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quarta-feira, 7 de março de 2018

O relatório secreto sobre os riscos na Ponte 25 de Abril

Filipe Luís

FILIPE LUÍS , Editor Executivo
7 de Março de 2018

Foi preciso a denúncia da VISÃO, que faz do assunto tema principal de capa, alertando para a extrema gravidade do estado da estrutura da Ponte 25 de Abril, para que as obras, que já eram urgentes há seis meses, tivessem luz verde do Ministério das Finanças. Na véspera em que a VISÃO divulga um documento secreto do Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC), no qual se alerta para a necessidade urgente de obras estruturais na Ponte 25 de Abril, que, caso nada se faça, corre o risco de colapso, as Infraestruturas de Portugal anunciam obras, nos próximos dois anos, com um orçamento de 18 milhões de euros. O caso foi detetado há três anos e pelo menos há dois que as Infraestruturas de Portugal vêm pedindo a intervenção, devido às fissuras graves na estrutura analisadas pelos técnicos. Desde então, a situação da principal ponte do País foi degradando-se até ao alerta recente do LNEC. Confrontado pela VISÃO, nesta semana, o Ministério do Planeamento e das Infraestruturas reconheceu, oficialmente, a gravidade da situação,remetendo para as Finanças o desbloqueamento das verbas necessárias, uma solicitação que estava há meio ano, sem resposta, no ministério tutelado por Mário Centeno. Confrontado pela VISÃO, o gabinete do ministro das Finanças prometeu uma reação em tempo útil, para até ao fim do dia de terça-feira, antes do fecho da edição da revista. Perguntas da VISÃO: era verdade que o pedido para o desbloqueamento de verbas de 20 milhões de euros estava pendente nas Finanças? Quando haveria uma decisão?. Ora, apesar dos contactos insistentes, durante a tarde e noite de terça-feira, os telefonemas não foram atendidos e os esclarecimentos não foram prestados. Milagrosamente, porém, a verba parece ter sido desbloqueada horas depois. Todo o relatório secreto, esta semana, na nossa edição em papel.
Conforme explicamos no extenso trabalho da editora-executiva Catarina Guerreiro, que esteve três semanas a investigar o tema, 
há fissuras, brechas e “parafusos” sem aperto a necessitar de intervenção imediata. Aliás, o relatório aconselha restrições ao tráfego de pesados e de comboios de mercadorias.

Quantas direitas cabem neste CDS? O que eles vão dizer no congresso

CDS-PP

7/3/2018, 14:42

Cristas quis despir o CDS de "rótulos" para destronar o PSD. Mas no próximo congresso será confrontada com as velhas tensões do partido. Onde está o CDS: ao centro, à direita ou a meio-caminho?

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Uma líder mais pragmática do que ideológica, galvanizada pelo resultado autárquico em Lisboa e convicta de que pode ser poder, acabando com o voto útil e com o bipartidarismo. Assim se apresentará Assunção Cristas no 27º Congresso do CDS, que decorre este fim de semana, em Lamego. Num partido habituado a gerir as tensões que o moldaram — se é de centro, centro-direita ou de direita, se é centrista, democrata-cristão ou liberal, se é europeísta, eurocético ou eurocalmo (ou se é tudo isto ao mesmo tempo) –, a líder do CDS parece atirar a discussão identitária para segundo plano e unir o partido em torno de um objetivo comum: afirmar-se como a única alternativa de “centro-direita” ao “Governo das esquerdas unidas”. E ainda que todos no CDS concordem com a emancipação do CDS face ao PSD e com o combate cerrado ao PS, nem todos concordam com o caminho definido pela líder do partido.

A estratégia de Assunção Cristas foi vertida na moção de 16 páginas que leva ao Congresso: afirmar o CDS como um partido interclassista, capaz de concorrer diretamente com PSD e PS. A líder entende que para conseguir isso é preciso secundarizar a discussão ideológica e romper de vez com “os rótulos que foram sendo colados injustamente” ao partido, segundo escreve na sua moção. Ao longo do documento estratégico, nunca se refere à matriz “democrata-cristã” do partido e sublinha esse apelo ao pragmatismo, desafiando os militantes a focarem-se mais na “solução do problema e menos na ideologia“.

Esse desprendimento ideológico já lhe valeu críticas dos setores mais conservadores do partido, com o ex-deputado Raul Almeida, por exemplo, a desafiar Assunção Cristas a assumir a “morte” do CDS como partido democrata-cristão. A líder do CDS desvalorizou as críticas, lembrando que este documento estratégico era a continuação do que foi aprovado há dois anos e que, mais do “proclamar a ideologia”, é urgente encontrar soluções para os problemas reais. E incluir todos:

Queremos um CDS que já não é visto como partido ‘dos ricos’, ‘dos patrões’ ou ‘dos quadros’, mas é o partido de todos, de todas as idades, homens e mulheres, rapazes e raparigas, que valorizam mais o trabalho, o mérito, as ideias, o afinco, a credibilidade, e, sobretudo, a imaginação, a força criativa e o entusiasmo. É preciso que cada um de nós possa e saiba explicar que não há nada intransponível, que o ‘vocês nunca lá chegam’ está a passar à história. Que o voto útil acabou, que o voto de cada um é cada vez mais livre”, escreve Cristas na moção.

Se quer ser poder, conclui Cristas, o CDS tem de se abrir a “todos” e “ultrapassar os limites construídos ao longo” da sua “curta história democrática”. E “todos”, insiste a líder do CDS, “são todos” mesmo: “Os  de dentro do partido e os de fora, que se interessam pelo CDS e veem em nós uma oportunidade de mudança apelativa, credível, moderada, sensata”, explica a líder do partido na moção. Sem agrilhoar o partido a discussões ideológicas, Cristas quer levar a votos um CDS de “centro-direita”, capaz de agregar eleitores da direita e o do centro em torno de um projeto comum, necessariamente menos ideológico, inevitavelmente mais pragmático.

