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domingo, 19 de novembro de 2017

Catarina Carvalho, ainda mais uma “especialista” em Educação

Aventar

por António Fernando Nabais

Nos últimos tempos, os “especialistas” em Educação têm andado especialmente activos, preocupados com os alunos e tudo e revoltados com os professores.

Durante anos, não se preocuparam com a criação de mega-agrupamentos, com o aumento do número de alunos por turma, com as constantes alterações legislativas e curriculares, com a falta de professores nas escolas, com a ausência de políticas sociais, com o empobrecimento da formação contínua dos professores, com a terrível falta de funcionários não-docentes, com o empobrecimento da formação inicial de professores graças ao sistema de Bolonha, com o empobrecimento dos estágios pedagógicos, a perda de qualidade das cantinas semiprivatizadas, enfim, com uma série infindável de problemas e medidas que tornam cada vez mais difícil que as escolas possam compensar, o máximo possível, os problemas de crianças causados por problemas sociais e/ou familiares.

O que tem levado os “especialistas” a sair das tocas em que vivem, dispostos a morder tudo o que cheire a professor? A possibilidade de haver um reposicionamento dos professores nos escalões onde deveriam estar, se a progressão não tivesse sido congelada durante quase dez anos. Em suma, os “especialistas” estão furiosos com a recuperação de direitos laborais, o que se compreende, porque é um conceito contrário à religião que praticam. Ler mais deste artigo

