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domingo, 15 de outubro de 2017

Marques Mendes e o enviesamento da Justiça

Estátua de Sal


por estatuadesal

(Por Estátua de Sal, 15/10/2017)

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Alguns dos meus leitores poderão dizer que sou masoquista. Frequento com reverência todos os comentadores de direita que opinam no espaço público, leio amiúde o Observador e até vejo a CMTV, apesar de não simpatizar com nenhum dos personagens que lá debitam opinião. Farto-me de sofrer mas não se pode analisar e antever as tácticas da Direita sem lhes escrutinar os clarins. Assim, hoje não perdi, a homília dominical do Marques Mendes.

Começo pelo fim da peroração. A Catalunha foi à defesa, deixando tudo em aberto, para poder cair, no futuro, para o lado que mais lhe convier – é o truque da pitonisa.

O orçamento. Bem o orçamento é mau porque é “chapa ganha, chapa gasta” – usando uma expressão do “grande economista” Gomes Ferreira, e porque pode vir aí uma crise qualquer, o preço dos ananases sobe, as pessoas comem mais bananas, as cascas vem todas desaguar às praias de Portugal, os turistas fogem todos e temos que chamar a troika de novo. E por isso não se devia aumentar os rendimentos do trabalho nem baixar o IRS, para amealhar e assim se poder limpar as areias da costa assoreada. É claro que estou a ironizar, mas este é o raciocínio da Direita. É claro que, numa economia aberta como a nossa, se houver uma nova crise mundial com a dimensão da de 2007/2008 que afecte as nossas condições de financiamento, estamos sempre tramados, qualquer que seja o nível do déficit e qualquer que seja o orçamento. Essa história do “papão” da crise não passa do wishful thinking, da Direita para chegar de novo ao poder, como sucedeu em 2011. O tal “diabo” de aguilhão em riste de que falava o Passos.

Chegamos assim, ao princípio da intervenção, a parte mais suculenta. Sócrates, claro. O Mendes acha que essa flor de estufa que é a presunção de inocência é só para os tribunais. Para ele, o dito cujo é mais do que culpado. Se não for dado como culpado em tribunal, pelo menos é sacripanta porque veste fatos Armani, ia de férias para sítios requintados, e tudo sempre à pala do amigo a quem “cravava” sem pudor. E portanto, para o Mendes, está visto que é objetivamente, culpado, senão de corrupção, pelo menos de “cravanço”. Acresce que o Mendes já há muito tempo que sabia que o Sócrates era “venal”, já o tinha atacado quando ele, Mendes, era líder do PSD, tendo havido à época um deputado do seu próprio partido que veio em defesa de Sócrates: Duarte Lima.

Logo, para o Mendes, a prova está feita: se Sócrates foi defendido pelo Duarte Lima, sabendo nós o que sabemos do Lima, o Sócrates só pode ser culpado, pelo que o MP produziu uma investigação “sólida” e está de parabéns. E está tanto de parabéns a D. Joana Vidal que Mendes concluiu que com o anterior Procurador-Geral da República, Pinto Monteiro, nunca teria havido investigação.

A afirmação de Marques Mendes é gravíssima. Diz que a Justiça é uma arma de arremesso a soldo de interesses políticos. Marques Mendes deve saber do que fala, e digo eu, deve saber mesmo, em causa própria, daquilo que fala. É que o argumento é reversível.

Durante os últimos anos Marques Mendes foi associado a várias situações de ilegalidade em situações de dúbio contorno que nunca foram investigadas em profundidade, a última das quais é o caso dos Vistos Gold, cujo julgamento está a decorrer a sete chaves, sem que nada se saiba nem transpire para a comunicação social nem mesmo para o sempre bem informado Correio da Manhã. Deixo aqui um elenco de notícias várias que associam o nome de Marques Mendes a situações de pouco clara legalidade. Uma delas é de pasmar. Tive que ir ler a Bola para saber que Miguel Macedo "meteu cunha" a Paulo Núncio no caso dos Vistos Gold! Sobre esta notícia escreveu o Expresso? Não. Deu a SIC, a TVI, a RTP a notícia? Não que eu visse.

Vejamos então a lista das notícias:

Marques Mendes apanhado em negócio ilegal de ações

MigueMacedo foi sócio da dona da Golden Vista

Amigos incriminam Macedo e Marques Mendes sabia dos favorecimentos dos Vistos Gold

Marques Mendes apanhado a pedir favores em escutas relacionadas com o caso Vistos Gold

«NÚNCIO CONFIRMA CUNHA DE MINISTRO MIGUEL MACEDO» - CORREIO DA MANHÃ

Logo, a minha conclusão é só uma. O argumento que Marques Mendes usou para atacar Pinto Monteiro é reversível: se a Procuradora-Geral da República não fosse Joana Marques Miguel será que Marques Mendes estaria tão tranquilo e tão leve de sorriso a falar sobre o caso de Sócrates? Será que as situações, que acima elenquei, não teriam tido outro tipo de investigação, levando a conclusões que o levariam a perder a sua prosápia de justiceiro dominical? É a pergunta final que aqui queria deixar.

