aproveitarmos dela. Dir-se-ia que somos um povo bipolar, do oito e do oitenta, como tantas vezes de nós próprios dizemos.

Mas não. Não é nada disso. Porque não são os mesmos que dão que, depois, vão roubar. Não são os mesmos que correm a acudir que, depois, correm a sacar. Não. Uns dão, outros roubam. Uns acodem na desgraça, outros sacam nos despojos.

Uns e outros são portugueses. É por isso que nem os portugueses são de uma generosidade ímpar, nem os portugueses são uma cambada de aldrabões sempre à coca de enganar tudo e todos. Há uns e outros…

Só que … “a ocasião faz o ladrão”. E em Portugal o que não falta é ocasião!

*A minha crónica de hoje na Cister FM

Entre as brumas da memória

Da série «Grandes Capas»

Posted: 19 Jul 2018 02:11 PM PDT

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19.07.1975 – Mário Soares na Fonte Luminosa

Posted: 19 Jul 2018 09:06 AM PDT

No seguimento do chamado «caso República», depois de muitas peripécias, o jornal saiu para a rua em 10 de Julho de 1975, com o nome de um director nomeado pelo MFA (e não com o de Raul Rego). Os ministros socialistas que faziam parte do IV Governo Provisório (Mário Soares, Salgado Zenha e Almeida Santos) pediram a demissão, e foram seguidos pelos do PSD, o que provocou a queda do Governo e a sua substituição pelo seguinte – o quinto e último presidido por Vasco Gonçalves –, que tomou posse em 8 de Agosto.

Entretanto, no dia 19 de Julho, o PS organizou a famosa manifestação da Fonte Luminosa – marco importante na história daquele Verão quente de 1975.

Foi António Guterres que organizou o comício, no qual discursaram vários dirigentes socialistas, sendo Salgado Zenha o penúltimo e Mário Soares a encerrar, com um discurso violentíssio contra o PCP e o governo de Vasco Gonçalves. Alguns excertos desse discurso (tirados de O Portal da História).

«O dia de hoje foi um dia grave na história do nosso povo. Depois de uma campanha alarmista de boatos sem precedentes, de uma ‘intentona’ artificial, de uma falsa conjura com intenção de enganar o povo; depois disso, organizaram-se barreiras para impedir que o povo dos arredores de Lisboa, deputações do povo de Portugal viesse aqui manifestar-se livremente, em favor da liberdade, da democracia, do socialismo. (...)


É uma cúpula de paranóicos, a direcção do PCP. É uma cúpula de irresponsáveis a dos dirigentes da Intersindical, que não representam o povo português. E as Forças Armadas, dando cobertura a esses irresponsáveis, indo acreditar que havia uma marcha sobre Lisboa, que nunca existiu – que só existiu na cabeça desses paranóicos – constituíram também graves responsabilidades. (...)


Dizemos que a reacção não passará, mas digamos também que a social-reacção não passará. Temos dito, e prova-se na prática da nossa acção política quotidiana, que nós não somos anticomunistas. Quem está a provocar o anticomunismo, como nem Caetano nem Salazar foram capazes de provocar é a cúpula reaccionária do PCP. (...)


A situação portuguesa é de tal maneira grave, o ambiente requer um Governo de salvação nacional e de unidade das forças políticas, que nós dizemos daqui ao Presidente da República e ao Conselho da Revolução que o primeiro-ministro designado para constituir o 5.º Governo Provisório não nos parece ser neste momento um factor de coesão e de unidade nacional. Portanto dizemos-lhes, com a autoridade de sermos um partido maioritário na representação do povo português, que será melhor eles escolherem uma outra individualidade que dê mais garantias de apartidarismo real, para que possa formar um governo de coligação nacional. (...)


O MFA que faça pois atenção, porque a hora é de autocrítica, é de emendar os erros passados. E esse MFA que iniciou esta revolução que foi chamada justamente a mais bela da Europa, uma revolução das flores, esse MFA se escutar a voz do Povo, tem todas as condições para, aliado ao Povo, poder salvar ainda a nossa revolução que está em perigo, porque há aqui e ali manchas de contra-revolucionários que querem polarizar à sua volta o descontentamento provocado pelo sectarismo e pelo fanatismo intolerável dos sociais-reaccionários que são a direcção do PCP». (...)


