Luís Marques Mendes
04 de março de 2018, às 21:20
As notas da semana de Marques Mendes nos seus comentários na SIC. O comentador fala sobre o crescimento da economia, o momento positivo de António Costa, o congresso do CDS, a reviravolta no Montepio e a Cimeira Portugal/Angola.
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ECONOMIA A CRESCER
O INE divulgou esta semana os dados do crescimento da economia em 2017 (2,7%). O que há a dizer de mais importante?
a) Primeiro: um excelente resultado. O melhor crescimento desde o ano 2000.
b) Segundo: um crescimento saudável e sustentado, porque alicerçado no investimento e nas exportações.
c) Terceiro: como dizia o Jornal de Negócios, numa síntese muito feliz, "Temos um Governo de esquerda que põe a economia a crescer com a receita da direita". Isto porque o modelo de crescimento fundado no investimento e nas exportações era o modelo de Passos Coelho e não o modelo prometido por António Costa.
d) Quarto: para além do mérito dos portugueses, devemos agradecer à Europa esta onda de crescimento – é que não é só Portugal a crescer. É toda a União Europeia. E a maioria dos países da UE até cresce mais que Portugal.
Mesmo assim, se tivéssemos que atribuir um Óscar, eu diria que a economia portuguesa merece o Óscar do Melhor Filme em 2017. Não é um best seller mas é um filme de sucesso.
COSTA EM ALTA
Esta foi mais uma boa semana para António Costa. O PM está em alta.
a) Está em alta na governação – Por causa dos bons resultados da economia e do emprego;
b) Está em alta na luta política – Não tem uma oposição que lhe cause verdadeiras dores de cabeça;
c) Está em alta em relação aos seus parceiros de coligação – Tem-nos controlados;
d) Está em alta por causa dos acordos a fazer com o PSD – Vai ficar como o líder moderado que dialoga com todos, à esquerda e à direita;
e) Está em alta porque o PSD e o CDS se preparam para lhe dar uma bênção eleitoral – irem em listas separadas às próximas eleições.
O PSD e o CDS deram esta semana o sinal de que concorrerão separados às eleições.
Isto é um erro enorme. Desta forma, o PS tem as eleições ganhas. Só falta saber se tem maioria absoluta.
Se fossem coligados, PSD e CDS poderiam ter, no mínimo, 40% dos votos e ter um élan para poderem tentar a maioria. Separados, dificilmente o PS perde o 1º lugar.
Se fossem coligados, PSD e CDS teriam sempre, com os mesmos votos, mais deputados do que terão concorrendo separadamente – o sistema eleitoral beneficia os blocos maiores
Como diz António Capucho, um especialista em leis eleitorais e apoiante de Rio, concorrer em separado é perder para o PS.
Conclusão: decididamente, António Costa é um homem com sorte. Em noite de Óscares, justificava o Óscar de Melhor Actor Principal – une a geringonça; mete no bolso os seus parceiros; dialoga com todos; e beneficiado crescimento da economia apesar de pouco ter feito para isso.
O DEBATE NEGRÃO/COSTA
Esta semana houve dois momentos relevantes na relação do PSD com o Governo – o debate Costa/Negrão e o início do diálogo em matéria de fundos e descentralização.
Debate quinzenal – Foi o baptismo de Fernando Negrão.
a) Na forma, o líder parlamentar do PSD não esteve brilhante. Tem um estilo civilizado e não trauliteiro. Mas falta-lhe acutilância e combatividade.
b) No conteúdo, esteve bem. Surpreendeu ao escolher como tema forte a questão do Montepio (e em política surpresa é sempre positiva); colocou António Costa à defesa (o tema é incómodo para o Governo); e ainda ameaçou com um inquérito parlamentar se o negócio avançar.
Acordos Governo/PSD – Foi o pontapé de saída para o diálogo.
Apesar de muito criticado por esta relação de diálogo com o Governo, acho que por aí as críticas a Rui Rio são injustas:
a) Primeiro, porque acordos PS/PSD em matéria de Fundos Estruturais e Descentralização não têm novidade. Já sucederam no passado.
b) Segundo, porque são óbvios e naturais. A descentralização deve ser vista como uma questão de regime; e, quanto aos fundos, uma posição conjunta dos dois partidos dá mais força a Portugal para em Bruxelas negociar um novo envelope financeiro de 25 mil milhões de euros de Fundos para os próximos anos.
Problema central do PSD – Ausência de oposição
Posto isto, o problema central do PSD não está no Grupo Parlamentar nem nos acordos com o Governo. Está, sim, na falta de oposição ao Governo.
a) Rio já foi eleito há quase dois meses. Quase dois meses depois, o PSD continua sem fazer oposição: não há uma agenda de oposição; uma iniciativa de oposição; uma causa de oposição ao Governo. A ausência do PSD no debate nacional sobre a saúde é paradigmático.
b) Depois do Congresso, o PSD devia estar virado para fora. Afinal, está virado para dentro. Devia estar politicamente ao ataque. Está à defesa e a discutir mercearia política.
c) E isto tem 3 riscos fortes:
O risco de divisão interna (só com acção se faz a unidade);
O risco de perder para o CDS a liderança da oposição;
O risco de o PSD ficar eleitoralmente ensanduichado – perder votos à direita para o CDS e ao centro para o PS.
d) Em matéria de Óscares, o PSD só merecia o Óscar dos Efeitos Especiais – É Elina Fraga; é a guerra com os deputados; ping-pong das críticas internas. Não dá votos mas gera efeito especial.
