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terça-feira, 5 de março de 2019

“The Handmaid’s Tale”, o tempo que se insinua

por estatuadesal

(Daniel Oliveira, in Expresso Diário, 04/03/2019)

Daniel Oliveira

Para o dia internacional da mulher, a Associação Sindical de Juízes não decidiu organizar um debate sobre o papel das mulheres na Justiça ou uma ação de formação sobre violência doméstica. PREFERIU PROMOVER UM WORKSHOP DE MAQUILHAGEM. A coisa não foi bem pensada? Não, e é por isso que tem relevância. Porque ela representa o automatismo misógino que se sente em muitas decisões quotidianas que são apenas caricaturadas pelos acórdãos de Neto de Moura.

Estarei a ser picuinhas? Não. Porque ao mesmo tempo que estes automatismos fazem o dia a dia das nossas instituições há quem trabalhe para os institucionalizar. São os que, no seu combate contra o “politicamente correto”, tentam que o discurso dominante volte a corresponder à prática dominante, permitindo assim travar novas conquistas e até recuar no tempo. Desses, não vêm atos “inocentes” e pouco pensados. Vem um discurso cada vez mais descarado, construído para chocar e criar novos normais. Ou retomar os velhos normais, na realidade.

Ao ler ESTE ARTIGO de Joana Bento Rodrigues, militante ultraconservadora do CDS, publicado no “Observador” e que rapidamente se tornou viral, fica-se inicialmente na dúvida se estamos perante um exercício de humor irónico. Depois percebe-se que não.

Primeiro, a mulher: “O potencial feminino refere-se a tudo o que, por norma, caracteriza a mulher. Gosta de se arranjar e de se sentir bonita. Gosta de ter a casa arrumada e bem decorada. Gosta de ver ordem à sua volta. Gosta de cuidar e receber e assume, amiúde, muitas das tarefas domésticas, com toda a sua alma, porque considera ser essa, também, a sua função.”

As mulheres já não estão apenas a lutar por mais direitos. Estão a lutar para impedir um brutal recuo civilizacional. Que lhes será imposto à primeira oportunidade. Não com artigos de jornal, mas com leis, repressão e doutrinação na escola. Vejam “The Handmaid's Tale”. Parece ficção científica mas é sobre um tempo que se insinua

Depois, a sua relação com o homem e o seu sucesso: “A mulher gosta de se sentir útil, de ser a retaguarda e de criar a estabilidade familiar, para que o marido possa ser profissionalmente bem sucedido. Esse sucesso é também o seu sucesso! Por norma, não se incomoda em ter menos rendimentos que o marido, até pelo contrário. Gosta, sim, que seja este a obtê-los, sendo para si um motivo de orgulho. Por outro lado, aprecia a ideia de ‘ter casado bem’, como se fosse este também um ponto de honra.”

Por fim, o seu papel na sociedade: “Não espanta, assim, que haja menos mulheres em cargos políticos e em posições de poder. A mulher escolhe-o naturalmente, ao dedicar menos tempo que o homem às causas partidárias e ao estudo da História e da atualidade, enquanto conhecimento necessário para defender e representar uma Nação.”

Dito tudo isto, falta a caracterização das atuais feministas. As do passado são excelentes, claro. Porque se já não estiver viva qualquer feminista é magnífica. E porque a estratégia destes novos ultraconservadores é darem a ideia que o problema está nos excessos da luta pela igualdade que eles apenas querem moderar. Como se vê pelo delírio deste texto, é uma tática sonsa. Eles são contra tudo aquilo pelo qual o movimento feminista se bateu desde que nasceu. Escreve a senhora: “A mulher dita feminista (...) optou por se objetificar, pretendendo ser apenas fonte de desejo em relações casuais, rejeitando todo o seu potencial feminino, matrimonial e maternal. (...) Este ativismo tornou-se, inclusivamente, desprestigiante para a mulher. Priva-a da possibilidade de ascensão social e profissional pelo mérito. Retira-lhe a doçura e candura.”

Joana Bento Rodrigues não é (só) uma maluquinha que resolveu mandar um texto delirante para um jornal. É membro da Tendência Esperança em Movimento (TEM) que, tendo um peso ainda pouco expressivo no CDS (10%), tem um espaço absurdo no “Observador”. Ali, onde se juntam a extrema-direita do PSD e a extrema-direita do CDS, aliando, à Bolsonaro, o populismo neoliberal ao ultraconservadorismo beato, está a ser formado uma espécie de Tea Party português. Se se manterá no CDS e no PSD é o que futuro dirá. Talvez com a notoriedade comece a sonhar com outros voos.

A estratégia deste tipo de grupos é chocar. Abel Matos Santos, líder da tendência, CELEBROU O SUCESSO DESTE ARTIGO no seu Facebook: “parece que se criou a semana da mulher, sem quotas, só pelo mérito dos textos e ações”. E O SEU PONTO DE VISTA sobre o papel da mulher na sociedade e no trabalho acompanha o de Joana Bento Rodrigues. O que, sendo um homem com mais tempo para “as causas partidárias e ao estudo da História e da atualidade”, tem logo outro valor: enquanto as mulheres são “empurradas pelo politicamente correto para o carreirismo, para estarem fora de casa, para terem uma carreira profissional (...) os homens não são empurrados para estas coisas, os homens sempre sentiram, naturalmente, impelidos a fazer isso”. Ou seja, a mulher é livre de ter uma carreira, mas enquanto isso é natural no homem é artificial na mulher. Joana Bento Rodrigues não se enganou, falou em nome de toda a organização.

A alegria dos até agora anónimos Abel Matos Santos e Joana Bento Rodrigues não segue apenas a velha máxima de que não há má publicidade. Se fosse isso a solução era ignorá-los. A estratégia é um pouco mais ambiciosa: é o choque ir dando lugar à banalização. Até o aberrante deixar de ser inaceitável. Porque a regra do combate ao “politicamente correto” é que nada é realmente inaceitável. Até eles chegarem ao poder e porem ordem nisto tudo, claro está. Esticar a corda, escrevendo textos que quase nos dão vontade de rir, não serve apenas para dar que falar. Serve para esticar as fronteiras do debate e assim mudar o seu ponto de equilíbrio. Até alguém dizer ainda pior e aquilo já parecer moderado. À décima vez que se escreva que a mulher até gosta de receber menos do que o seu marido, que prefere ser a sua sombra e que é natural que não esteja preparada para a política, aquilo deixa de chocar. E sobe-se para o degrau seguinte. Não nos parece Sarah Palin uma senhora ponderada quando ouvimos Donald Trump? Não nos parece Joana Bento Rodrigues uma progressista quando ouvimos Jair Bolsonaro? É sempre uma questão de posição relativa para que o abjeto pareça normal e, depois, se transforme na norma.