Este foi um dia de vitória. Tenhamos confiança no futuro, tenhamos confiança no nosso Povo. A revolução está em marcha e não pára.


Venceremos!»

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Nicarágua: desgraçado povo!

Posted: 19 Jul 2018 06:23 AM PDT

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Trump despede-se de 1989

Posted: 19 Jul 2018 03:18 AM PDT

Daniel Oliveira no Expresso diário de 18.07.2018:

«Uma das coisas que me incomoda na forma como tratamos o fenómeno de Donald Trump é a incapacidade de pensarmos para além das nossas irritações. Trump é errático e parece irracional? Sim. Mas, talvez por contágio, acabamos por acompanhar a sua irracionalidade e falta de consistência. É por isso que muita gente ainda atribui a eleição de Trump à estupidez do eleitorado ou às redes sociais. Somos quase tão infantis como Trump quando falamos de Trump.

Quase todos olham para as relações de Trump com a Europa e com a Rússia como se estivéssemos apenas perante idiossincrasias tontas de um lunático a soldo de Putin. Espantam-se por Trump ser mais doce com um regime autoritário do que com as democracias europeias. Poderemos dizer, e eu tenderei a subscrever, que as escolhas de Trump são demasiado arriscadas para os interesses dos Estados Unidos e denunciam, em muitos casos, uma total incapacidade de medir a dose e o tom nas suas declarações públicas. Nisso, a explicação parece-me óbvia: ele só quer saber o que pensa a sua base eleitoral de apoio. Mas isso não quer dizer que não tenha uma estratégia. Resumir tudo a uma traição aos europeus perante um inimigo comum é ignorar que algumas coisas mudaram no mundo.

A primeira é a Europa. Com o fim da Guerra Fria, este continente deixou de ser um espaço de confronto entre dois polos ideológicos. Os EUA partilham alguns interesses com os europeus e outros são contraditórios. A Alemanha tem interesses específicos no Leste europeu que nada dizem aos norte-americanos. Na realidade, apenas são relevantes para a Alemanha e os restantes europeus são obrigados a apoiar quem manda. Ao contrário do que acontecia pelo menos desde a descolonização, em que o Ocidente tinha interesses geralmente comuns, o poder dispersou-se e as alianças passaram a ter geometrias variáveis. Isso é bem evidente na salganhada da Síria. Não podemos passar o tempo a recordar o fim da Guerra Fria e o nascimento de uma nova ordem mundial, passando pela perda de relevância da Europa no mundo, e depois analisar o comportamento de Donald Trump, por mais errático que seja, ignorando essa nova realidade. Mesmo na crítica ao discurso de Trump sobre as contribuições financeiras para a NATO temos um dever de honestidade. Na União Europeia, a Alemanha interessa-se por si e impõe àqueles que a ela querem estar aliados o preço a pagar por isso. Na NATO, os EUA interessam-se por si e impõem aos aliados o preço a pagar por isso. Dantes eram indispensáveis para os EUA e eles pagavam por isso. Hoje somos menos e não querem pagar tanto. Chocados? Só os que contam a história do mundo através de filmes de Hollywood.

A segunda é a Ásia. Apesar da geoestratégia e do poderio militar ainda contar muito no xadrez internacional, o lugar que cada um ocupa no tabuleiro de uma economia totalmente globalizada está hoje muito mais dependente do poder comercial e financeiro do que estava há trinta anos. E a maior preocupação dos EUA é, neste momento, a China e o seu poder económico (com ele virá o resto). Claro que a Rússia conta e a forma como vai interferindo na vida interna dos países diz-nos como pode contar bastante. Mas é neste mundo a três que Trump pensa quando fala com Putin. Estará provavelmente enganado ao pensar que num mundo a três poderá contar com a Rússia, mas não está enganado ao saber que as coisas não se dividem entre um “mundo livre” liderado pelos EUA com uma aliança de ferro com a Europa e um bloco liderado pela Rússia. Esse mundo já não existe. Interessa o comércio, não a velha Guerra Fria. Trump não desfez a ideia de Ocidente, apenas confirmou o enterro do Ocidente enquanto entidade política. Se olharmos para a União Europeia percebemos que a Europa fez o mesmo há algum tempo.