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Semanada

Estátua de Sal


por estatuadesal

(In Blog O Jumento, 15/10/2017)

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O país festejou a acusação a Sócrates, uns porque tiveram matéria para o pendurar mais uma vez, outros porque começavam a ter dúvidas da competência do MP. Mas há os que deverão estar tristes; acabaram-se os segredos da vida pessoal de um ex-primeiro-ministro, resta-nos a esperança de que sejam abertos mais processos.

Há uns anos atrás soube-se de pintinhas em pirilaus, agora das férias, namoradas e ex-esposas de Sócrates, mas há muito por saber. Pagava para que o Marques Mendes tivesse um processo para que o CM nos contasse como é que ele dá uma em pé. Delirava ver o Sol, até mesmo o seu diretor a escrever um livro sobre as se Assunção Cristas compra na Intimissimi ou se ainda recorre ao enxoval do casamento e usa lingerie com rendas de bilros.

A propósito do OE para 2017 Marcelo Rebelo de Sousa manifestou-se preocupado com o eleitoralismo em 2019, o que nos leva a questionar se na próxima comunicação na noite de Natal vai falar das prendas no sapatinho deste ano ou das desgraças de 2019. Talvez Marcelo Rebelo de Sousa não tenha reparado, mas todos os orçamentos são eleitoralistas, se os governos forem honestos e a realidade o permitir, cumprem o que previram nos programas eleitorais adotando medidas orçamentais ao longo da legislatura. Se a Geringonça concluir em 2019 as medidas previstas no acordo e no programa eleitoral do PS faz o que prometeu aos eleitores. Aliás, a Geringonça não estará apenas a cumprir as suas promessas: muito do que Marcelo designa por eleitoralismo estava previsto no programa do PAF para 2019!

A propósito do incêndio de Pedrógão Grande Marcelo falou de “responsabilidade funcional”. Embora não tenha explicado o que é essa coisa de responsabilidade funcional, isto é, o que significa ter responsabilidade porque quem tem funções está vários degraus abaixo na hierarquia, parece que sugere que a ministra seja responsabilizada. Abaixo da ministra há tantos degraus hierárquicos como os que existem entre o comandante supremo das forças armadas e o comandante da base de Tancos. Será que no caso de Tancos também serão assumidas as responsabilidades funcionais?

O país teve dois momentos de grande felicidade nesta semana, dignos de se cantar o hino com grande exaltação nacionalista, desta vez a seleção conseguiu ganhar à Suíça e como se isso não bastasse, até o país tremeu com esse enorme orgasmo nacional que foi o anúncio pelo próprio da candidatura de Pedro Santana Lopes, um homem que todos conhecemos e podemos certificar que não é gay ou coisa parecida. Consta que as fábricas de incubadoras estão a adotar controlos de qualidade mais exigentes enquanto as fábricas de talheres estão a aumentar o stock de facas pois prevê-se um aumento significativo da procura.

O homem e a sua circunstância

Estátua de Sal


por estatuadesal

(Carlos Esperança, in Facebook, 11/10/2017)

cavaco_salazar

Um homem sem passado conhecido, exatamente por não ser conhecido, pôde chegar a primeiro-ministro de um país.

Bastou-lhe parecer sério, manifestar enfado com a política, colocar a família acima de si próprio e Deus acima de tudo. A Revolução de Abril não conseguiu mudar radicalmente o paradigma salazarista. Deus, Pátria e Família colaram-se no subconsciente coletivo e permitiram que o regime democrático, à falta do defunto, elegesse um avatar.

Ao fim de uma década o país fartou-se dele e o homem tratou da vida, mas a amnésia do povo, que esquece o passado, deu-lhe o benefício da dúvida por mais uma década.

Resistiu à intriga, que correu mal, contra o PM, às explicações exigíveis sobre negócios privados, às ligações com vizinhos de um condomínio de luxo e acabou a estrebuchar contra a formação de um governo que a AR exigia e a Constituição lhe impunha.

Este homem pôde ser tudo em democracia, sem nunca a estimar; representar o País, sem o merecer; presidir ao 10 de Junho, sem ler Os Lusíadas; ser o PR dos portugueses, sem saber o plural de cidadão; jurar respeitar e fazer respeitar a Constituição, sem a prezar; e chefiar a República, para lhe apagar a data no calendário dos feriados.

