Translate

quinta-feira, 29 de março de 2018

Uma estação espacial vai cair do céu e pode ser no norte de Portugal. 9 respostas para saber se deve ter medo

29 Março 2018116

Marta Leite Ferreira

A estação espacial que está em queda descontrolada em direção à Terra pode chegar entre esta sexta-feira Santa e domingo de Páscoa. O sítio? É "uma roleta russa". Mas o norte de Portugal está na mira.

Vamos começar pelas más notícias: há uma estação espacial com o tamanho de um autocarro escolar em queda livre em direção à Terra; e uma das regiões onde é mais provável que possa cair é no norte de Portugal durante este fim de semana da Páscoa. Agora as boas: a probabilidade de se despenhar entre o Porto e o Minho, embora seja a maior de todas, não ultrapassa os 3%; e, de qualquer modo, é altamente improvável que uma das peças lhe caia em cima do folar. Não há registo na História de qualquer pessoa atingida por uma peça de um veículo espacial em queda descontrolada em direção ao nosso planeta.

Tudo indica que a Tiangong-1, a estação chinesa que foi desativada há cinco anos e cujo nome significa “Palácio Celestial”, vá entrar na atmosfera terrestre algures entre esta sexta-feira, 30 de março, e domingo, 1 de abril. As estimativas mais recentes da Agência Espacial Europeia apontam o domingo de Páscoa como a data mais provável para o evento, mas as incertezas são tantas — em parte por causa do secretismo dos chineses — que não se sabe sequer o local exato onde o veículo vai cair. O melhor mesmo é ficar atento ao céu, mas permanecer afastado de qualquer pedaço da maquineta: é que a bordo dela está um químico corrosivo que pode causar desde tosse até convulsões e ferimentos profundos na pele.

Em conversa com o Observador, o astrónomo Rui Agostinho, do Observatório Astronómico de Lisboa, explicou que a queda desta estação espacial é mais preocupante do que a queda de um simples satélite por causa da robustez que tem: um satélite tem de suportar apenas as forças extremas do lançamento para o espaço, por isso não precisa de materiais muito resistentes nem pesados; mas a Tiangong-1 foi feita para receber missões tripuladas, por isso alguns dos seus materiais podem ser robustos e fortes o suficiente para chegarem ao solo sem serem destruídos pela fricção, pelo desgaste e pelas temperaturas na ordem dos milhares de graus Celsius provocados pela atmosfera terrestre.

Por enquanto não há nada que se possa fazer, a não ser esperar que a trajetória da Tiangong-1 seja rasante o suficiente para que, ao entrar na atmosfera da Terra, fique obrigado a percorrer mais tempo o percurso entre o espaço e o solo e, portanto, a ser mais massacrado pelo caminho. “É uma autêntica roleta russa”, descreve Rui Agostinho. O melhor mesmo é estar preparado para o que der e vier, por isso veja as respostas a todas as suas perguntas aqui em baixo.

A Administração Espacial Nacional da China disse que a estação "parou de funcionar" e já não estava a enviar informações para os técnicos da agência espacial chinesa. Tiangong-1 estava assim em queda livre em direção à Terra.

O que que vai acontecer?

A estação espacial chinesa Tiangong-1 vai reentrar na atmosfera terrestre algures entre esta sexta-feira Santa e o domingo de Páscoa. Estima-se que grande parte do material não vá resistir à força de fricção nem às temperaturas extremas provocadas pela atmosfera, que funciona como um escudo que protege a integridade do planeta de objetos vindos do exterior. De acordo com a Agência Espacial Europeia, em meados de janeiro a estação estava numa órbita a 280 quilómetros de altitude, mas tem vindo a diminuir desde então.

A Tiangong-1 já não estava a funcionar. A estação espacial foi lançada para o espaço em 2011 e estava projetada para continuar ativa durante dois anos. Foi isso que aconteceu: em junho de 2013, a missão espacial tripulada Shenzhou-10 visitou a Tiangong-1 naquela que foi a sua última operação. Pouco depois, a máquina foi posta em suspensão para depois ser guiada para dentro do planeta de forma controlada.

No entanto, em março do ano passado, a Administração Espacial Nacional da China disse que a estação “parou de funcionar” e já não estava a enviar informações para os técnicos da agência espacial chinesa. Tiangong-1 estava então em queda livre em direção à Terra. Desde então, a agência chinesa limitou os detalhes que tem partilhado com as outras agências espaciais.

Qual é o trajecto da queda?

A Administração Espacial Nacional da China, que é a agência espacial chinesa, começou por dizer que a Tiangong-1 faria “uma reentrada controlada” na Terra: o controlo em solo iria assumir o comando dos motores, fazê-los disparar e depois utilizá-los para diminuir a velocidade da máquina até que as peças mais resistentes caíssem em segurança. A ideia era que os motores fossem postos a trabalhar num momento específico da órbita que permitisse à estação espacial arder quase por completo ao atravessar a atmosfera da Terra. As peças mais resistentes iriam cair na região sul do Oceano Pacífico, longe de qualquer zona povoada.

Era algo parecido com o que mostra este vídeo, captado na reentrada controlada da Julio Verne ATV/ Veículo de Transferência Automatizado 001 em 2008, o que devia acontecer com a Tiangong-1.

Mas o plano saiu furado. Em março de 2016, a Tiangong-1 ainda estava completa, isto é, não tinha perdido nenhuma peça. Mas quando a estação espacial “parou de funcionar”, e tanto quanto podem confirmar as agências internacionais, o controlo em terra deixou de ter acesso aos motores e a reentrada na atmosfera deixou de poder ser comandada pelos técnicos. Tiangong-1 passou a cair “de forma descontrolada” em direção à Terra.

Quando a China notificou as Nações Unidas do que estava a acontecer, explicou por pontos o que iria fazer a partir dali. Em primeiro lugar, prometeu “rastrear e monotorizar de perto” a estação espacial para conhecer o desenvolvimento orbital da máquina e, em função dele, “publicar uma previsão oportuna da sua reentrada” terrestre. Essa operação está a ser possível graças aos dados enviados à agência espacial chinesa pelo Comité Inter-Agências de Coordenação de Detritos Espaciais. Depois, garantiu que publicaria qualquer informação que recebesse sobre a Tiangong-1no site da Administração Espacial Nacional da China, tanto em mandarim como em inglês. De facto, alguma dessa informação iria ainda ser enviada aos meios de comunicação social, nomeadamente detalhes sobre a hora e o local da reentrada.