A terceira é a relação entre o capitalismo e a democracia. Havia, pelo menos na aparência, uma relação entre capitalismo e democracia. E não apenas na aparência. As burguesias nacionais eram isso mesmo: nacionais. Os seus interesses eram muitas vezes coincidentes com os interesses das nações. E acabaram por ser, em grande parte das vezes, elementos fundamentais na construção das democracias nacionais. Democracia liberal, Estado-nação e industrialização são parentes com relações muito próximas. Com a globalização e financeirização da economia, as elites económicas estão a perder o seu vínculo nacional e, com isso, o seu vínculo à democracia. Por isso tenho escrito que penso termos entrado na fase pós-democrática do capitalismo. Hoje, os melhores exemplos de eficácia competitiva no capitalismo global vêm de ditaduras como a China. O fascínio que Trump tem por homens de mão pesada não é uma tara sua, corresponde ao arquétipo do líder político atual. A eleição de Trump, impossível há trinta anos, prova isso mesmo. Da normalização do poder dos eurocratas sobre os eleitos à criação, nos acordos de comércio internacional, de instrumentos de mediação que estão acima das leis dos Estados e dos seus tribunais, tudo nos explica que há um divórcio crescente entre a democracia e o capitalismo que segue em linhas paralelas com a perda de poder dos Estados. Para analisar a política norte-americana temos, por isso, de esquecer as velhas divisões ideológicas. Sim, Putin pode ser aliado de Trump, assim como o poderia ser Xi Jinping. A democracia é irrelevante neste jogo porque ela é irrelevante para o futuro do capitalismo financeiro. Na realidade, até é um empecilho.

Podem fazer de Trump um pateta porque ele é um pateta. Mas quando um pateta chega ao poder é sempre mais do que isso. Não sei se Trump é o começo de uma era, tenho a certeza de que encerra definitivamente o mundo de 1989. Os que se chocam com a forma como trata os velhos aliados e os velhos inimigos é porque ainda estão nesse tempo que acabou. Outros que sucedam Trump farão, com outra elegância e mantendo a patine do passado, o mesmo.»

O Japão aqui tão perto

Novo artigo em Aventar


por Ana Moreno

Já está: A UE e o Japão assinaram hoje o JEFTA, o acordo comercial UE/Japão, criando uma zona de comércio livre com mais de 600 milhões de habitantes

Mais uma vez, a voz da sociedade civil ficou de fora; entre os cidadãos, quem ouviu falar deste colosso que sujeita às leis do comércio livre quase todas as áreas da nossa vida???

Eis apenas uns exemplos dos problemazinhos do JEFTA:

a água é considerada uma mercadoria; o princípio europeu da precaução não é mencionado; preconiza uma cooperação regulatória que nos rouba soberania; submete os serviços públicos às leis do mercado (excepto aqueles que cada governo tiver expressamente listado como excepção), limitando severamente a capacidade de governos os criarem, expandirem e regularem e de reverterem liberalizações ou privatizações; restringe ainda mais a capacidade da UE e dos Estados-membros controlarem as importações de alimentos e rações provenientes do Japão, apesar de já existirem casos documentados de importação ilegal de ração geneticamente modificada do Japão...

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quinta-feira, 19 de julho de 2018

O ukase sobre “Os Maias”

  por estatuadesal

(José Rentes de Carvalho, in Expresso Diário, 19/07/2018)

eça

Uma notícia com mais de uma década tornou-se de repente facto aparentemente fresco: “Os Maias” deixaram de ser leitura obrigatória no secundário, escreveu a imprensa esta semana. As redes sociais viram, insurgiram-se e questionaram: como é possível tamanha afronta ao Eça, que indignidade é esta? Mas, na verdade, há mais de uma década que assim é: trata-se de facto verdadeiro em 2018 mas também em 2017 e assim anteriormente. Por isso, há aqui matéria para muitos anos de indignação, motivo que nos leva a J. Rentes de Carvalho: a pedido do Expresso, o escritor explica a falta que uns “Maias” obrigatórios fazem ao país - sobretudo aos mangas-de-alpaca.


