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sexta-feira, 20 de setembro de 2024

 

Não é a Terceira Guerra Mundial: esta é uma Guerra de Terror

By estatuadesal on Setembro 20, 2024

(Por Pepe Escobar, in Strategic Culture, 18/09/2024, Trad. Estátua de Sal)

Cartoom from International Art

A Rússia está a travar uma guerra existencial pela sobrevivência da Pátria – o que tem feito repetidamente ao longo dos séculos.


Isto não é festa
Isto não é discoteca
Isto não é brincadeira
Não há tempo para dançar
Ou amores
Eu não tenho tempo para isso agora
.

Talking Heads, A vida em tempos de guerra


Primeiro tivemos ação: o Presidente Putin – calmo, sereno, controlado – alerta que qualquer ataque à Rússia com mísseis de longo alcance da NATO será um ato de guerra. Então tivemos reação: os ratos da NATO a correrem e a regressarem à sarjeta – à pressa. Por enquanto.

Tudo isso foi uma consequência direta do desastre de Kursk. Uma aposta desesperada. Mas o estado das coisas na guerra por procuração na Ucrânia era desesperado para a NATO. Até que ficou claro, como cristal, que tudo é basicamente irrecuperável. Então restam duas opções.

A rendição incondicional da Ucrânia, nos termos da Rússia, que equivale à completa humilhação da NATO. Ou uma escalada para uma guerra total  (itálico meu) com a Rússia.

As classes dominantes dos EUA – mas não do Reino Unido – parecem ter registado a essência da mensagem de Putin: se a NATO está em guerra com a Rússia, “então, tendo em mente a mudança na essência do conflito,  tomaremos as decisões apropriadas  em resposta às ameaças que serão colocadas sobre nós”.

O vice-ministro das Relações Exteriores, Sergey Ryabkov, foi ainda mais preciso e ameaçador: “A decisão foi tomada, foi dada carta-branca e todas as indulgências foram dadas [a Kiev], então nós [Rússia] estamos prontos para tudo. E reagiremos de uma forma que não será bonita.”

A NATO está de facto em guerra com a Rússia

Para todos os efeitos práticos, a NATO já está em guerra com a Rússia: voos de reconhecimento sem escalas, ataques de alta precisão em campos de aviação na Crimeia, forçando a Frota do Mar Negro a mudar-se de Sebastopol, esses são apenas alguns exemplos. Com “permissão” para atacar até 500 km de profundidade na Rússia, e uma lista de vários alvos já submetidos por Kiev para “aprovação”, Putin declarou claramente o óbvio.

A Rússia está a travar uma guerra existencial pela sobrevivência da Pátria – o que tem feito repetidamente ao longo dos séculos. A URSS sofreu 27 milhões de baixas mas emergiu da Segunda Guerra Mundial mais forte do que nunca. Essa demonstração de força de vontade, por si só, assusta até à morte.o Ocidente coletivo.

O Ministro das Relações Exteriores, Sergey Lavrov – cuja paciência taoista parece estar a esgotar-se – acrescentou um pouco de cor ao Grande Quadro, trazendo à cena a literatura inglesa:

“ George Orwell tinha uma rica imaginação e previsão histórica. Mas, mesmo ele, não conseguia imaginar como seria um estado totalitário. Ele descreveu alguns de seus contornos, mas falhou em penetrar nas profundezas do totalitarismo que agora vemos, dentro da estrutura da 'ordem baseada em regras'. Não tenho nada a acrescentar. Não tenho nada a acrescentar. Os actuais dirigentes de Washington, que suprimem qualquer dissidência, ultrapassaram-no. É o totalitarismo na sua forma mais pura”.

Lavrov concluiu que “eles estão historicamente condenados”. No entanto, eles não têm realmente coragem de provocar a 3ª Guerra Mundial. Covardes de marca registada só podem recorrer a uma Guerra de Terror.

Aqui estão alguns exemplos. O SVR – A Inteligência russa – descobriu um plano de Kiev para encenar um ataque de míssil russo a um hospital ou jardim-de-infância em território controlado por Kiev. Os objetivos incluíam elevar o moral – em colapso – das AFU; justificar a remoção completa de quaisquer restrições a ataques de mísseis de longo alcance dentro da Federação Russa; e atrair o apoio do Sul Global – que entende amplamente o que a Rússia está a fazer na Ucrânia. Paralelamente, se essa descomunal falsa bandeira funcionar, o Hegemon vai utilizá-la para “aumentar a pressão” (Como? Gritando a plenos pulmões?) sobre o Irão e a Coreia do Norte, cujos mísseis provavelmente seriam os supostos perpetradores da carnificina.

Por muito que isto pareça rebuscado ao nível do Estupidistão Máximo, considerando a Demência Profunda que vai de Washington e Londres a Kiev, continua a ser possível, uma vez que a NATOstão detém, de facto, a iniciativa estratégica nesta guerra. A Rússia, por seu lado, permanece passiva. É a NATO que escolhe o método, o local e o momento para os seus ataques-chave decisivos.

Outro exemplo clássico da Guerra do Terror é o facto de o grupo jihadista e subproduto da Al-Qaeda, Hayat Tahrir al-Sham, na Síria, ter recebido 75 drones de Kiev, em troca da promessa de enviar um grupo de combatentes experientes do espaço pós-soviético para o Donbass. Nada de novo na frente do terror: O espião ucraniano Kirill Budanov - adorado no Ocidente como uma espécie de James Bond ucraniano - está sempre em contacto estreito com os jihadistas em Idlib, como noticiou o jornal sírio Al-Watan.