O resposta à radicalização do conservadorismo não é moderar o discurso a ver se não irritamos os talibã. Isso permitiria que o centro do debate sobre os direitos das mulheres – assim como os das minorias – voltasse para o lugar onde esteve num passado. Pelo contrário, o discurso e a prática devem ser ainda mais assertivos na luta pela igualdade. Sabendo que as mulheres já não estão apenas a lutar por mais direitos, estão a lutar para impedir um brutal recuo civilizacional. Elas serão, como são quase sempre, as primeiras vítimas do retrocesso. Que lhes será imposto à primeira oportunidade. Não com artigos de jornais, mas com leis, repressão e doutrinação na escola. Vejam “The Handmaid's Tale”. Parece ficção científica mas é sobre um tempo que se insinua.

Salvador Malheiro disse que foi ao Euro com a Olivedesportos, mas quem o convidou foi um construtor que trabalha com a Câmara de Ovar

Luís Rosa

Tânia Teixeira

Autarca de Ovar disse que tinha sido convidado pela Olivedesportos para ir ao Euro 2016. Mas documento confirma que foi mesmo a convite de construtor com quem a câmara fez 13 contratos de 3,9 milhões.

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Esta é a história clássica de como um desmentido se pode comparar a um ‘tiro pela culatra’. Tudo se resume a uma pergunta: quem convidou Salvador Malheiro, presidente da Câmara de Ovar e vice-presidente do PSD, e a sua mulher, para assistirem ao jogo Portugal-País de Gales, da meia-final do Euro 2016 que decorreu no dia 6 de julho em Lyon, França? O Observador teve a informação desde o início de que teria sido Joel Pinho, filho do principal sócio da sociedade Construções Carlos Pinho, mas Salvador Malheiro sempre garantiu ao Observador que tinha sido convidado pela Olivedesportos de Joaquim Oliveira.

É aqui há um grande detalhe importante. As Construções Carlos Pinho ganharam 13 contratos adjudicados pela Câmara de Ovar desde que Salvador Malheiro é presidente de Câmara de Ovar. Entre ajustes diretos e concursos públicos, são cerca de 3,9 milhões de euros que foram contratualizados entre 2014 e 2018

Documentação interna da Agência Cosmos (do Grupo Olivedesportos) a que o Observador teve acesso na semana passada, indica claramente que Salvador Malheiro e a sua mulher foram, de facto, convidados pelo filho de Carlos Pinho. Ao que o Observador apurou, o convite original da empresa de Joaquim Oliveira terá sido dirigido precisamente a Carlos Pinho mas o então presidente do Futebol Clube de Arouca que estava naquela altura na I Liga terá indicado, através do seu filho Joel, o nome do presidente da Câmara de Ovar e da sua mulher Bárbara Moura.

Confrontado com esta documentação, Salvador Malheiro diz agora que “a indicação que eu tenho é que tinha um convite para duas pessoas da parte da Olivedesportos”. Mas foi convidado por alguém da Olivedesportos? “Creio que sim mas não tenho a certeza. Não sei”, disse, acrescentando que falou com Joaquim Oliveira “uma ou duas vezes em eventos sociais”.

Documentação indica convite de Joel Pinho

De acordo a documentação, o casal Malheiro/Moura viajou no chamado “Grupo Olivedesportos” composto por 33 passageiros que apanharam um avião fretado pela Agência Cosmos para a viagem Lisboa/Lyon e Lyon/Lisboa. Os primeiros nomes referidos são precisamente “Joaquim Oliveira”, a sua mulher “Irene Oliveira”, o seu filho “Rolando Oliveira” e mais quatro familiares com o apelido “Oliveira”. Salvador Malheiro, descrito como “Salvador Silva” visto que o seu nome completo é Salvador Malheiro Ferreira da Silva, e a sua mulher Bárbara Moura, são os únicos membros do grupo que têm a seguinte observação: “CONV. JOEL PINHO” e a indicação de que o preço individual é de 850 euros. Ou seja, um total de 1.700 euros para o casal Malheiro/Moura.

Além do casal Malheiro/Moura, apenas o 33.ª passageiro, Sónia Leocádia, é descrita no documento como “familiar FERNANDO SANTOS” nas observações do documento.

Ou seja, com a exceção de Malheiro e da sua mulher, todos terão sido efetivamente convidados por Joaquim Oliveira. Entre esses convidados, estão Luís Montenegro, Luís Campos Ferreira e Hugo Soares — os três social-democratas que foram constituídos arguidos pelo Ministério Público (MP) pelo alegado crime de recebimento indevido de vantagem. No documento, a que o Observador teve acesso, está escrita a mesma observação à frente do nome de cada um deles: “Pago diretamente pelo próprio (850 euros)“. O MP, contudo, tal como a revista Sábado já noticiou, entende que os pagamentos terão sido feitos com cheques fora do prazo após a notícia do Observador que revelou a oferta de Joaquim Oliveira aos três deputados, sendo por isso igualmente suspeitos de falsificação de documento.

Outro dos convidados por Joaquim Oliveira foi Luís Marques Mendes. Contactado pelo Observador, Marques Mendes confirmou o convite. “Fui a dois jogos do Euro 2016 em que paguei as viagens pelos meus próprios meios e fui convidado por Joaquim Oliveira para ir ver dois jogos. Já não me recordo se um deles foi a meia-final mas admito que tenha sido”, disse. Saliente-se, contudo, que o ex-líder do PSD não é titular de cargo político ou público, não sendo, portanto, abrangido pelo ilícito de recebimento indevido de vantagem. Esse tem sido o entendimento do MP e da juíza Cláudia Pina, titular do processo no Tribunal de Instrução Criminal, para os casos Galpgate (convites da empresa Galp) e Olivedesportos.

