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domingo, 28 de janeiro de 2018

Duas ou três coisas sobre sexo e Hollywood

ASSÉDIO SEXUAL

Alberto Gonçalves

27/1/2018, 2:311.135

No instante em que escrevo, arriscando a ultrapassagem pelos acontecimentos, cada homem é suspeito, e provavelmente culpado, de praticar acções ou pensamentos pecaminosos face à sua semelhante.

Não aprecio lengalengas que tratam os homens e as mulheres como duas entidades perfeitamente distintas entre si e perfeitamente idênticas dentro de si. Reduzir o carácter de uma pessoa ou, no jargão em voga, a “identidade” ao “género” é recurso de adolescentes ou charlatães com falta de assunto. Conversas do estilo “os homens são de Marte, as mulheres de Vénus” dão vontade de enviar alguém para Saturno ou para o raio que o/a parta. E o movimento #MeToo é uma espécie de consagração desse tique enervante.

Há meses, Hollywood descobriu que certos cavalheiros do “meio” abusavam do respectivo poder para se aliviarem sexualmente com as senhoras que se punham, ou eram postas, a jeito. Antes tarde do que nunca. Pelo menos desde 1921, quando o então popularíssimo “Fatty” Arbuckle foi acusado de esventrar uma aspirante a actriz com uma garrafa de Coca-Cola, a indústria do cinema é fértil em animação de bastidores. Sob a histeria punitiva dos “media”, Arbuckle viu-se julgado, depois ilibado, e por fim profissionalmente arruinado.

No clima actual, o julgamento é imediato mas o desfecho é similar. Basta que X, soluçante, afirme ter visto o pénis de Y nos idos de 1992 para que Y seja responsável por perversões inomináveis e banido da sociedade decente. Não importa que, no mundo das fitas e no mundo cá fora, as matérias sexuais se mostrem particularmente pródigas em alegações falsas. O berreiro decidiu, está decidido: a necessidade de provas é um pechisbeque dispensável, o tipo de atitude que costuma inspirar belos episódios. No processo, quase no sentido kafkiano do termo, destroem-se vidas e carreiras. Por reflexo, lamento todos os inocentes. Por puro egoísmo de espectador, e por ser amigo de um amigo, lamento Louis C.K.

É plausível que haja violadores autênticos, a pedir penas sociais e judiciais sortidas. O chato é que, sem surpresas, muitas das mais empenhadas militantes da inquisição em curso conviveram jovialmente durante anos com muitos dos mais empenhados abusadores do ramo. Ao longo de décadas, os múltiplos talentos de Roman Polanski suscitaram apenas indiferença. E a sra. Meryl Streep, a figura que melhor representa o ridículo de Hollywood e, talvez, do Ocidente, manteve longa e frutuosa amizade com Harvey Weinstein, que hoje é, a acreditar nos “media” (eu sei, eu sei), o Demónio em forma de gente. Aparentemente, as proezas lúbricas do sr. Weinstein pertenciam ao domínio público e só se tornaram condenáveis no momento em que a condenação se converteu num espasmo colectivo e obrigatório.

Para cúmulo, no espasmo vale tudo e confunde-se tudo. Confunde-se estupros com festinhas no ombro, chantagens com piropos, violência com engates e, principalmente, mulheres que foram abusadas de facto com mulheres que fingem ter sido abusadas de modo a não perderem lugar na plateia dos linchamentos. É evidente que, ao valorizar-se vítimas imaginárias de crimes imaginários, acaba-se a desvalorizar-se vítimas reais de crimes medonhos. E acaba-se a colaborar no crime.

No instante em que escrevo, arriscando a ultrapassagem pelos acontecimentos, a situação é a seguinte: cada homem é suspeito, e provavelmente culpado, de praticar acções ou no mínimo pensamentos pecaminosos face à sua semelhante. A caça aos bruxos decretada pelas celebridades espalha-se pela América inteira e, alimentada por relatos sem confirmação, arrasa a título preventivo inúmeras criaturas. Vozes progressistas exigem a censura de filmes, livros, peças e pinturas em que a Mulher, com maiúscula, não é retratada segundo critérios específicos.

