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quarta-feira, 13 de janeiro de 2021

Depois do desastre

Posted: 12 Jan 2021 03:25 AM PST

 


«Referiu-se aqui o "feitiço" do Natal; parece agora mais apropriado falar de "maldição". 

Ninguém hoje nega que o disparo enorme dos contágios que atualmente nos assusta e põe em causa todo o sistema se deve à onda das compras e às reuniões de família e amigos. Fez-se a opção entre duas maneiras de morrer: ou numa cama de hospital ou numa letal consoada a dois. 

A sensibilidade social da quadra levou as autoridades a fazer uma aposta na sensatez das pessoas, que foi escandalosamente perdida. Fez-se batota com a covid, mas o vírus não brinca. 

Mantidas as regras, a soma das festas de fim de ano ao Natal teria resultado numa irremediável e impensável catástrofe nacional. O português médio continua a exigir um modo de vida muito próximo da velha normalidade, só desperta para o problema quando está deitado de borco numa cama com quatro enfermeiros à volta. Procura-se agora o nível adequado de confinamento para o futuro imediato. 

E mais uma vez se tende a ignorar o papel das escolas em toda a situação. Não que as escolas sejam lugares inseguros, mas o seu funcionamento presencial gera uma imensa movimentação de saídas e entradas, de levar e trazer, que foi - a não ser que alguém prove o contrário - responsável pelo primeiro sobressalto dos números, verificado a partir da segunda metade de setembro, não só em Portugal, mas em toda a Europa. 

Pelo menos no Ensino Superior e nos últimos anos do Secundário, a passagem ao ensino online é uma medida razoável e adequada à travagem do alastramento da infeção.» 

António Monteiro Fernandes 

Procuradoria Europeia: uma triste novela portuguesa seguida de uma confusão lamentável

por estatuadesal

(Daniel Oliveira, in Expresso Diário, 12/01/2021)

Se pegássemos em cada um dos elementos da cansativa novela da escolha do procurador europeu, podia ser apenas incómodo. O problema é quando juntamos tudo. Não suspeito que o PS esteja a tentar dominar a Procuradoria Europeia. Suspeito de guerras corporativas. Como se tudo já não fosse péssimo, Costa acrescentou-lhe a pior das confusões: a que toma o governo pela Nação. Foi salvo pelo PSD, que apresentou uma queixa-crime contra o primeiro-ministro. Nada se safa nesta novela portuguesa.

O Conselho Superior do Ministério Público (CSMP) escolheu José Guerra, relegando Ana Carla Almeida para terceiro lugar. Teve como critério a antiguidade. Parece que o critério surgiu depois de se conhecerem os candidatos, o que é absurdo. Mas por esse absurdo o governo não tem qualquer responsabilidade. Chegada ao júri europeu, a escolha foi invertida, com Ana Carla Almeida em primeiro lugar. O critério foi a currículo em investigação de crimes económicos. O governo optou pela escolha nacional. Tendo em conta que escolha europeia não era vinculativa, a opção da ministra da Justiça era legitima. Só obrigaria a um cuidado redobrados.

Dois problemas: a magistrada preterida anda a investigar o caso das golas anti-fumo, que envolve o governo e há proximidades antigas da ministra com o magistrado que foi selecionado (trabalhou com ela no DIAP de Lisboa). Mais uma vez, cada uma das coisas isoladas não levanta problemas: um magistrado que esteja a investigar o governo não passa à frente dos restantes só para não levantar suspeitas; como a ministra é magistrada do Ministério Público é quase inevitável que tenha relações com muitos dos envolvidos, sobretudo se forem de topo. Estes dois factos, associados ao do governo ter contrariado a decisão do júri europeu, obrigariam a cuidados ainda mais redobrados.