Este vídeo da Corporação Aerospace mostra uma simulação do que pode vir a acontecer na reentrada da estação espacial chinesa algures nos próximos dias.

Mais que isto é que já não se sabe.

Quando é que tudo vai acontecer?

As últimas previsões da Agência Espacial Europeia dizem que a Tiangong-1 vai começar a reentrar na Terra em qualquer dia entre 30 de março (esta sexta-feira) e 2 de abril (a próxima segunda-feira). No entanto, só teremos certezas mais fundamentadas do que vai — e  de quando vai — acontecer um dia antes da estação espacial chegar à Terra, porque só na véspera é que podemos desenhar melhor a órbita precisa que Tiangong-1 seguirá nas últimas horas antes de colidir com o planeta.

As últimas previsões da Agência Espacial Europeia dizem que a Tiangong-1 vai começar a reentrar na Terra entre 30 de março e 2 de abril. Só teremos certezas mais fundamentadas do que vai acontecer um dia antes da estação espacial chegar à Terra.

Mesmo assim, não fique demasiado entusiasmado quando a véspera do embate chegar: nenhuma das agências espaciais ativas neste momento têm ferramentas suficientemente precisas para adivinhar as coordenadas dos sítios onde as peças de Tiangong-1 podem cair ou simplesmente serem vistas a entrar em órbita. A Agência Espacial Europeia disse mesmo que “não podemos fazer previsões locais nem sequer com margens de erros na ordem dos quilómetros” porque “isso está para lá das nossas habilidades técnicas atuais por causa da complexidade de retratar a atmosfera”.

A Agência Espacial Europeia explica que, por norma, a incerteza tipicamente existente em casos de reentradas descontroladas como esta fica em redor dos 20%. Em termos práticos, isto significa que sete horas depois de Tiangong-1 ter entrado na atmosfera, nenhum astrónomo ou especialista em astronáutica conseguiria prever onde é que as peças da estação espacial iriam cair: “A incerteza do lugar da desintegração [quando o objeto se estilhaça] é de milhares de quilómetros”.

Que zonas da Terra podem ser afetadas?

Como as agências espaciais estão a monitorizar os movimentos da estação espacial, sabemos que a órbita da Tiangong-1 tem uma inclinação de 42,8 graus em relação à atmosfera terrestre. Isso significa que a Tiangong-1 pode entrar na atmosfera, desintegrar-se e cair em qualquer região da Terra que estava confinada entre as latitudes 42,8º norte e 42,8º sul. Essa região inclui quase todo o continente americano (desde os Estados Unidos até ao sul da Argentina), todo o continente africano, o sul asiático, a Oceânia e o sul da Europa, que inclui Portugal inteiro.

A Tiangong-1 pode entrar na atmosfera, desintegrar-se e cair em qualquer região da Terra que esteja confinada entre as latitudes 42,8º norte e 42,8º sul. As regiões mais prováveis são o norte de Portugal e o sul da Austrália.

Mas nem todas essas regiões estão em condições de igualdade: há maior probabilidade (3%) da Tiangong-1 reentrar na atmosfera terrestre na latitude 42,8ºN (que coincide com o norte do nosso país) e na latitude 42,8º S (na ponta sul da Austrália) do que em qualquer região mais próxima do equador (próximo de 0%). E é assim porque a órbita da estação espacial à volta da Terra é circular, por isso passa mais tempo nessas latitudes do que a atravessar a região da Terra entre uma e outra.

Se a reentrada ocorrer nas zonas com maior probabilidade de tal acontecer, será pior caso aconteça na nossa latitude do que na que a atravessa a ponta sul da Austrália, por causa da densidade populacional ser muito maior do que a do hemisfério sul.

A verde estão marcadas as áreas onde há maior probabilidade que a estação espacial chinesa venha a cair. No gráfico mais à esquerda pode consultar as regiões com maior densidade populacional (onde a queda do objeto pode causar mais danos). No gráfico à direita pode ver-se a probabilidade de queda naquela altitude: Portugal está numa das duas mais altas. Créditos: ESA CC BY-SA IGO 3.0

Quão provável é que uma peça caia na minha casa?

É possível que isso aconteça, mas a probabilidade é muitíssimo baixa. Os cientistas tentam perceber o comportamento que os materiais da Tiangong-1 vão assumir ao estudar o comportamento dos materiais que compõem outras naves espaciais mais conhecidas de outras agências espaciais, como o Veículo de Transferência Automatizado da Agência Espacial Europeia, o Progress da Agência Espacial Federal Russa ou a Dragon da Administração Nacional da Aeronáutica e Espaço. Tanto quanto sabemos sobre o que aconteceu com essas máquinas, grande parte da Tiangong-1 vai desintegrar-se ao atravessar a atmosfera, mas algumas partes, as mais resistentes, podem sobreviver e chegar a terra.

Os estilhaços vão cair sobre uma área gigantesca “com milhares de quilómetros de comprimento e centenas de quilómetros de largura”. Mas embora grande, essa área pode não ter um significado muito expressivo porque a maior parte da superfície da Terra está coberta por água ou é desabitada. De acordo com a Agência Espacial Europeia, “a probabilidade pessoal de se ser atingido por um pedaço da Tiangong-1 é dez milhões de vezes mais pequena do que a probabilidade de ser atingido por um raio”.

De acordo com a Agência Espacial Europeia, "a probabilidade pessoal de ser atingido por um pedaço da Tiangong-1 é dez milhões de vezes mais pequena do que a probabilidade de ser atingido por um raio".

Há uma outra boa notícia a juntar a esta: é que nunca houve registo de uma pessoa ter sido atingida por estilhaços vindos do espaço e com origem em objetos espaciais em queda. Mas também estamos numa situação de cara ou coroa: segundo Rui Agostinho do Observatório Astronómico de Lisboa, quanto mais rasante for a trajetória da estação espacial em relação à atmosfera, maior a distância que ela terá de perfurar ao longo desse nosso escudo e mais tempo estará à mercê da fricção e das altas temperaturas da reentrada sendo assim mais fácil que se estilhace. Mas quanto mais próxima estiver a inclinação da órbita dos 90º, maior a velocidade o objeto vai adquirir e menor será o espaço que terá de percorrer podendo ficar mais intacta.