Limites de uma relação egoísta


por estatuadesal
(João Ramos de Almeida, in Blog Ladrões de Bicicicletas, 19/11/2017)
<blink>Fonte: Marktest, valor de novembro Eurosondagem (Expresso)</blink>
O PS está com sondagens que não lhe dão, presentemente, uma maioria absoluta. E muito menos no futuro.
Convém lembrar que o PSD ainda não se clarificou, nem Marcelo Rebelo de Sousa está na sua plenitude de ataque a um governo de esquerda, apesar de já ter dado um ar da sua graça na questão dos incêndios que, aliás, marcaram o fim de um governo em apoteose. (Para quem acha que o conhece, leia-se este post).
Tudo isto aponta para que o PS esteja forçado a escolher com quem quer governar em 2019. Nada fazer não é uma opção, porque o tempo não joga a favor do PS.
Mas em que ponto é que está o PS?
O governo socialista e os partidos à esquerda têm mantido a relação graças aos pontos em comuns, mas sem nunca querer resolver as suas divergências, para um acordo estável, coerente de futuro.
A fórmula encontrada - e repetida à exaustão em debates - é a de que "somos diferentes e assumimos as nossas diferenças". Esse comportamento salvou o início, resolveu a urgência, esvaziou a crítica da Direita, permitiu aos partidos à esquerda manter comodamente a sua autonomia de discurso e fez caminho através de negociações diárias e intensas. Mas tem igualmente encontrado os seus limites.
O Partido Socialista manteve o controlo da informação que permite fazer contas dos impactos de políticas, e - com base nisso - tem gerido relacionamentos distintos. Encontrou pontos comuns em cada relacionamento e estimulou cada parceiro a fazer alarde do que conseguiu junto do Governo. Com essa atitude, fez com que cada parceiro elogiasse o Governo do PS e, ao mesmo tempo, se comprometesse igualmente com essa relação conjunta.
Fonte: Marktest
Mas esta atitude é a principal responsável pelo "ciúme" que se gera entre os partidos à esquerda do PS, que não se relacionam oficialmente entre si. A salvaguarda da identidade de cada partido passou a sentir-se em pressão sobre o governo.
Este problema tornou-se mais gritante quando os resultados das eleições autárquicas foram percepcionadas na comunicação social, como sendo uma grande vitória do Bloco de Esquerda - que tem uma política comunicacional mais agressiva, quando na realidade ficou longíssimo dos seus resultados nacionais - e uma derrota do PCP/PEV - mais discreto, quando as sondagens não mostram essa tendência de descida a nível nacional.
Esse ciúme alimentado - e no qual Bloco e PCP se deixam cair diariamente - é, contudo, o cimento de uma solução que o PS gere, sabendo que nenhum dos partidos do acordo o poderá romper, sob pena de politicamente pagar cara a ousadia. Não é por acaso que num artigo recente no Observador, o deputado socialista Paulo Trigo Pereira sustenta que "muito dificilmente a geringonça se repetirá em 2019, mas é bom que cumpra, e bem, esta legislatura."
"Qualquer partido que diretamente, ou por interposta instituição (por exemplo sindicato) criasse uma situação insustentável para a viabilidade governativa, pagaria um preço eleitoral forte por isso. Essa penalização dependeria não da realidade dos factos, mas da perceção que o cidadão mediano teria sobre a responsabilidade dessa eventual crise política. Se o incentivo para a estabilidade política existe, não devem ser subestimados os desafios que se colocarão à governação nesta segunda metade da legislatura."
O que impede então a continuação da experiência à esquerda?
Os "pontos de convergência são claros: "política económica assente no estímulo à procura interna e externa, reforço do combate à pobreza e desigualdades, reforço dos direitos sociais e de medidas de combate a várias discriminações, redução da dívida pública sem privatizações, etc." Mas são igualmente claros os pontos de divergência : "aspetos do mercado laboral, necessidade de reforma do sistema político, necessidade de prosseguir a consolidação orçamental, projeto europeu."
Aliás, num artigo recente, o deputado do Bloco José Soeiro lembrava isso mesmo, estabelecendo uma nova plataforma de entendimento e quase como mostrando o ponto de não retorno:
Estas regras perpetuam o profundo desequilíbrio entre capital e trabalho, reproduzem e acentuam as desigualdades e comprimem os salários. Sem mexermos nestes três aspetos, continuaremos num impasse. Não nos enganemos: este é provavelmente o maior bloqueio do atual Governo e será, crescentemente, o maior problema com a sua base de apoio. 
Para o PCP, o seu posicionamento na questão laboral é igualmente feito - não por causa das eleições autárquicas - mas devido ao limite que sente no posicionamento do PS quando se tornou claro que nada seria feito para inverter a legislação laboral introduzida pela maioria de direita entre 2011 e 2015. O posicionamento do PCP sobre o Orçamento de Estado para 2018 ou até na questão concreta da carreira dos funcionários públicos é o sinal da incapacidade de entendimento com o PS sobre uma área essencial, que lida com a vida de milhões de portugueses, que constitui o elemento fundamental de integração social e de valorização pessoal de cada pessoa e que tem se degradado até durante a retoma económica, reforçando a fatia patronal da distribuição do rendimento.
Claro que à direita, já se prepara a solução. Martelar nas diferenças é sempre produtivo.
Marcelo Rebelo de Sousa vai martelando, com a sua guerra de comemoração regular dos incêndios e de fazer "presidência abertas à la Mário Soares, mas numa base diária. Rui Rio diz e desdiz-se - ainda é cedo - mas defenderá um entendimento com o PS. Na comunicação social, amplia-se as divergências no acordo político. David Dinis,director do Público, critica o Governo por ter cedido aos partidos à esquerda e não ter resolvido a "justa luta" dos funcionários por uma progressão na carreira (o problema não é não haver dinheiro, é uma questão de opção), embora anos atrás, em 2014, parecia muito mais interessado em que nada fosse feito, sob pena da Troica voltar. No Observador, Rui Ramos oblitera da sua memória as más políticas de direita - achando que a economia cresce por uma boa conjuntura externa ou que tudo está mal não porque fruto de políticas de direita seguidas desde a década de 70, mesmo pelo PS, mas apenas por causa dos socialistas - e assusta o povo com a insustentabilidade do funcionalismo. José Miguel Júdice, aquele militante que é várias vezes é citado como tendo actuado nos anos 70 nas organizações terroristas de direita ELP/MDLP, tudo promove para ver se o poder cai no colo da direita.
Ora, a manter-se, tal como está - se não houver uma evolução no relacionamento, se se mantiver a incapacidade de encontrar soluções conjuntas para o país, mais profundas, necessárias e duradouras, estruturadas numa visão articulada do futuro nacional - este acordo terá um fim à vista.
E esse fim apenas pode querer dizer duas coisas, nenhuma delas positiva: Ou um abraço à direita pelo PS ou vitória de uma Direita unida das próximas eleições. E que voltará ainda mais acirrada.
O PS tem, pois, de decidir porque dele será a responsabilidade primeira.



