Quando se percebe que a carta que acompanhou o currículo (e não o currículo), em novembro de 2019, tem dois erros de palmatória (chamem-lhe mentiras ou lapsos, conforme a severidade do julgamento) que têm a coincidência de favorecer o escolhido (a de que era Procurador Geral Adjunto e a de que dirigiu a investigação ao caso da UGT, quando só foi procurador no julgamento), tudo começa a cheirar mesmo mal. Nesta altura, já não se pode escrever que esta trapalhada, que isolada poderia ser apenas isso, exige cuidados redobrados. Porque já todos os cuidados foram descurados. Ainda mais quando o demissionário diretor-geral de Política de Justiça, ainda por cima um dos autores do programa do PS para o setor, garante que a ministra conhecia a carta.

Não suspeito que o PS esteja a tentar dominar a Procuradoria Europeia. Não me parece que ambição seja tanta e que uma carta chegasse para tal coisa. Suspeito que esta história tem mais a ver com guerras corporativas. E que isto demonstra que não é excelente ideia ter uma magistrada como ministra da Justiça. A moda da tecnocracia retirou ao poder político a autonomia em relação às áreas que tutela. E isso tem, como se vê neste caso, efeitos. Em vez de estar acima das guerras intestinas dos poderes do Estado, faz parte deles.

Como se tudo isto não fosse péssimo, António Costa resolveu acrescentar-lhe a pior das confusões. Ao dizer que as críticas, justas ou injustas, excessivas ou não, de Paulo Rangel e Poiares Maduro eram uma campanha contra o país, toma o governo pela Nação. Um democrata, como António Costa indubitavelmente é, não pode fazer uma confusão destas. É que criticar a um procedimento administrativo do governo não é o mesmo que andar na Europa, no meio de uma negociação com Comissão Europeia em torno do orçamento, a advogar contra o Portugal para conseguir que ele fosse vetado, como aconteceu no início da “geringonça”. O que se fez há quatro anos é politicamente inaceitável – porque tenta nos corredores de Bruxelas o que não conseguiu no Parlamento nacional –, a critica a uma escolha para um cargo europeu é legitima. Mas Costa tem sorte. É sempre salvo pelo PSD. Pôr um processo contra o primeiro-ministro, tentando judicializar um combate político, faz o pleno do disparate. Nada se safa nesta novela portuguesa.

 

Trump não tomará cianureto


por estatuadesal

(Boaventura Sousa Santos, in Outras Palavras, 11/01/2021)

Alienado como Hitler sob cerco do Exército Vermelho, presidente não está, porém, perdido. Crê que seu futuro apenas começou, e nisso tem razão. Mas quem dará as cartas não é a sua vontade – e sim três fatores, que merecem ser examinados a fundo.

Trump não é Hitler, os EUA não são a Alemanha nazista, nenhum exército invasor está a caminho da Casa Branca. Apesar de tudo isto, não é possível evitar uma comparação entre Trump nestes últimos dias e os últimos dias de Hitler. Hitler no seu bunker, Trump na Casa Branca. Os dois, tendo perdido o sentido da realidade, dão ordens que ninguém cumpre e, quando desobedecidos, declaram traições, e estas vão chegando até aos mais próximos e incondicionais: Himmler, no caso de Hitler, Mike Pence, no caso de Trump. Tal como Hitler se recusou a acreditar que o Exército Vermelho soviético estava a dez quilômetros do bunker, Trump recusa-se a reconhecer que perdeu as eleições. Terminam aqui as comparações. Ao contrário de Hitler, Trump não vê chegado o seu fim político e muito menos recolherá ao seu quarto para, juntamente com a mulher, Melania Trump, ingerir cianureto, e ter os seus corpos incinerados, conforme testamento, no exterior do bunker, ou seja, nos jardins da Casa Branca. Por que não o faz?