Esta visão de Cristas não é inteiramente subscrita pelas outras moções que vão ser discutidas no Congresso do partido. Há quem defenda o reposicionamento ao centro, há quem peça o regresso do CDS às origens democratas-cristãs e há quem exija a afirmação do partido como “primeira força à direita”. Se Assunção Cristas pediu pragmatismo, outras sensibilidades no CDS responderam-lhe com mais ideologia.

Olhando para as sete moções estratégicas globais alternativas à de Assunção Cristas, há dois traços transversais a todas documentos: a recusa do federalismo europeu e da subalternização ao PSD. Fora isso, há propostas tão diferentes como a penalização do aborto,a revogação do casamento homossexual, a reposição do serviço militar obrigatório, a restrição do direito ao divórcio ou o combate contra a eutanásia. Também há quem defenda a revisão do papel do Tribunal Constitucional, a limitação do número de deputados ou a atribuição do direito ao voto aos 16 anos. Que CDS é este além-Cristas?

Penalizar o aborto e revogar o casamento homossexual

São apenas duas das muitas propostas que integram a moção apresentada pela Tendência Esperança em Movimento (TEM), uma corrente interna do CDS, que tem como primeiro subscritor Abel Matos Santos. Assumindo sem rodeios que querem projetar o CDS como “um partido de causas, assentes nos valores e princípios da democracia-cristã”, os subscritores desta moção não têm dúvidas: “[É preciso] constituir alternativas preferíveis às opções que vão sendo impostas à sociedade através das esquerdas”.

Por isso, além da penalização do aborto e da revogação do casamento homossexual, a TEM defende ainda que a lei que permitiu a adoção de crianças por casais do mesmo género deve ser revogada e que as situações de divórcio por decisão unilateral devem ser restringidas.

Paralelamente, os subscritores desta moção defendem ainda a reposição do serviço militar obrigatório, a “restrição de critérios de aquisição da nacionalidade portuguesa a não nascidos no território nacional” e o “aumento da moldura penal nos crimes contra as pessoas, comparativamente aos crimes contra o património”.

Esta tendência defende também a revisão da Constituição que permita, entre outros aspetos, a alteração do papel do Tribunal Constitucional: “Justifica-se a existência de um Tribunal Constitucional? Ou substitui-lo por secção específica do Supremo?”, perguntam os subscritores. Também defendem a limitação de mandatos para todos os titulares de cargos políticos e a reforma do sistema político e eleitoral, com a criação de um “sistema misto com círculos uninominais, complementado com um círculo nacional de compensação, para as eleições legislativas”.

Os proponentes desta moção também têm ideias para consumo interno: à cabeça, a “criação de uma plataforma política alargada” que inclua, por exemplo, o PPM, MPT, PPV (partido pró-vida), e independentes, “como forma de agregar a direita e abrir ao centro direita e ao centro”; e, por exemplo, que os candidatos dos partidos à Assembleia da República sejam eleitos pelos militantes em eleições “primárias diretas”.

Combater o “centrão” e liderar à assumidamente direita

Ao contrário da estratégia enunciada por Assunção Cristas, a estratégia de Juventude Popular é marcadamente mais ideológica do que a da líder democrata-cristã. A jota, liderada por Francisco Rodrigues dos Santos, não tem dúvidas em defender que o CDS se deve assumir como a “direita que conquista o centro, que lhe concede identidade e sabe imprimir-lhe rumo” e não pertencer a um “centro que toma conta da direita, a descaracteriza e neutraliza”.

Uma viragem à direita assumida e descomplexada, defende a moção “Da JP para o País”. “O estatuto do CDS, sustentado pelo notório crescimento das novas gerações, é o de primeira força política à direita, o verdadeiro contra-peso das esquerdas e a principal alternativa coerente ao Partido Socialista”, pode ler-se.

O documento estratégico assinado pela Juventude Popular rejeita “a ilusão do ‘centrão’” e não deixa de criticar implicitamente a estratégia assumida por Rui Rio e pelos seus apoiantes, recordando, sem nunca a atribuir, a expressão utilizada por Manuela Ferreira Leite, que sugeriu que o “PSD devia vender a alma ao diabo para pôr a esquerda na rua”.

A equidistância dos polos, própria dos que apregoam “vender a alma ao diabo” a preço de saldo, mais não é do que do que defender, no domínio das ideologias e do pragmatismo, tudo ao mesmo tempo, o mundo e o seu contrário, no fim de contas, não advogar rigorosamente nada digno de credibilidade. A vertigem pelo centro dos interesses confunde-se com a lógica do poder pelo poder, no fundo, pela divisão do Estado pelos clientelismos partidários, pela rejeição dos valores, a apologia do relativismo, em nome da transação de favores sufragada em urnas através de proposta fraudulenta apresentada aos eleitores”, escreve a JP.

Se Assunção Cristas defende que é preciso abrir o partido a “todos”, numa estratégia de sedução alargada, Francisco Rodrigues dos Santos parece mais restritivo. Ou estão com PSD, que não respeita o eleitorado de centro-direita, ou “se deixam convencer pela virtude da proposta do CDS, no quadro do qual este se afirma por aquilo que é e não pelas concessões que faz a princípios que estão no seu ADN”, defende.

O desejo de emancipação face ao PSD é, aliás, uma constante ao logo de toda a moção. “O CDS não nasceu para ser mordomo, satélite, muleta ou subalterno de nenhum outro partido político. Tem dignidade autónoma e potencial para aspirar a mais (…). O CDS só tem um caminho: apostar em quebrar o bipartidarismo instalado; (…) deve dar procedência a uma estratégia que promova a demarcação programática do socialismo democrático e da social-democracia, sinónimos no capítulo da teoria política, ao passo que assume a liberdade de não ser sucedâneo de nenhum adversário ou concorrente, tão pouco a sua respectiva ‘marca branca'”, nota a JP.

