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sábado, 17 de novembro de 2018

PSD a cair, PS a crescer. Costa embalado, Marcelo superstar

  por estatuadesal

(Ângela Silva, in Expresso Diário, 16/11/2018)

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PS continua a subir e o PSD a descer. O BE e o PCP aguentam-se sem oscilações dignas de nota. O partido de Assunção Cristas, que foi de férias em julho com 7,5% das intenções de voto e regressou em setembro com 7,7%, caiu agora para 7%.


Más notícias para a direita, portanto. A soma dos dois partidos nesta faixa do espetro político vale menos oito pontos do que o PS sozinho, já que o PSD voltou a cair e já só consegue reunir 26,8% das intenções de voto. Os socialistas subiram quatro décimas de setembro para novembro e estão com 41,8%, o que confirma uma caminhada lenta mas sustentada rumo à maioria absoluta.

O facto de os seus parceiros à esquerda se aguentarem sem grandes alterações - a CDU sobe uma décima relativamente ao último barómetro, de 6,9% para 7%, e o BE desce três décimas mas fica nos 7,7% - pode não facilitar as contas de António Costa para se bastar a si próprio, mas como o que decide as maiorias absolutas é, antes de mais, a diferença entre o primeiro e o segundo partido, a evolução do PSD, a manter-se, deixa mesmo tudo em aberto para o PS.

PSD A 15 PONTOS DO PS

A popularidade de Rui tem um saldo positivo de 9,8%, mas o partido não resiste ao desgaste dos casos e convulsões internas. Na semana em que o secretário-geral do partido foi apanhado com presenças em sessões parlamentares de onde esteve ausente, o PSD cai de 27,5% para 26,8% das intenções de voto. E fica a 15 pontos do Partido Socialista. Em 2005, quando José Sócrates ganhou a primeira maioria absoluta para o PS, com 45,03% de votos, a diferença para o PSD (que ficou com 28,7%) foi de 16 pontos.

A boa fase do PS de Costa coincide com a aprovação do último Orçamento da legislatura, que fez correr rios de tinta sobre ser ou não eleitoralista, e embora a popularidade do Governo esteja em negativos (-0,3%), a do primeiro-ministro continua a ser avaliada à parte. António Costa surge neste barómetro com um saldo positivo de 34,4%. A léguas dos parceiros da geringonça, já que Jerónimo de Sousa vê a sua popularidade nos 1,6%, acima de Catarina Martins, que não passa de 0,2%. Com melhor popularidade surge Assunção Cristas: a líder do CDS tem um saldo positivo de 3,5%.

O campeão da popularidade continua a ser Marcelo Rebelo de Sousa. O Presidente da República tem um saldo positivo de 64,8%, mais 1,2 pontos do que no anterior barómetro, em setembro. As críticas de que tem sido alvo por parte de alguns sectores da direita que o acusam de continuar a dar um apoio decisivo ao Governo, não parecem beliscar a relação de Marcelo com o eleitorado.


FICHA TÉCNICA

Estudo de Opinião efetuado pela Eurosondagem S.A. para o Expresso e SIC, de 7 a 14 de NOVEMBRO de 2018. Entrevistas telefónicas, realizadas por entrevistadores selecionados e supervisionados. O Universo é a população com 18 anos ou mais, residente em Portugal Continental e habitando em lares com telefone da rede fixa. A amostra foi estratificada por Região (Norte – 20,4%; A.M. do Porto – 14%; Centro – 29,1%; A.M. de Lisboa – 26,5%; Sul – 10%), num total de 1.018 entrevistas validadas. Foram efetuadas 1.188 tentativas de entrevistas e, destas, 170 (14,3%) não aceitaram colaborar Estudo de Opinião. A escolha do lar foi aleatória nas listas telefónicas e o entrevistado, em cada agregado familiar, o elemento que fez anos há menos tempo, e desta forma aleatória resultou, em termos de sexo, (Feminino – 51,9%;0 Masculino – 48,1%) e, no que concerne à faixa etária, (dos 18 aos 30 anos – 16,7%; dos 31 aos 59 – 51,1%; com 60 anos ou mais – 32,2%). O erro máximo da Amostra é de 3,07%, para um grau de probabilidade de 95%. Um exemplar deste Estudo de Opinião está depositado na Entidade Reguladora para a Comunicação Social.

sexta-feira, 16 de novembro de 2018

A poderosa arma da EDP

Novo artigo em Aventar


por Ana Moreno


Cartoon por: Letícia Carmo

O Tratado da Carta da Energia (TCE) é um daqueles bombardeamentos perpetrados por Estados contra os interesses dos cidadãos, para servirem magnanimamente os dos investidores transnacionais; ocorrem tipicamente sem conhecimento da esmagadora maioria dos cidadãos e os seus efeitos tóxicos mantêm-se por muitas e muitas décadas.