No final da guerra, Hitler sentia-se isolado e profundamente desiludido com os alemães por não terem sabido estar à altura dos altos destinos que lhes reservara. Como diria Goebbels, também no bunker: “O povo alemão escolheu o seu destino e agora as suas pequenas gargantas estão sendo cortadas”. Ao contrário, Trump tem uma base social de milhões de norte-americanos e, entre os mais fiéis, grupos de supremacistas brancos armados e dispostos a seguir o líder, mesmo que a ordem seja invadir e vandalizar a sede do Congresso. E, longe de ser pessimista a respeito deles, Trump considera os seus seguidores os melhores norte-americanos e grandes patriotas, aqueles que farão a “America great again”. Hitler sabia que tinha chegado ao fim e que o seu fim político seria também o seu fim físico. Trump, longe disso, acredita que a sua luta verdadeiramente só agora começa, porque só agora será convincentemente uma luta contra o sistema. Enquanto muitos milhões de norte-americanos querem pensar que o conflito chegou ao fim, Trump e os seus seguidores desejam mostrar que agora é que vai começar – e continuará até que a América lhes seja devolvida. Joe Biden está, pois, equivocado quando, ao ver a vandalização do Congresso, afirma que isto não é os EUA. É, sim, porque os EUA são um país que não só nasceu de um ato violento (a chacina dos índios), como foi por via da violência que todo o seu progresso ocorreu, traduzido em vitórias de que o mundo tantas vezes se orgulhou, da própria união dos Estados “Unidos” (620.000 mortos na guerra civil) até à luminosa conquista dos direitos cívicos políticos por parte da população negra (inúmeros linchamentos, assassinatos de líderes, sendo Martin Luther King. Jr. o mais destacado entre eles), como ainda é o país onde muitos dos melhores líderes políticos eleitos foram assassinados, de Abraham Lincoln a John Kennedy. E essa violência tanto dominou a vida interna como toda a sua política imperial, sobretudo depois da II Guerra Mundial. Que o digam os latino-americanos, o Vietnã, os Balcãs, o Iraque, a Líbia, os palestinos, etc.

Joe Biden também está equivocado quando diz que o pesadelo chegou ao fim e que agora se vai retomar o caminho da normalidade democrática. Pelo contrário, Trump tem razão ao pensar que tudo está a começar agora. O problema é que ele, ao contrário do que pensa, não controla o que vai começar e, por isso, os próximos anos tanto lhe podem ser favoráveis, reconduzindo-o à Casa Branca, como podem ditar o seu fim, um triste fim. Enquanto sistema político e social, os EUA estão num momento de bifurcação, um momento, próprio dos sistemas muito afastados dos pontos de equilíbrio, em que quaisquer pequenas mudanças podem produzir desproporcionadas consequências. É, pois, mais difícil ainda do que o usual prever o que se vai passar. Identifico três fatores que podem causar mudanças num ou noutro sentido: desigualdade e fragmentação, primado do direito, Stacey Abrams.

Desigualdade e fragmentação. Desde a década de 1980, a desigualdade social tem vindo a aumentar, tanto que os EUA são hoje o país mais desigual do mundo. A metade mais pobre da população tem hoje apenas 12% do rendimento nacional, enquanto o 1% mais rico tem 20% desse rendimento. Nos últimos quarenta anos o neoliberalismo ditou o empobrecimento dos trabalhadores norte-americanos e destruiu as classes médias. Num país sem serviço público de saúde e sem outras políticas sociais dignas do nome, uma em cada cinco crianças passa fome. Em 2017, um em cada dez jovens com idade entre os 18 e os 24 anos (3.5 milhões de pessoas) tinha passado nos últimos doze meses por um período sem lugar onde morar (homelessness). Endoutrinados pela ideologia do “milagre americano” das oportunidades e vivendo num sistema político fechado que não permite imaginar alternativas ao status quo, a política do ressentimento que a extrema-direita é exímia em explorar fez com que os norte-americanos vitimizados pelo sistema considerassem que a origem dos seus males estava noutros grupos ainda mais vitimizados que eles: negros, latinos ou imigrantes em geral. Com a desigualdade social aumentou a discriminação étnico-racial. Os corpos racializados são considerados inferiores por natureza; se nos causam mal, não há que discutir com eles. Há que neutralizá- los, depositando-os em prisões ou matando-os. Os EUA têm a taxa de encarceramento mais alta do mundo (698 presos por 100.000 habitantes). Com menos de 5% da população mundial, os EUA têm 25% de população prisional. A probabilidade de jovens negros serem condenados a penas de prisão é cinco vezes superior à de jovens brancos. Nestas condições, é de surpreender que o apelo ao anti-sistema seja atrativo? Note-se que há mais de 300 milícias armadas de extrema-direita espalhadas por todo o país, um número que cresceu depois da eleição de Obama. Se nada for feito nos próximos quatro anos para alterar esta situação, Trump continuará a alimentar, e com boas razões, a sua obsessão de voltar à Casa Branca.

