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quinta-feira, 20 de julho de 2017

Fecho de mercados: Risco da dívida portuguesa em mínimos e euro em máximos com Draghi

Depois de Mario Draghi não ter feito alterações no discurso do BCE sobre as políticas de expansão económica, o prémio de risco da dívida portuguesa recuou para mínimos de Janeiro de 2016 e o euro disparou para o valor mais alto contra o dólar desde Agosto de 2015.
Fecho de mercados: Risco da dívida portuguesa em mínimos e euro em máximos com Draghi
Bloomberg

David Santiago
David Santiago dsantiago@negocios.pt
20 de julho de 2017 às 17:26

Os mercados em números
PSI-20 ganhou 0,23% para 5.314,35 pontos
Stoxx 600 caiu 0,38% para 383,77 pontos
S&P 500 cede 0,06% para 2.472,25 pontos
Juros da dívida a dez anos recuam 5,9 pontos base para 3,009%
Euro sobe 1,10% para 1,1642 dólares
Brent cai 0,38% para 49,51 dólares
Bolsas europeias sem rumo definido
As principais bolsas europeias negociaram sem uma tendência definida, divididas entre ganhos e perdas depois de Mairo Draghi ter anunciado esta quinta-feira, 20 de Julho, que o Banco Central Europeu só no Outono decidirá sobre um eventual novo rumo a dar à política monetária da instituição.
O PSI-20 ganhou 0,23% para 5.314,35 pontos, com a praça lisboeta a ser apoiada pela valorização do BCP que somou 1,95% para 25,1 cêntimos. Já o índice de referência europeu Stoxx 600 perdeu 0,38% para 383,77 pontos. Em forte alta negoceia Wall Street, numa sessão em que os índices Standard & Poor’s 500 e Nasdaq Composite voltaram a registar novos máximos de sempre, beneficiando da melhoria do mercado laboral e dos resultados positivos apresentados por várias cotadas.
Juros em queda e prémio de risco da dívida em mínimos
Os juros da dívida pública portuguesa estão a cair em quase todas as maturidades, exceptuando o prazo a seis meses. A taxa de juro associada às obrigações lusas com maturidade a 10 anos está a recuar 5,9 pontos base para 3,009%, num dia em que já chegou a estar abaixo da barreira dos 3% (2,999%), o que representa um mínimo de 6 de Julho.
Já o prémio de risco da dívida lusa – medido contra os juros da dívida alemã, tidos como referência para a Zona Euro – está no valor mais baixo desde Janeiro de 2016, em torno dos 248 pontos.
Também os juros da generalidade dos países do bloco do euro estão em queda, com as taxas de juro associadas às obrigações a 10 anos de Espanha e de Itália a caírem 7,5 e 7,9 pontos base para 1,485% e 2,114%, respectivamente. A taxa de juro associada às "bunds" alemãs também recua 1,2 pontos base para 0,530%
Depois de a generalidade das obrigações de dívida negociadas no mercado secundário dos países do euro estar em alta durante a manhã – em concreto a dívida portuguesa – a declaração feita pelo presidente do BCE ao início da tarde acabou por provocar um volte-face. Mario Draghi não fez qualquer tipo de alteração ao discurso de continuidade das políticas de expansão económica em vigor, com o italiano a não fazer qualquer referência ao fim do programa de compra mensal de activos, o que foi lido pelos mercados como um sinal de estabilidade.
Euribor a 3 e 6 meses em mínimos
A Euribor a três e a seis meses fixou-se mínimos esta quinta-feira. A três meses manteve-se em -0,332%, um mínimo de sempre, e a seis meses, a taxa mais utilizada em Portugal nos créditos à habitação, continuou no mínimo de sempre pelo terceiro dia (-0,274%).
No prazo a 12 meses a taxa Euribor permaneceu em -0,151%, enquanto a Euribor a nove meses caiu hoje para -0,206%.
Euro em máximos de Agosto de 2015 contra o dólar
A moeda única europeia está a valorizar 1,10% para 1,1642 dólares, estando assim a negociar nos mercados cambiais no valor mais alto face à divisa norte-americana desde 29 de Agosto de 2015 depois de já ter tocado nos 1,1658 dólares.
Também a valorização do euro está a ser potenciada pelas declarações hoje feitas por Mario Draghi, que não deu qualquer indicações no sentido de um atenuar da política monetária do BCE.
Petróleo desvaloriza
O petróleo segue em queda nos mercados internacionais, com o Brent, transaccionado em Londres e utilizado como valor de referência para as importações nacionais, a cair 0,38% para 49,51 dólares por barril.
Na mesma linha, em Nova Iorque o West Texas Intermediate (WTI) cai 0,47% para 46,90 dólares por barril.
Ouro regressa às valorizações para máximo de 30 de Junho
Depois de ontem ter desvalorizado pela primeira vez em quatro sessões, o metal precioso retomou esta quinta-feira as valorização estando agora a subir 0,43% para 1.246,55 dólares por onça, estando assim a transaccionar em máximos de 30 de Junho.
está a perder brilho pela primeira vez em quatro dias, penalizado pela recuperação do dólar. O ouro cai 0,2% para 1.239 dólares por onça, com os investidores focados nas decisões de política monetária do BCE, esta quinta-feira, e da Reserva Federal dos EUA, na próxima semana.