O TCE entrou em vigor em 1998; actualmente fazem parte dele cerca de 50 Estados, incluindo Portugal, e continua em expansão. Descreve-o a legislação da UE nos seguintes termos:

O Tratado tem por objectivo estabelecer um quadro jurídico que permita promover a cooperação a longo prazo no domínio da energia, com base nos princípios enunciados na Carta Europeia da Energia. As disposições mais importantes do Tratado referem-se à protecção dos investimentos, ao comércio dos materiais e produtos energéticos, ao trânsito e à resolução dos litígios.“ (...)

E concretizando o que já deixava adivinhar: “Em caso de diferendo entre um investidor e um Estado, o investidor pode decidir submetê-lo a um processo de arbitragem internacional.”

Ora cá está ele, o tristemente famoso ISDS (sigla em inglês de Investor-State Dispute Settlement) que, de tão escandaloso, até pelo Parlamento Europeu foi recusado, assim como por mais de uma centena de juristas académicos internacionalmente reconhecidose por numerosas organizações da sociedade civil europeia.

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QUE FUTURO, ESQUERDAS?

  por estatuadesal

(Joaquim Vassalo Abreu, 15/11/2018)

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Habituei-me durante toda a minha vida, pela educação dos meus Pais, pelos ensinamentos colhidos dos Professores e também pelo ouvido de gente mais velha, que o “óptimo é inimigo do bom”, que “quem tudo quer tudo perde”, mas que só com luta e perseverança se consegue alcançar o que consideramos justo se quem o deveria proporcionar disso não se lembra sem que haja essa luta perseverante…

E, exceptuando o período a seguir ao 25 de Abril de 1974 em que várias coisas de dignidade mínimas foram por decreto estabelecidas, como o Ordenado Mínimo por exemplo, nada mais os Trabalhadores, sejam eles Privados ou Públicos, conseguiram dos sucessivos governos, em tudo o que à dignificação do sagrado valor do Trabalho diga respeito, sem uma luta firme da Classe Trabalhadora, impulsionada pelas suas estruturas Sindicais e, ainda, pelos Partidos que na Assembleia da República maioritariamente os seus interesses representam.

Isto é um dado objectivo e para mim inquestionável e esta constatação advém do facto de o Partido charneira do nosso sistema politica, o PS, que até é composto maioritariamente por gente das Esquerdas, ter tido sempre e sempre uma politica de privilegiar a Direita nos seus acordos Sociais e Parlamentares. E eles diziam sempre que era “em nome da responsabilidade”!

Esta foi sempre a principal razão, a falta de confiança absoluta, que me levou vezes e vezes, praticamente sempre, a votar na CDU e não no PS! Dizia eu, meio a brincar e meio a sério que, assim, nunca me doeriam as mãos…A CDU foi sempre, para mim, um depositário fiável do meu voto…

Mas ansiei sempre e sempre que as coisas se alterassem e que fosse possível haver enfim, já não digo uma união, mas ao menos um acordo das Esquerdas em questões básicas, como finalmente veio a acontecer. Como antecipadamente escrevi (e a memória escrita não deixa mentir…), senti que as condições, depois do tremendo e imperdoável erro histórico do PCP e do BE quando votaram contra o PEC IV e escaqueiraram as portas do poder à Direita, estavam a fortalecer-se e decidi votar COSTA!

E posso afirmar, agora de coração aberto (abstraindo-me, é claro, da minha vida familiar e particular), ter sido este curto período da minha vida (incluindo aquele logo a seguir ao 25 de Abril) em que a minha alma se sentiu mais cheia e me levou, como nunca, a dar Graças à Vida! E a gritar: finalmente!