Primado do direito. Os EUA transformaram-se nos campeões mundiais da rule of law e da law and order. Durante muito tempo, em nenhum país se conhecia o nome dos juízes do Supremo Tribunal, exceto nos EUA. Os tribunais norte-americanos exerciam com razoável independência o papel de zelar pelo cumprimento da Constituição. Até que certos sectores das classes dominantes entenderam que os tribunais podiam ser postos mais ativamente ao serviço dos seus interesses. Para isso, decidiram investir muito dinheiro na formação de magistrados e na eleição ou nomeação de juízes para os tribunais superiores. Esta mobilização política da justiça teve uma dimensão internacional quando, sobretudo depois da queda do Muro de Berlim, a CIA e o Departamento de Justiça passaram a investir fortemente na formação de magistrados e na mudança da lei processual (delação premiada) dos países sob a sua influência. Assim surgiu a lawfare, guerra jurídica, de que a Operação Lava-Jato no Brasil é um exemplo paradigmático. Trump cometeu vários crimes federais e estaduais, entre eles, obstrução da justiça, lavagem de dinheiro, financiamento ilegal de campanha eleitoral e crimes eleitorais (o mais recente dos quais foi a tentativa de alterar fraudulentamente os resultados das eleições na Geórgia em Janeiro de 2021). Funcionará o sistema penal como nos habituou no passado? Se assim for, Trump será condenado e muito provavelmente preso. Se isso acontecer, o seu fim político estará próximo. Caso contrário, Trump trabalhará a sua base, dentro ou fora do partido republicano, para regressar com estrondo em 2025.

Stacey Abrams. Esta ex-congressista negra é a grande responsável pela recente eleição dos dois senadores democratas no estado da Geórgia, uma vitória decisiva para dar a maioria do Senado aos democratas e permitir assim que Biden não seja objeto de obstrução política permanente. Qual é o segredo desta mulher? Ao longo de dez anos procurou articular politicamente todas as minorias pobres da Geórgia – negras, latinas e asiáticas – um estado onde 57.8% da população é branca, um estado tido por racista e surpremacista, onde tradicionalmente ganham os conservadores. Durante anos, Abrams criou organizações para promover o registo eleitoral das minorias pobres alienadas pelo fatalismo de ver ganhar sempre os mesmos opressores. Orientou o trabalho de base para incentivar a união entre os diferentes grupos sociais empobrecidos, tantas vezes separados pelos preconceitos étnico-raciais que alimentam o poder das classes dominantes. Ao fim de dez anos, e depois de uma carreira notável que podia ter atingido o auge com a nomeação para vice-presidente de Biden – no que foi preterida em favor de Kamala Harris, mais conservadora e próxima dos interesses das grandes empresas de informação e de comunicação de Silicon Valley – Abrams consegue uma vitória que pode liquidar a ambição de Trump de regressar ao poder. No mesmo dia em que os vândalos partiam vidros e saqueavam o Capitólio, festejava-se na Geórgia este feito notável, uma demonstração pujante de que o trabalho político que pode garantir a sobrevivência das democracias liberais nestes tempos difíceis não pode estar limitado a votar de quatro em quatro anos, e nem sequer ao trabalho nas comissões parlamentares por parte dos eleitos. Exige trabalho de base nos locais inóspitos e muitas vezes perigosos onde vivem as populações empobrecidas, ofendidas e humilhadas que, quase sempre com boas razões, perderam o interesse e a esperança na democracia. O trabalho de Stacey Abrams, multiplicado pelos movimentos Black Lives Matter, Black Voters Matter e tanto e tantos outros, muitos deles inspirados por Bernie Sanders e a “nossa revolução” por ele animada, podem vir a devolver à democracia norte-americana a dignidade e a vitalidade que Trump pôs em risco. Se assim for, a melhor lição que os norte-americanos podem aprender é que o mito do “excepcionalismo americano” é isso mesmo, um mito. Os EUA são um país tão vulnerável como qualquer outro a aventuras autoritárias. A sua democracia é tão frágil quanto frágeis forem os mecanismos que podem impedir autocratas, antidemocratas de serem eleitos democraticamente. A diferença entre eles e os ditadores é que, enquanto estes últimos começam por destruir a democracia para chegar ao poder, os primeiros usam a democracia para ser eleitos, mas depois recusam-se a governar democraticamente e abandonar democraticamente o poder. Da perspectiva da cidadania, a diferença não é muito grande. 

