Translate

segunda-feira, 30 de outubro de 2017

Sobre o juiz que se limitou a cumprir a lei



Blasfémias

por JoaoMiranda

As pessoas têm uma noção muito errada das leis que nos regem e de como chegamos a elas. Mas a ideia é reabilitar o criminoso, não é puni-lo nem trazer justiça à vítima. Está tudo vertido no código penal. Chegamos aqui deliberadamente. São os que mais promoveram isto que agora querem penas efectivas para violência doméstica (porque é o crime da moda).

Artigo 50.º
1 - O tribunal suspende a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a cinco anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
[...]

Artigo 71.º
Determinação da medida da pena
1 - A determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção.
2 - Na determinação concreta da pena o tribunal atende a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou contra ele, considerando, nomeadamente:
a) O grau de ilicitude do facto, o modo de execução deste e a gravidade das suas consequências, bem como o grau de violação dos deveres impostos ao agente;
b) A intensidade do dolo ou da negligência;
c) Os sentimentos manifestados no cometimento do crime e os fins ou motivos que o determinaram;
d) As condições pessoais do agente e a sua situação económica;
e) A conduta anterior ao facto e a posterior a este, especialmente quando esta seja destinada a reparar as consequências do crime;
f) A falta de preparação para manter uma conduta lícita, manifestada no facto, quando essa falta deva ser censurada através da aplicação da pena.
3 - Na sentença são expressamente referidos os fundamentos da medida da pena.

Artigo 72.º
1 - O tribunal atenua especialmente a pena, para além dos casos expressamente previstos na lei, quando existirem circunstâncias anteriores ou posteriores ao crime, ou contemporâneas dele, que diminuam por forma acentuada a ilicitude do facto, a culpa do agente ou a necessidade da pena.
2 - Para efeito do disposto no número anterior, são consideradas, entre outras, as circunstâncias seguintes:
a) Ter o agente actuado sob influência de ameaça grave ou sob ascendente de pessoa de quem dependa ou a quem deva obediência;
b) Ter sido a conduta do agente determinada por motivo honroso, por forte solicitação ou tentação da própria vítima ou por provocação injusta ou ofensa imerecida;
c) Ter havido actos demonstrativos de arrependimento sincero do agente, nomeadamente a reparação, até onde lhe era possível, dos danos causados;
d) Ter decorrido muito tempo sobre a prática do crime, mantendo o agente boa conduta.
[...]





Se puder, vá mesmo!

Aventar

por Ana Moreno

Paulete Matos
Foto de Paulete Matos
É conhecida a enorme dificuldade da sociedade civil portuguesa em articular-se de forma organizada. Interpretações das causas há várias; ocorre-me a recomendação da Carla para a análise em “Causas da Decadência dos Povos Peninsulares nos Últimos Três Séculos”, lembro-me da de José Gil, em “Portugal, hoje – o medo de existir”. Elementos úteis para perceber esta carência de cidadania; e outros haverá. Tenho para mim que uma das causas é a aversão intrínseca dos portugueses à organização; organizar-se é abdicar de um pedacinho de individualismo por mor de uma causa cívica – uma cedência inadmissível para grande parte dos portugueses (sendo-lhes mais fácil tratando-se de uma causa caritativa). Poderia sugerir várias outras razões que contribuem para essa letargia cívica, mas vou directa ao assunto que aqui me traz:
Incitei aqui à participação numa manifestação por uma justa causa – e foi tão justa que foi noticiada a nível internacional. Incitei à participação nesta, porque era esta que se ía realizar nesse dia, como já incitei à participação noutras. Pois não faltaram comentadores a perguntar: então e contra a “irresponsabilidade que permite que morram mais de cem pessoas em incêndios?“; então e contra a corrupção? Isto para já não falar no carimbo de “manifestações idiotas”. Ler mais deste artigo




BLOCO DE ESQUERDA QUER MAIS INVESTIMENTO E MELHORES CUIDADOS DE SAÚDE NO HOSPITAL DE OVAR

Bloco de Esquerda Ovar

Comissão Coordenadora Concelhia


Comunicado de Imprensa
BLOCO DE ESQUERDA QUER MAIS INVESTIMENTO E MELHORES CUIDADOS DE SAÚDE NO HOSPITAL DE OVAR
Hospital de OvarCentro de Saúde de Ovar