Muito voltada para o combate à precariedade laboral, sobretudo entre os mais jovens, os jotinhas defendem nesta moção a redução do IRC e da TSU para empresas que contratem jovens trabalhadores e a adoção de um contrato único, à semelhança do que acontece na Dinamarca. A JP sugere ainda um sistema de indemnizações em caso de despedimento, idêntico ao modelo austríaco, “financiado por contribuições mensais feitas pelos empregadores no valor equivalente de 1,53% do salário bruto do trabalhador, realizadas a partir do segundo mês do contrato e que acabam quando este terminar”, sendo que essas “contribuições permanecem num fundo até ao fim do contrato ou até o trabalhador se reformar”.

A JP defende ainda um combate determinado à legalização da eutanásia, ou, como classificam, “um homicídio a pedido da vítima“. A rejeição da eutanásia é, aliás, uma ideia transversal a todas as oito moções que vão ser avaliadas no Congresso do PSD.

Combater a “prepotência do PSD” e assumir o centro

Foi talvez o maior (e o único) crítico de Assunção Cristas desde que a ex-ministra assumiu a liderança do partido, em 2016. Pedro Borges de Lemos, líder do movimento CDS XXI, uma corrente informal de opinião dentro do CDS, vai a Lamego bater-se por um partido com “vocação de poder“, “independente” e “autónomo de qualquer outra força política”.

Na moção “Futuro no Presente”, o advogado e membro da comissão política da concelhia do CDS de Lisboa, defende o “reposicionamento do CDS no espectro, reafirmando-o como um partido de centro, e tornando-o finalmente num grande partido democrata-cristão interclassista”. O maior destaque, ainda assim, vai para a recusa de qualquer aliança com o PSD, um parceiro “prepotente”, que só se aproxima do CDS quando lhe convém.

“O CDS tem de ser capaz de liderar todo o espaço do centro-direita em Portugal, tornando a direita num espaço plural, como acontece hoje com a esquerda, e disputando eleitoralmente esse espaço com o PSD. Para isso, o CDS tem de ser autónomo e independente do PSD, que concorre verdadeiramente com o nosso partido e que se aproxima de nós quando lhe é conveniente para chegar ao poder, tratando o CDS, muitas vezes, com prepotência“, pode ler-se na moção estratégica.

Pedro Borges de Lemos defende, por isso, que o CDS se afirme “na diferença”, mas, sobretudo, “numa oposição construtiva, responsável, frontal e dialogante”, com “coerência, com sentido de Estado e sem desvios de oportunismo político“, proporcionando “condições para pactos de regime em áreas estruturais”. Uma posição já assumida em dezembro, quando, em declarações ao Observador, assumiu uma possível aliança com o PS e criticou Assunção Cristas por hipotecar qualquer tipo de diálogo com António Costa.

Nessa mesma ocasião, Borges de Lemos acusava Cristas de incoerência em diversas matérias, como no casamento homossexual, nas barrigas de aluguer, na despenalização do aborto ou no referendo à eutanásia. Na moção que leva ao congresso, o democrata-cristão recupera algumas dessas bandeiras e assume-se abertamente contra o aborto e contra o referendo à eutanásia.

Quanto à vida interna do partido, o advogado defende a introdução de eleições diretas para a escolha do líder do partido e a obrigatoriedade de todos os deputados serem residentes ou naturais da região por onde são eleitos. Pedro Borges de Lemos propõe ainda que o CDS se bata pela limitação de mandatos para qualquer cargo eleitoral e pelo fim da possibilidade de acumulação de mandatos parlamentares com cargos executivos locais.

Natalidade, “militante digital”, voto aos 16, Instastories e memes

A distrital do CDS/Lisboa, liderada por João Gonçalves Pereira, vai apresentar uma moção global em que defende, entre outros aspetos, a abertura do partido a simpatizantes — ainda que não fale em primárias para a escolha do líder — e o reforço do aparelho democrata-cristão. Objetivo número um: tornar o CDS no “maior partido de centro e de direita” e numa verdadeira “alternativa ao bloco central”.

Os subscritores da moção “Portugal: Compromissos e Gerações” defendem que, para isso, o CDS tem de começar a trabalhar antes mesmo das eleições, apostando de forma decidida na reorganização das estruturas locais, na renovação digital do partido e na criação das figuras do “militante simpatizante”, num esforço de abertura do CDS à sociedade, sobretudo à franjas mais jovens, e do “militante digital”, que teriam acesso a espaços digitais criados para apresentar, debater e votar propostas ao Conselho Nacional.

Estes novos militantes teriam acesso livre a conteúdos multimédia produzidos pelo próprio partido e pela JP, como fóruns de discussão, fact checks, sondagens, memes, instastories ou quizzes sobre “o espólio, património e história do CDS”. Aos militantes com quotas pagas teriam direito a uma “área de acesso reservado”, onde poderiam “gerir o seu perfil, atualizar dados, configurar a informação que pretende receber (georreferenciada), pagar as quotas online e aceder primeiro a informação privilegiada, convocatórias e material de divulgação interna, fóruns de debate internos, formação, vídeos e chats em tempo real com as estruturas”.

Muito centrada nos desafios da natalidade e no compromisso com as futuras gerações, a distrital do CDS/Lisboa defende “a afetação de 4% do PIB a políticas de incentivo e protecção da natalidade durante 10 anos, devendo este valor situar-se nos 3,5% nos anos seguintes”, a redução do IRS em função do número de dependentes e a progressiva redução de horário em função do número de filhos. Para atrair mais jovens para a política, a moção subscrita por João Gonçalves Pereira propõe ainda que se permita aos jovens com 16 anos votar nas eleições autárquicas.

Apostar no interior, abrir o CDS

Na moção “O CDS somos todos nós”, José Lino Ramos, antigo secretário-geral do CDS, é claro: “Este é seguramente o momento de afirmar o CDS, de regressar às suas origens e de afirmar a democracia-cristã“. “Uma Democracia Cristã renovada com os ensinamentos e a evolução do pensamento do Papa Francisco em temas basilares da nossa sociedade, e que nos são tão caros, como o direito à vida, ao casamento, à família, à adopção, entre outros”, defende.