Longe da Dinamarca

por estatuadesal

(Por Valupi, in Blog Aspirina B, 17/11/2017)

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Em matéria de escândalos, o maior de 2017 (até agora, mas ainda há tempo para superar a marca) na categoria imprensa é o da publicação de excertos de um suposto relatório de um suposto serviço de informação militar pelo Expresso (Ver aqui). Tudo no episódio tresanda a golpada política, uma repetição da “Inventona de Belém” no que ao intento de ataque político e promoção de alarme público diz respeito. Primeiro, não compete a qualquer serviço de informação, militar ou civil, estar a coligir e tratar opiniões estritamente políticas e de natureza subjectiva. Segundo, mesmo que elas sejam inclusas nalgum relatório, serão sempre como apêndice de contexto e sujeitas ao sigilo institucional que justificará a sua recolha. Terceiro, a decisão de fazer chegar a jornalistas um relatório secreto que vai ser explorado sensacionalmente como arma de arremesso contra o ministro da Defesa configura um crime. Se não for crime já com moldura penal aplicável, de certeza que ficaremos a precisar de uma. Porque quem tal fez expôs material relativo à segurança nacional a quem não tinha autorização para o consultar, pode-se até esquecer o uso que depois foi feito do mesmo embora seja uma agravante.

As explicações dadas pelos responsáveis do Expresso ficam como um monumento à desonestidade intelectual, expõem impante aversão ao código deontológico da profissão. Agarraram-se à prova de terem na sua posse 63 páginas escritas por alguém, e que nelas estavam realmente as passagens que resolveram publicar e destacar. Assumiram a postura mental de uma criança de 7 anos que foi apanhada a meter as mãos no bolo de aniversário às escondidas antes da festa e que depois se desculpa repetindo que o bolo estava ali em cima da mesa, pelo que a culpa era de quem o lá tinha deixado. Mas nada quiserem assumir em resultado de todos os serviços de informação militar terem declarado oficialmente não terem produzido essa resma de folhas. Ou seja, perante a resposta estatal ao mais alto nível que colocava esse documento, no máximo, como uma peça cujo âmbito e resultados não tinham sequer entrado nas operações formais dos serviços secretos militares, e ainda menos tinha chegado aos órgãos institucionais servidos pelas secretas, os responsáveis por uma escabrosa e indigna notícia falsa optaram pela absoluta irresponsabilidade.

A coisa tem relação com outra coisa, chamada “Operação Zeus”. O que nela surge gravado na acusação, mas com provas que parecem indiscutíveis, será, por sua vez, o maior escândalo nas Forças Armadas até onde a minha memória alcança. Um escândalo em que os valores pecuniários envolvidos são a parte que menos gravidade tem. É o esquema, a sua extensão e a sua duração que mais importa legal, cívica e, acima de tudo, politicamente. Porque quando se põe como hipótese, nascida de testemunhos, que esse tipo de corrupção possa ocorrer há pelo menos 30 anos, e quando se olha para as patentes dos arguidos, então é perfeitamente legítima a suspeita de estarmos, apesar do choque, apenas a olhar para a ponta do icebergue. Isto também se liga, fundamentalmente, com a nossa imprensa (ou falta dela).

No caso do desaparecimento das armas em Tancos houve logo ao começo um aspecto que sobressaiu, tendo ficado ocultado no fluxo noticioso e opinativo seguinte – o da tensão, e mesmo conflito, entre as judiciárias militar e civil. Essa disfunção, posto que era suposto termos os dois corpos policiais a colaborarem exemplarmente, rebentou num novo escândalo, igualmente de imediato abafado, aquando da recuperação do material na Chamusca; onde a Polícia Judiciária Militar esteve no local durante um tempo indeterminado antes de ter chamado a PJ. Que se está a passar? Por mais jornalistas e jornaleiros que consultemos de nada de nada ficaremos a saber. O caudal noticioso e opinativo produzido tem sido um exercício clássico de baixa política e assassinato de carácter. Nesta autêntica campanha pela demissão de Azeredo Lopes, liderada pelo Expresso e pelo DN, a figura de Marcelo tem sido instrumental. Embora as suas declarações sobre o caso de Tancos sejam, literalmente, de um rigor institucional sem mácula – posto que se limita a dizer que se tem de investigar, e só depois apurar responsabilidades judiciais e políticas – elas são invariavelmente apresentadas como se fossem uma forma de crítica e pressão sobre o ministro da Defesa. Como se competisse ao Governo fazer o trabalho das polícias, é o que a imprensa portuguesa tem vendido desde que se tornou público o desaparecimento do armamento. Marcelo poderia pôr na ordem a comunicação social, mas também aqui está a fazer uma gestão política cuja lógica é similar à dos jornalistas: aproveitar os casos que apareçam para avançar com a sua agenda. Mas qual é a agenda dos jornalistas que fizeram uma jura para abater o Azeredo, antigo par com quem talvez tenham contas a acertar ou a quem não suportam o estilo por ser demasiado independente da pressão mediática para o que estão habituados?