Fonte: Jornal de Negócios

terça-feira, 4 de julho de 2017

Lágrimas de crocodilo



por estatuadesal
(Manuel Carvalho da Silva, in Jornal de Notícias, 02/07/2017)

carvalho_da_silva

Mario Draghi esteve em Sintra no dia 27 de junho no Fórum da Banca Central e abriu os trabalhos com um discurso revelador. Disse-nos que desde há três anos está preocupado com a estagnação dos preços, ou mesmo deflação, na Zona Euro.

Mario Draghi tem razões para estar preocupado. Falta perceber se essas razões decorrem da sua constatação de que os povos têm sido sacrificados em vão, ou se, sendo evidente essa injustiça e ineficácia, ele se preocupa porque ainda não inventou novos processos para assegurar futuro a este capitalismo neoliberal predador. Draghi e seus pares têm construído estratégias monetárias e financeiras que vão encanando a perna à rã e no imediato deixam os povos respirar um pouco melhor, mas as suas políticas contribuem para "o programa de sociedade" neoliberal continuar a ser consentido, quer pela passividade associada à subjugação, quer pela abstenção que atrofia a democracia.
Num contexto em que o geral das empresas vende os seus produtos a preços quase estagnados e muitos trabalhadores veem o valor do seu trabalho (salários) diminuir, uns e outros são cada vez mais exauridos pelo peso da dívida no seu rendimento.
Para combater a deflação o BCE adotou uma política monetária, dita não convencional, que passa pela fixação de taxas de juros a níveis muito baixos - até negativos - e pela compra de títulos públicos e privados. Esta política tem, por um lado, impedido que o peso dos juros no rendimento dos endividados (incluído o Estado português) se tornem insuportáveis, e por outro, tem beneficiado os detentores de propriedade imobiliária e mobiliária, ao reforçar o valor dos seus ativos (ações, obrigações, edifícios e terrenos). Entretanto, a inflação continua abaixo da meta do BCE e isso preocupa Draghi.
O governador do BCE mostra-se particularmente perplexo com o facto de os preços não aumentarem num contexto em que, em toda a Zona Euro, o PIB vai crescendo acima da tendência e o desemprego diminui. Procura explicações para o que designa de "situação inabitual" e adianta as seguintes: a primeira remete para a descida dos preços da energia e de outras matérias-primas nos mercados mundiais; a segunda aponta uma maior disponibilidade das pessoas para trabalharem mais barato, em consequência dos processos migratórios e do retorno dos inativos ao mercado de trabalho; a terceira está associada à existência de um desemprego muito superior ao que é medido pelas estatísticas convencionais (segundo Draghi, uma medida mais larga de desemprego que inclua o subemprego e alguns inativos atiraria a taxa de desemprego na Zona Euro para 18%); a quarta - a mais surpreendente - aponta para os efeitos das "reformas estruturais" no mercado de trabalho. Disse Draghi, "o comportamento de fixação dos preços e dos salários na Zona Euro pode ter mudado durante a crise, de forma a abrandar a resposta da inflação (...) por exemplo, as reformas estruturais que aumentaram a negociação salarial ao nível das empresas podem ter tornado os salários mais flexíveis à descida, mas não necessariamente à subida". É caso para perguntar: os Draghi desta Europa são tão impreparados que não saberiam que isto inevitavelmente aconteceria?
É evidente que as "reformas estruturais" do mercado de trabalho impostas pelo BCE, até como condição dos seus resgates, reduziram a capacidade negocial dos trabalhadores e dos sindicatos, avançaram num conceito de negociação assente na unilateralidade do poder patronal, obrigaram trabalhadores idosos a procurar emprego, generalizaram o trabalho barato dos jovens e forçaram a sua emigração. Entretanto, a inflação pode mesmo surgir. Resta saber se não será sob forma de uma bolha especulativa no imobiliário das grandes cidades, incluindo em Portugal.
Deixem-se de hipocrisia. Os diagnósticos há muito estão feitos, existem propostas alternativas bem fundamentadas por amplos setores técnicos e científicos passíveis de forte apoio social. Em Portugal, não se devem adiar por mais tempo a revisão cirúrgica da legislação laboral, o incremento da negociação coletiva, o combate à precariedade laboral e a promoção do emprego digno.