O meu “feeling” estava correcto e, como escrevi no anterior artigo, Portugal tem vivido um período que, ainda que curto, mas de resultados jamais expectáveis, tem sido um período de afirmação internacional e um período de aumento e confiança e auto estima nele próprio que não me lembro de ver, mas que lhe colocam, a si, ao Governo e às forças que no Parlamento o apoiam, desafios de enorme relevância!

E aqui, embora haja pessoas que, no seu pleno direito à discordância, digam que eu faria bem melhor se estivesse calado,pretendendo certamente dizer que há “vacas sagradas” nas quais não podemos mexer, sob pena de sermos abjurados por essas Esquerdas, eu só posso dizer a essas pessoas e demais que me leiam que eu, depois de quase 500 (quinhentos) textos publicados, em que à saciedade exprimi as minhas opiniões, não é agora que me vou calar… Ainda por cima por opiniões que estão abertas a todos e quaisquer contraditórios…

Se mudei de opinião? Muitas vezes já mudei e “Se na Vida tudo muda, que eu mude não é estranho…” (Julio Numhauser e Mercedes Sosa - TODO CAMBIA)!

E quais são esses desafios? Há um primeiro e essencial que é um certo deslumbramento, principalmente do PS, quanto à situação da Direita, não levando em conta do que ela é capaz, tal como tem sido bem espelhado em recentes eleições, mesmo em países Europeus. Eles são capazes de tudo e eu realço a capacidade de se colarem aos protestos dos Trabalhadores e das suas Organizações Sindicais, fazendo crer que este Governo poderia e deveria ter feito muito mais e só não o fez porque não quis ou não teve competência para tal! Competências que eles já demonstraram ter, certamente…

Depois, eu tenho visto com alguma preocupação este fenómeno de, depois deste Governo ter restituído tudo o que anterior “confiscou”, de ter reposto tudo o que anterior “retirou” e ter, ainda, restabelecido o que, não só o anterior, mas também anteriores alienaram, haver tantas greves e tantas lutas sectoriais e desgastantes, muito embora eu continue e pensar não estarem elas a ser acompanhadas ou apoiadas por uma Sociedade que, em geral, se mostra mais consciente dos resultados conseguidos pelo Governo. Mas…

Isto é, esta Oposição, inoperante, ausente de ideias e propósitos, enleada nas suas próprias idiossincrasias e nas suas contradições, vale-se das posições dos parceiros deste Governo para, através deles e das suas contradições, fazer oposição.

Pois, como entender que Partidos que votaram a favor do Orçamento na Generalidade, anunciem propostas que visam deturpá-lo na sua essência e mesmo desvirtuá-lo? Como entender? E como entender que estes Partidos (PCP e BE) aceitem que o PSD a eles se alie na reprovação de certos items? Como entender?

Como entender também que, em relação a medidas positivas conseguidas (e para isso lá estão), venham de imediato reclamar a sua autoria ou pressão definitiva, não demonstrando qualquer solidariedade com um Governo que no fundo vão suportando, mas no qual não se revêm e, por isso, recusaram e recusam dele fazer parte?

Será que, por exemplo, os Professores, ou melhor os seus representantes, os que se sentam diante do Governo para negociar, pensam mesmo que o Governo não lhes dá o que eles reclamam, sendo que tanto já lhes deu do que roubado lhes foi, porque não lhe apetece ou mesmo não quer? Ou, antes pelo contrário, pretendem mesmo uma outra politica, como em 2011 sucedeu?

Dá às tantas para subentender que, como profissionais que são, pois a maior parte deles outra coisa nunca na vida fez, desejam que tudo volte ao antes para assim poderem exercer o seu múnus, mas um múnus de que, infelizmente, durante os governos da direita muito se esqueceram…

E atenção, muita atenção, aos jornais e televisões pois, embora eu pouco as veja, já notei estarem a potenciar estes, para já, pequenos pormenores, como no “Expresso” vir “escarrapachado” que “os salários cresceram, mas o poder de compra está aos níveis de 2011…”.

Toda a gente percebe ser isto uma inverdade (basta atentar no aumento do consumo) e mesmo um silogismo, mas…que eu estou preocupado? Lá isso estou…

Mas entendo aproximarem-se tempos de decisões e destes Partidos dizerem sem sofismas o que pretendem. Eles têm medo do PS, é óbvio, e desejam que, acima de tudo, que o Povo veja reconhecida a utilidade decisiva do seu “apoio” ao Governo. Mas, também no meu entender, o Povo perguntará: e que vão fazer a seguir? Apoiar ou ser contra? E aqui torna-se tudo mais difícil para eles…

É que, depois, voltará o de sempre, o velho discurso: o de que o PS é um aliado da direita, que quando é governo só faz politicas de direita etc, etc..