Como é que se chegou aqui, em Hollywood e no resto? A teoria divide-se. Uns sugerem a perversão (graçola não intencional) do feminismo original, que começou a exigir igualdade e termina a menorizar as pobres, ingénuas e desprotegidas fêmeas. Outros referem a progressão natural do “politicamente correcto”, agora em rédea solta rumo à demência. Há ainda os que lembram o ódio da esquerda à masculinidade, a tradição moralista do marxismo e diagnósticos assim discutíveis.

Se me permitem (que remédio), apresento, assaz sumariamente, a minha tese. Um pedacinho da história da humanidade é a história da repressão sexual, que antes de ser um produto das religiões é um produto da natureza humana. Mesmo sem a crença no divino, o homem – e a mulher, acrescente-se para fugir a equívocos – haveria sempre de arranjar maneira de crer no gozo em proibir o gozo alheio, na cama e onde calha. Não é a religião que tenta impedir-nos de comer sal ou bolachas. A vontade de limitar “excessos” paira por aí, à espera dos zelotas que a transformem na sua “causa”. Em Hollywood, território propenso a tarados de orientações várias, encontrou imensos.

Notas de rodapé

1. Consta que, este ano, a “taxa do audiovisual” aumentará 6%, agravando a conta da luz. É uma óptima notícia por dois motivos. Por um lado, porque confirma a prosperidade que tomou conta dos portugueses, hoje tão prósperos que podem suportar sem dramas, e até com certo gosto, qualquer dos inúmeros aumentos de impostos que em boa hora lhes despejam em cima. Por outro lado, porque permite aos cidadãos patrocinarem com verbas crescentes uma instituição como a RTP e adjacências, instituições cujo mérito está escarrapachado nas centenas de milhões que anualmente nos custam. Não consumo a RTP e não conheço quem o faça, mas não me custa nada, excepto uns euros por mês, dispensar uns euros por mês a fim de sustentar as maravilhas que sem dúvida por lá se cometem, vulgo o “serviço público”. Não o veria nem que me pagassem. Como não vejo, pago eu. Faz sentido.

2. E aquilo do sr. Lula? Alguém acredita que um socialista possa ter delapidado em diversos milhões o povo que tanto adora? Alguém acredita que um ex-sindicalista possa ser um rematado ladrão? Alguém acredita que o homem que cruzou o oceano para apresentar uma obra de José Sócrates possa estar no centro de um dos maiores esquemas de corrupção que o mundo conheceu? Eu não acredito. Para mim, é golpe.

Arruda dos Vinhos: Um vale encantado repleto de misticismo

Arruda dos Vinhos: Um vale encantado repleto de misticismo

26 JANEIRO, 2018

Arruda dos Vinhos: Um vale encantado repleto de misticismo

Quem já não ouviu ou utilizou a expressão ‘Bruxa d’Arruda’? Quem não conhece ou ouviu falar da ‘Erva Arruda’? Ambas são expressões que refletem, em grande medida, todo o misticismo que rodeia Arruda dos Vinhos…

