Depois de se demarcar (exemplarmente, diga-se) das declarações racistas e xenófobas de André Ventura, e de desvincular o seu partido da coligação com o PSD em Loures (rejeitando fazer parte do «teste Trump», em que Passos Coelho continua empenhado), Assunção Cristas parece não ter sido capaz de ceder à tentação (ou a alguma contestação interna) e decidiu insistir no velho discurso do CDS-PP sobre o Rendimento Social de Inserção, fazendo uma requentada alusão às «pessoas com grandes carros e que vivem do RSI».
Sejamos justos e rigorosos: na sua referência à prestação, a presidente do CDS-PP não só não associa as supostas fraudes dos beneficiários a qualquer minoria ou comunidade étnica específica (ao contrário do que faz Ventura), como expressa de forma clara o entendimento do seu partido sobre o RSI. Segundo Cristas, «o CDS sempre foi a favor a se dar o rendimento a quem dele precisa, mas sempre foi a favor de uma grande fiscalização», opondo-se por isso à «renovação automática» da medida sem um escrutínio da «manutenção das condições de necessidade».
Podemos pois assumir que as declarações de Assunção Cristas, ainda que eventualmente suscitadas pela necessidade de não perder demasiado o pé face à golpada eleitoralista sem escrúpulos em que Passos e Ventura embarcaram, revelam sobretudo o persistente preconceito da direita, que prefere a caridade assitencialista, em relação às políticas sociais públicas. Vale por isso a pena reler o recente artigo de Ricardo Moreira sobre o suposto «regabofe» no RSI e relembrar alguns factos, como a circunstância de «a prestação mais controlada» de todas (mas de reconhecida eficácia na redução da intensidade da pobreza e com reduzidos níveis de fraude) representar apenas «2% do total de despesas da Segurança Social» (tendo sofrido «um corte de -45%» entre 2010 e 2015) e em que cerca de 40% dos beneficiários são «menores ou pessoas com mais de 65 anos, que não podem trabalhar».
Ou seja, se acreditarmos que «o CDS sempre foi a favor a dar o rendimento a quem dele precisa», e se considerarmos o agravamento do desemprego e dos níveis de pobreza entre 2010 e 2015 (com uma redução das situações cobertas por prestações de RSI e CSI), teremos que concluir que o corte no número de beneficiários ocorrido nesse período - cerca de 230 mil no total, entre os quais 93 mil crianças e cerca de 10 mil idosos - apenas resultou da «fiscalização e escrutínio da medida», que terá possibilitado a identificação das situações de fraude existentes (como as de «pessoas com grandes carros e que vivem do RSI»). 230 mil beneficiários, 93 mil crianças e 10 mil idosos, é isso, não é Dra. Assunção?
Fonte: Ladrões de Bicicletas
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