Senhora deputada,
Acabo de visualizar o vídeo em que a senhora deputada apela ao voto no seu colega de partido e presidente da autarquia onde que resido, a Trofa, onde afirma conhecer bem o edil há mais de 20 anos, bem como o seu percurso político. Pois bem, uma vez que conhece e que acompanha o percurso deste indivíduo, aproveito a oportunidade para lhe dar a conhecer alguns aspectos da sua governação, que com certeza não serão do seu conhecimento, ou não fosse a senhora membro suplente da comissão parlamentar de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias e da Comissão Eventual para o Reforço da Transparência no Exercício de Funções Públicas. Caso fossem, estou certo que já teria agido.
Começando pela questão do reforço da transparência no exercício de funções públicas, saiba a senhora deputada que, na antecâmara das Autárquicas de 2013, a campanha eleitoral do seu amigo Sérgio Humberto decidiu criar um jornal de propaganda, de seu nome Correio da Trofa, dedicado a promover a sua campanha e a atacar os seus opositores, com recurso a um editorial não assinado, dedicado, não raras vezes, a explorar a vida pessoal da sua opositora. Um detalhe: o seu amigo, tal como a sua entourage, nunca assumiu a paternidade de um jornal que, dias depois da vitória eleitoral, se mudou de armas e bagagens para a até então sede de campanha do PSD/CDS-PP.
Claro que nada de ilegal existe nestes esquemas de propaganda dissimulada. Qualquer partido ou caudilho é livre de aldrabar quem quiser, da maneira que quiser, estando sujeito às eventuais consequências que daí decorram. Mas quando mexe no dinheiro dos nossos impostos, a coisa muda de figura. É que, desde que chegou ao poder, o seu amigo Sérgio Humberto já entregou perto de 100 mil euros – em ajustes directos, claro – a ex-colaboradores e proprietários desse jornal. Por exemplo, aos dois jornalistas que adquiriram o jornal após as eleições, tendo trabalhado arduamente na sua campanha e depois dela, desta feita pagos pela autarquia, o senhor presidente atribuiu mais de 19 mil euros + IVA para que estes cavalheiros organizassem um concurso de fotografia – um flop que resultou na exposição de meia-dúzia de fotografias, sem menção do seu autor, para o qual foi preciso melhorar a qualidade do prémio a meio do processo, tal era a procura do mesmo – e criassem uma revista que nunca ninguém viu.
Melhor só mesmo a então designer do Correio da Trofa, que tendo também colaborado num outro flop a convite do executivo, um festival de cinema adjudicado a uns amigos por 60 mil euros, que esteve literalmente às moscas, recebeu perto de 54 mil euros + IVA para trabalhos de publicidade, que é sempre uma rúbrica boa para pagar favores. E sabe o que é mais interessante no meio de todos estes ajustes directos, dos milhares em publicidade que a autarquia e as juntas PSD/CDS-PP pagaram a este jornal com dinheiro dos nossos impostos, da propaganda descarada e dos ataques ad hominem que o poder encomenda a testas-de-ferro estacionados neste pasquim? É que este jornal, que continua a laborar, ininterruptamente, deixou de cumprir com as suas obrigações junto da ERC, dois meses após as eleições de 2013, e como tal foi cancelado oficiosamente pela Entidade Reguladora. Acresce a isto que, durante um período que não consigo precisar mas que facilmente se comprova (ver leituras recomendadas, no final), o director deste jornal era também assessor do PSD de Santo Tirso, ilegal à luz da legislação em vigor que regula a actividade dos profissionais do jornalismo. Tudo muito transparente, não lhe parece, senhora deputada? Qualquer semelhança com um esquema sem-vergonha de tráfico de influências e manipulação da opinião pública é mera coincidência.
Mudando agora um pouco o escopo para a outra comissão à qual está ligada, a dos Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, vou lhe contar outra história. Existe na Trofa uma associação da qual faço parte, o Clube Slotcar da Trofa (CST), tão exemplar que, em tempos, o seu amigo Sérgio Humberto se desfazia em rasgados elogios (deixo-lhe uma transcrição de um deles, bem como um vídeo) à nossa actividade. Apesar desta associação continuar a ser exemplar, a cumprir com o seu plano de actividades de forma rigorosa e a desempenhar uma actividade ímpar no nosso concelho, reconhecida por milhares de trofenses, pelo IPDJ e pelo secretaria de Estado que tutela o associativismo, tendo o anterior titular da pasta, Emídio Guerreiro (PSD), incluindo a associação no seu último roteiro por estruturas de excelência, existem na direcção desta associação pessoas que, fora dela, exprimem livremente a sua liberdade de expressão. Eu sou uma delas. E o que é a liberdade de expressão senão um direito, uma liberdade e uma garantia constitucionalmente protegida?