Outra coisa que é preciso ter em conta, do lado das notícias menos boas, é que nenhum dos veículos espaciais estudados pelas agências espaciais foram concebidas para receber humanos, por isso foram feitos de materiais menos resistentes: “Os mecanismos dos satélites não são robustos porque só têm de sobreviver ao lançamento, mas depois não estão sujeitos a forças extremas enquanto estão no espaço. Como quanto maior for o peso do satélite, mais caro será lançá-lo num foguetão, as agências tentam fazê-los o mais leves possível”, explica Rui Agostinho. Mas a Tiangong-1 é uma estação espacial, por isso “está preparada para colocar pessoas lá dentro, tem zonas mais robustas que podem sobreviver à reentrada na atmosfera”. São essas as peças mais perigosas para o humano.

Há produtos perigosos a bordo da estação espacial?

Sim. A hidrazina é um composto químico no estado líquido que foi usado na Tiangong-1 como um propelente em veículos espaciais e é também usado em alguns produtos na agricultura. O problema é que a hidrazina é altamente tóxica e corrosiva: um relatório da Agência das Substâncias Tóxicas dos Estados Unidos diz que “respirar hidrazina por curtos períodos de tempo pode causar tosse e irritações na garganta e nos pulmões, convulsões, tremores e ferimentos”. No entanto, segundo os cientistas chineses, “é muito pequena a probabilidade de [a hidrazina] vir a causar danos à aviação ou às pessoas em terra”.

Se encontrar objetos que possam ter tido origem na estação espacial chinesa, o melhor é não tocar neles e nem sequer se aproximar: os vapores que emitem podem tornar-se muitos perigosos para a saúde.

A hidrazina é um composto químico no estado líquido que foi usado na Tiangong-1 como um propelente em veículos espaciais e é usado em alguns produtos na agricultura. O problema é que a hidrazina é altamente tóxica e corrosiva.

Quem está a controlar a situação?

A 10 de maio de 2017, a China enviou ao Departamento das Nações Unidas para os Assuntos Espaciais uma notificação onde dizia que a Tiangong-1 tinha “parado de funcionar” e que “mantinha total integridade estrutural”. Naquela altura, a estação espacial estava a 349 quilómetros de altitude e caía diariamente, e em média, 160 metros em direção à Terra, por isso a matemática dizia que reentraria na atmosfera entre outubro do ano passado e abril deste ano. A China garantia ainda que “a maior parte dos componentes estruturais da Tiangong-1 seria destruído por inflamação ao longo da sua reentrada” e que “a probabilidade de causar estragos e colocar em perigo a aviação ou as atividades em solo são muito baixas”. Tendo isto em conta, a China pediu a ajuda do Departamento das Nações Unidas para os Assuntos Espaciais e Comité Inter-Agências de Coordenação de Detritos Espaciais para estar de olhos postos na estação chinesa.

Ao mobilizar o Comité, a Administração Espacial Nacional da China colocou 13 agências espaciais, entre as quais a NASA (dos Estados Unidos), a ESA (com 22 estados-membros europeus), a Roscosmos (da Rússia), a JAXA (do Japão), a ISRO (da Índia) e a KARI (da Coreia do Sul). Todas estão em sintonia para tentar descobrir, acima de tudo, onde e quando ia a Tiangong-1 entrar na atmosfera terrestre.

Esta reentrada é a mais perigosa a que já assistimos?

Não. A 23 de março de 2001, o mundo assistiu à reentrada na atmosfera da estação espacial Mir, que com 120 toneladas (a Tiangong-1 tem 8,5 toneladas) foi o maior veículo espacial construído pelo Homem a cair na Terra. Era uma estação modular — a primeira de todas e o maior veículo espacial até àquela época — que esteve na órbita baixa da Terra entre 1986 e 2001, pertencia à União Soviética e foi montada já em órbita entre 1986 e 1996. Até começar a cair, o Mir era o maior satélite em órbita, um título que depois passou a pertencer à  Estação Espacial Internacional.

A Mir permaneceu no espaço a 400 quilómetros de altitude, completando uma órbita em volta da Terra a cada 90 minutos. Em 2000, a Rússia decidiu destruir o veículo espacial “por falta de meios técnicos e financeiros” para suportar a máquina. A 23 de março de 2001, a Mir entrou na atmosfera terrestre e desintegrou-se em segundos: a maior parte das partes da estação foi completamente destruída, mas algumas peças caíram em chamas no Oceano Pacífico a dois mil quilómetros da Austrália sem causar danos a nenhuma pessoa ou infraestrutura. A operação custou 27 milhões de dólares.

Este não é o objeto mais perigoso que já vimos reentrar na Terra. A 23 de março de 2001, o mundo assistiu à reentrada na atmosfera da estação espacial Mir, que com 120 toneladas (a Tiangong-1 tem 8,5 toneladas) foi o maior veículo espacial construído pelo Homem a cair no planeta.

Posso ver a reentrada da estação na Terra?

De acordo com a Corporação Aerospace, uma organização independente dedicada à investigação técnica e científica relacionada com a aeronáutica, dependendo das condições meteorológicas, da hora e do local da reentrada da Tiangong-1, pode ser possível ver objetos incandescentes a rasgarem o céu durante um minuto ou mais.Se tiver sinais da reentrada da estação espacial na Terra, envie um relatório para a Corporação Aerospace com informações do local em que estava, que horas eram, uma descrição do que viu e, se possível, fotografias ou vídeos que consiga captar desse momento.

ATIVOS TÓXICOS, GASES TÓXICOS E COBARDES TÓXICOS

  por estatuadesal

(In Blog O Jumento, 29/03/2018)

caveira

Esta direita de galos-da-Índia que são algumas personagens do CDS e do PSD só têm coragem quando americanos e ingleses lhes pedem para ladrarem contra gente perigosa com armas químicas. Cá por dentro só aparecem para tentar colher frutos das desgraças nacionais, sejam assaltos a paióis ou grandes incêndios. Quando lhes convém deixam de estar esganiçados, metem o rabinho entre as pernas e calam-se, não se vá reparar neles.

Onde estão Paulo Portas, Maria Luís Albuquerque, Carlos Costa, Passos Coelho, Teodora Cardoso e todos os que durante quatro anos executaram, apoiaram ou deram cobertura à política económica de um governo que fez uma coleta nacional junto dos pobres para refinanciar a banca? Onde estão os bandalhos que não se cansavam de repetir que a intervenção no BES não teria custos para os contribuintes? Até garantiam que os investimentos na banca iriam dar lucros.

Onde estão os senhores banqueiros que não se cansavam de dar lições de moral ao país, que andavam muito preocupados com saída dos centros de decisão e até se juntaram para forçarem o governo a pedir a intervenção externa? Deixaram o agora presidente do Novo Banco a falar sozinho, não apareceu uma única personalidade a dar a cara.