Para cúmulo do opróbrio, num intervalo da defunção política, no rescaldo das eleições autárquicas, cujos resultados o contrariaram, numa manifestação de indigência cívica e no pior e mais degradante exemplo de cidadania, declarou:

“Acontece que não votei nas autárquicas. Estava num casamento".

O ex-PM e ex-PR e a sua inseparável prótese conjugal preferiram a boda e a missa ao cumprimento de um dever cívico e ao exemplo a que eram obrigados.

Ditosa Pátria!

Capas e contracapas

ladroes de bicicletas

Posted: 14 Oct 2017 06:36 AM PDT

A capa do Público de hoje, representando comunistas e bloquistas como ameaça orçamental, é uma vergonha, bem reveladora do processo de observadorização em curso na generalidade das linhas editoriais na comunicação social, ou seja, do domínio do estilo ideológico de um bem financiado blogue de direita. Jamais fariam uma capa destas em torno dos perversos impactos orçamentais do sector bancário, por exemplo. Enfim, as linhas editoriais dominantes são as linhas dos grupos dominantes, não se esqueçam.
Num quadro de perversos constrangimentos europeus, numa correlação de forças desfavorável nas várias escalas, as esquerdas contribuíram, com as suas propostas orçamentais, para um ligeiro aumento do poder de compra das pensões mais baixas, para algum alívio fiscal para a classe média realmente existente, para a continuação do lento processo de recuperação da dignidade salarial e profissional dos funcionários públicos, indispensável para a reconquista de confiança no Estado e nos seus serviços, naturalmente altamente intensivos em trabalho relativamente mais qualificado.
Estas modestas conquistas, ainda que num quadro em que continua a faltar um impulso forte a um investimento público duradouramente deprimido, contribuem para a confiança na procura interna, o que conjuntamente com a procura externa ainda relativamente favorável, ajuda o investimento privado. Lembremos, também contra comentadores-directores televisivos, os que monopolizam o chamado debate público, falando em nome do capitalismo monopolista, que as grandes empresas podem bem suportar neste contexto um eventual aumento da sua contribuição fiscal, que isso não afectará um investimento empresarial que depende sobretudo das expectativas de evolução das vendas (esta gente não respeita a evidência empírica recolhida desde há anos pelo INE, toldados que estão pela mais míope das ideologias).
Obviamente, a situação do país é muito frágil, dada a falta de instrumentos decentes de política e as regras europeias por esta responsáveis, num contexto de endividamento externo persistente e em que crescem os sinais de uma bolha financeira internacional por rebentar. Mas quem tem colocado de forma consequente em cima da mesa estes problemas são os mesmo que lutam orçamentalmente pelos de baixo. Para a sabedoria convencional, essa eventual crise futura seria uma oportunidade, neste contexto estrutural, para o mesmo ajuste de contas de um tempo, o da troika estrangeira, pelo qual anseiam.

QUO VADIS, PEDRO?

Estátua de Sal


por estatuadesal
(José Gabriel, in Facebook, 15/10/2017)
misericordia
Pedro, Pedro, que descuido é este em que vives? Deu-te a Providência - pela mão do outro Pedro e, depois, do António - uma ocupação - um emprego, vá - na qual, além das pingues recompensas, poderias ficar quietinho, de teus anos colhendo doce fruito, fazendo o teu número de "senador" - como diz a malta dos tablóides -, botando inocentes e banais sentenças e vais tu, sem resistir ao apelo do sarilho, mergulhas num jogo em que, permite que to lembre, perdeste sempre. Eu sei, eu sei, viste o Rio e não resistes ao mergulho. Fazes mal. Nota que foste abençoado com um nome que contém em si a tua actual profissão. Santa...são as primeiras sílabas do teu nome. Santa, é a Casa da Misericórdia que governavas - não muito bem, mas enfim...-, como se para tal fosses predestinado.

Pensas agora que te candidatas ao teu partido porque és o desejado. Não percebeste; és desejado, mas no lugar onde estás, onde não te metes em política, coisa para que não tens jeito nenhum mas parece a única que queres fazer.
Foste o único 1º ministro, que me lembre, que, liderando uma maioria parlamentar, conseguiu ser demitido pelo PR - e os efeitos colaterais deste facto ainda hoje se fazem sentir entre o teu povo.
Por um lado, compreendo-te: olhas para o Rio e sentes que, perante aquele deprimente deserto de ideias, aquela pequenez intelectual, a vitória é fácil. Mas é uma vitória de Pirro, por isso sai-te cara - a ti e aos outros. E repara: no trono da Santa Casa e nos diálogos gelatinosos com o Vitorino ainda vais disfarçando e há até quem te leve a sério.
O teu confronto com Rio vai tornar evidente a todos o que já é claro para muitos: não tens grande coisa na cabeça. Será deserto contra deserto. E não é só a ligeireza que te faz declarar a beleza de concertos Chopin que nunca existiram: é a incapacidade de assumir a tua ignorância disfarçando-a, sempre, com a segurança de quem pensa que todos os outros são uns imbecis.
Pedro, Pedro, quo vadis?