Arruda dos Vinhos é um concelho do Oeste de Portugal, situado a cerca de 30 minutos de Lisboa.
É muito apreciado pelas suas verdejantes paisagens, pela sua gastronomia que atrai ao município inúmeros visitantes e pelos seus vinhos.
É ainda um concelho também repleto de misticismo…
De seu nome Ti’Ana, desempenhava o papel de curandeira ou ervanária, realizava tratamentos e concedia consultas. Também era conhecida por afastar o mau-olhado, tratar o quebranto e dar alegria a quem se encontrava na tristeza.
Para tal, eram utilizadas orações, leituras do azeite, receitas e ervas medicinais peculiares, onde a erva Arruda (que esteve na origem do nome da vila) tinha um papel de destaque, mas era acompanhada pelas malvas, as barbas de milho, a hortelã, as tádigas, entre outras.
Contudo, a Bruxa não foi apenas uma mulher, mas sim uma longa sucessão de mulheres, que foram passando os seus conhecimentos e saberes “secretos” de geração em geração, que poderão ter sido ou não herdados de certas Curandeiras da Ordem de Santiago.
A sua personalidade tão característica remeteu para inúmeras lendas, daí se ouvir dizer múltiplas vezes que Arruda é a terra da Bruxa.
A sua popularidade foi tão notável que, a 29 de Novembro de 1906, o Diário de Notícias lhe consagrou uma reportagem.
A Bruxa d’Arruda tem hoje um papel muito importante no que toca ao património imaterial e oral da Vila de Arruda dos Vinhos.
Tanto no artesanato como na gastronomia, a Bruxa d’Arruda está presente no quotidiano de quem ali vive ou simplesmente visita este concelho, uma dos mais antigos desta região.
Todos os anos, aquando do Mercado Oitocentista, que decorre no primeiro fim de semana de Junho, o misticismo e as lendas deste Concelho são relembradas e celebradas, pois em Arruda dos Vinhos, entende-se que só se constrói um futuro melhor se nunca nos esquecermos do nosso passado e das nossas raízes.

Vinho e gastronomia: outros predicados para visitar Arruda

A Bruxa d’Arruda, como foi referido, surge no quotidiano desta Vila até na gastronomia. As crenças e a sabedoria da Ti’Ana, revelam-se também em forma de doce: uma pequena torta feita à base de noz, doce de ovos e fios de chocolate, aguçam-nos o apetite para descobrir este concelho à mesa dos seus restaurantes.
Se pela tradição rural do concelho, as carnes de capoeira (coelho, galinha, galo, pato), são uma degustação secular em termos alimentares, há no menu de todos os restaurantes arrudenses a excelente carne produzida e transformada pelas empresas locais e o mais “fiel amigo” dos Portugueses, no que à mesa diz respeito, o Bacalhau.
Quem não conhece o famoso Bacalhau servido no ‘O Fuso’ sendo, atualmente, esta iguaria servida em quase a totalidade dos restaurantes deste Concelho, com uma qualidade ímpar, que leva a que os mesmos sejam dos restaurantes mais conhecidos da região e só por si façam deslocar a Arruda dos Vinhos inúmeros forasteiros.
E nada melhor para associar aos bons sabores da mesa que o bom néctar produzido nas encostas deste Vale Encantado.
Se a Erva Arruda esteve na origem do nome da localidade, os Vinhos também.
O concelho de Arruda dos Vinhos é atualmente o décimo concelho do país com mais área de vinha plantada, em termos percentuais, dados do IVV (Instituto da Vinha e do Vinho), e os seus solos, o seu clima, a par da excelência e sabedoria de quem trabalha a vinha faz com que os seus vinhos sejam reconhecidos mundialmente.
A Adega Cooperativa e a Quinta de S. Sebastião são os principais produtores do Concelho e, provando os seus vinhos, entendemos o porquê de Arruda ser dos Vinhos e como se diz pelo concelho os vinhos são de Arruda.
Juntamos nesta pequena viagem o imaterial e o sensorial.
O imaginário, as lendas, os ritos, associados aos bons sabores da comida e dos vinhos, deixam-nos a pensar que tão perto de uma grande metrópole como é Lisboa e a sua área metropolitana, encontramos um concelho onde a tradição se mistura com a modernidade, onde a ruralidade se mistura com a urbanidade.
Ao chegarmos a Arruda, vindos de Lisboa pela A10, encontramos um vale coberto de nevoeiro, sentimos pela primeira vez o misticismo deste Vale Encantado, com o dissipar do nevoeiro surgem as belas e verdejantes paisagens, que podem sempre ser usufruídas através do acompanhamento gastronómico e brindado com o seu excelente vinho.
Razões mais do que suficientes para descobrir este Vale Encantado a 30 minutos de Lisboa.