A resposta, qualquer que ela seja, está ligada com esta evidência: nunca ninguém leu no Expresso, no DN, ou viu na SIC, ou ouviu na TSF, ou noutro órgão à escolha, uma reportagem, uma mísera notícia, que permitisse começar a desvendar o que se passa nas Forças Armadas; lá onde a corrupção, como se deixa indiciado pela “Operação Zeus”, criou um verdadeiro Estado militar. Em contrapartida, Azeredo Lopes tem mostrado conseguir enfrentar as pressões castrenses sem vacilar no respeito pelo interesse público e pela Lei, como se viu no caso do Colégio Militar.

Quando vemos jornalistas a aceitar e publicar documentos apócrifos com ataques políticos canalhas, ou quando vemos jornalistas a perverterem declarações numa entrevista para criarem desgaste político e o abate de um governante, a única conclusão é a de que algo cheira a podre. E essa podridão está muito longe da Dinamarca.

sábado, 18 de novembro de 2017

A BELINHA BOA E A BELINHA PÉRFIDA

por estatuadesal

(In Blog O Jumento, 18/11/2017)

isabel_dos_santos

Vale a pena ver a excitação que por aí vai com a perda de influência de Isabel dos Santos. Mas não deixa de ser curioso como se ignora as ligações portuguesas de Isabel dos Santos a personalidades e grupos financeiros que têm beneficiado e ajudado ao enriquecimento acelerado da filha mais velha do até há pouco tempo ditador de Angola.

Basta olhar para as personalidades que servem os interesses financeiros e empresariais de Isabel dos Santos em Portugal, mais os grupos empresariais que por cá estão associados aos investimentos para percebermos que a Belinha é um polvo cujos tentáculos não estão todos à vista.

Um bom exemplo dos sócios locais da filha do ditador angolano é a SONAE, cujos líderes são uma espécie de flores de cheiro em matéria de honestidade empresarial, basta ver a forma como se referem a políticos, governos ou entidades públicas. Ainda há poucos dias, numa tentativa de influenciar as decisões das autoridades o Azevedo Jr veio dizer que o caso da compra da TVI pela Altice era bem mais grave do que o Caso Marquês, caso em que o mesmo Belmirinho se envolveu quando julgou que já não corria riscos. Como é que se compatibilizam estes valores da SONAE para consumo interno com uma aliança empresarial duvidosa?

Se juntarmos os políticos portugueses ligados aos sócios da Belinha em Portugal temos um quase governo com um grande apoio parlamentar e televisivo. Se somarmos, por exemplo, os amigos da SONAE com os do Grupo Amorim temos um movimento bem mais forte do que a Maçonaria ou a Opus Dei, uma coligação capaz de impor ou de derrubar governos.

Portanto, é bom não esquecer que a queda da Belinha em Angola pode ter custos muito elevados para os interesses portugueses, um preço a pagar pela aposta que os empresários portugueses fizeram na corrupção e nos jogos menos transparentes, como se já viu com o setor bancário. Em Angola a Belinha aparece associada a portugueses e talvez mereça a pena voltar a ler o texto do discurso de posse do atual presidente angolano, que ignorou Portugal quando enumerou os países que considera parceiros estratégicos.

Não há duas Belinhas, uma angolana, sinistra, perigosa, corrupta e pérfida e uma Belinha portuguesa, uma empresárias tão exemplar e honesta como os Belmiros, tão dinâmica como o Mira Amaral ou tão humilde no trato como Teixeira dos Santos, para referir dois dirigentes recentes do Banco BIC.