Pois é! Mas durante estes três anos quem “obrigou” o PS a fazer politicas de Esquerda? Foram eles ou não? Estiveram dentro estando fora ou estiveram mesmo fora fingindo estar dentro?

Por isso vão ter de o dizer! Ou sim ou não. Ou estão dentro permanecendo fora ou estão mesmo fora não pretendendo fingir que estarão dento. Eu, pelo menos eu, já não dou para esse peditório.

E, como exijo e vou exigir essa clarificação, muito embora não pretenda uma maioria absoluta de Costa, não hesitarei em nele votar se tal clarificação não se verificar…

E se esta pressão contranatura se mantiver…Eu não pensarei duas vezes!

Tenho dito e fica escrito!

Debaixo do tapete de Joana Marques Vidal e Cavaco

  por estatuadesal

(Por Valupi, in Aspirina B, 15/11/2018)

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A forma como o final de mandato de Joana Marques Vidal foi politizado ofuscou, por desvio e saturação, a politização com que foi cumprido e a politização que lhe deu origem. No fim e no princípio, inclusive na sua pré-história, encontramos Cavaco. E encontrar Cavaco é olhar para o chefe da decadente direita portuguesa desde 1985 até ao presente.

Em 2007, a direita entra na sua mais profunda crise após o 25 de Novembro. O PS leva dois anos de maioria absoluta com um líder carismático e um projecto de modernização da economia e da sociedade que obtém aplausos quase unânimes e resultados aquém e além fronteiras. Não existe ninguém na direita que sequer chegue aos calcanhares de Sócrates no apelo eleitoral, o que leva à queda do cavaquista Marques Mendes como presidente do PSD e à entrada em cena de Luís Filipe Menezes, uma anedota ambulante. Ao mesmo tempo, no BCP rebenta uma guerra intestina entre Jardim Gonçalves e o seu delfim, Paulo Teixeira Pinto, a qual levaria no ano seguinte à saída de ambos da instituição e a uma radical alteração accionista, entre outras consequências graves no plano judicial. O BCP não se limitava a ser o maior banco privado português, era igualmente um monumento piramidal da supremacia ideológica e financeira do conservadorismo de fachada belicamente católica. A sua desgraça, juntamente com a do BPN e do BPP em 2008 e 2009, deixou a direita oligárquica portuguesa num estado de pânico e horror. A vingança pela perda dos bastiões financeiros e simbólicos queria-se imediata e servida a ferver. Cavaco, até então um Presidente da República que tinha optado por cooperar com o Governo socialista maioritário na intenção de ir conseguindo fazer negócios para os seus, era a única réstia de esperança da estrutura do poder laranja que via crescer uma crise económica mundial inaudita sem ter ninguém nos seus quadros para sequer conseguir beliscar o PS nas eleições de 2009. Neste ambiente de desespero, antes de se conseguir dar um chuto nos cueiros do doutor choramingas e sua ciência de Gaia, até se ensaiou começar a falar num Governo presidencial, com ou sem alteração constitucional respectiva. Um bloqueio dos camionistas, em Junho de 2008, ensaiou um alarme social cuja finalidade era o desgaste abrupto do Governo e a entrada no ano eleitoral num ambiente de ameaça à ordem pública. Foi folclórico, foi obra de uns jarretas, mas foi também a primeira resposta de Cavaco aos pedidos de socorro dos seus amigos, seguindo um manual clássico de desestabilização e guerrilha política.