Agora já não se queixam de que o governo está condicionado pela Geringonça para tapar os buracos que deixaram em vários bancos. Agora não aparecem como fizeram em várias ocasiões em que mal saíam boas notícias eram os primeiros a dizer que os louros eram deles. Não aparecem para assumir o buraco no Novo Banco, como não apareceram no caso Banif e só aparecem no Montepio mas não para dizerem que esconderam o problema para agora tentarem colher frutos.

Nem Marcelo Rebelo de Sousa, que disse que tinha sido Passos que tinha aberto o trilho, pelo qual este governo caminhou tranquilamente, aparece agora a comentar; poderia dizer que foi o Passos Coelho que abriu os buracos em que este governo e o país se poderiam ter enterrado.

Não deixa de ter alguma graça o fato de políticos tão corajosos contra os russos, como já o foram contra Sadam, se revelem tão cobardolas quando o assunto é o BES, o BANIF ou o BPN. Parece que estão mais preocupados com os gases tóxicos produzidos pelos russos do que com os ativos tóxicos resultantes dos roubos promovidos pelos seus amigos corruptores da banca portuguesa, que terão de ser pagos pelos contribuintes.

Resta saber o que será mais tóxico, se os gases que acusam os russos de ter usado, os ativos tóxicos dos nossos banqueiros corruptos ou a as intervenções dos cobardes que andam por aí escondidos quando lhes convém.

O Brasil real é brutal

Novo artigo em Aventar


por Autor Convidado

brasil_primeira_missa
[Gil Sotero]

O mito do Brasil cordial, sem violência foi criado e perpetuado ainda no século 19 e os quadros pintados, bem longe daqui, foram financiado por uma elite que queria passar uma imagem nova da identidade brasileira. Como este quadro do Victor Meirelles de 1860 que "retrata" a primeira missa no país como um momento mágico com indígenas dóceis sendo meros espectadores da luz do homem branco colonizador. O próprio pintor era um dos artistas preferidos de D. Pedro II.
Nesta edição do Café Filosófico o historiador Jorge Coli disserta sobre esses mitos criados no Brasil, até hoje, mesmo no cinema brasileiro, contribuem para uma percepção muito limitada do que é o Brasil de verdade: um país violento, dominado por boçais racistas, sinhás, fanáticos e lacaios que mantém as estruturas que lhes convém.
O BRASIL REAL É BRUTAL.

E se assaltassem a “Casa de Papel” portuguesa?

29 Março 2018222

Carolina Branco

Sónia Simões

Onde se fabrica o dinheiro em Portugal? Como está protegido o local? E como seria negociada a libertação de reféns, caso alguém imitasse o assalto da série de ficção espanhola "Casa de Papel"?

Partilhe

“O que achas de 2.400 milhões de euros?”, pergunta “o professor” a Tóquio, quando a recruta para concretizar “o maior assalto da história”: sequestrar os funcionários e os visitantes da Casa da Moeda em Madrid e prolongar o sequestro o máximo de tempo possível, para permitir que os próprios reféns produzam 2.400 milhões de euros. Se estranhou as linhas anteriores, é porque ainda não viu “A Casa de Papel”, a série espanhola que está a ser um fenómeno na Netflix e que acompanha as peripécias de Berlim, Rio, Denver, Nairobi e os outros assaltantes profissionais que usam cidades como nomes de código.

A ideia dos argumentistas é sempre a de aproximar ao máximo a ficção à realidade, quando se trata de policiais deste tipo. Daí que tenhamos feito o exercício, trazendo a hipótese do assalto até Portugal. Onde fica a fábrica do dinheiro? Como está protegida? Quem agiria em caso de assalto? E quem teria de autorizar uma intervenção de atiradores? Sete perguntas e respostas para tentar perceber o que aconteceria se o ataque à Casa de Papel fosse em Portugal.

Onde é e como funciona a “Casa de Papel” em Portugal?

A Fábrica Nacional de Moneda y Timbre da série está localizada no centro da capital espanhola. Se os assaltantes se dirigissem à Imprensa Nacional – Casa da Moeda, junto ao Jardim do Arco do Cego, em Lisboa, por muito que os reféns trabalhassem, nunca seria um assalto muito proveitoso: ali só se fazem moedas. Para produzir notas, o local do crime teria de ser a 40 minutos do centro de Lisboa, na zona industrial do Carregado. É aí que fica localizada a Valora, uma empresa detida a 100% pelo Banco de Portugal, instalada numa área de 67 mil metros quadrados, junto a uma fábrica de batatas fritas. E é aí que chegam diariamente as carrinhas de transporte de valores para recolherem as notas que distribuem pelo sistema bancário.

“Agora vamos trabalhar”, avisa Nairobi na série espanhola, na primeira noite do assalto em que os reféns começam a imprimir notas de 50 euros. É “o trabalho mais bem pago da história: 2.400 milhões de euros”. Na fábrica portuguesa, quanto tempo seria necessário para produzir essa quantia? Em 2017, a Valora produziu 248 milhões de notas. (Foi a quantidade atribuída pelo Eurosistema ao Banco de Portugal — um dos 15 bancos centrais com capacidade de produzir dinheiro). Se as 248 milhões de notas fossem todas de 50 euros (as notas que, na série, os assaltantes produzem), a Valora teria produzido 12.400 milhões de euros num ano. Ou seja, para conseguirem atingir os 2.400 milhões de euros em notas, ou imprimiam notas de um valor superior, ou teriam de manter o sequestro durante dois meses e 8 dias, numa média aproximada, uma vez que em regime normal, as máquinas não trabalham 24 horas por dia.

O método de produção é semelhante ao de qualquer outra fábrica: há matéria-prima, máquinas, funcionários e um produto final. Cerca de 200 funcionários da Valora transformam o algodão preparado, que inclui produtos têxteis reciclados, em notas. A ser assaltada, os autores do crime sairiam da Valora com notas facilmente identificadas: todas as que são produzidas na empresa têm um número de série que começa com a letra M. Na série o bando tinha essa questão acautelada, porém.