O CONGRESSO DO CDS
O Congresso do CDS do próximo fim de semana surge num dos melhores momentos de sempre do partido:
a) O CDS não sofreu tanto quanto o PSD o desgaste de ter estado no Governo;
b) O CDS ultrapassou com mais facilidade do que se pensava a saída de Portas;
c) O CDS está unido e motivado;
d) O CDS sente que tem espaço para crescer.
Assunção Cristas tem um grande mérito neste balanço.
a) Teve um acto de coragem que lhe rendeu votos e prestígio – a candidatura a Lisboa. Ganhou estatuto.
b) Tem uma imagem que só joga a seu favor – imagem de simpatia, ambição e capacidade de trabalho.
c) Não tem anti-corpos no PSD, o que lhe permite conquistar votos no PSD com mais facilidade do que sucedia com Paulo Portas.
d) Há 2 anos era considerada uma líder de transição. Dois anos depois, está consagrada como líder.
O que vai ser o Congresso? Sem nunca falar no PSD, vai ser um Congresso para marcar diferenças em relação ao PSD. Assunção Cristas quer:
a) Mostrar que o CDS está unido (por contraste com o PSD);
b) Mostrar que o CDS lidera a oposição (por contraste com o PSD);
c) Mostrar que o CDS foi quem mais iniciativas de oposição apresentou no Parlamento (por contraste com o PSD);
d) Mostrar que o CDS tem uma alternativa para o futuro (por contraste com o PSD);
e) Definir que o CDS concorrerá em listas separadas às eleições europeias e legislativas (para se autonomizar do PSD);
f) E até surpreender – Assunção Cristas está a tentar colocar nos órgãos nacionais 50% de mulheres. Ou seja, metade homens, metade, mulheres.
Numa palavra, em noite de Óscares, eu diria que Assunção Cristas justificaria o Óscar da Melhor Actriz Principal. Com um senão: a sua estratégia de concorrer separada do PSD é uma notável ajuda para o PS ganhar as eleições.
REVIRAVOLTA NO MONTEPIO
Há 2 meses eu disse aqui que, se a Misericórdia de Lisboa comprasse 10% do capital do Montepio por 200 milhões de euros (o plano que então estava em cima da mesa), o caso acabaria num inquérito parlamentar e numa investigação judicial, por suspeitas de gestão danosa.
Dois meses depois, já não vai ser necessária nem investigação judicial nem inquérito parlamentar. Houve uma reviravolta no processo e a Misericórdia foi obrigada a recuar. Três sinais dessa reviravolta:
a) A decisão, segundo o Provedor, era para ser tomada em Janeiro. Estamos em Março e ainda não há decisão, porque tudo mudou.
b) A avaliação do Montepio feita pelo Haitong ficou muito abaixo dos 2 mil milhões. Tão abaixo que a Misericórdia escondeu o valor exacto.
c) A indicação de Manuel Teixeira para Administrador Não Executivo é outro sinal de que a operação inicial não se faz. Se se fizesse, a Misericórdia teria um Administrador, sim, mas Executivo.
Agora, o propósito é salvar a face. Como?
a) Fazendo a Misericórdia de Lisboa entrar mas com uma participação muito mais modesta;
b) Fazendo a Misericórdia de Lisboa entrar mas em conjunto com outras Misericórdias, as quais podem entrar mas com participações meramente simbólicas (mil euros é a hipótese em cima da mesa).
c) Em conclusão: uma má notícia para o Governo, que estava empenhadíssimo neste negócio. Uma boa notícia para o país.
A CIMEIRA PORTUGAL/ANGOLA
Segundo O Expresso, o Presidente da República vai apadrinhar uma importante cimeira empresarial Portugal/Angola. É uma boa iniciativa e um bom sinal. Isto significa que a relação entre Portugal e Angola está mais calma e mais desanuviada, a caminhar para a normalidade.
E isto é tão mais importante quanto:
a) Angola está a viver uma mudança política enorme, onde se nota, por exemplo, uma grande abertura no sector da comunicação social;
b) Angola está a iniciar um grande processo de mudança no plano económico. Um exemplo: amanhã entra em vigor uma lei histórica para favorecer o investimento estrangeiro. Até agora, um estrangeiro que quisesse investir em Angola tinha obrigatoriamente de ter um sócio angolano, com um mínimo de 35% do capital. A partir de agora, essa exigência acaba. Uma boa notícia para os empresários portugueses;
c) Angola está a ganhar credibilidade na comunidade internacional, em grande medida fruto do novo ciclo político que foi aberto com a presidência de João Lourenço;
d) Em Angola vê-se na população uma atmosfera de grande esperança e de muita expectativa.
e) Os grandes líderes europeus têm encontros agendados com o Presidente Angolano – o Presidente do governo espanhol; o Presidente da República de França e a Chanceler alemã.
Se todos querem acompanhar de perto a nova Angola que está em construção, Portugal, por maioria de razão, não deverá desperdiçar este novo leque de oportunidades que se abre em Angola.