Trump pode se tornar primeiro presidente dos EUA alvo de dois impeachments

Os democratas na Câmara dos EUA devem votar nesta quarta-feira o processo de impeachment contra Trump pela incitação à invasão no Capitólio

O presidente americano, Donald Trump, pode entrar hoje para a história: o republicano pode terminar o dia sendo o primeiro presidente americano a ter dois processos de impeachment abertos contra si e aprovados pela Câmara.

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Os democratas tentam avançar nesta quarta-feira, 13, na votação de um processo de impeachment relâmpago contra Trump pela incitação à invasão no Capitólio na última semana.

Na noite de terça-feira, 12, os democratas já votaram na Câmara para pedir que o vice-presidente Mike Pence desencadeie a chamada Emenda 25 da Constituição. Pela regra, um presidente pode ser destituído por incapacidade.

Como Pence não deve pedir a destituição de Trump, os democratas na Câmara tendem a votar ainda nesta noite o processo de impeachment direto.

Em carta à presidente democrata da Câmara, Nancy Pelosi, Pence disse que “eu não acredito que tal curso de ação está no melhor interesse da nossa nação ou é consistente com nossa Constituição”, disse, sobre ativar a emenda 25.

Na votação para exigir que Pence avalie a emenda 25, a Câmara terminou com votação de 223 votos a favor e 205 contra. A expectativa no impeachment é que ao menos 217 deputados votem a favor do impeachment, o suficiente para o processo ser aprovado.

Na votação do impeachment hoje, os democratas esperam contar com alguma ajuda também dos republicanos. Ao menos cinco deputados do partido afirmaram que votariam a favor do impeachment.

O caso mais emblemático foi da deputada Liz Cheney, que faz parte da liderança republicana na Casa. “Nunca houve uma traição maior do presidente dos Estados Unidos de seu cargo e de seu juramento à Constituição”, disse, sobre a invasão no Capitólio em 6 de janeiro. Segundo ela, o presidente “convocou a multidão, organizou a multidão e acendeu a chama deste ataque”.

Liz Cheney é filha, inclusive, de um ex-vice-presidente republicano, Dick Cheney.

Também ontem, Trump fez sua primeira aparição pública desde a invasão do Capitólio. No discurso, no Texas, o presidente repetiu que a vitória do democrata Joe Biden na eleição é ilegítima e disse não ser culpado pela invasão no Congresso.

Os republicanos vão apoiar o impeachment?