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Quem pagou a viagem e os bilhetes para o jogo?

Salvador Malheiro sempre admitiu ao Observador que não pagou a viagem e os bilhetes para o jogo à Agência Cosmos. Não é claro no documento a que o Observador teve acesso o que está incluído no valor de 1.700 euros que é atribuído a Salvador Malheiro e à sua mulher: só a viagem de avião de ida e volta ou também os bilhetes para a meia-final do Euro 2016? A informação que o Observador tem é que o custo total da viagem e dos bilhetes para o jogo situar-se-á entre os 2.500 e os 3.000 euros.

Quem pagou esse valor? Tal informação não consta da documentação a que o Observador teve acesso.

O Observador tentou contactar Joel Pinho por diversas vezes desde o dia 12 de fevereiro, mas o ex-diretor desportivo do Arouca nunca respondeu nem às chamadas telefónicas nem aos dois emails que lhe foram enviados com todos os factos descritos nesta peça para o email indicado por um funcionário da sociedade Construções Carlos Pinho. O seu pai também não respondeu às perguntas do Observador.

Também a Olivedesportos, através de Rolando Oliveira (filho de Joaquim Oliveira), recusou prestar comentários sobre a forma como Salvador Malheiro e a mulher viajaram para França.

Recorde-se que o Departamento de Investigação e Ação Penal (DIAP) de Lisboa abriu dois inquéritos criminais ao caso das viagens do Euro 2016.

O primeiro está relacionado com a notícia da revista Sábado sobre este caso que relatava as viagens e bilhetes para dois jogos de Portugal pagos pela Galp a Fernando Rocha Andrade, então secretário de Estado dos Assuntos Fiscais. Costa Andrade, João Vasconcelos (então secretário de Estado da Indústria), a Jorge Oliveira (então secretário de Estado da Indústria) e a diversos membros dos respetivos gabinetes, além de Vítor Escária (então assessor económico de António Costa) acabaram por se demitir do Governo e foram constituídos arguidos.

Já o segundo processo está relacionado com a Olivedesportos e é aquele em que Luís Montenegro, Hugo Soares e Luís Campos Ferreira também passa arguidos.

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Os desmentidos e a nova reação de Malheiro

Confrontado no dia 12 de fevereiro com a informação de que tinha sido Joel Pinho, filho do principal sócio da sociedade Construções Carlos Pinho, a convidá-lo e à sua mulher para assistir ao jogo que viria a carimbar a qualificação de Portugal para a final do Euro 2016, Salvador Malheiro confirmou que tinha estado presente no jogo Portugal/País de Gales com a sua mulher mas refutou cabalmente que a “viagem tenha sido paga”por aquela empresa de obras públicas e construção civil que costuma trabalhar com a Câmara de Ovar. Nesse primeiro contacto, Malheiro recusou dizer se tinha pago a viagem e foi taxativo: “Não falo mais sobre esse assunto. Podem e devem procurar e vasculhar o que bem entenderem. Estou de consciência tranquila”, disse.

Dois dias mais tarde, a 14 de fevereiro, o Observador insistiu junto de Salvador Malheiro: se não tinha sido Joel Pinho e a sociedadade Construção Carlos Pinho a convidá-lo, quem foi o autor o convite para ir a França? O autarca de Ovar admitiu que “os bilhetes de avião e os bilhetes para o jogo foram uma oferta da Olivedesportos”, e acrescentou: “Ligaram-me e disseram-me que os bihetes estariam no aeroporto em meu nome para eu levantar. Assim fiz. Fui de manhã cedo e regressei à noite. Paguei as minhas refeições e as da minha mulher. Não dormi em França” e “paguei as minhas refeições.”

Salvador Malheiro confirmou que não pagou à Agência Cosmos o preço dos bilhetes dos avião e dos bilhetes para a meia-final do Euro 2016 mas não viu nisso qualquer problema. “Não paguei nada. A Olivedesportos não tem qualquer relação comercial com a Câmara de Ovar. Não vejo qual é o problema”, afirmou.

O Observador voltou a contactar Salvador Malheiro no dia 26 e no dia 27 de fevereiro para o confrontar com o documento a que tivemos acesso e a informação relativa ao convite de Joel Pinho, assim como ao facto de a Olivedesportos ter convidado Carlos Pinho, tendo este delegado o convite para duas pessoas em Malheiro e na sua mulher. A res foi o seguinte:

— Quem é que o convidou da parte da Olivedesportos?
— “Não sei. A indicação que tenho é que tinha um convite para duas pessoas, da parte da Olivedesportos, que tinha de levantar no aeroporto”

— Mas foi convidado por alguém da Olivedesportos?
“Eu creio que sim, mas não tenho a certeza. Não sei”

— O sr. conhecia o sr. Joaquim Oliveira? Foi ele quem o convidou?
— “A informação que eu tinha era sobre um convite da Olivedesportos. Não conhecia o sr. Joaquim Oliveira. Devo tê-lo cumprimentado uma vez num jogo de futebol.”

— Então, se não foi o sr. Joaquim Oliveira a convidá-lo, se não foi ninguém da Olivedesportos a convidá-lo, quem é que o convidou?
— “Não sei se não foi o o Joaquim Oliveira. Chegou-me a informação ao gabinete da presidência que tinha esses dois convites para levantar da parte da Olivedesportos. Não sei como surgem esses convites”

A informação que está no documento que o Observador tem na sua posse é que foi convidado pelo Joel Pinho.
— “Refuto isso. Refuto que tenha sido convidado pelo sr. Joel Pinho”

— As informações originais  que temos é que o sr. Joaquim Oliveira convidou originalmente o sr. Carlos Pinho e uma pessoa que este quisesse levar. O sr. Carlos Pinho, através do seu filho Joel, informou a Olivedesportos de que delegaria esses convites no senhor e na sua mulher Bárbara. Qual o seu comentário?
— “Desconheço isso. Recebi a informação que tinha esses dois convites e levantei-os no aeroporto. Vou procurar no gabinete da presidência mais informação sobre essa matéria.”

Salvador Malheiro informou o Observador na manhã desta quinta-feira que não encontrou no Gabinete de Apoio à Presidência da Câmara de Ovar “nenhum documento relativo a esse convite da Olivedesportos”. Apesar disso, Malheiro manteve as declarações que já tinha feito ao nosso jornal.