O que vem logo ao pensamento ao receber a notícia de que “Os Maias” deixa ser leitura obrigatória no secundário é investigar a árvore genealógica dos néscios que tomaram essa decisão, porque de certeza há entre eles descendentes em linha directa do Conde Abranhos ou daqueles políticos que no fino retrato que Eça de Queirós deles fez se destacavam por terem ”uma grande cabeça” e dormirem durante as sessões parlamentares.

Por má sorte, não é a dormir que estes cavalheiros andam, antes parece que bem acordados levam a sério as suas fantasias, imaginando que a sociedade para ser moderna de verdade deve ser psicadélica, que os jovens cidadãos só encontrarão felicidade e êxito na vida se se mantiverem no rebanho dos semianalfabetos, dóceis e manipuláveis como crianças do infantário.

Na óptica dessas “grandes cabeças” a leitura de “Os Maias” e obras de igual “dificuldade” é uma inútil sobrecarga para a massa cinzenta de uma juventude que, como estímulo intelectual, não precisa mais do que os desafios do Facebook e os êxitos dos influencers no Instagram.

Pobre juventude, infelizes os pais e os educadores que inutilmente se esforçam por lutar contra a poderosa corrente da parvoíce, pois dominante como já é na sociedade, bem se dispensava vê-la também abençoada pelos que governam, e levanta sérias dúvida sobre o desenvolvimento cerebral e as capacidades intelectuais dos mesmos.

Não é porque a Eça de Queirós devo muito e sei o seu valor que me põe de avesso o ukase dos senhores da Educação, mas porque o considero um crime. Qualquer português adulto, em seu juízo e um mínimo de escolaridade, sabe que Eça de Queirós é mais que um nome, uma estátua ou uma placa de rua.

Eça de Queirós Foto D.R.

Eça de Queirós FOTO D.R.

O seu nome ficou, ficará, enquanto dos mangas-de-alpaca que depois do seu falecimento o foram achincalhando, porque o temiam e achavam venenosa a sua ironia, não sabemos o nome de nenhum, nem lhes conhecemos a cara, destino que terão estes de agora, a quem talvez incomode menos a cansaço de ler “Os Maias” do que dar à juventude a perigosa oportunidade de descobrir o terrorista social que escreveu “As Farpas”.

Fossem eles cidadãos conscientes e políticos de verdade interessados no progresso do país, não se entreteriam na busca de “facilidades” e exigências mínimas para o ensino da juventude, seria sua obrigação elevar a craveira, exigir excelência. Todavia o mais certo, porque disso dão mostra, é que eles próprios de Eça de Queirós e do pouco que leram nada aprenderam, nem se deram conta de estarem lá fiel e finamente retratados.

José Rentes de Carvalho é um dos autores de “Os Novos Maias”, o prolongamento da narrativa de “Os Maias” até aos dias da fundação do Expresso, em 1973 – texto publicado na coleção “Eça Agora”, editada em 2013 no âmbito das comemorações dos 40 anos do Expresso

Grande mal é ser a luta inglória, cansativa, de todos os tempos, e resultar sempre como Schiller (1759-1805) nos avisou, de que “Contra a ignorância até os deuses lutam em vão”.

Infelizmente, também não é item que prometa êxito se levado ao Facebook, pelo que a nós, os de boa vontade, cientes do valor da obra do “pobre homem da Póvoa de Varzim”, resta-nos fazer trabalho de missão: convencer os que o ignoram que a obra de Eça de Queirós nos dá um genial retrato do país que éramos, fomos, continuamos a ser, mas onde para mal de todos nós os mangas-de-alpaca só conhecem uma velocidade: a marcha atrás.


(J. Rentes de Carvalho escreve de acordo com a antiga ortografia)