Com um documento estratégico muito voltado para a defesa do interior, Lino Ramos propõe uma decidida e competente “descentralização de meios e competências” e, por exemplo, a “isenção total” em sede de “IRC, IRS e derrama” para empresas que se fixem no interior.

Mas são as propostas para o funcionamento interno do partido que mais rutura causam com a linha dominante no partido. Para Lino Ramos, “é chegado o momento de se encontrar um modelo de participação direta dos militantes nas escolhas dos seus representantes nos vários órgãos políticos, de os militantes das estruturas locais escolherem diretamente os seus candidatos às autarquias, ao parlamento e aos vários níveis de representação política”.

Na prática, o método defendido por Lino Ramos acabaria com os congressos eletivos no CDS, fazendo com que os líderes do partido fossem escolhidos pelos militantes em eleições diretas (como, aliás, já aconteceu). Mais: que fossem as concelhias e as distritais do CDS a escolherem diretamente os candidatos às câmaras municipais e ao Parlamento, sem que essa escolha estivesse condicionada pela intervenção da direção do partido.

Controlar a imigração, recuperar o serviço militar obrigatório e investir na Defesa

Miguel Mattos Chaves, militante do CDS, vice-presidente da Comissão Europeia da Sociedade de Geografia e auditor de Defesa Nacional, é o autor da moção “Um Serviço a Portugal”, em que desafia o partido a instituir um “governo sombra” com “porta-vozes sectoriais/ministeriais para cada pasta da governação”.

Dizendo-se “farto” de ver o CDS “como ‘muleta’ inútil do PSD, cuja prática e ideologia nada têm a ver” com o partido democrata-cristão, Mattos Chaves pressiona Assunção Cristas a recuperar as origens do CDS, o “partido dos contribuintes” e dos “reformados”, humanista personalista, meritocrata, defensor da livre iniciativa privada e protetor dos mais fracos.

Com propostas em todas as áreas da governação, da economia (ex: redução do IRC para empresas que se fixem no interior) ao ambiente (ex: proibição de venda e importação de garrafas e sacos de plástico), Mattos Chaves defende também o regresso do serviço militar obritagório (tal como Abel Matos Santos), o reforço da despesa orçamental com a Defesa e, ainda, mais controlo à imigração. Para este democrata-cristão, os imigrantes que entrem de forma ilegal no país devem ser imediatamente expulsos do país, assim como os imigrantes legais, em caso de crime.

“Reflitam, pensem, sobre que vos têm dito. Desafio-vos a pensar sobre este tema. Tirem as Vossas próprias conclusões”, desafia Miguel Mattos Chaves.

Rever a Constituição e reformar o sistema eleitoral

Não é um exclusivo da moção “Novos Tempos, Novos Desafios, o Mesmo Propósito – Servir Portugal” mas é talvez a que leva mais longe a reforma do sistema eleitoral. No documento estratégico que leva ao Congresso, a Federação dos Trabalhadores Democratas Cristãos (FTDC) propõe quatro alterações profundas:

  • a redução do número de deputados;
  • que os partidos só fossem responsáveis pela eleição de 2/3 dos parlamentares;
  • que a eleição fosse nominal — 1/3 dos deputados seriam eleitos em listas de âmbito nacional; 1/3 em lista de âmbito regional, de acordo com as Áreas Metropolitanas, Comunidades Intermunicipais e residentes naquele círculo;
  • e, finalmente, que os restantes deputados fossem eleitos uninominalmente pela “sociedade civil independente”.

“No entender da FTDC, esta é a ‘chave da mudança e do futuro’. Representa uma alternativa doutrinal e um reforço poderoso para restringir a autoridade arbitrária dos governantes e deverá ser publicitada junto dos eleitores”, argumentam os trabalhadores democratas-cristãos.

O CDS é o partido que não quer “ir longe demais”

CDS-PP

Miguel Pinheiro

7/3/2018, 7:34103

No novíssimo CDS fala-se em Adriano Moreira, em Adelino Amaro da Costa e em Lucas Pires. Mas o segredo para perceber o partido mais bem comportado do regime está em Freitas do Amaral.

Com o PSD em indefinição, com 20% de votos em Lisboa e com um congresso no próximo fim de semana, o CDS deixou, subitamente, de ser visto como o equivalente político do exército italiano, que perde todas as batalhas onde se mete. O regresso da velha promessa de dividir o eleitorado do PSD e seduzir a direita fez com que todos os aspirantes a Napoleão começassem a fazer revista às tropas.

Além da excitação e da ambição, paira no ar uma pergunta fatal: vai o CDS finalmente regressar às origens para depois, de forma heróica, conquistar o mundo? Aparentemente, todos acham que sim. Sem uma alternativa moderna ao “portismo”, resta um regresso ao passado, que parece sempre mais luminoso quando já saímos dele. Mas o problema é que os militantes do CDS mais agitados ignoram que origens foram essas e preferem refugiar-se em fantasias políticas.

Uns suspiram pelo conservadorismo cristão de Adriano Moreira, que vai ser homenageado pelo partido este sábado. Convém, porém, lembrar como essa história terminou: com a maioria absoluta de Cavaco Silva e com o CDS transformado no “partido do táxi”. Os pobres, que Adriano Moreira referia com abundância, preferiram enriquecer com o PSD em vez de receberem festinhas caridosas do CDS.

Outros sonham com o purismo centrista de Adelino Amaro da Costa, que se transformou no santo secular do partido. Mas talvez seja útil referir que a mais perfeita expressão do seu pensamento político e da sua teoria das “duas bossas do camelo” não é a AD de 1979, mas o Governo PS/CDS de 1978. Aliás, não por acaso, uma parte do CDS transferiu-se, com gosto, para o PS guterrista.