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As obras de Carlos Pinho para a Câmara de Ovar

A Câmara Municipal de Ovar, liderada desde 2013 por Salvador Malheiro, adjudicou à sociedade comercial Construções Carlos Pinho, Lda um total de 13 contratos no valor total de cerca de 3,9 milhões de euros entre 2014 e 2018, de acordo com dados recolhidos no portal Base.gov.pt.

Tais contratos foram adjudicados via concurso público ou via ajuste direto e estão relacionadas com empreitadas de obras públicas, nomeadamente requalificação de estradas cuja manutenção é da responsabilidade da autarquia, requalificações de ruas e outros arranjos urbanísticos.

No portal Base também é possível encontrar um conjunto de adjudicações muito significativas da obras públicas adjudicadas pela empresa AdRA — Águas da Região de Aveiro, SA às Construções Carlos Pinho. Salvador Malheiro é vogal não executivo desta empresa do grupo Águas de Portugal, visto que a Câmara de Ovar tem 8,28% do capital da AdRA.

Recorde-se que Carlos Pinho e o seu filho Joel ganharam notoriedade pública com líder do Futebol Clube Arouca. Foi com o investimento da família Pinho que o Arouca, um pequeno município com 22 mil habitantes do distrito de Aveiro, conseguiu estar na I Liga entre as épocas 2013/2014 e 2016/2017, tendo descido à II Liga onde ainda se encontra.

Enquanto esteve no principal campeonato de futebol profissional, Carlos Pinho envolveu-se em algumas polémicas, sendo a mais conhecida do caso do túnel quando se envolveu num discussão acessa com Bruno de Carvalho, então presidente do Sporting, na zona dos balneários do Estádio José de Alvalade. Os dois dirigentes acabaram por ser castigados pelas instâncias displinares desportivas.

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Os contactos com Joel Pinho

Além dos emails enviados no dia 12 e no dia 26 de fevereiro, o Observador tentou contactar Joel Pinho três vezes por telefone entre a noite de 17 de fevereiro e a manhã de 18 de fevereiro, sem sucesso. Chegámos a obter uma resposta, por SMS, de que o engenheiro não poderia falar no momento da primeira chamada. Nas horas seguintes o telefone manteve-se desligado, encaminhando as ligações para a caixa de correio.

O Observador visitou ainda no dia 18 de fevereiro a sede da Construções Carlos Pinho, Lda, localizada na Zona Industrial da Farrapa, na freguesia de Chave. No local, um funcionário da empresa afirmou que “é raro” Joel Pinho estar na firma. Além disso, também não soube informar se Joel Pinho poderia estar em alguma das obras em execução pela Construções Carlos Pinho, Lda., mas esse cenário pareceu-lhe pouco provável.

O dono da construtora, Carlos Pinho, também não estava nas instalações da empresa.

Gorada mais uma tentativa de chegar à fala com Joel Pinho, tentámos um novo contacto por telefone para o número pessoal do filho de Carlos Pinho, pela quarta vez. Ao início da tarde do dia 18 de fevereiro, a chamada foi atendida. Do outro lado estava Pedro Henrique, que se identificou como assessor de Joel Pinho e transmitiu que Joel estaria ocupado e ausente nos próximos dias, no estrangeiro, e que por esse motivo, não poderia falar com o Observador.

Entre as brumas da memória


Bons conselhos

Posted: 04 Mar 2019 01:21 PM PST

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Carnaval?

Posted: 04 Mar 2019 11:35 AM PST

Será sempre isto.
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RAP sobre Neto de Moura

Posted: 04 Mar 2019 05:52 AM PST

Vídeo, a não perder, AQUI.
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O fim do mundo eurocêntrico e as ameaças à paz mundial

Posted: 04 Mar 2019 03:09 AM PST

1. Caxemira e a Coreia do Norte marcaram a política internacional dos últimos dias. Em ambos os casos há poderes nucleares de facto envolvidos. Em ambos os casos os conflitos situam-se na Ásia, num longínquo Oriente ou Extremo Oriente, na visão do mundo usual dos europeus. No caso da Coreia do Norte, devido à presença do Presidente dos EUA, Donald Trump, a visibilidade mediática acabou por ser grande. No caso de Caxemira, o confronto militar fronteiriço entre a Índia e o Paquistão pareceu mais uma disputa exótica ocorrida numa obscura região montanhosa, nos confins do Norte do subcontinente indiano, próximo dos Himalaias.

Pelo seu passado recente, os europeus estão habituados a que os seus conflitos — e os que se passam nas regiões envolventes, como o israelo-palestiniano — sejam a coisa mais importante do mundo. Isso hoje é uma grande ilusão. Esse mundo está a desaparecer e de forma muito rápida. Era assim há um século quando a disputa franco-germânica sobre a Alsácia-Lorena tornava as rivalidades entre os dois países uma ameaça à paz mundial.

Acontecimentos como assassinato de 1914 do herdeiro do trono da Áustria-Hungria, em Sarajevo, na Bósnia, tiverem repercussões mundiais. O mesmo ocorreu nos anos 1930 com os alemães dos Sudetas na antiga Checoslováquia, e a questão de Dantzig e do corredor polaco. Foram pretextos para a Alemanha nazi anexar a Checoslováquia e invadir a Polónia. Foi o desencadear de uma segunda guerra europeia com repercussões mundiais. Hoje, vistos do mundo exterior à Europa, vistos do mundo não euro-atlântico, provavelmente são conflitos ocorridos em lugares remotos, sem grande importância para o mundo actual, a não ser por curiosidade histórica.

2. Os mapas usualmente (não) mentem, mas podem criar uma visão do mundo ilusória. Enquanto europeus, estamos habituados a olhar o mundo da forma que Gerardus Mercator — nome latinizado do geógrafo e matemático flamengo Gerhard Kremer — nos habituou desde o século XVI. A ele devemos a ideia da projecção cilíndrica do globo terrestre, feita sob a forma de um mapa plano. Devemos-lhe também a centralidade da Europa nessas projecções cartográficas do mundo.