O Presidente de todos os afetos completa dois anos de mandato

26 JANEIRO, 2018

O Presidente de todos os afetos completa dois anos de mandato

Eleito há apenas dois anos, Marcelo Rebelo de Sousa tem marcado a diferença, por exercer o mandato com muita popularidade e espírito interventivo, estando em permanência no centro da vida social e política, analisando e deixando recomendações sobre todos os temas da atualidade.
O ex-comentador político e professor universitário de direito, que completou 69 anos no mês passado, foi eleito Presidente da República em 24 de janeiro de 2016, à primeira volta, com 52% dos votos, e tomou posse em 9 de março desse ano, após um ciclo de dez anos de Aníbal Cavaco Silva em Belém.

Logo a seguir às eleições presidenciais, elencou os seguintes princípios para o seu mandato: “Afetos, proximidade, simplicidade e estabilidade”.
Embora vindo da mesma área política, e sendo igualmente um antigo líder do PSD, o novo chefe de Estado distinguiu-se do seu antecessor, desde logo, no registo informal de proximidade com os cidadãos e na agenda intensa, em contraste com o estilo mais contido e formal de Cavaco Silva. Nos seus primeiros 100 dias em funções, Marcelo Rebelo de Sousa teve mais de 250 iniciativas e falou praticamente todos os dias, em regra várias vezes ao dia. Mostrou também diferenças na interpretação da função presidencial ao exercer um acompanhamento permanente e ativo da governação e da atividade parlamentar, ouvindo regularmente – de três em três meses – os partidos com assento na Assembleia da República, as confederações patronais e sindicais e o Conselho de Estado.

já convocou o conselho de estado oito vezes

Em menos de dois anos, já convocou oito vezes o Conselho de Estado. Em contraste, nos dez anos de mandato de Cavaco Silva, este órgão de consulta presidencial tinha-se reunido, no total, 12 vezes. Ainda não recorreu ao Tribunal Constitucional, mas utilizou seis vezes o poder de veto político, em relação a dois decretos do Governo, sobre acesso a informação bancária e o estatuto da GNR, e a quatro diplomas do parlamento, sobre gestação de substituição, os transportes do Porto e de Lisboa e alterações ao financiamento dos partidos.
Em janeiro de 2017, perante alunos de uma escola secundária, em Cascais, definiu-se como um Presidente da República que não recorre frequentemente ao Tribunal Constitucional como “uma espécie de defesa”, mas que exerce “sem complexo nenhum” o veto político, perante fortes divergências.
Enfrentando um quadro de bipolarização resultante das legislativas, o início do seu mandato foi marcado pela desdramatização da atual solução governativa minoritária do PS, suportada pelas forças à sua esquerda, e por um tom de distensão e descrispação, embora com reparos e alertas para a necessidade de mais crescimento e de salvaguarda do equilíbrio orçamental.
Defensor da estabilidade política, o chefe de Estado tem, em termos gerais, elogiado os resultados da governação e estado em convergência com o executivo chefiado por António Costa. Contudo, a sua atuação mudou na sequência dos incêndios de 2017, de forma agravada quando em outubro se repetiram dezenas de mortes.
Tornou-se mais vigilante e exigiu “um novo ciclo” com ação urgente, numa comunicação ao país em outubro do ano passado, em que também pediu uma clarificação do apoio ao Governo no parlamento, aconselhou um pedido de desculpas, sugeriu mudanças de equipas e prometeu usar todos os seus poderes para assegurar que o Estado cumpre o dever de proteção das populações.
O chefe de Estado classificou os fogos de junho e de outubro, que no seu conjunto mataram mais de cem pessoas, como “o ponto mais doloroso” da sua presidência e prometeu nunca mais largar o assunto, tendo decidido passar o Dia de Natal e o final do ano nos municípios mais atingidos.
No entanto, Marcelo Rebelo de Sousa teve de ser operado de urgência a uma hérnia umbilical, no dia 28 de dezembro, o que o obrigou a cancelar toda a sua agenda até 1 de janeiro, incluindo a deslocação às regiões atingidas pelos fogos prevista para a altura do fim de ano, e a abrandar o ritmo nas semanas seguintes. O Presidente da República tem apelado a acordos de regime setoriais, defendendo ao mesmo tempo a necessidade de um Governo e de uma oposição fortes, que sejam espaços alternativos – ideia que reiterou neste início de 2018, depois de ver Rui Rio ser eleito para a liderança do PSD, contra Pedro Santana Lopes.