Preparando o remix da Operação Barbarossa

Paralelamente, tivemos o Secretário de Estado Adjunto dos EUA, Kurt Campbell - o russofóbico/sinófobo que inventou o “pivot para a China” durante a primeira administração Obama - a informar os burocratas seniores da UE e da NATO sobre a cooperação militar do novo eixo do mal, como é designado pelo Império: Rússia-China-Irão.

Campbell concentrou-se sobretudo no facto de Moscovo ajudar Pequim com conhecimentos avançados sobre submarinos, mísseis e sistemas furtivos, em troca de fornecimentos chineses.

É óbvio que a gente por trás do zombie, que não consegue nem descobrir uma maneira de lamber um sorvete, não tem conhecimento da colaboração militar interligada das parcerias estratégicas Rússia-China-Irão. Cegos como mil morcegos, tal gente interpreta a partilha pela Rússia do seu conhecimento militar com a China - até então fortemente guardado -, como “um sinal de crescente imprudência”. A verdadeira história preocupante por trás dessa mistura de ignorância e pânico é que não tem origem no zombie que não consegue nem lamber um sorvete. É o “bando Biden” que está, de facto, a trabalhar arduamente para pré-definir a trajetória da guerra por procuração na Ucrânia para além de janeiro de 2025 – independentemente de quem ganhe as eleições para a Casa Branca.

A Guerra do Terror deverá ser o paradigma geral - enquanto prosseguem os preparativos para a verdadeira guerra contra a Rússia, com o horizonte fixado para 2030, de acordo com as deliberações internas da própria NATO. É nessa altura que eles acreditam que estarão no auge da sua capacidade para avançar com uma versão remisturada da Operação Barbarossa de 1941.

Esses palhaços são congenitamente incapazes de entender que Putin não faz bluff. Se não houver opção, a Rússia recorrerá (itálico meu)  ao nuclear. Ainda que, atualmente, Putin e o Conselho de Segurança - não obstante a retórica incendiária de Medvedev - estejam empenhados na difícil tarefa de encaixar, golpe após golpe, para evitar o Armagedão.

Isso exige uma paciência taoista ilimitada — partilhada por Putin, Lavrov, e Patrushev — aliada ao facto de que Putin joga o GO japonês muito melhor do que xadrez, e é um tático formidável. Putin lê o manual demente do NATOstão como se fosse um livro de histórias infantis (de facto é). No momento fatídico em que se perspetivar o ganho máximo e em toda a linha para a Rússia, Putin ordenará, por exemplo, a necessária decapitação da serpente de Kiev.

O debate incessante e acalorado sobre o uso de armas nucleares pela Rússia depende essencialmente de o Kremlin considerar um ataque de mísseis da NATO como uma ameaça existencial.

Os neoconservadores e os zio-cons, bem como os vassalos da NATO, podem desejar uma guerra nuclear - teoricamente - porque, de facto, isso geraria um despovoamento maciço. Nunca devemos esquecer que o bando do Fórum Económico Mundial/Davos quer e prega uma redução da população humana a nível mundial na ordem dos 85%. O único caminho para isso é, obviamente, uma guerra nuclear. Mas a realidade é muito mais prosaica. Os cobardes neoconservadores e zio-cons - imitando o exemplo dos genocidas talmúdicos de Telavive - querem, na melhor das hipóteses, usar a ameaça de uma guerra nuclear para intimidar especialmente a parceria estratégica Rússia-China.

Em contrapartida, Putin, Xi e alguns líderes selecionados da Maioria Global, como o malaio Anwar, continuam a dar provas de inteligência, integridade, paciência, previsão e humanidade. Para o Ocidente coletivo e as suas elites políticas e bancárias terrivelmente medíocres, o que interessa é sempre o dinheiro e os lucros. Bem, isso também pode estar prestes a mudar drasticamente a 22 de outubro, em Kazan, na cimeira dos BRICS - quando deverão ser anunciados passos importantes para a construção de um mundo pós-unilateral.

O assunto do momento em Moscovo

Em Moscovo, há uma discussão generalizada sobre a forma de pôr fim à guerra por procuração na Ucrânia. A paciência taoista de Putin é fortemente criticada - não necessariamente por observadores informados com o conhecimento interno mais completo da geopolítica. Os críticos não compreendem que Washington nunca aceitará as principais exigências russas. Paralelamente, quando se trata da desnazificação total da Ucrânia, Moscovo acaba já por não se contentar com a existência de um mero regime “amigável” em Kiev.

Parece haver um consenso de que o Ocidente coletivo não reconhecerá de forma alguma a soberania da Rússia sobre a Crimeia, bem como tudo o que foi conquistado nos campos de batalha de Novorossiya. No final, a principal evidência é que todos os detalhes do plano de negociação da Rússia serão decididos por Putin. E eles  mudam a toda a hora. O que ele propôs - de forma bastante generosa - na véspera daquela patética cimeira de paz na Suíça, em junho, já não está em cima da mesa depois de Kursk.

Tudo vai depender, mais uma vez, do que acontecer no campo de batalha. Se - ou melhor, quando - a frente ucraniana se desmoronar, a piada hoje recorrente em Moscovo ganhará atualidade: “Pedro [o Grande] e Catarina [a Grande] estão à espera”. Bem, já não estarão à espera, porque estes foram os Grandes que incorporaram na Rússia, de facto, o que é o leste e o sul da Ucrânia.

E isso selará a humilhação cósmica da NATO. Daí a perpetuação do Plano B: nada de 3ª Guerra Mundial, mas uma implacável Guerra de Terror.

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