Os mapas mundiais, os planisférios que nos são familiares e estão baseados nos referidos trabalhos de Gerardus Mercator contêm, no entanto, distorções significativas na representação dos continentes. A Europa surge no centro do mundo, o que pode compreender-se dado tratar-se de um olhar europeu sobre este. Mas o mapa dá a ideia de uma área terrestre europeia superior à efectivamente existente, o que ocorre, de uma forma acentuada, por exemplo, no caso da Península da Escandinava ou da Gronelândia. Ao inverso, por exemplo, a Índia, a América do Sul ou a Austrália estão sub-representadas na sua dimensão, sugerindo áreas significativamente menores do que as reais.

Mas esta longa era de eurocentrismo iniciada nos séculos XV e XVI — e que o planisfério de Mercator bem exemplifica — à qual o crescente domínio económico, político e militar da Europa no mundo dava plausibilidade, acabou abruptamente em meados do século XX.

3. Politicamente, o fim de um mundo centrado na Europa stricto sensu começou a tornar-se evidente a partir de 1945. A partir daí, EUA e União Soviética dominaram a política mundial. Todavia, a ruptura não foi radical como poderia parecer à primeira vista. Num certo sentido, o domínio do mundo passou a ser feito por prolongamentos da Europa — um euro-asiático (a Rússia), o outro euro-atlântico (os EUA). Isso permitiu continuar a ver o mundo e os seus conflitos através de ideologias políticas europeias, embora protagonizadas por outros: o socialismo-comunista e a democracia capitalista-liberal. Nesse aspecto, o fim da Guerra-Fria e da União Soviética em 1989-1991, deixando na última década do século XX a política mundial dominada pelos EUA, continuou a ser um terreno fundamentalmente familiar.

A grande ruptura está a ocorrer neste início de século XXI, com a gradual transferência do poder económico, político e militar para a Ásia-Pacífico. Enquanto europeus, habituámo-nos a ver o mundo que contava para o rumo dos acontecimentos mundiais como estando situado em Paris, Londres e Berlim. Mais recentemente em Moscovo e Washington. Temos grande dificuldade em apreender um afastamento, agora bem maior, do centro do poder mundial. Está a deslocar-se para uma enorme e heterogénea área que vai de San Francisco, na costa americana do Pacífico, até Pequim e Nova Deli, na Ásia. Uma área geográfica muito afastada da Europa, e que, se a tendência se confirmar, a tornará periférica no longo prazo.

4. A visão eurocêntrica é ainda um quadro intelectual bastante comum, muito enraizado por razões contraditórias e que vão além do já apontado. A mais óbvia é ser um legado do colonialismo e imperialismo do passado. A menos óbvia é ser também um legado do ideário marxista que se lhe opunha. Isso é visível no pensamento de Karl Marx formulado no século XIX, mas também nos modelos centro-periferia da segunda metade do século XX, usados para explicar a relação entre um centro (desenvolvido) e uma periferia (subdesenvolvida). Foram comuns nos anos 1960 a 1980, sendo impulsionados pelos trabalhos de Andre Gunder Frank e de Samir Amin, entre outros.

Em particular no campo da Sociologia o modelo centro-periferia, inspirado na análise marxista do sistema internacional, permitiu explicar o subdesenvolvimento e a dependência do chamado Terceiro Mundo. Numa versão mais recente, similar explicação foi dada pela teoria do sistema-mundo de Immanuel Wallerstein, influente nos anos 1990, nos primórdios da globalização.

Apesar da crítica feita ao colonialismo e imperialismo europeu, em qualquer uma das suas versões são teorias fundamentalmente eurocêntricas. São uma espécie de imagem invertida da visão do mundo do escritor britânico Rudyard Kipling, do fardo da missão civilizadora do homem branco. Encontram aí a explicação para o atraso estrutural e dependência dos outros (a periferia). Para o bem ou para o mal, a acção europeia no mundo explicava (quase) tudo. Hoje não explica (quase) nada.

5. Do Próximo Oriente ao Extremo Oriente, na terminologia geográfica usual dos europeus do passado, o mundo está em rápida transformação. Turquia, Rússia, Irão, Índia, China e Coreia do Norte são Estados em crescendo de poder, que ambicionam ser potências mundiais ou regionais. Quase todos são herdeiros de grandes impérios do passado e dominaram inúmeros povos em diferentes momentos da sua história. Nesse aspecto, ironicamente, a Europa nada inventou e tem mais lições históricas a receber do que a dar. Quase todos são potências nucleares (Rússia, Índia, China e Coreia do Norte), ou ambicionam ser (Irão e, talvez também, a Turquia).

O quadro eurocêntrico que ainda persiste engana. Nos conflitos e rivalidades desta imensa região da Ásia-Pacífico, os europeus são hoje, quase sempre, espectadores impotentes: confrontos entre a Índia e o Paquistão em Caxemira, programa nuclear iraniano, disputas de soberania no mar do Sul da China, tensões entre a China e Taiwan (Formosa), capacidade nuclear-militar da Coreia do Norte.

A renovada centralidade da Ásia-Pacifico está a tornar as suas rivalidades e conflitos centrais no mundo globalizado do século XXI. A ascensão económica-político-militar da China e o declínio relativo de poder dos EUA intensificam-nos. A Alsácia-Lorena e Dantzig são o passado. Caxemira e a Coreia do Norte são o mundo de hoje e o futuro.

A Europa actual tem horror ao seu passado de guerras e fez mea culpa quanto ao domínio colonial. Quer viver em paz. Tornou-se um mercado e um museu. Não é certo que o resto do mundo mostre compaixão por tal arrependimento, nem deixe de projectar os seus conflitos violentos, tal como os europeus faziam no passado. O fim do eurocentrismo não trouxe a paz perpétua.»

José Pedro Teixeira Fernandes

Lambedoras de quê, Dr. Renato Serrano Vieira?

Novo artigo em Aventar


por João Mendes

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"Woman performing cunnilingus on another woman", de Achille Devéria

Não admira que os humoristas não "deslarguem" o juiz Neto de Moura. E, há que dizê-lo com frontalidade, como dizia o pai deles todos, que tanto Ricardo Araújo Pereira, como a dupla Quadros/Nogueira, foram exímios na mais recente sentença que aplicaram ao juiz do momento.