mais de 30 visitas em matéria de política externa

No plano da política externa, já fez mais de 30 deslocações ao estrangeiro, a maior parte a países da Europa.
Em 2017, esteve em Madrid, Bruxelas, Andorra, Barcelona, Atenas, Malta, em curtas visitas oficiais ou conferências internacionais, e foi à posse do novo Presidente de Angola, João Lourenço. Além disso, dividiu as cerimónias do 10 de Junho entre o Porto e as cidades brasileiras de São Paulo e Rio de Janeiro – repetindo um modelo inédito iniciado em 2016 de celebração do Dia de Portugal junto das comunidades portuguesas no estrangeiro – e visitou os 140 militares portugueses em missão na Lituânia. Fez, até agora, oito visitas de Estado, a Moçambique, Suíça e Cuba, em 2016, Cabo Verde, Senegal, Croácia e Luxemburgo e México, em 2017, seguindo-se São Tomé e Príncipe, em fevereiro próximo. Em território nacional, no último ano, destacam-se as suas visitas às nove ilhas da Região Autónoma dos Açores, que percorreu em duas etapas.

Marcelo no seu espelho de selfies

por estatuadesal

(José Pacheco Pereira, in Público, 27/01/2018)

JPP

Pacheco Pereira

Os ciclos de amor e desamor políticos com o Presidente da República são isso mesmo, ciclos. Até aos incêndios e as reprimendas públicas que fez ao Governo, o Presidente era detestado à direita, que via nele uma muleta essencial da “geringonça”, e era afavelmente tolerado pela esquerda, que o via como inesperado aliado. Depois dos incêndios, passou a ser amado pela direita a tal ponto que foi a direita portuguesa a principal força “comemorativa” dos seus dois anos de Presidência. Antes via nele uma força perversa que funcionava atrás de António Costa por ódio a Passos Coelho, agora considera-o o grande disciplinador do Governo, que o impede de se deitar nos braços malditos do BE e do PCP.

Há depois uma terceira tese, que certamente não desagradará ao Presidente — é de que estas oscilações de simpatias e antipatias revelam a independência do seu mandato, nem dependente da esquerda, que governa, nem da direita, que é oposição. E, em anexo, uma quarta tese, muito vocal nos “homens do Presidente” que são comentadores em prime time, de que a sua enorme popularidade lhe dá uma força política própria, que o coloca por cima dos partidos e que em última instância lhe permite fazer literalmente o que quiser. Quem manda no país é ele, em união directa com o povo sem intermediários, que faz do Presidente o primeiro dirigente político genuinamente “popular” de há muito tempo a esta parte. Por último, uma humilde e solitária quinta tese, a minha, é de que nada disto é o que é, e apenas “parece” ser, porque não há verdadeiro escrutínio dos actos presidenciais e do seu significado e o Presidente, assim solto das amarras da crítica e da razão, faz uma política própria que tem aspectos positivos, mas também aspectos negativos e alguns mesmo mais do que negativos — perigosos.