E o que decidiu fazer o executivo liderado pelo seu amigo Sérgio Humberto? Simples: depois de terem passado o ano de 2016 em desculpas esfarrapadas para não responderem à candidatura aos apoios municipais ao associativismo, entregue de forma regular e dentro dos prazos legais, alegando que o processo estava a decorrer, este executivo decidiu castigar a associação pelas opiniões emitidas por dois elementos da direcção do clube. Isto apesar de tais opiniões terem sido emitidas a título pessoal, sem qualquer tipo de vínculo à actividade associativa dos visados. Quando confrontei o vereador da cultura, no primeiro Conselho Municipal de Juventude de 2017, sobre o porquê de não nos ter sido dada uma resposta, foi me dito que:
A Câmara Municipal da Trofa não fez nem fará protocolos com qualquer Associação/Instituição que:
- não possua a documentação exigida em ordem;
- que não possua as declarações da Segurança Social e Finanças atualizadas e livres que qualquer divida;
- com quem não possui relacionamento institucional;
- nem com nenhuma instituição cujos membros da direção colocam constantemente em causa a gestão municipal, por vezes de forma difamatória; consideramos que ao fazê-lo, estaríamos a cometer um contrassenso em absoluto.
O que é que sucede? Sucede que toda a documentação estava em ordem, as declarações da Segurança Social e Finanças estavam actualizadas e livres que qualquer divida, o relacionamento institucional nunca foi oficialmente quebrado, tendo o CST participado, a convite da autarquia, em várias actividades municipais durante o ano de 2016 e 2017, pelo que sobra apenas aquele quarto ponto. Escusado será explicar a um membro da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias que o que ali está um claro atentado contra a liberdade de expressão de quem não concorda com alguns aspectos da gestão municipal. Como é direito inviolável de qualquer cidadão que habite num Estado de Direito. Como é elementar em democracia.
A Trofa não está em boas mãos, senhora deputada. Obras públicas qualquer um pode fazer, principalmente quando as eleições estão próximas, mas castigar uma associação com centenas de associados e provas dadas, usando-a para uma vingança pessoal contra dois elementos da mesma não é próprio de um democrata. Como não é próprio de um democrata usar recursos públicos para promover a sua imagem, como Sérgio Humberto fez neste e neste caso. Como não é próprio de um democrata boicotar a liberdade de imprensa dos jornais que não controla ou acusá-lo de ser uma fraude quando a única fraude é o jornal que o próprio Sérgio Humberto ajudou a erguer. Boicote esse que deu origem a um processo na ERC, no qual o seu amigo Sérgio Humberto voltou a ficar mal na fotografia. Nada disto é próprio de um verdadeiro democrata. É próprio de caudilhos autoritários do tempo da outra senhora que, penso que concordará comigo, ou não fosse a senhora deputada uma democrata, não são bem-vindos em democracia.
Infelizmente, é altamente provável que o seu amigo seja reeleito. O poder e os recursos que o PSD Trofa tem, aliados a uma rede de propaganda bem oleada, a uma distribuição inteligente de tachos e subsídios e a uma política de betão nos meses que antecederam as eleições dificilmente lhe permitirão sair derrotado. O que de resto não deve ser particularmente surpreendente para a senhora deputada, ou não residisse em Gondomar, terra do histórico e transparente presidente laranja, Valentim Loureiro.
Grato pelo seu tempo, senhora deputada!
Atentamente,
João Mendes
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Leituras adicionais
Sobre o jornal de propaganda da coligação PSD/CDS-PP, o Correio da Trofa
Aquilo que a coligação Unidos pela Trofa não lhe contou: dinheiro público para colaboradores do Correio da Trofa (05.10.2016)
Correio da Trofa, um jornal que não respeita a lei (19.10.2016)
É irónico, não é senhor presidente? (20.10.2016)
Sobre a perseguição da coligação PSD/CDS-PP ao Clube Slotcar da Trofa
Uma contradição gritante com cheiro a perseguição (30.09.2016)
Deixem o Clube Slotcar da Trofa trabalhar (11.12.2016)
Do desrespeito pelo associativismo (16.01.2017)
Comunicado – Clube Slotcar da Trofa (29.06.2017)
Fonte: AVENTAR
Interrogação do autor do Blogue: Haverá gente em Ovar capaz de fazer uma denúncia pública deste género, especialmente, os Diretores de Coletividades que não compareceram na apresentação da recandidatura do Salvador Malheiro?
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