E se não fosse já suficientemente cómico, ver um juiz que considera que ofensas verbais e ameaças "não revelam uma carga de ilicitude particularmente acentuada", surgir agora no papel de virgem ofendida, por não conseguir encaixar meia-dúzia de crónicas ou sketches humorísticos, preparado para processar meio mundo, eis que descobri outra pérola, digna de registo: então não é que a escolha de Neto de Moura para defender a sua honra é o advogado Renato Serrano Vieira?

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Quererão os juízes transformar-se na classe mais odiada em Portugal?

Novo artigo em Aventar


por João Mendes

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Quero começar por dizer que tenho máximo respeito pelo princípio de separação de poderes, que entendo ser condição sine qua non para a existência de uma verdadeira democracia, e que respeito (quase todos) os juízes portugueses que, acredito, não conseguem mais resultados por vivermos num país onde praticamente toda a coisa pública está viciada.

Posto isto, e sem mais demoras, o assunto do momento: Neto de Moura. Não vou perder grande tempo com uma cronologia que todos conhecemos, ou não estivesse ela em todo o lado. Conhecemos os polémicos acórdãos, as considerações bíblicas que não têm lugar no ordenamento jurídico de uma democracia liberal e a forma como o juiz desvalorizou actos de violência atroz. E, estou disso convencido, existe unanimidade entre a sociedade portuguesa, no que à condenação da conduta de Neto de Moura diz respeito.

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Essa coisa da “honra”…

Novo artigo em Aventar


por Ana Moreno

Poderá ser especificidade conotativa minha, mas ouvir falar em “honra” provoca no meu córtex cerebral a desbobinagem de um filme antigo e mau: vejo homens violentos a matarem ou “castigarem” a mulher, filhas ou irmãs “desonradas” (e/ou eventualmente os supostos rivais) para “lavarem” com sangue a "honra" da família...

Sou tresladada por via de maior incidência para a Índia, Turquia, Bangladesh ou Egipto, assisto mentalmente ao enterro de mulheres vivas ou ao seu apedrejamento pela vergonha que trouxeram à "honra" da família...

Sinto espetar-se-me na nuca a ponta aguçada da dupla moral.

“Honra”, na minha idiossincrasia, está nos antípodas de “dignidade”, que associo aos direitos humanos e ao Artigo 1 das constituições portuguesa e alemã.

Fui verificar; o dicionário diz que o significado é o mesmo; pois será, mas não sinto assim.

Aliás, também é: Virgindade ou castidade sexual, em geral nas mulheres (ex.: perder a honra)

Vem isto ao caso de um certo juiz ter declarado que vai processar quem o criticou no contexto de decisões em casos de violência doméstica por sentir ofendida a sua “honra pessoal e profissional”. Logo a “honra” sr. Juiz? ??? Isto será puro acaso??? Não estou a reconhecer aí o exacerbado ego machista a abespinhar-se?

Acalme-se, olhe que até Vital Moreira comenta que "não lembrava ao diabo a ideia de o Juiz-Desembargador Neto de Moura de acionar judicialmente, para efeitos de reparação de danos, por alegado atentado à sua honra, todos os que (políticos, comentadores e, mesmo humoristas!) comentaram com maior ou menor severidade, aliás merecida, as suas bizarras conceções acerca das mulheres quando vítimas de violência doméstica", começa por escrever, considerando que, com esta decisão, o juiz arrisca a "tornar-se no bombo da festa de todos os humoristas deste País".

Essa coisa da “honra” dá sempre para o torto.

Alessandra Strutzel, a merda que resulta do politicamente incorrecto

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por João Mendes

Merda1

Este monstro cruel e hediondo, que dá pelo nome de Alessandra Strutzel, está longe de ser um caso isolado. A blogger brasileira é até bastante representativa daquilo que é parte muito significativa do eleitorado de Jair Bolsonaro, repleto de defensores da violência indiscriminada, que sonham com o regresso da tortura e com fuzilamentos à moda antiga, que querem ser livres para espancar homossexuais, e quem diz homossexuais diz a própria mulher, ou outra mulher qualquer, e que desejam armas, muitas armas na rua. Gente que celebra o torturador Ustra ou a morte de Marielle Franco. É deste tipo de "gente" que estamos a falar.

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O Grande Encobridor dos clérigos pedófilos – Para quando a descanonização de ‘S. João Paulo II’?

por estatuadesal

(Por Mário de Oliveira, in A Viagem dos Argonautas, 03/03/2019)

A Cimeira dos bispos presidentes das conferências episcopais com o papa sobre os crimes de pedofilia dos clérigos católicos não passou de mais uma viagem turística para os bispos, e de mais um dos muitos shows mediáticos em que o jesuíta Jorge Mário Bergóglio, ex-cardeal emérito de Buenos Aires e, desde há anos, bispo de Roma, é manifestamente perito.

Ou não seja ele o mais recente sucessor do imperador Constantino, o primeiro papa da igreja católica romana e o pai do Credo de Niceia-Constantinopla que ainda hoje continua a ser vergonhosamente recitado nas missas de domingo. Numa criminosa tentativa de apagar da memória dos povos Jesus histórico, o filho de Maria, que o mesmo império, ao tempo de Tibério, manda executar em Abril do ano 30, no pior dos seus instrumentos de tortura política, a cruz. Essa mesma que hoje é apresentada como o símbolo maior do cristianismo católico e protestante. O que, só por si, constitui o absurdo dos absurdos e o sadomasoquismo elevado à máxima potência.

Os crimes, consumados ou só platónicos, de pedofilia dos clérigos são tão antigos quanto os próprios clérigos. Decorrem da natureza do ser-clérigo. Existem, desde que eles existem. E só terminam, quando eles forem definitivamente extintos.

Mas como extingui-los, se a igreja católica de Roma, desde o papa, no topo da pirâmide, ao mais ignoto pároco de aldeia, na base da pirâmide. está fundada sobre eles, todos celibatários? Os chamados leigos, elas e eles, não são igreja. Só os clérigos o são. Os próprios povos das nações, porque não clérigos, vêem-se condenados a ter de carregar sobre os ombros o peso da pirâmide clerical e a ter de ouvir e calar o que suas excelências reverendíssimas, os bispos e os párocos, suas eminências, os cardeais, e sua santidade, o papa, têm para lhes dizer, do altar para baixo. Para isso foram escolhidos por ‘deus-pai todo poderoso’, o do Credo de Niceia-Constantinopla.