Marcelo Rebelo de Sousa ganhou a Presidência por uma combinação de méritos próprios, uma intensa campanha conduzida na e pela comunicação social, por ele ser “um deles”, e uma conjuntura de cansaços e esperanças que teve o seu apogeu como momento de viragem em 2015 e lhe deu um país politicamente estável. Como já disse e repito, Marcelo não seria o Presidente que é sem ter por detrás uma conjuntura que todos imaginavam como altamente instável, mas que se revelou solidamente estável: a aliança política do PS com o BE e o PCP e mesmo o PAN. Pela primeira vez, havia uma alternativa à esquerda que podia competir com a tradicional aliança PSD-CDS, este grupo de partidos que funcionava como uma “frente de rejeição” do PAF, mudava a realidade nacional, pondo a direita longe de poder governar sem ter maioria absoluta. O risco de tal solução para todos envolvidos gerava uma moral de resistência, que hoje está já um pouco esbatida, mas que permitia assegurar que seriam ultrapassadas todas as dificuldades que poderiam pôr em causa a solução de governo.

Cavaco Silva fez tudo para que tal solução não fosse possível, Marcelo acolheu-a como favorável a uma estabilidade política de que ele faria parte e cujos frutos seria capaz, como foi, de recolher. Já era evidente na campanha que o terreno que desejava para a sua presidência era o da estabilidade política, e António Costa era o único que lho podia dar. Quando os primeiros resultados económicos favoráveis começaram a surgir, era ouro sobre azul e a colaboração entre Marcelo e Costa correspondia a uma respiração natural que irritava profundamente o PSD do Diabo.

Marcelo começou a ser o Presidente dos afectos, dos abraços, dos beijos, das selfies com enorme sucesso. Antes havia antipatia, quer pelo anterior Presidente, quer pelo Governo da troika, agora havia um período de um novo optimismo que precisava de um símbolo. O “povo” tinha um enorme cansaço, recusa e hostilidade para com Cavaco Silva, que faria de um qualquer seu sucessor que sorrisse uma vez por mês um génio de afabilidade. Marcelo sorriu quinhentas vezes por dia e conquistou o país. Mas a história não ficou por aí, porque ele sabe melhor do que ninguém que beijos, abraços e selfies só dão poder político se houver um adversário, se forem contra alguém. Não podia haver na cena política portuguesa dois optimistas, por isso passou a haver um que era “irritantemente optimista”, António Costa, e outro que era o príncipe dos afectos, sempre do lado do “povo” contra os poderosos, que é quem o “povo” quer sempre ao seu lado.

A tragédia dos incêndios foi o que mudou tudo. E mesmo que não apareça nas sondagens, mudou mesmo tudo. Não estou a dizer que o Presidente “usou” a tragédia para encontrar o contraponto que precisava para transformar os beijos, abraços e selfies em poder político duro — estou convencido que nos fogos no essencial a postura de Marcelo foi genuína e sincera; o que acontece é que a atitude do Presidente foi a certa na tragédia e a de Costa e do Governo a errada. E, se as coisas tivessem ficado por aí, o Presidente recolhia os méritos de uma vez por todas ter usado a sua personalidade e proximidade para sarar feridas, e o Governo recebia o demérito através de uma quebra do estado de graça que potenciará sempre qualquer coisa negativa que lhe aconteça. Mas a partir daí Marcelo passou a comportar-se como proprietário da dor dos portugueses, afirmando um poder político que extravasa as funções presidenciais. Assumiu comportamentos que são populistas — o que nele não era novidade, já os tinha tido como comentador — e passou a ter um aproveitamento pessoal dos beijos, abraços e selfies. Tudo isto já lá estava antes? Já, mas passou a funcionar como um contraponto de poder que é negativo para a democracia portuguesa, mais do que para o Governo.

Esses aspectos negativos são vários. O Presidente faz um contínuo meta-discurso sobre tudo o que acontece, seja na governação, seja na vida partidária, seja na Justiça, seja nas questões europeias, seja na cultura e, se esse metadiscurso era visto de forma benévola como a dificuldade de Marcelo-Presidente deixar de ser Marcelo-comentador, hoje é sujeito a uma interpretação que procura (e encontra) distanciações e reservas face aos outros poderes, seja o executivo, seja o legislativo.