Em 2017, a Valora produziu 143 milhões de notas de 20 euros, que dizem respeito a encomendas recebidas em 2016 e 2017

A circulação do dinheiro implica desgaste das notas. Por isso, além de imprimir notas novas, a Valora tem também uma importante função de regeneração do dinheiro. No departamento de saneamento da fábrica, existem cinco máquinas que avaliam as condições das notas a uma velocidade de 33 notas por segundo. Aquelas que estiverem danificadas são analisadas para avaliar a sua substituição. Em 2016, foi avaliada a qualidade de 627,5 milhões de notas entregues ao Banco de Portugal por empresas e bancos. 7757 notas foram retiradas de circulação por serem falsas, segundo o relatório do Banco de Portugal.

Só elementos da cúpula do Banco de Portugal é que decidem quem entra na casa forte.  Os administradores do Banco de Portugal José de Matos e Hélder Rosalino (ex-secretário de Estado da Administração Pública) são, respetivamente, presidente e vogal da Valora. O administrador delegado da empresa é Eugénio Fernandes Gaspar. Será em Portugal o que tem as funções mais parecidas com as de Arturo Roman, o diretor da Casa da Moeda espanhola, uma personagem que incita vários outros reféns a iniciar esquemas de fuga, mas raramente tem a coragem de avançar primeiro.

Como funciona a segurança da “Casa das Notas”?

A segurança da “Casa das Notas” — na verdade, em Portugal, o nome Valora não dava para um título de uma série — foi pensada logo no momento em que foi construído o edifício. Como as instalações estão na área da GNR, o Banco de Portugal fez um protocolo com a Guarda para definir todo o sistema. O Comando optou por escolher a sua unidade de elite, a Unidade de Intervenção, como responsável por aquelas instalações. Por isso, no local, existe uma sala reservada aos militares da Unidade de Intervenção que ali prestam serviço 24 horas por dia, 365 dias por ano. Cada um deles faz turnos de seis horas e é substituído de oito em oito dias.

O próprio Banco de Portugal acordou com a GNR e comprou os carros a usar no patrulhamento do edifício. As viaturas ali utilizadas não saem do perímetro da fábrica, porque assim dificilmente alguém consegue alterá-las ou usá-las para promover um assalto no interior, por exemplo, através da instalação de uma câmara.

No interior do edifício foram montados sofisticados sistemas de videovigilância, que dispõem de sensores de movimento e de calor. Cá fora, se alguém pular um muro, o sistema de alarme dispara só pelo toque dos pés do suspeito no chão. Mesmo no interior do edifício está um cofre “suspenso no ar” para evitar assaltos por via subterrânea. Trata-se de um armazém com luzes fluorescentes, mas que guarda notas em paletes: durante uma visita permitida aos jornalistas em abril do ano passado, estavam visíveis várias paletes de 8 milhões de euros em notas de 20 euros, por exemplo. É nesse cofre que está uma reserva fiduciária em numerário. Ao lado do armazém há uma câmara com cerca de metade das reservas de ouro do país, avaliadas em 6 mil milhões de euros: são mais de 170 toneladas de barras de ouro — algumas ainda estão gravadas com uma foice e um martelo, símbolos da antiga URSS.

Mas não se pense que esta abertura a jornalistas seja uma rotina. Lá dentro, os funcionários não comunicam, estão separados por paredes de vidro à prova de bala. E as portas não abrem ao mesmo tempo. Não há entrega direta de materiais ou de dinheiro. Se for preciso entregar um saco é deixado num local, depois fecham-se as portas e abrir-se-ão outras para que outro funcionário pegue no saco. Não há comunicação entre eles sequer.

No exterior do edifício existem dois perímetros e uma equipa da unidade de elite da GNR, a Unidade de Intervenção, está permanentemente no local, apoiada por cães. Além do acesso às câmaras do Banco de Portugal, tem também câmaras próprias.

Assaltos com algumas semelhanças com o da série da Netflix não são só ficção e os funcionários do Banco de Portugal sabem disso. Um deles revelou ao jornal Eco que o cuidado é tanto que nem os filhos podem dizer na escola onde os seus pais trabalham, porque neste setor é comum a prática de tiger kidnaping — um tipo de crime em que são raptadas pessoas para que elas próprias executem outro crime. Tal como na série A Casa de Papel, em que são os próprios funcionários e visitantes da Casa de la Moneda que são mantidos sequestrados para serem eles a produzir as notas. Esta é uma das particularidades da série: os assaltantes não querem levar o dinheiro que ali está e que tem dono, querem produzir o próprio dinheiro.

No entanto, apesar dessas precauções de segurança, além dos administradores, há pelo menos mais três funcionários da Valora com perfil na rede Linkedin: uma diretora financeira, um diretor adjunto de produção e uma embaladora.

Porta de segurança do armazém de notas para expedição no Complexo do Carregado do Banco de Portugal

Quem era chamado a intervir em caso de assalto?

O Observador falou com o chefe da Secção de Operações, do Comando de Lisboa da GNR para perceber o que acontecia. O tenente-coronel Bolas admite que dificilmente alguém ali entraria. Uma outra fonte militar, que conhece o local, disse que mesmo se entrasse “dificilmente conseguiria sair”. O sistema de segurança ali instalado é “ímpar” no País, garante.

A título de exemplo, na série espanhola, o grupo de assaltantes consegue fazer uma emboscada ao carro com dois polícias que escolta a carrinha que leva o papel para as notas. E é assim que consegue entrar nas instalações. Em Portugal não são dois patrulheiros que escoltam estas carrinhas, mas militares da Unidade de Intervenção da GNR em número que depende da carga transportada — militares estes preparados para enfrentar os cenários mais extremos, mesmo os de guerra. O tenente-coronel Bolas explica que quando as carrinhas chegam ao Banco de Portugal no Carregado ficam num local completamente bloqueadas. “Só temos espaço para fazer a descarga e voltar a sair, nem sequer o veiculo pode arranjar balanço para arrancar”, descreve.

Como agiria a GNR e as outras forças?

Imaginando que um ou mais assaltantes conseguiriam entrar e fazer reféns, a primeira intervenção seria dos militares que ali prestam serviço permanente, que deviam fazer um perímetro de segurança, avisar a Unidade e acionar aquilo a que a Polícia chama de Incidente Táctico Policial (ITP). “Neste caso, com particularidades interessantes”, admite o tenente-coronel Bolas ao Observador. É que existem dois tipos de ITP: o normal e o grave.

Este último acontece quando está em causa um ataque terrorista ou uma intervenção que leve à participação de várias polícias — obrigando a secretária geral de Segurança Interna, Helena Fazenda, a assumir o comando da operação, em vez do comandante das forças no local.  “Mas, neste caso, o BdP funciona como uma ilha, não pertence ao Comando Territorial de Lisboa, porque todo o efetivo que lá presta serviço é da Unidade de Intervenção”, explica.