Após o processo passar na Câmara hoje, contudo, não está claro qual será o próximo movimento no Congresso. Os democratas têm maioria na Câmara e, além disso, a Casa só exige maioria simples para o impeachment. No Senado, onde após a aprovação na Câmara acontece um julgamento das ações do presidente, serão precisos dois terços dos senadores.

Embora os democratas tenham ganhado uma pequena maioria com a vitória de dois senadores na Geórgia, a vantagem ainda será muito pequena. Seria preciso que ao menos 17 republicanos dos 100 senadores votem contra Trump.

Republicanos e democratas terão 50 senadores na nova legislatura, e, depois da posse de Biden, vota também a vice-presidente Kamala Harris, já que o cargo de vice é também de líder no Senado — o que garante vantagem de um voto aos democratas em votações de maioria simples, embora não suficiente no impeachment.

O impeachment também não deve terminar no Senado antes da posse de Biden, em 20 de janeiro. Assim, mais do que retirar o presidente Donald Trump do cargo, o impeachment deve funcionar como o real julgamento das ações e definição do futuro de Trump na vida pública. A depender de como o caso avance, Trump pode, por exemplo, ficar impedido de se candidatar de novo em 2024.

A grande dúvida é o quanto republicanos no Senado podem apoiar o impeachment. Ontem, o New York Times divulgou que o líder republicano na Casa, Mitch McConnell, estaria avaliando a ideia de apoiar em partes o processo para que Trump perca força internamente dentro do partido.

O primeiro processo de impeachment contra Trump, aprovado pela Câmara democrata na ocasião, foi no começo de 2020. O presidente era acusado de abuso de poder e obstrução do Congresso. Em janeiro daquele ano, o Senado, de maioria republicana, votou contra ambos os casos.

terça-feira, 12 de janeiro de 2021

Brasil sem plano de vacinação

De  Anelise Borges
Brasil continua sem calendário para as vacinas
Brasil continua sem calendário para as vacinas   -   Direitos de autor  Eraldo Peres/Copyright 2020 The Associated Press. All rights reserved
TAMANHO DO TEXTOAaAa

Para quem admira a paisagem do Rio de Janeiro a partir do cimo do Pão de Açúcar, parece difícil de imaginar que este é um país que está a ser martirizado pela Covid-19.

As praias cheias também parecem esconder uma realidade dura. O Brasil chegou, há poucos dias, à marca dos 200 mil mortos causados pela pandemia, com números superiores a mil mortos diários. Nas grandes cidades, como o Rio de Janeiro, São Paulo ou Manaus, o panorama é trágico, com hospitais sobrelotados.

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Segundo Marcelo Gomes, do instituto Fiocruz, os números verdadeiros podem ser muito superiores aos divulgados, já que a época das festas de final de ano, com muita gente de férias, é propícia a que os números só cheguem com muito atraso.

O Brasil tem dificuldade em avaliar a verdadeira dimensão da crise de saúde pública causada pela Covid-19 e não parece haver fim à vista nos problemas do país. O ministério da Saúde ainda não tem um programa nacional de vacinação detalhado. Sem uma visão clara de quando e como a população vai ser vacinada, as clínicas privadas começam a tomar iniciativas e a fazer os próprios acordos para importar doses para quem as pode pagar.

Gonzalo Vecina Neto, ex-diretor e um dos fundadores da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) critica o que se está a passar e frisa que a distribuição das vacinas não pode privilegiar ninguém: "É inaceitável que quem tem dinheiro possa passar à frente do público geral", disse à euronews.

Ninguém pode passar à frente dos outros só por ter dinheiro.
Gonzalo Vecina Neto 
Ex-diretor da Anvisa

O presidente Jair Bolsonaro insiste na narrativa de que o país não pode parar. As restrições aplicam-se apenas localmente, como no caso de Manaus, que decretou um estado de emergência. Os serviços de saúde começam a preparar-se para o pior e estima-se que a situação mais grave chegue nas próximas semanas.