Com a colocação de Manuela Ferreira Leite na presidência do PSD, em meados de 2008, Belém voltou a controlar a Lapa. Podia dar-se início a uma estratégia concertada que iria ter como bandeira o tema da “verdade” – “Falar verdade aos portugueses”, lema de Cavaco; “Política de Verdade”, lema do PSD – escolhido precisamente para apontar ao carácter e conduta de Sócrates, doravante obsessivamente atacado como “mentiroso”. Não passava da arma mais antiga e mais baixa do catálogo das pulhices políticas, mas que no caso iria introduzir em Portugal uma operação de judicialização da política sem precedentes. O “Freeport” foi recuperado nos finais de 2008 e foi explorado de todas as maneiras e feitios até às eleições legislativas de 2009 sem interrupções. Não sei quantos outros casos, da licenciatura às casas na Guarda, do Magalhães à eventual compra da TVI pela PT, foram lançados para gerar um clima de perseguição ininterrupta e impiedosa. Em Aveiro, iniciou-se uma operação ilegal de espionagem de um primeiro-ministro através de um seu amigo que é metido à força num caso pindérico de um sucateiro. Daqui, parte-se para a tentativa de perverter as eleições de 2009 com a criação de um caso judicial falso. Finalmente, e de modo análogo, lança-se a inventona de que o Governo estaria a espiar Cavaco e leva-se essa suspeita até às eleições de 2009. Nunca tal perseguição se tinha visto na Grei, a direita portuguesa estava a lutar pela sobrevivência com pavor e ódio, raiando o toque a rebate para pegarem em armas. Ao seu lado, comunistas e bloquistas enchiam as ruas e os ecrãs com homéricas declarações de ódio ao Governo e ao PS, de que as manifestações de professores foram o fenómeno sociológica e mediaticamente mais impressionante nessa legislatura. Fechando o cerco, não existia então, como não existe agora, sequer um órgão de comunicação social que defendesse editorialmente, ou que no mínimo fizesse spin a seu favor, o Governo socialista e o PS. Era exacta, precisa e completamente ao contrário.

A Manela perdeu, o PSD foi para eleições internas preparar o brevíssimo ciclo político posto que o Governo minoritário de Sócrates iria cair assim que o Aníbal iniciasse o seu segundo mandato. Até lá, com a pressurosa e entusiasmada colaboração do BE e do PCP, os socialistas iriam ser assados em lume raras vezes brando. Na disputa laranja, o cavaquista Paulo Rangel, dado como favorito, revelou-se não só ingénuo como inepto no páreo com Passos – já então um especialista em “fake news avant la lettre“, como mais tarde Fernando Moreira de Sá viria a explicar numa tese de mestrado de fazer corar as paredes da Assembleia da República. O Pedro foi a escolha estética de um eleitorado social-democrata que sonhava ter o seu Sócrates, visto e sentido como o tipo de líder ideal para a direita. Havia que afastar o bafio do Cavaquistão que Ferreira Leite, Paulo Rangel e Aguiar-Branco exalavam. O Pedro dava muito melhores tempos de antena, tinha um cabelo à beto e uma voz de barítono. Ideias? Qualquer coisa empapada com cuspo servia, era indiferente. Ganhou, mesmo depois de se ter colado a Sócrates quando fazia oposição interna a Ferreira Leite. Acontece que este garboso rapaz era também um ser político sem qualquer escrúpulo, tendo feito a rodagem no complexo de empresas do laranjal e vivendo à pala do tio Ângelo Correia e de um parceiro de altos e baixíssimos voos, Miguel Relvas. Estava prontíssimo para despachar uns milhões de piegas para fora da sua zona de conforto. Cavaco, que teria preferido lidar com um dos seus pretorianos, rapidamente se concertou com Passos em relação ao essencial: afundar o País ao boicotarem o acordo com a Europa que teria evitado o resgate de emergência e ter um comissário político na Procuradoria-Geral da República capaz de, nas imortais palavras do Manuel Carvalho, acabar com os “resquícios de uma Justiça burocrática”.