Para mais, na série espanhola umas das reféns é filha de um diplomata o que, a acontecer em Portugal, obrigaria à intervenção do Ministério dos Negócios Estrangeiros. “Considerando que é uma instalação crítica do Estado, estou em crer que o Governo teria de se envolver diretamente. Creio que se a secretária-geral não quisesse o Comando, teria de pelo menos assumir o controlo da operação”, considera o oficial. O que até podia ser feito a partir do seu gabinete em Lisboa.

Atiradores especiais da Unidade de Intervenção da GNR

Para o local seriam chamadas as várias valências da Unidade de Intervenção, como o Grupo de Intervenção de Operações Especiais, onde se incluem os negociadores e os especialistas em intelligence, o Grupo de Inativação de Engenhos Explosivos e até o Grupo de Intervenção Cinotécnica da Guarda (com cães polícias). Estes militares, que estão aquartelados na Pontinha, têm neste momento uma prontidão de zero minutos, ou seja, estão dentro das viaturas com os carros prontos a sair desde o momento em que exista um telefonema para o comandante. É assim desde os ataques em Paris, em que os países da União Europeia decidiram mudar os seus planos de alerta e alterar a prontidão de 30 minutos para zero.

Ainda assim, meia hora seria o tempo necessário para chegarem ao Carregado. “Num caso destes não me parece que a celeridade inicial seja muito relevante, porque o objeto do crime neste caso, pela frieza com que o mesmo foi planeado, não me parece que seja de fazer vítimas. Isso pode acontecer à posteriori se se enervarem”, considera o tenente-coronel Bolas. “Temos um protocolo de emprego de forças a aplicar face à tipologia do incidente. De acordo com o número de reféns, de assaltantes e com as armas usadas parece-me estarmos num tipo de incidente n.º5, o mais grave”, refere.

O plano de coordenação das forças e serviços de segurança num caso destes prevê que no posto de comando participem outras polícias. O oficial explica que Helena Fazenda poderia mandar chamar alguém do Serviço de Informações e Segurança ou mesmo da Força Aérea, caso fosse necessário, por exemplo, um helicóptero munido de câmaras para tentar perceber algo mais do assalto. Já a PJ normalmente está sempre presente num ITP, porque depois de terminado são eles que têm a competência para investigar este tipo de crimes.

O trabalho destas forças também poderá ser essencial para descobrir a identidade dos agressores e negociar com eles. Em “A Casa de Papel”, durante uma discussão entre Tóquio e Rio, uma refém acaba por fazer um vídeo do interior do local do crime que vai parar à mão da polícia. O vídeo permite identificar um dos assaltantes, Rio (especialista em programação e responsável pela inativação dos sistemas de segurança eletrónicos da Casa de Papel). Segue-se depois a identificação de Tóquio.

E a negociação?

Depois de avaliado o grau de ameaça, deve estabelecer-se a “ligação ao outro lado”, como explicou uma fonte policial ao Observador. E o incidente táctico policial, em teoria, desenvolve-se de acordo com vários fatores. Há reféns? Na ficção há funcionários e uma turma de jovens em visita de estudo. No Carregado trabalham cerca de 200 funcionários, mas não conseguimos saber se são permitidas visitas de estudo, uma vez que o Banco de Portugal não quis comentar nem responder às questões colocadas. As portas já chegaram a abrir-se, por exemplo, a jornalistas que tiveram direito a visitas guiadas e possibilidade de tirar fotografias.

É importante para as autoridades perceber se há vítimas e, sobretudo, perceber o que os assaltantes querem. E isso é trabalho para os negociadores.

A negociação é sempre feita por um negociador escolhido pelo seu perfil ou pelo perfil dos assaltantes. Em a “Casa de Papel” este trabalho é atribuído a “Raquel Murillo”, uma polícia que dizem ter o perfil ideal para o trabalho, mas que enfrenta alguns problemas pessoais. (Acaba de acusar o ex-marido, também ele polícia, de violência doméstica e o tribunal decreta uma ordem de afastamento da filha que têm em comum). Por vezes, os negociadores têm de recorrer a intérpretes e têm o trabalho mais dificultado.

A identificação dos suspeitos é um elemento importante para a negociação. “Descobrir a identidade das pessoas para perceber fragilidades, para criar laços, é importante, mas pode ter outro efeito”, avisa o oficial da GNR. No caso de um local tão fortemente vigiado, as autoridades iriam procurar ligações com funcionários que pudessem ser cúmplices.

Na série a polícia espanhola faz um vídeo com os pais de Rio a apelarem que ele se entregue e mostra-o. “Por vezes usamos intermediários, que podem ser importantes, um filho, a mulher, a mãe, que aparecem para desestabilizar emocionalmente. Quando eles percebem que já os identificámos deixam de ser uma coisa cinzenta. Conseguir sair do local e não ser descoberto dissipou-se. Isso pode gerar um sentimento de raiva e pode levar a suicídio ou homicídio.Outras vezes resulta muito bem, porque desestabiliza ao ponto de haver um convencimento da entrega”, explica o oficial da GNR.

Segundo a experiência do tenente-coronel Bolas, normalmente nos incidentes que envolvem armas de fogo, os suspeitos entregam-se ao fim de um dia e de uma noite de negociações. Mas já houve situações em que tal não aconteceu e que a Guarda teve que intervir, como a ocorrida no Pinhal Novo, em 2013, que acabou na morte do suspeito e de um militar da GNR.

As exigências dos assaltantes também fazem parte da vida real. Na série, para ganhar tempo, o “Professor” pede um barco que tinha sido apreendido com um carregamento de cocaína pelas autoridades. Por cá, se acontecesse no Carregado, a GNR admite que teria que dizer que não a certos pedidos. “As exigências são uma moeda de troca. São consideradas porque servem de moeda de troca ou ponte de entendimento. Devem ser atendidas na medida do possível, mas às vezes são negadas. São estabelecidas regras”, diz. Na série, os polícias fornecem comida e medicamentos sem qualquer discussão. “Porque ao nível biológico, se as pessoas passam fome ou sede, os seus níveis de ansiedade vão subir e vão ficar mais agressivas. Se comerem vai haver um relaxamento muscular e vai ser melhor para comunicar”, explica. Por vezes até existem pausas na negociação. As autoridades chegam a permitir que os suspeitos durmam. “Muitos deles acabam por se alcoolizar e o problema resolve-se de manhã quando passou a embriaguez”, diz.