Desde sempre critiquei essa pletora verbal, porque desgastava o poder da palavra presidencial para quando fosse necessária, mas hoje está-se noutro patamar e esse mesmo metadiscurso aparece agora como um conjunto de prevenções, de sinais, de avisos que, não sendo novo nos discursos dos anteriores presidentes, no caso de Marcelo ganha outra amplitude, porque vem mais em continuidade do que foi o seu discurso de comentador de décadas conhecido pelo seu cinismo, a propensão para a intriga e mesmo ajustes de contas nas antipatias próprias. Uma espécie de amnésia colectiva esquece que esta era a “imagem” de Marcelo antes de ser Presidente, e, se se pode mudar, nunca se muda tanto.

E o que torna perigoso esse processo é que, em vez de valores de audiências, hoje temos uma base muito mais complexa que é a da “popularidade” política pessoal e intransmissível. Numa altura em que as democracias estão sujeitas ao assalto populista, temos um presidente que não se coíbe de usar as armas dos políticos populistas modernos, feitos pela televisão, para cultivar uma “proximidade” cujo sucesso é sempre ser “contra” alguma coisa.

Os gregos antigos não se caracterizavam por matar por razões políticas. Os poucos assassinatos políticos ocorridos na Grécia fazem da Atenas democrática uma excepção quase única na história antiga e moderna. Mas um dos instrumentos principais da democracia ateniense, a expulsão da cidade, era usado contra todos os que pareciam ser muito “populares”, mesmo tratando-se de generais vitoriosos. Os atenienses, nessa experiência também única, que foi a democracia antiga, temiam o efeito para a saúde da sua democracia da popularidade, porque a consideravam perigosa para o poder dos cidadãos que na colina do Pnyx se reuniam e votavam.

Mesmo a contragosto de 80% dos portugueses que “amam” Marcelo, convém lembrar que a essência da democracia não é a popularidade, em particular nestes tempos tablóides.

Forbes considera Portugal “o novo destino para investir”

Revista considera o país um "reservatório de talentos", referindo-se à população jovem, especializada e grandemente desempregada. Infraestrutura de apoio ao empreendedorismo é também elogiada.


25 DE JANEIRO DE 2018, ÀS 11:37

Revista considera o país um "reservatório de talentos", referindo-se à população jovem, especializada e grandemente desempregada. Infraestrutura de apoio ao empreendedorismo é também elogiada.

Portugal está a tornar-se num destino europeu privilegiado para o investimento e para os negócios.A opinião é de Hugues Franc. O colunista da Forbes francesa destaca, como fatores positivos da nação lusitana, a população “jovem e especializada”, o setor imobiliário “acessível”, a rede aérea desenvolvida e a robusta infraestrutura de apoio às startups.

“Portugal tem uma população jovem e especializada, particularmente nos setores de engenharia, negócios e design”, começa Franc, referindo, no entanto, que 33% desses cidadãos estão desempregados. O colunista considera, por isso, que Portugal é um “reservatório de talentos à espera de se expressarem”.

Google, “a primeira” de várias gigantes a caminho de Lisboa

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Além disso, o setor imobiliário, isto é, a sua acessibilidade e o interesse que tem gerado junto de várias celebridades, é também realçado como fator para a afirmação de Portugal como novo destino de investimento. Em terceiro lugar, a revista elogia a rede aérea de que Portugal dispõe, considerando-a “desenvolvida”.

Portugal, o país das aceleradoras

De acordo com a Forbes, Portugal conta, neste momento, com mais de duas mil empresas emergentes (das quais, 34% são estrangeiras) e 121 incubadoras, que, a juntar aos programas de aceleração e apoio institucional, formam, segundo a publicação, uma infraestrutura robusta de suporte ao empreendedorismo.

Muitos encontros e conferências são realizadas regularmente, permitindo que as comunidades de tecnologia e startups floresçam”, assinala ainda Hugues Franc. Destaque também para a “facilidade de acesso ao investimento”, já que, segundo o colunista, o capital de risco anda de olho no ecossistema português.