Só há uma Belinha, a Belinha de Luanda é a mesma que a Belinha de Lisboa, os métodos são os mesmos, as relações que estabelece com os meios políticos são as mesmas, o modelo de enriquecimento é o mesmo. Não é porque se enriquece em Angola e se aplica o dinheiro em Portugal que se torna noutra Belinha.

O grande impasse

por estatuadesal

(José Soeiro, in Expresso Diário, 17/11/2017)

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José Soeiro

Esta semana ficamos a saber que Portugal tem mais 7 mil milionários do que no ano passado. Ao mesmo tempo, o crescimento da economia e o crescimento significativo do emprego (mais 170 mil postos de trabalho nos últimos dois anos) não tem sido uma garantia de crescimento dos salários.

Na verdade, a produtividade por trabalhador está a evoluir mais rápido do que os salários. As instituições europeias preveem um crescimento da produtividade de 2,3% em 2018 e 2019, ao passo que o salário médio por empregado não sobe além de 1,7% ou 1,8%. Conclusão: os custos do trabalho estão a ser embaratecidos.

De acordo com a Organização Internacional do Trabalho, Portugal foi nos anos da austeridade um dos países em que a proporção dos salários no rendimento nacional mais diminuiu. Era de 60% do em 2003 e passou para os 52% em 2014. Esta tendência não se tem alterado. A economia está melhor, mas a média dos salários não, porque o novo emprego agora criado tem salários mais baixos que o emprego que foi destruído nos últimos anos. É isso que mostra, também, um estudo do Observatório das Crises e das Alternativas e os dados do INE. O dado em contracorrente é o aumento do salário mínimo, que tem sido superior à inflação e que tem permitido recuperar poder de compra para os trabalhadores mais pobres. Mas, na ausência de poder negocial e de contratação coletiva, o próprio salário mínimo vai-se transformando perversamente numa espécie de “salário-padrão”.

Há quem insista em explicar o fenómeno pelos sectores e categorias em que o emprego é criado, com um peso muito forte de postos de trabalho indiferenciados na área dos serviços. Mas essa explicação, por si só, diz-nos pouco. É o facto de os empregos estarem relacionados com o turismo, ou com a segurança, ou com a operação de instalações e de máquinas, que determina que os salários sejam tão baixos e que aumente, por essa via, a acumulação de riqueza e se reproduzam as desigualdades?

A razão tem de ser encontrada noutro lado. De facto, a política de recuperação de rendimentos, bem como o crescimento de sectores como o turismo, tem permitido criar dezenas de milhares de postos de trabalho. Mas esse emprego, que é criado em resultado de uma orientação económica diferente da do período anterior, continua a ser enquadrado pela legislação laboral feita pelo PSD e pelo CDS, sob as instruções da troika. Essa legislação teve três características principais.

A primeira foi promover a precariedade, nomeadamente facilitando o despedimento e autorizando, por exemplo, que funções permanentes pudessem ser enquadradas com contratos a prazo, no caso de desempregados de longa duração e de jovens à procura do primeiro emprego, o que correspondeu a uma estratégia de compressão dos salários. A segunda foi embaratecer o trabalho aumentando o tempo de trabalho não pago (pela eliminação de três dias de férias ou do descanso compensatório) e reduzindo o preço pago pelo trabalho (por exemplo, diminuindo para metade o valor do trabalho suplementar). A terceira, que já vinha de trás mas que foi extraordinariamente aprofundada, passou por enfraquecer o poder negocial dos trabalhadores, permitindo a caducidade unilateral das convenções coletivas, o que significou, num primeiro momento, uma quebra brutal do número de trabalhadores abrangidos pela contratação coletiva e, num segundo momento, que é o que vivemos, que as novas convenções coletivas são piores que as anteriores.

Estas regras perpetuam o profundo desequilíbrio entre capital e trabalho, reproduzem e acentuam as desigualdades e comprimem os salários. Sem mexermos nestes três aspetos, continuaremos num impasse. Não nos enganemos: este é provavelmente o maior bloqueio do atual Governo e será, crescentemente, o maior problema com a sua base de apoio.