A secretária geral de Segurança Interna, Helena Fazenda

Quando se decide intervir?

A resposta, na boca do tenente-coronel Bolas, não é simples. “Há várias questões, não há uma resposta linear. Mas existem orientações”, explica. Mais uma vez, usando o exemplo do Pinhal Novo, o oficial lembra que os “homens não disparam só à ordem, porque se aplica o princípio geral da legítima defesa”. Ou seja, se um atirador especial vê um suspeito com dois reféns que dispara sobre um deles e se prepara para atirar sobre o outro, então o atirador pode disparar.

“No Pinhal Novo, tínhamos no interior um militar nosso, que estava gravemente ferido e a esvair-se em sangue e que segundo o INEM ou atuávamos depressa ou ele morria. E foi esse perigo para a vida que determinou a entrada”, recorda.

Já nos casos de suicídio, em que os visados estão sozinhos, “negociamos até à exaustão, até ele se cansar”. Mas se houvesse um assalto à “Casa das Notas” no Carregado seria diferente. “Numa situação destas havia repercussões internacionais. Entraria aqui em questão a exposição em termos dos media ao nível internacional. Expõe o país e as suas fragilidades. Intervir ou não, em termos técnicos pode ser vantajoso…  Mas enquanto houver diálogo há sempre a possibilidade de convencimento da desistência”, considera. Na série, também a mediatização do caso é abordada. As televisões estão sempre em cima do acontecimento. E, a certa altura, a negociadora, Raquel, questiona mesmo como os jornalistas conseguem tanta informação.

Para a GNR, o desfecho de um caso destes “ficaria muito dependente da forma como o discurso da negociação decorreria”. A ideia era perceber se “a GNR estava a perder tempo e a deixar os suspeitos organizarem-se”. Na série, os assaltantes querem tempo precisamente porque também estão a tentar cavar um túnel para fugir.

Tendo em conta que é percetível que os suspeitos não querem ferir alguém e que os ferimentos causados se deveram a vicissitudes ou acidentes por se terem enervado, o tenente-coronel considera que, num caso semelhante em território português, que a secretária geral de Segurança Interna teria que propor ao Primeiro Ministro uma solução: dar luz verde para os militares entrarem na fábrica do dinheiro.

O facto de suspeitos e vítimas estarem vestidos da mesma forma poderá parecer uma forma de complicar o cenário, mas a GNR considera que, numa intervenção, a forma como estão vestidos não faria diferença. “Nenhum agressor ou vítima é libertado até serem feitas as identificações. O facto de estarem vestidos de igual só serve para não termos uma identificação imediata, mas na verdade vai materializar-se quando ela aponta uma arma ou dispara. Supõe-se que uma vítima não aponte uma arma à polícia e que não constitua ameaça”, diz.

Uma fonte da PSP recordou ao Observador o assalto ao BES de Campolide, em Lisboa, que agitou o verão de 2008. Neste caso, eram dois os assaltantes que irromperam na agência e que fizeram reféns funcionários e clientes. Foram longas horas de negociação até que os dois homens deixaram sair os clientes, mantendo os gerentes no interior da dependência bancária. A PSP acabou, horas depois, por estacionar o carro que os assaltantes exigiam à porta do banco. Mas mal os dois se aproximaram da porta, os snipers (atiradores especiais da Unidade Especial de Polícia) abriram fogo. Um dos assaltantes morreu no local, o outro foi julgado e condenado a 11 anos de prisão. Foi a primeira vez que um atirador especial da PSP fez uma vítima mortal para salvar reféns.

No verão de 2008, dois assaltantes entraram no BES de Campolide e fizeram reféns

“Do ponto de vista psicológico era completamente diferente. Eles não eram assaltantes preparados como os da série, estavam nervosos, cansados e isso também é tido em conta ao longo da operação”, explicou a fonte, que esteve no caso do BES e que agora acompanha a série. “É um pouco irreal. Seria impossível deixar os assaltantes a produzir dinheiro lá dentro. Nem que cortássemos a luz e a água, teríamos que impedir que o fizessem”, disse. No caso do BES, foi o diretor nacional da PSP quem decidiu atirar. Informou o então ministro da Administração Interna, Rui Pereira, e ele disse “para fazer o que fosse necessário e adequado”.

Se os assaltantes produzem dinheiro, mas não roubam, qual é o crime?

A ideia dos nove assaltantes da série é sair sem roubar dinheiro, por isso a ideia é produzi-lo. A acontecer em Portugal, ainda assim os suspeitos incorriam num crime de contrafação de moeda, punível entre os três e os 12 anos. Na série, apesar de não quererem fazer feridos, os assaltantes acabam por ter alguns percalços, o que os pode levar a incorrer em crimes de tentativa de homicídio (o homicídio simples é punível com uma pena entre os 8 e os 16 anos), tanto de um polícia logo no início do assalto, como de reféns. Em causa podem estar ainda crimes de ofensas corporais graves, de posse de arma proibida e de posse ilegal de arma e, até, de associação criminosa e sequestro de mais de duas dezenas de reféns. Em cúmulo jurídico, a pena a aplicar a um destes assaltantes (todos eles têm antecedentes criminais) podia atingir facilmente a pena máxima de cadeia em Portugal, que é de 25 anos.

Texto de Carolina Branco e Sónia Simões, ilustração de Maria Gralheiro.

será o dr. antónio costa liberal?

29 Março, 2018

rui a.

1. Não há nada de anormal nem de ofensivo no facto de se interpelar um partido político e os seus dirigentes acerca das suas origens e intenções. Tão pouco de confrontar os seus responsáveis com o que eles mesmos disseram, escreveram ou subscreveram. Pelo contrário, chama-se a isso responsabilidade democrática e é isso, entre outras coisas também importantes, que distingue as democracias liberais dos totalitarismos e das ditaduras: ética, transparência, responsabilidade e respeitabilidade. Qualquer partido, em regime democrático, deve cumprir estas regras mínimas

2. O meu interesse pela Iniciativa Liberal nasceu com uma brincadeira em que me envolvi por causa da recente vaga de novos partidos liberais que estão a surgir em Portugal. No facebook rascunhei dois ou três posts a brincar com o tema, sem qualquer destinatário preconcebido. Até que alguém me tagou no mesmo facebook sugerindo que, em vez de maldizer, avançasse para a frente de combate partidário, como alguém já teria feito. A pessoa em causa, constatei depois, tem responsabilidades na Iniciativa Liberal e foi assim que lá cheguei.