Por fim, há quem aspire ao liberalismo europeísta de Lucas Pires, que é visto como a promessa não cumprida de salvação do partido pela direita que se julga civilizada. Contudo, é bom não esquecer que o “pirismo” teve o enorme prazer de ser deglutido pelo PSD de Bruxelas e pelo centrão social-democrata do Parlamento Europeu, esquecendo rapidamente o liberalismo e, mais rapidamente ainda, o CDS.

Como se vê, cada um cria a “origem” do CDS que mais se adequa aos seus interesses e convicções — mas, curiosamente, ninguém lembra a verdadeira origem do partido, que se chama Diogo Freitas do Amaral. Isso acontece porque todos preferem esquecer que o CDS surgiu como o partido mais bem comportado do regime.

Depois do 25 de Abril, o PCP nasceu pela força da sua história, o PS pela força da sua tradição e o PSD pela força do seu líder. Os três já esperneavam e vociferavam poucos dias depois da revolução. Mas o CDS não. Freitas do Amaral esperou longos meses e só se decidiu a avançar, cheio de receios e de hesitações, depois de um dirigente militar do MFA lhe perguntar, de forma paternalista e impaciente, de que é que estava à espera para fazer um partido.

Houve apenas um momento em que o CDS se colocou na fronteira do regime moldado pela aliança PCP/MFA. Foi a 2 de Abril de 1976, quando votou contra a Constituição que instituiu o avanço inexorável de Portugal em direção ao socialismo. Essa decisão arrojada deu ao CDS o seu melhor resultado de sempre em legislativas: 15,98% de votos e 42 deputados. O que é que o partido fez com essa força? Nada. Preferiu regressar ao confortável colo do regime.

Aliás, não havia razão para equívocos. Logo no primeiro comício do CDS, em Agosto de 1975, em Vila Nova de Famalicão, Freitas do Amaral definiu na perfeição aquilo que o partido iria ser: “Somos, em suma, um partido disposto, em todos os domínios, a ir tão longe quanto for necessário, mas sem ir longe demais”.

Pelo que se tem visto e ouvido nos últimos dias, o novíssimo CDS, com ou sem Assunção Cristas, prefere continuar a ser o partido que não se atreve a “ir longe demais”. Para já, o PSD pode dormir descansado.

José Bettencourt, o português que só queria ser um simples padre e que o Papa nomeou embaixador

07 Março 2018

João Francisco Gomes

Recém-nomeado embaixador, José Bettencourt é das figuras mais influentes em Roma. Chefe de protocolo do Papa, preparou em 8 dias o encontro de Shimon Peres com Mahmoud Abbas, recebeu Trump e Marcelo.

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Nos últimos seis anos, sempre que um chefe de Estado ou de Governo chegava ao Vaticano para um encontro diplomático com o Papa Francisco, a primeira pessoa com quem se encontrava era, invariavelmente, um português. José Avelino Bettencourt, nascido na ilha de São Jorge, nos Açores, é desde 2012 o chefe do protocolo da Santa Sé, sendo por isso o mais alto responsável pela preparação dos encontros diplomáticos do líder da Igreja Católica — e um dos portugueses mais influentes do Vaticano.

Foi ele, portanto, quem preparou o encontro do Papa com Marcelo Rebelo de Sousa em 2016 — a primeira visita de Estado do Presidente da República — mas também os encontros de Francisco com Barack Obama, Donald Trump, Angela Merkel e a rainha Isabel II, a visita do Papa a Jerusalém e ainda o maior desafio diplomático do pontificado de Francisco, o histórico encontro entre Shimon Peres eMahmoud Abbas nos jardins do Vaticano, que foi preparado em apenas oito dias. Apesar da dimensão do desafio diário, Bettencourt admite que não há nenhuma fórmula para preparar um encontro diplomático papal. “São poucas ou mesmo nenhumas as indicações que se dá a quem vai encontrar o Papa”, explica ao Observador a partir do Vaticano.

José Avelino Bettencourt chegou longe, mas sempre sem esconder a vontade de voltar a ser um simples pároco. Porém, o Papa Francisco trocou-lhe a voltas. Chamou-o, e, “com um brilho nos olhos e um sorriso como quem brincava com a situação”, como descreve Bettencourt ao Observador, disse-lhe: “Vai-te preparando“. O alerta estava dado. “Com muito afeto e amizade, mostrando o seu apoio e a sua amizade, disse-me que me preparasse para a nova missão que me esperava”, conta.

Esta semana, soube-se publicamente qual era a nova missão. O papa Francisco nomeou Bettencourt para o posto de Núncio Apostólico — ou seja, embaixador do Vaticano — e elevou-o à dignidade de arcebispo. “Em breve”, garantiu ao Observador o novo embaixador, irá abandonar Roma, onde desde 2003 serve como chefe de protocolo da Santa Sé, para representar diplomaticamente o Vaticano na Arménia. Bettencourt torna-se assim o segundo português a ocupar o posto de Núncio Apostólico, o mais elevado da carreira diplomática do Vaticano, depois do cardeal Manuel Monteiro de Castro, que exerceu funções em Antígua e Barbuda, El Salvador, Honduras, África do Sul, Lesoto e Espanha. Em simultâneo, será ordenado bispo, numa celebração a 19 de março, dia em que se completam cinco anos da inauguração do pontificado de Francisco.

José Avelino Bettencourt não despiu a pele de conselheiro de nunciatura (o seu anterior título diplomático, equivalente a conselheiro de embaixada) quando, ainda antes da nomeação, falou ao Observador sobre a sua vida como colaborador próximo do Papa. Nem para falar dos próprios papas, em particular sobre os dois que serviu. “Cada um deles tem o seu carisma particular, e a seu modo, são duas personalidades que estimulam a refletir sobre a essência do Cristianismo e como viver e propor nos dias de hoje”, responde, quando lhe perguntamos sobre as diferenças em termos de respeito pelo protocolo entre Bento XVI — que o nomeou para o cargo — e Francisco — que, admite, “gosta da espontaneidade”.