sábado, 14 de outubro de 2017

OE/2018: para acabar de vez com essa conversa da austeridade de esquerda

Estátua de Sal


por estatuadesal

(Nicolau Santos, in Expresso Diário, 13/10/2017)

nicolau

A proposta de lei do Orçamento do Estado para 2018 reforça os sinais dos dois anteriores orçamentos: reposição de salários e pensões, bem como dos apoios sociais cortados durante o período 2011-2015; continuação do desagravamento fiscal; mas, ao mesmo tempo, mantém a redução do défice orçamental e aponta para uma significativa diminuição da dívida pública em percentagem do PIB. É muito difícil dizer, depois disto que; 1) não havia alternativa à política da troika e do Governo PSD/CDS; 2) que esta é uma austeridade de esquerda. Este orçamento é expansionista.

O OE/2018 é claramente mais favorável ao trabalho que ao capital; preocupa-se bem mais com os trabalhadores, os reformados, os pensionistas, as famílias, do que com as empresas; vai buscar dinheiro a bens importados (nomeadamente o setor automóvel) e a produtos alimentares que podem ser prejudiciais à saúde; onera o recurso ao crédito para consumo; mantém a taxa de energia sobre Galp, REN e EDP; as contribuições extraordinárias da banca, energia e farmacêuticas mantém-se; aumenta a derrama para empresas com lucros acima dos 35 milhões de euros (medida ainda não confirmada no momento em que escrevo); contempla um aumento extra de seis a dez euros para os pensionistas; continua a repor os valores do Rendimento Social de Inserção, Complemento Solidário para Idosos e o abono de família; desaparece o corte de 10% que se aplicava ao subsídio de desemprego ao fim de seis meses; os cortes no valor das horas extraordinárias dos trabalhadores da administração pública acabam; e as progressões nas carreiras serão totalmente descongeladas em 2018 e 2019.

Ora como é possível fazer tudo isto e mesmo assim apontar para um défice orçamental de 1% em 2018 e uma redução da dívida pública para 123,5% do PIB contra os 126,7% do final deste ano?

O segredo está obviamente num crescimento muito mais forte do que aquele que tinha sido estimado inicialmente pelo Governo e por todas as organizações nacionais e internacionais. E essa é a chave que dá a folga orçamental (da ordem dos mil milhões, a que se juntam a descida dos juros da dívida e os dividendos do Banco de Portugal) para fazer uma política orçamental muito mais justa do ponto de vista social, cumprindo ao mesmo tempo todos os critérios exigidos pela Comissão Europeia e dando sinais claros aos mercados e às agências de rating de que a economia portuguesa está a evoluir no bom sentido.

Foi isto que a receita da troika e do PSD/CDS nunca quis ver: que só com maior crescimento era possível o país sair do buraco em que tinha caído. E quando ao mesmo tempo se deprimia brutalmente a procura interna e a capacidade creditícia da banca que operava no mercado nacional, o resultado só podia ser uma recessão prolongada, que durou três anos e encolheu a riqueza produzida no país em mais de 7%, levando à emigração de meio milhão de pessoas e fazendo disparar a taxa de desemprego até aos 17%.

É claro que a economia portuguesa está, como todas as outras, muito dependente da conjuntura externa e, em particular, do que se passa na União Europeia. As fragilidades são óbvias, não foram superadas de um dia para o outro e um forte abanão externo pode colocar tudo em causa. Percebe-se que este orçamento visa garantir a continuação do apoio parlamentar do BE e PCP à atual solução governativa e que a manta não deve ser esticada ao ponto de, em caso de ventos externos adversos, ser impossível arrepiar caminho e manter o barco equilibrado. Por isso, é necessário não descurar o apoio ao investimento, seja nacional ou estrangeiro, bem como aos milhares de pequenas e médias empresas que constituem o tecido produtivo nacional. Sobre isto, o OE/2018 é razoavelmente omisso. E esse é um flanco que não pode ser descurado. Porque sem investimento, não há emprego nem criação de riqueza para distribuir.

Em qualquer caso, continuar a descer o défice e, pelo segundo ano consecutivo, reduzir a dívida pública é um sinal fundamental que Portugal passa para os mercados e que será inevitavelmente reconhecido pelas agências de rating e pelos investidores. E essa mensagem é decisiva para o futuro do país.