3. Fui, então, ver o que é que a coisa era. E, lamento dizê-lo, no site da organização encontrei um amontoado de banalidades que, por si mesmas, poderia encontrar em qualquer site dos nossos três partidos democráticos – PS, PSD e CDS, e que manifestamente não chegam para caracterizar como liberal um projecto político, quanto mais um partido já criado.

Escrevi aqui, no Blasfémias, um post sobre o que li no site do novo partido – o Manifesto Liberal – e logo recebi algumas metralhadas em resposta. O argumento mais falacioso de todos, repetido por várias pessoas envolvidas no projecto, é que aquilo é um «simples» manifesto e não o programa do partido, como se um manifesto de um projecto político nascente não contenha o seu ADN baptismal. Entre os vários ataques, um jovem mais azougado referiu a minha «desonestidade» por o ter feito, enquanto que o mesmo responsável que me tinha interpelado à «acção» disse que me deveria ter dirigido à posta restante do partido, em vez de estar numa página de arruaceiros a expor o tema. Fiquei esclarecido.

Como, todavia, sou uma pessoa de boa vontade, voltei ao site da organização e deparei-me, desta vez, com um documento intitulado «Programa – Portugal Mais Liberal», que terminava com umas frases sobre a União Europeia onde se podia ler que a Iniciativa Liberal pretende «uma maior integração europeia, com novos patamares de governação e de cidadania». Como isto é matéria importante, mas por si só significa pouco ou nada, escrevi outro texto perguntando-lhes o que queriam dizer. Não obtive resposta, a não ser de alguns comentadores de patrulha que insinuaram coisas medonhas sobre o meu interesse pela organização.

Mais recentemente, nuns comentários feitos no facebook, mais uma vez um responsável da Iniciativa Liberal apareceu, em tom irritadiço, a pedir que documentasse o que escrevera numa conversa entre amigos. Tendo-lhe respondido parcialmente ao que pedira, desqualificou a resposta como sendo uma «deturpação». Em face disso, fiquei-me por aí.

4. Ora, aqui chegados, é bom que os responsáveis da Iniciativa Liberal entendam que são eles – que se propõem ir para o governo do país – a prestar esclarecimentos aos eleitores e não os eleitores que lhes têm de prestar esclarecimentos a eles. E, de facto, há ainda muito por esclarecer.

Em primeiro lugar, donde vieram os sentimentos liberais aos protagonistas do partido, que nunca ninguém, em anos, lhos conheceu, nem por escrito, nem em conferências, nem (peço desculpa se errar) em lado nenhum?

Em segundo lugar, como conseguiram criar o partido? Onde disponibilizaram os documentos para serem assinados pelos 7.500 subscritores? Por que não se assistiu, nem sentiu, na sociedade portuguesa, ou nalguns dos seus sectores (nas Universidades, por exemplo, que são um bom caldo de cultura destas coisas) a um movimento de opinião que levasse a essa importante formação?

Em terceiro lugar, que espécie de liberalismo é que defendem, que não está reflectido no Manifesto, que não se lê nas entrevistas que dão nem nos artigos que escrevem, e que acabou num apelo público para que qualquer interessado possa contribuir para o programa, ou seja, para a ideologia do partido?

Em quarto lugar, se ainda não tem o tal programa, nem personalidades públicas relevantes, qual foi o motivo com que convenceram 7.500 cidadãos portugueses a assinarem a constituição do partido.

5. Como não sou pessoa de meias palavras, vou dizer o que penso.

E o que penso é que o grupo de fundadores da Iniciativa Liberal terá saído de círculos próximos do Partido Socialista e que ao Partido Socialista lhe convém ter por perto um partido liberal.

Fundamento.

Em primeiro lugar, porque o esforço de criação do partido não se viu em lado nenhum (pelo menos, a mim passou-me despercebido, pelo que agradeço que me corrijam, se estiver enganado), e não é com duas tretas que se recolhe 7.500 assinaturas para este fim, prontas a serem validadas no Tribunal Constitucional. Exige profissionalismo, que, por enquanto, não se vislumbra na organização.

Em segundo lugar, porque há pessoas muito próximas da Iniciativa Liberal ligadas ao PS ou, pelo menos, directamente a António Costa. As pessoas podem mudar de ideias? Claro que sim. Talvez tenha acontecido aqui. Quem sabe? Esperemos que sim.

Em terceiro lugar, porque não seria coisa nova no PS., que já em tempos, numa tentativa de partir o PSD, contribuiu para a formação da ASDI (com quem se coligaria eleitoralmente) e formou uma ala democrata-cristã, para ir pescar às águas mais conservadoras do CDS. O liberalismo tem já alguma marca política em Portugal, e antes que outros lá cheguem, sobretudo no PSD e no CDS, há que ocupar o espaço. Confesso, de resto, a minha admiração pela insistência com que alguns responsáveis pelo projecto referem que o PSD e o CDS não foram liberais no último governo, como se fosse possível sê-lo num governo que mais não era do que um executor de um programa internacional de reestruturação financeira. E acho que essa minha estupefação ajuda o meu argumento.

6. Dito isto convém que fique muito claro que nada de mal tem em que um partido político viabilize a criação de um outro que, ou por razões puramente ideológicas ou meramente pessoais, não cabe completamente no que já existe. Vejam-se, por exemplo, o caso do PEV, ou aquilo em que o MDP-CDE se transformou no pós-25 de Abril. Como nada de grave há em que um grupo de pessoas, eventualmente mais próximas de um liberalismo social, se constitua em partido. A família liberal não é unívoca e, de resto, a ascendência portuguesa é muito mais próxima dessa forma de ver o liberalismo do que de um liberalismo de raízes anglo-saxónicas ou austríacas. Basta olhar para o século XIX. Como existe uma tradição liberal fortíssima que sai da Revolução Francesa e ainda hoje influencia grupos e partidos por esse mundo fora. Só que temos que ser claros e esclarecer donde vimos, quem somos e o que pretendemos. O jogo da democracia é isso mesmo e quem quer ficar por cá nos próximos cinquenta anos tem que se habituar a ele. Com transparência e clareza, sem azedumes nem azias.

P.S. (não o referido no texto, note-se): o título deste texto, apesar de colocado sob interrogação, é, obviamente, provocatório, esperando, sinceramente, estar enganado. Quando os responsáveis pela Iniciativa Liberal mo demonstrarem, não hesitarei em reconhecê-lo publicamente.