José Avelino Bettencourt a receber a rainha de Inglaterra, Isabel II, no Vaticano, para um encontro com o Papa (DR)

Em 2013, Cavaco Silva condecorou-o com a Ordem Militar de Cristo, pela sua “competência, lealdade e dedicação”. Mesmo tendo vivido a maior parte da sua vida no Canadá, para onde a sua família emigrou, e em Itália, afirma com frequência “a sua qualidade de cidadão português” e quer “manter uma viva ligação a Portugal”, disse na ocasião o Presidente da República. “Para mim, como sacerdote português, foi um momento verdadeiramente memorável e profundamente simbólico”, lembra hoje Bettencourt.

“Não é todos os dias que uma pessoa se encontra com o papa Francisco”

Como o Papa, José Avelino Bettencourt levanta-se todos os dias bem cedo. Às sete da manhã celebra a missa matinal e às oito horas já está a trabalhar na Secretaria de Estado, onde se ocupa a cuidar das complexas relações diplomáticas que a Santa Sé estabelece com 185 países. Entre os compromissos que preenchem um dia normal de trabalho no departamento do protocolo do Vaticano — composto apenas por sete pessoas — estão as frequentes reuniões com delegações estrangeiras, os cumprimentos aos embaixadores que acabam de chegar a Roma ou o agendamento das audiências privadas do Papa.

PABLO MARTINEZ MONSIVAIS/AFP/Getty Images

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“A cortesia é o primeiro passo da caridade”, defende Bettencourt, dizendo-se “consciente de que os serviços protocolares são frequentemente o primeiro contacto que os governos estabelecem com a Santa Sé”. “Estes passos são importantíssimos, porque são os que ficam na memória dos nossos interlocutores”, destaca. O grande desafio do serviço de protocolo do Vaticano, garante o seu responsável, é garantir que o acolhimento das entidades estrangeiras “seja sempre fiel à melhor tradição do Cristianismo e ao mesmo tempo consiga ir ao encontro de expressões culturais concretas e muito específicas”.

Como o novo arcebispo admite, “não é todos os dias que uma pessoa se encontra com o papa Francisco”, pelo que os momentos antes de um encontro com o líder da Igreja Católica podem ser de nervosismo, mesmo quando se trata de uma figura habituada a encontros de alto nível. É aí que entra o serviço de protocolo. “É importante que todos os interlocutores, mesmo os intermediários, sintam confiança e segurança de que o que vai suceder durante a visita corresponda ao previamente acordado”, explica o responsável do protocolo, sublinhando que se procura “criar um ambiente familiar para minimizar qualquer natural tensão ou nervosismo”.

Papa Francisco “gosta da espontaneidade”, mas respeita o protocolo

A resignação de Bento XVI e a eleição de Francisco trouxeram uma mudança significativa na imagem externa da Igreja Católica. Tornou-se banal ver o Papa a contornar as regras habituais, a sair de cortejos para cumprimentar fiéis, a passear por Roma quase sem seguranças para comprar óculos ou a telefonar a doentes internados em hospitais. Francisco recusou o luxuoso apartamento papal e ficou a residir na casa de Santa Marta, onde vive grande parte do séquito papal e onde ficam alojados os cardeais que visitam a Santa Sé.

Mesmo que, no que toca à doutrina, nada tenha mudado nos últimos cinco anos, a verdade é que a forma como a Igreja é olhada — sobretudo pelos não católicos — mudou substancialmente com a eleição do papa Francisco. Sobretudo devido às constantes quebras de protocolo, que ajudaram a construir a imagem de um Papa mais próximo das pessoas, menos fechado na sacristia e mais aberto à diferença.

Nomeado chefe de protocolo do Vaticano em 2012 pelo papa Bento XVI, José Avelino Bettencourt liderou a organização da cerimónia de inauguração do pontificado de Francisco (DR)

Facilmente se imaginaria, por isso, que a frequência com que Francisco fura as regras fosse motivo de grandes dores de cabeça a quem trata de garantir que o protocolo é cumprido. Mas José Avelino Bettencourt garante que o Papa respeita escrupulosamente as normas protocolares. “Temos que ver qual é o contexto a que nos referimos. Quando o papa Francisco está com as pessoas em geral, ele sente-se muito à vontade e livre, enquanto nas visitas de chefes de Estado há um protocolo que garante dignidade e adaptabilidade às características de cada delegação”, sublinha.

“Creio que os imprevistos ocorrem mais quando o papa Francisco está com as pessoas na praça, nas audiências, nas visitas pastorais”, considera o responsável do protocolo do Vaticano. Bettencourt admite, porém, que a espontaneidade de Francisco também ajudou a tornar mais descontraído o ambiente das visitas de Estado. “São muito espontâneas as reações dos fiéis e dos visitantes”, explica Bettencourt, assegurando que “o papa Francisco gosta da espontaneidade”, mas que “tem uma excelente capacidade de adaptação e de resposta conforme as circunstâncias exigem”.

"Quando o papa Francisco está com as pessoas em geral, ele sente-se muito à vontade e livre, enquanto nas visitas de chefes de Estado há um protocolo que garante dignidade e adaptabilidade às características de cada delegação"

D. José Avelino Bettencourt, chefe de protocolo do Vaticano

O papa Francisco conseguiu inspirar e motivar católicos e não católicos. A nível da agenda internacional, conseguiu colocar como prioritários temas como o sentido da responsabilidade e da solidariedade para com os refugiados, como a pobreza vivida pelo mundo, o diálogo e a paz”, destaca Bettencourt, sublinhando que “nem todos os que se encontram com o Papa são católicos ou crentes”. “Isso também contribui para que cada encontro tenha muitas condicionantes e resultados diferentes”, explica o chefe do protocolo da Santa Sé.