Acima a pré-história do que em 2012 foi conseguido, a colocação na Procuradoria-Geral da República de alguém que permitisse abusos de poder e crimes já tentados em 2009, mas abortados pela integridade de quem defendeu a Lei. Havendo indícios judicialmente legítimos para meter Sócrates na condição de arguido, e havia, o processo poderia ter seguido dois caminhos, e apenas dois: (i) blindagem absoluta a qualquer forma de ilegalidade e aproveitamento político dada a gravidade histórica e partidária de se suspeitar que um ex-primeiro-ministro pudesse ser acusado de corrupção; (ii) aproveitamento político de uma extraordinária ocasião para atingir o PS e provocar um desequilíbrio partidário a favor do PSD e CDS que durasse algumas legislaturas ou que conseguisse mesmo destruir o Partido Socialista, doravante e para todo o sempre associado à corrupção – de caminho, e como primeira motivação, executar uma das maiores vinganças na História de Portugal. Soubemos meses antes da espectacular detenção de Sócrates para português ver qual dos caminhos iria ser o da PGR. Quando em Julho de 2014, sem ainda existir publicamente a “Operação Marquês” e sem qualquer cidadão ter ainda sido constituído arguido, foi publicado pela Cofina o núcleo central das teses acusatórias dos procuradores que viriam com base nelas a conseguir prender Sócrates – calendário que só se explica pela ocorrência de eleições no PS onde Seguro agitava a bandeira justiceira e persecutória contra os “socráticos corruptos” alegadamente representados por Costa – ficámos todos a saber que Sócrates iria ser usado como arma política pela própria Justiça em conluio criminoso com impérios da comunicação e jornalistas.

Joana Marques Vidal nunca apareceu em público com uma camisola onde se lesse “Sócrates, é desta que vais dentro” ou “Fodi-te bem, Pinóquio”, pelo que o seu método poderá ter passado despercebido a crianças de 9 anos (mas não todas). Ele é, no entanto, estupidamente simples: usar o incomensurável poder do Ministério Público para devassar e coagir cidadãos. Esse poder não precisa de ser usado de forma ilegal para ser uma violação do Estado de direito e das mais básicas noções constitucionais a respeito da democracia e dos direitos individuais. Aliás, nada justifica que se faça uso indevido dessa capacidade para exercer violência em nome do Estado em casos onde não haja nenhum prémio político (ou de outro tipo) que o justifique. Quem fosse por esse caminho acabaria rapidamente, ou fatalmente, denunciado e castigado, expulso pelo sistema. Porém, contudo, todavia, havendo um prémio político colossal em jogo, algo historicamente imperdível e com clientes facticamente poderosíssimos dispostos a apoiar a execução do plano, então algo como a “Operação Marquês” pode avançar sem que os mandantes e executantes se sintam ameaçados seja por quem for.

Joana Marques Vidal notabilizou-se por aparecer em público a desvalorizar, abafar e mesmo ridicularizar as violações do segredo de justiça que foram parte material da estratégia de assassinato de carácter, ataque político e condicionamento judicial. Nunca teve de justificar por que razão foi conivente com a detenção e prisão de Sócrates sem provas para tal, nunca teve de justificar por que razão se fez da “Operação Marquês” um megaprocesso, nunca parou de usar a sua palavra, e especialmente o seu silêncio, para apoiar e exponenciar a fétida e alucinada campanha para a renovação do seu mandato. A sua maior perversidade consistiu em dominar a duplicidade discursiva que lhe permitia manter uma pose institucionalmente imaculada ao mesmo tempo que alimentava as explorações mediáticas dos que usaram o seu nome com hipocrisia e deboche para perseguirem adversários políticos. Assistiu calada e deleitada, de braço dado com Carlos Alexandre, ao lançamento no espaço público de mensagens que apelam ao regresso a um Estado policial como forma de disputa política onde se consegue prender os adversários. A lógica imanente a este contexto foi levada às ultimas consequências e gerou a inacreditável experiência de termos visto um ex-primeiro-ministro e um ex-Presidente da República a acusarem os actuais primeiro-ministro e Presidente da República de serem criminosos por estarem a substituir quem tinha servido tão bem as agendas políticas de um sector do País.

Cavaco e Joana Marques Vidal. Joana Marques Vidal e Cavaco. Pelo que representam, pelo poder que lhes foi dado em nome do Estado, e pelo que fizeram nessas funções onde ficam associados à utilização dos cargos para perverter a democracia, são a manifestação e consubstanciação de outras forças. Eles são a prova de que o regime concede à direita o uso do Estado para exercer violência política, abusos esses nunca sindicados sequer pela imprensa posto que esta, no máximo e excepcionalmente, só consegue ser neutral e pela rama quando se trata de expor a agenda da oligarquia.

Não por acaso, o cavaquismo, essa mistela de propalada santidade à moda de Boliqueime com cinismo rapace e prepotente, foi o herdeiro directo do salazarismo antropológico que o 25 de Abril não varreu – apenas conseguiu meter debaixo do tapete.