É hoje público e notório que o papa polaco João Paulo II, com tudo de anti-comunista e anti-ateista primário, como de anti-Concílio Vaticano II – é um dos poucos que, enquanto bispo conciliar, vota contra a Constituição Lumen Gentium sobre a igreja – é o Grande Encobridor dos crimes de pedofilia dos clérigos. Sob o pretexto de que ‘o bom nome da igreja’ está acima de tudo o mais. Por mais que nesse então gritem as vítimas dos clérigos, os seus gritos esbarram sempre na muralha de aço do silêncio papal. Mas é assim que o Grande Encobridor adquire aura de santo e vê entrar nos cofres do Vaticano rios de dinheiro, em troca do seu silêncio. O mais aberrante dos muitos casos que então chegam ao seu conhecimento é o do fundador dos ‘Legionários de Cristo’ – só o nome já nos faz mijar de medo! – um tal clérigo católico, Marcial Maciel. É dele a instituição que, nas suas muitas casas, acolhe crianças e jovens em situação de fragilidade. E sempre que Maciel passa por cada uma delas, só tem de escolher entre todos os menores os que sexualmente mais o excitem. Uma escolha que deve ser vista pelas vítimas, não como um crime, sim como uma ‘promoção’!!!

De tudo o papa João Paulo II é sabedor. Mas os rios de dinheiro que o clérigo Maciel faz entrar no Banco do Vaticano têm o poder de tornar ‘santos’ os seus horrendos crimes. E para que tais horrores silenciados não venham a impedir, mais tarde, a sua previsível canonização pós-morte, o mesmo papa decide acabar com a figura de ‘Advogado do Diabo’, nos respectivos processos. E assim a sua canonização aconteceu quase na hora. A partir de então, deixou de haver o papa João Paulo II histórico com todos os seus crimes e há apenas o mítico ‘S. João Paulo II’.

Uma realidade que a Cimeira dos bispos com o papa Francisco ignorou de todo. Daí a inevitável pergunta, Para quando a descanonização de ‘S. João Paulo II’ e a condenação pública do papa João Paulo II? Enquanto esta imperiosa operação se não concretizar, todas as Cimeiras de bispos que o papa promova não passam de refinado fariseísmo católico romano. E são de crocodilo todas as suas lágrimas.


P.S.

Interrompo por uma semana completa as minhas actividades, também jornalísticas. Pelo que conto estar de volta ao Vosso contacto no domingo 17 de Março 2019. Uma saudável diversão de Carnaval para quem ainda o não dispensa. Por mim, prefiro águas mais profundas onde se escutam os sons do Cosmos em expansão e a Festa tem o incomparável paladar da plenitude HUMANA. A todas, todos a minha Paz.

Neto de Moura: vantagens e desvantagens de perder a vergonha

por estatuadesal

(Francisco Louçã, in Expresso, 04/03/2019)

Ao desencadear uma tempestade quando se soube que ia processar algumas das pessoas que o criticaram (ou todas?), o juiz Neto de Moura pode ter agora compreendido que, numa sociedade de comunicação tão líquida, a pior das condenações é ser alvo de chacota.

Para ele, tudo é mau: mesmo enfraquecido pela censura dos seus pares, decidiu fazer-se notar pela perseguição a quem contraria as suas espantosas sentenças; convoca o tribunal, o lugar da exposição pública da sua doutrina, para uma evocação da lei que ele próprio amesquinhou por particularismos religiosos ou outros; escolhe como advogado alguém cuja exuberante vulnerabilidade no mesmo terreno do menosprezo pelos direitos das mulheres foi notada, abrindo a via para as teses de uma ação sistemática por uma causa; e, pior do que tudo, torna-se ridículo, o que não convém mesmo nada a quem veste uma toga. As consequências deste fim de semana alucinante de Neto de Moura vão no entanto muito para além destes tons inevitavelmente carnavalescos.

A primeira consequência é um efeito de aglomeração de todas as queixas. Com os seus acórdãos, Neto de Moura já tinha enfraquecido a credibilidade da Justiça. Mas nada disso deixava prever, até porque não seria o único, que, ao contrário de outros, viria ameaçar a liberdade de opinião e, por isso, colocar-se no centro de uma tormenta crescente. Ele escolheu portanto personalizar em si próprio todas as frustrações com a Justiça, todas as zangas das mulheres maltratadas, todos os temores de quem entra num tribunal. Até se dirá que há alguma injustiça nessa justiça poética e que foi traído pelo seu próprio conceito de um tribunal que fala de si próprio a partir do lugar da autoridade, ou até se pode notar que, por vezes, erros dos tribunais de primeira instância limitam o âmbito de deliberação da segunda instância.

Mas o que nunca se pode aceitar é que a religião seja uma fonte de jurisprudência ou que os preconceitos de um juiz contra mulheres possam influenciar a decisão do tribunal. Assim, do primeiro ao último dia deste escândalo, porque se tornou um escândalo que vai marcar a história dos tribunais portugueses, Neto de Moura enterrou-se num percurso que envergonha a democracia e de que parece não querer nem redimir-se nem proteger-se.

A segunda consequência, e essa exige uma reflexão de fundo, é o custo imenso da inevitável mediatização da Justiça. É conveniente lembrar quem iniciou este processo, que em Portugal era até então muito contido, inaugurado por um juiz que convocou os jornalistas para se fazer filmar num elevador do Parlamento a ir pedir o levantamento de imunidade de um deputado que viria a ser acusado de pedofilia (e depois inocentado).

Depois vieram outras fontes de autoridades judiciárias, que criaram ligações privilegiadas com alguns jornais para a indústria de fugas ao segredo de justiça, com divulgação de transcrições de escutas ou vídeos de interrogatórios, sempre para ferozes sentenças preliminares executando os arguidos ou acusados. Houve mesmo uma assessora de imprensa de um Procurador-Geral da República que o apontou como a fonte principal de algumas das mentiras mais populares num jornal de escândalos. Foi uma saborosa forma de poder até ao dia tremendo em que a roda deste mecanismo atropelou o juiz Neto de Moura e passou a ser normal o que é normal, o escrutínio público das sentenças e do exercício da justiça. Distinguir agora entre um obscuro populismo mediático, a clareza da Justiça como parte da vida democrática e a fronteira da exposição dos próprios magistrados torna-se um problema que merece atenção.