O encontro entre Shimon Peres e Mahmoud Abbas preparado em oito dias

As pequenas visitas de Estado individuais, preparadas durante várias semanas através de reuniões prévias com representantes dos vários países para estabelecer a agenda do encontro, são o menor dos desafios para o protocolo do Vaticano. O maior terá sido mesmo há cinco anos, nos meses de fevereiro e março de 2013. Com a resignação do Papa Bento XVI e as cerimónias de inauguração do pontificado do papa Francisco, trabalhou-se a um ritmo elevado nos corredores da Santa Sé: só para a ocasião, deslocaram-se ao Vaticano cerca de 140 delegaçõesdiplomáticas, vindas de todo o mundo, incluindo 40 chefes de Estado e de Governo.

José Avelino Bettencourt e a equipa do protocolo da Santa Sé tiveram apenas uma semana para preparar o encontro histórico entre o presidente de Israel, Shimon Peres, e o líder da Autoridade Palestiniana, Mahmoud Abbas, nos jardins do Vaticano, resultado de um convite direto que o Papa fez aos dois líderes em Jerusalém

“Nessa altura houve uma enorme pressão para agendar audiências entre os chefes de Estado e de Governo e o papa Francisco”, lembra Bettencourt. O sacerdote português era chefe de protocolo há poucos meses e aquele foi o seu primeiro grande desafio, com reuniões preparatórias com as delegações a estenderem-se frequentemente até às três da manhã. Desse momento, Bettencourt guarda um momento: “Recordo-me que quando comentei à chanceler Angela Merkel que a Igreja tinha um papel a desempenhar no mundo de hoje, ela imediatamente me respondeu que a Igreja era a única voz alternativa no mundo atual”.

Quando Donald Trump visitou o papa Francisco, em maio do ano passado, também foi a José Avelino Bettencourt que coube a preparação e organização da visita. Polémicas à parte — as comparações entre o sorriso de Francisco com Obama e a falta dele com Trump marcaram a visita –, o encontro entre os dois foi proveitoso, garante o português que o preparou. “O presidente dos EUA, Donald Trump, quis visitar o papa Francisco durante a sua primeira visita ao exterior do seu país, e quis dedicar toda uma manhã à Santa Sé. A sua opção fala por si, de como ele acha relevantes as relações dos Estados Unidos com a Santa Sé”, assegura, lembrando que Trump ficou “muito impressionado” quando viu as obras de Miguel Ângelo na Capela Sistina.

O maior desafio diplomático do pontificado de Francisco seria, porém, o encontro entre o presidente de Israel, Shimon Peres, e o presidente da Autoridade Palestiniana, Mahmoud Abbas, para uma oração nos jardins do Vaticano mediada pelo próprio Papa. “A seguir à visita do papa Francisco à Terra Santa, em 2014, ele convidou o presidente de Israel, o presidente da Palestina e também o Patriarca de Constantinopla, para se deslocarem até ao Vaticano para rezarem pela paz na Terra Santa”, lembra. Numa altura em que a tensão em torno de Jerusalém, disputada entre Israel e a Palestina, crescia, o serviço de protocolo do Vaticano teve “apenas oito dias” para organizar um dos encontros diplomáticos mais sensíveis dos últimos anos, que atraiu durante aquele dia as atenções de todo o mundo.

Dadas “as complexidades que existem nas relações entre os povos da Terra Santa”, aqueles oito dias foram de trabalho intenso para garantir que o encontro decorria “de modo aceitável para todos”. Colocar cristãos, judeus e muçulmanos a rezar juntos pela paz em Jerusalém não foi tarefa fácil e envolveu muitas reuniões, estudo e discussão sobre cada detalhe daquele momento único, que a imprensa internacional acompanhou ao segundo. O New York Times descreveu-o mesmo como uma“cerimónia ricamente simbólica” e “uma ‘cimeira de oração’ cuidadosamente orquestrada”.



O abraço entre Shimon Peres e Mahmoud Abbas, observado de perto pelo papa Francisco, foi um momento histórico

Franco Origlia/Getty Images

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“No fim, o papa Francisco conseguiu que todas as partes se sentissem perfeitamente à vontade e o encontro teve um importante resultado”, considera o responsável do protocolo. Preferindo não avaliar de imediato as várias reuniões diplomáticas que ocorrem dentro dos muros do Vaticano, José Avelino Bettencourt mostra-se esperançoso nos seus resultados a longo prazo. “Por vezes, só mais tarde se volta a lembrar um encontro que teve um qualquer efeito no tempo. Os encontros com o Papa são quase sempre matéria de reflexão e sobretudo para confirmar na fé”.

Pronto para voltar a ser um simples pároco, foi nomeado arcebispo

Nascido em maio de 1962 nas Velas, na ilha de S. Jorge, Açores, José Avelino Bettencourt foi para Otava, Canadá, com apenas três anos de idade. Foi na capital canadiana que estudou Letras, Filosofia e Teologia e que, em 1993, foi ordenado padre, servindo como pároco em duas paróquias da arquidiocese de Otava, incluindo uma comunidade de emigrantes portugueses. Mas este serviço não duraria muito. Em 1995, o arcebispo de Otava convidou-o para se mudar para Roma, para se especializar em direito canónico.

“Foi um ano depois de chegar a Roma que a Secretaria de Estado escreveu ao meu bispo para pedir que eu fosse posto ao serviço da diplomacia da Santa Sé”, recorda José Avelino Bettencourt, até agora monsenhor — um título atribuído pelo Papa a padres que ocupam cargos relevantes no Vaticano ou nas representações diplomáticas da Santa Sé — e a partir de agora arcebispo. “Tudo ocorreu muito diferente daquilo que pensava quando fui ordenado sacerdote”, diz, explicando que aquela “foi a missão que a Igreja escolheu” para si.

Assim que terminou os estudos na Pontifícia Academia Eclesiástica, que lhe deram as habilitações para ingressar no serviço diplomático do Vaticano, Bettencourt foi nomeado para a nunciatura (embaixada do Vaticano) na República Democrática do Congo, onde esteve entre 1999 e 2002. Na altura, o país estava em plena guerra civil, que levaria ao assassinato do presidente Laurent-Désiré Kabila. Bettencourt viu tudo. “Muitas vezes assisti a religiosos e religiosas que colocavam a própria vida em perigo para chegar aos que se encontravam mais longe e dispersos”, lembra.