Entre as brumas da memória


A TV avaria no Bruno

Posted: 15 Nov 2018 02:04 PM PST

(Daqui.)

Brasil: «absoluta ingovernabilidade»

Posted: 15 Nov 2018 12:15 PM PST

Abriu-se a porteira da absoluta ingovernabilidade no Brasil, diz Paulo Arantes.

É um texto longo de um filósofo marxista, que merece ser liso na íntegra.

«O prisma para se entender o que ocorreu agora é o renascimento da política. Nós não imaginávamos. Quando eu digo nós, eu estou falando, sobretudo, da esquerda. Nós estávamos completamente anestesiados com um tipo de esquerda que se consagrou com a abertura [pós ditadura] em diante, dos anos 1990 em diante, que é uma esquerda que pensa em governo e não se imagina fora do governo. Uma esquerda para governar. Essa é a grande novidade do petismo e, portanto, gestionária.

De tal maneira nós estávamos impregnados por essa ideia que nós, de certa maneira, tínhamos abandonado a ideia clássica de política como conflito social canalizado em torno de algumas grandes expectativas – e nos aferramos à ideia de gestão, governo e administração. E eu acho que estava subentendido que não haveria mais política. No fundo, era isso: a política tinha se resumido na disputa dos fundos públicos e políticas orçamentárias alternativas.»

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Brasil: agora o novo ministro das Relações Exteriores

Posted: 15 Nov 2018 08:45 AM PST

As opiniões polémicas do novo chanceler sobre raça, fake news e 8 temas.
Um simples exemplo, mas há que ler o texto todo:
«Sou Ernesto Araújo. Tenho 28 anos de serviço público e sou também escritor. Quero ajudar o Brasil e o mundo a se libertarem da ideologia globalista. Globalismo é a globalização econômica que passou a ser pilotada pelo marxismo cultural. Essencialmente é um sistema anti-humano e anti-cristão. A fé em Cristo significa, hoje, lutar contra o globalismo, cujo objetivo último é romper a conexão entre Deus e o homem, tornado o homem escravo e Deus irrelevante. O projeto metapolítico significa, essencialmente, abrir-se para a presença de Deus na política e na história.»
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O PS nunca desilude

Posted: 15 Nov 2018 11:12 AM PST

Igual a si próprio há 45 anos. E a ministra da Cultura? Que se lixe, engula sapos.

PS contra Governo: deputados propõem IVA das touradas a 6%.

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Porque é que a democracia está a vacilar?

Posted: 15 Nov 2018 03:28 AM PST

«Jair Bolsonaro, vencedor das presidenciais do Brasil, é um hiper-nacionalista da extrema-direita, apaixonado por armas e um fraco adepto da comunicação social. O facto de ele não estar desenquadrado no meio dos líderes globais de hoje - incluindo os líderes de algumas das maiores democracias do mundo - deve preocupar-nos a todos. E isso leva-nos à seguinte questão: porque é que a democracia está a vacilar?

Estamos num ponto de viragem histórico. O rápido progresso tecnológico, particularmente o surgimento da tecnologia digital e da inteligência artificial, está a transformar a forma como as nossas economias e sociedades funcionam. Ainda que essas tecnologias tenham trazido benefícios importantes, também levantaram sérios desafios - e deixaram muitos segmentos da população a sentir-se vulneráveis, ansiosos e zangados.

Uma consequência do recente progresso tecnológico tem sido um declínio na proporção relativa dos salários no PIB. Como um número relativamente pequeno de pessoas reivindicou uma fatia crescente do bolo, na forma de rendas e lucros, a crescente desigualdade de riqueza e rendimentos alimentou a frustração generalizada com os arranjos económicos e políticos existentes.

Já lá vai o tempo em que se podia contar com um emprego fixo nas fábricas para pagar as contas indefinidamente. Com as máquinas a assumirem uma parte importante dos empregos na produção industrial, as empresas estão a procurar cada vez mais trabalhadores com elevada qualificação em áreas que vão da ciência às artes. Essa mudança na procura de competências está a alimentar a frustração. Imagine que, depois uma vida inteira de musculação, lhe dizem que as regras mudaram e que a medalha de ouro não será atribuída ao wrestling, mas sim ao xadrez. Isso será enfurecedor e injusto. O problema é que ninguém faz isso deliberadamente; mudanças deste tipo são o resultado da evolução natural da tecnologia. A natureza é muitas vezes injusta. O ónus de corrigir a injustiça está do nosso lado.