Finalmente, a terceira consequência deste frenesim carnavalesco de Neto de Moura é que no imediato favoreceu quem queria prejudicar. Imagino que as manifestações e a greve deste 8 de março ganhem uma dimensão distinta por se tornarem a voz das vítimas e que registarão o impulso dado pelo juiz, que mostrou que havia razões profundíssimas para a sua indignação e até para a vontade de protegerem o direito de opinião. Também um dia saberemos se começa aqui uma carreira política: na Andaluzia, foi por ofensas menos graves que começou o percurso do chefe local do Voxx, um juiz que fora suspenso pelo seu preconceito contra os direitos maternais e depois se dedicou à extrema-direita. Haverá quem se lembre disso.

Finalmente, agora mesmo importa destacar a vítima que não tem tido defesa: essa é a Justiça, que deve ser salvaguardada destas vagas de confusão e degradação que foram desencadeadas por Neto de Moura, muito para além do imaginável. Salvemos os tribunais, onde as mulheres devem saber que passam a poder entrar para encontrar o mesmo respeito devido a qualquer pessoa e a aplicação da lei que as protege da violência doméstica e de género.

O Novo Banco e a pesada herança

por estatuadesal

(Por Carlos Esperança, 04/03/2019)

Chuta para cá mais mil milhões, diz o Ramalho, o CEO do Novo Banco...

Há quem recorde a ministra Maria Luís, uma promoção do aluno, ora catedrático, que exasperou Paulo Portas e o obrigou à provisória demissão irrevogável, a dizer que a resolução do BES não custaria um cêntimo aos contribuintes, o que a Dr.ª Cristas, de férias, logo apoiou, a partir da praia, pela confiança que lhe merecia a ansiosa amiga.

Claro que foi uma afirmação tão irresponsável com a do maior economista português, e um dos maiores de Boliqueime, a confirmar a solidez do banco de Ricardo Salgado, em cuja vivenda a sua primeira candidatura vitoriosa a PR foi gizada, durante um modesto jantar para quatro casais. Além do anfitrião e do protocandidato a PR, Marcelo e Durão Barroso eram as cabeças pensantes, também presentes, que urdiram a infeliz candidatura vencedora.

O Dr. Carlos Costa, do Banco de Portugal, responsável pela venda, incumbiu, por cerca de 30 mil euros mensais, o Dr. Sérgio Monteiro, conhecido por secretário de Estado das Privatizações, com cadastro na matéria (ANA, CTT, TAP e CP Carga), para proceder à venda. O resultado foi a escolha do fundo Lone Star para tomar 75% do Novo Banco, a custo zero, com o Fundo de Resolução a assumir um “mecanismo contingente” que cobre até 3,9 mil milhões de euros em potenciais perdas com determinados ativos do ex-BES.
Parece que o fundo abutre comprador, se agarra ao “mecanismo contingente” como as carraças aos cães.

Compreende-se que o PSD faça questão de chamar o ministro das Finanças à AR e diga que Mário Centeno tem que se "responsabilizar pela situação".

Na impossibilidade de punir os carrascos, pagam as vítimas. E vítimas somos todos nós.

Lamber ou não lamber… eis a questão!

por estatuadesal

(Por Abílio Hernandez, 04/03/2019)

Lamber ou não lamber...

De uma coisa não pode ser acusado o juiz Neto de Moura: de falta de coerência. Os dois já populares acórdãos sobre violência doméstica, inspirados no Código do Levítico, estão aí para o comprovar. Mas não é apenas em matéria de acórdãos e de sabedoria bíblica (reduzida, é certo, a um único livro do Velho Testamento) que o meritíssimo juiz é firme e hirto na sua coerência.

Em resultado dos ataques que tem sofrido da parte de políticos e humoristas – ataques violentíssimos, como é notório, comparados com os casos de amorosos rebentamentos de tímpanos e singelas ameaças de morte apreciados por ele – Neto de Moura decidiu interpor ação contra os seus (na sua ótica) caluniadores e constituiu Ricardo Serrano Vieira seu advogado.

Mais uma vez, o juiz não podia ter sido mais coerente, pois parece ter escolhido uma alma gémea para a tarefa de lhe defender a honra. E porquê? Porque o distinto causídico já (alegadamente, claro) demonstrou o seu desconforto, quiçá (belo vocábulo), náusea ou mesmo repugnância por atitudes de mulheres conhecidas pelas suas ideias feministas, neste caso pertencentes ao grupo Capazes. E, num comentário colocado na página da sua esposa (calculo que ele se lhe refira por esposa e não mulher, mas não posso confirmá-lo), definiu as referidas feministas como “lambedoras de c…”.Ou seja, o grande dilema hamletiano “to be or not to be, that is the question” ganhou uma nova e inovadora versão jurídica sob a pena digital do Dr. Vieira: lamber ou não lamber c…, eis a questão.

Os tempos mudam e ainda bem que, como se vê, até mudam para melhor, porque se o dilema é este talvez muitos dos mais graves do planeta possam resolver-se tranquilamente, em privado, e não sob incómodos holofotes públicos.

Só não consigo perceber o comentário da esposa ao comentário do marido jurista. Foi um ----------------------------------------------------------------->>

Habituado a interpretar textos, cogitei, cogitei e não consegui libertar-me de dúvidas. Na linguagem dos emojis, este significa riso, alegria, boa disposição. O que quereria então a esposa, de apelido Pissarra (curioso vocábulo, diria o ex-Presidente da Assembleia da República, João Bosco Mota Amaral), dizer com este sorriso rasgado ao marido desdenhoso das “lambedoras de c…”? A reação benigna de quem pensa “és mesmo parvo”? Um carinhoso incitamento, a chamá-lo à razão? Uma maneira gentil de dizer-lhe “nem sabes o que perdes”?

Os tempos estão mesmo a mudar, como canta o Bob Dylan. Mas ao meritíssimo juiz e ao seu distinto advogado, não aconselho nem o verso de Shakespeare, nem a harmónica do Prémio Nobel. Aconselho a ambos, vivamente, o divino Marquês de Sade e a sua “Philosophie dans le Boudoir”, traduzido em Português por “Filosofia na Alcova”.

Podeis crer, digníssimos senhores, que se aprende muito!