“As nunciaturas apostólicas procuram apoiar o trabalho heroico que por vezes a Igreja local é chamada a desempenhar. Assistir aos bispos, sacerdotes, religiosos e missionários, facultar meios de assistência sanitária, de alimentação e até formação académica. Em primeiro lugar, procuram saídas de situações de guerra e desenvolvem esforços para que haja um clima de diálogo e paz, pois com a guerra tudo o que se constrói é destruído, mesmo as próprias vidas e famílias. A nunciatura apostólica onde trabalhei colaborava com as instituições e organismos internacionais também naquilo que dizia respeito a refugiados e assistência humanitária”, explica o sacerdote.



Cavaco Silva condecorou José Avelino Bettencourt em 2013, pela sua ligação ao país

Presidência da República

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Em 2002, Bettencourt regressou a Roma, para a Secretaria de Estado do Vaticano, onde viria a ficar. Primeiro a acompanhar as relações com os países de língua inglesa, francesa e portuguesa da África Ocidental e depois na própria Casa Pontifícia, para trabalhar na antecâmara pontifícia — ou seja, a receber os convidados e visitantes imediatamente antes de encontrarem com Bento XVI, o Papa que em 2012 o viria a nomear chefe de protocolo da Santa Sé.

Durante aqueles dez anos, apesar do serviço na Casa Pontifícia, Bettencourt procurou manter-se ligado às bases da Igreja e fez trabalho pastoral numa paróquia em Roma, todas as semanas. E não esconde que, mesmo trabalhando no centro da estrutura da Igreja Católica, gostava de tornar a ser um simples pároco. “Há dois anos, aproveitei a visita do meu bispo para propor, um pouco por graça, um pouco a sério, que estava pronto a voltar a ser pároco numa paróquia na diocese. Ele, que é um grande homem da Igreja, com ampla visão das necessidades pelo mundo, depois de me ouvir, simplesmente reencaminhou a conversa para outro assunto. Creio que o essencial é servir onde somos chamados a servir.”

O caminho, porém, parece ser no sentido contrário, já que o monsenhor que gostava de voltar a ser um simples padre acaba de ser elevado a arcebispo pelo Papa. “Nós estamos num caminho que vai andando para a frente. O servir, o querer servir, é onde somos chamados a servir”, conta agora. Sem esconder que mantém o desejo de voltar à vida de paróquia, garante ser “um simples servo da Igreja”, mostrando-se disponível para qualquer desafio que a Igreja lhe lance. “Isso foi, na verdade, uma das razões pelas quais aceitei”, explica.

“É uma missão diplomática, que tem a ver com o encontro dos povos, com a união da Igreja. Serve para dar voz àquelas que não têm voz“, sublinha o novo embaixador da Santa Sé, dizendo-se “muito contente” com o desafio. Vai “trabalhar com a hierarquia da Igreja local, com o povo de Deus, especialmente nos casos em que há maiores necessidades”. É precisamente por isso que, além de ser nomeado Núncio Apostólico, foi também elevado a arcebispo: para se poder relacionar de igual para igual com os líderes da Igreja que vai encontrar na sua nova missão. “Os núncios atuais são todos arcebispos”, sublinha.

Até ao dia da ordenação episcopal, Bettencourt mantém-se como chefe de protocolo do Vaticano. Depois, deixa Roma, mas não parte para a representação diplomática sem passar pelo Canadá e por Portugal. “Depois da ordenação, vou passar a Semana Santa na minha diocese, para celebrar com o clero de Otava. Depois, é possível que dê um salto aos Açores, para celebrar a festa de São Jorge [23 de abril], padroeiro da ilha. Será uma ocasião para saudar os meus egrégios avós.”

A dra. cristas tem os dias contados

por rui a.

A avaliar pelo que se lê neste artigo do Observador, parece que há uns quantos cidadãos filiados no CDS sumamente preocupados com o «esvaziamento ideológico» do partido, que se propõem redefini-lo nos «grandes princípios» que o devem nortear.

Lido o texto do jornal, e presumindo que este não falta à verdade, conclui-se que o esforço intelectual desses cidadãos não excede o de uma toupeira à procura de um buraco por onde possa ver a claridade do luar. Porque, se for verdade o que ali está escrito, o esforço da toupeira será infinitamente superior aos resultados aqui apresentados.

Enumerando os méritos de tão suados trabalhos, ficamos a saber que o CDS deverá «abrir-se» aos militantes e ao povo trabalhador, proibir o aborto e o casamento homossexual, conferir o direito de voto nas autárquicas aos jovens com dezasseis anos, afirmar-se perante o PSD (de que não poderá ser «muleta») e – não podia faltar – retomar as suas preciosas origens «democratas-cristãs».

Admitindo que todos os subscritores das peças «ideológicas» a submeter ao Congresso do partido tenham mais do que dezasseis anos - o que o teor das propostas não permite assegurar - e que aqueles que tenham já atingido a maioridade tenham todos casamentos heterossexuais e nunca tenham levado as namoradas à parteira, é de lhes perguntar o que pensam (?) sobre o destino do país e da sua economia, sobre o papel do estado na regulação social, a carga fiscal que incide sobre os portugueses e as suas empresas, a educação e a justiça, ou até, fugindo às funções tradicionais da soberania, coisas um pouco mais prosaicas como, por exemplo, o alojamento local, o Serviço Nacional de Saúde, a RTP ou a Caixa Geral de Depósitos. Tudo coisas certamente muito comezinhas para preocupar tamanhas inteligências, preocupadas que estão com a especulação sobre o cosmos e a vida, de que as propostas que veiculam trazem uma nova e invejável mundovisão.

A Dra. Cristas que se acautele, ou não aquecerá o lugar que ocupa.