Estes desenvolvimentos contribuíram para as crescentes disparidades ao nível da educação e das oportunidades. Há muito que um contexto de maior riqueza aumenta as oportunidades de uma pessoa receber uma educação superior e, assim, conseguir empregos com salários mais altos. À medida que o valor das habilidades mecânicas no mercado de trabalho diminui e a desigualdade de rendimentos aumenta, essa diferença deverá tornar-se cada vez mais pronunciada. A menos que transformemos os sistemas de educação para garantir um acesso mais equitativo à formação de qualidade, a desigualdade tornar-se-á cada vez mais enraizada.

O crescente sentimento de injustiça que acompanha estes desenvolvimentos penalizou a "legitimidade democrática", como Paulo Tucker discute no seu livro Unelected Power. Na nossa economia globalizada profundamente interconectada, as políticas de um país - como barreiras comerciais, taxas de juro ou expansão monetária - podem ter efeitos colaterais de longo alcance. Os mexicanos, por exemplo, não precisam de se preocupar apenas com quem elegem para presidente; também precisam de se preocupar com quem chega ao poder nos Estados Unidos - um resultado sobre o qual não têm voz. Neste sentido, a globalização leva naturalmente à erosão da democracia.

Neste contexto, a actual transformação da política não deveria ser surpreendente. A frustração de grandes segmentos da população criou um terreno fértil para o tribalismo, que políticos como Trump e Bolsonaro exploraram avidamente.

A ciência económica dominante baseia-se na suposição de que os seres humanos são motivados por preferências dadas exogenamente - o que os economistas chamam de "funções de utilidade". Embora os pesos relativos possam diferir, todos os indivíduos querem mais e melhores alimentos, roupas, abrigo, férias e outras experiências.

O que essa interpretação negligencia são os "alvos criados" que surgem à medida que nos movemos pela vida. Não nascemos com um impulso essencial para chutar uma bola para dentro de uma baliza. Mas assim que começamos a jogar futebol, ficamos obcecados com isso. Não o fazemos para obter mais comida ou roupas ou casas. Torna-se uma fonte de alegria em si. É um alvo criado.

Tornar-se um fã de desporto é semelhante. Ninguém é essencialmente um adepto do Real Madrid ou do New England Patriots. Mas, através da família, da geografia ou da experiência, pode-se ficar profundamente ligado a uma determinada equipa desportiva, a ponto de isso se tornar uma espécie de identidade tribal. Um fã é capaz de apoiar os jogadores não pela forma como jogam, mas por causa da equipa que representam.

É esta dinâmica que está a alimentar o tribalismo na política nos dias de hoje. Muitos dos que apoiam Trump ou Bolsonaro não o fazem por causa do que Trump ou Bolsonaro farão, mas sim por causa da sua identidade tribal. Eles criaram alvos relacionados com a pertença à "Equipa Trump" ou à "Equipa Bolsonaro". Isso prejudica a democracia ao dar aos líderes políticos uma licença que eles não tinham antes. Eles podem fazer o que querem sem serem constrangidos pela vontade do povo.

Como é que podemos corrigir esses problemas, proteger os vulneráveis e restaurar a legitimidade democrática? A resposta não é clara. O que é evidente é que continuar na mesma não resolverá os problemas.

A Revolução Industrial - outro importante ponto de inflexão para a humanidade - trouxe enormes mudanças regulatórias e legais, desde as várias Leis das Fábricas no Reino Unido até à implementação do imposto sobre o rendimento em 1842. Também trouxe o nascimento da economia moderna, com grandes avanços por parte de pessoas como Adam Smith, Augustin Cournot e John Stuart Mill.

Mas estamos numa viragem histórica que impõe que repensemos o tema da economia política. O dinossauro não tinha capacidade de auto-análise e caminhou em direcção à extinção há 65 milhões de anos. Nós também corremos o risco de um colapso civilizacional. Mas, felizmente, somos a primeira espécie com capacidade de auto-análise. É aí que reside a esperança de, apesar de todo o tumulto e conflito que vemos à nossa volta, acabarmos por evitar o "risco dos dinossauros" e nos afastarmos da beira do abismo.»

Kaushik Basu

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