O Governo encomendou um estudo que pretendia integrar o Hospital de Ovar numa estrutura onde se incluía ainda o Hospital da Feira, o Hospital de S. João da Madeira e o Hospital de Oliveira de Azeméis, bem como os centros de saúde de 6 concelhos do distrito de Aveiro.
Essa proposta era prejudicial para o Hospital e para o concelho de Ovar. Primeiro porque poderia traduzir-se na perda de valências e de serviços, principalmente os serviços de proximidade à população. Segundo porque teria como consequência o corte de serviços muito importantes para a população, como a realização de exames médicos no hospital de Ovar.
O Bloco de Esquerda nunca poderia aceitar o esvaziamento do Hospital de Ovar. A saúde tem que ser uma área de investimento e tem que ser gerida a pensar nas pessoas e não a pensar em poupanças que, no fundo, são cortes nos serviços.
Por isso apresentamos uma proposta alternativa na Assembleia da República.
O Bloco de Esquerda propôs a rejeição do estudo encomendado pelo Governo e, em alternativa, propôs um maior investimento e uma maior contratação de profissionais, garantindo proximidade, melhor acesso e maior qualidade dos serviços de saúde prestados à população.
O Bloco de Esquerda quer a realização de obras urgentes no bloco operatório do Hospital de Ovar, assim como a reabertura do Serviço de Urgência.
Não podemos deixar de lamentar que a proposta de rejeitar o estudo do Governo tenha sido chumbada com os votos contra do PS e do PSD e com a abstenção do CDS. Estes partidos estão a prestar um péssimo serviço à população de Ovar. Estranhamos ainda mais a posição destes partidos, na Assembleia da República (AR), depois de a nível local todos os partidos se terem manifestado contra o “plano de negócios” que foi feito para o Hospital de Ovar. Como podem PSD e PS conciliar sentidos de voto tão distintos a nível local e nacional?
O Bloco de Esquerda não abandona a população e, por isso, continuaremos a propor os cuidados de saúde de proximidade e o investimento no Hospital Dr. Francisco Zagalo. Por isso, no último sábado, o BE Ovar e o deputado do BE à AR pelo distrito de Aveiro, Moisés Ferreira, divulgaram mais uma vez as nossas propostas, junto dos utentes do hospital e do centro de saúde de Ovar.
Ovar, 29 de Outubro de 2017

domingo, 29 de outubro de 2017

Afinal cheira a crise


Estátua de Sal

por estatuadesal
(Francisco Louçã, in Público, 27/10/2017)
Francisco Louçã
Desculparão os leitores, mas este texto não é sobre a crise de que se fala, sobre o barómetro que mede quem ficou mais “chocado”. Com franqueza, não havia necessidade. É sobre outra crise, uma que importa mesmo. Aquela que Schauble anunciou na despedida na sua última reunião do Eurogrupo, antes mesmo de receber uma nota de cem euros com a sua cara gravada, que amável presentinho. Essa crise não é o tal diabo que faltou e que o homem bem se fartou de anunciar (aos países do sul), mas é certamente o risco de um abismo basto infernal (para todos os países).
Lembrava Schauble, sem deixar de picar Mario Draghi, que a inundação de dinheiro despejado na Europa nos últimos dois anos tem como destino mais certo uma bolha financeira. E que, como é da natureza das coisas, a bolha rebentará. Draghi respondeu esta semana que não vê nenhum problema sistémico, nem na valorização do euro, nem no excesso de dívida. Como se vai embora dentro de ano e meio, bem se percebe que não queira em caso algum perturbações que obriguem a novas formas de intervenção – até porque lhe restam poucos instrumentos para o fazer.
O BCE injectou 2100000 milhões de euros nos mercados financeiros em dois anos. Promete continuar, mesmo que em dose mais moderada. Ora, tudo correria bem se esse capital fosse usado em investimento. Não foi. Serviu essencialmente para aumentar o preço dos activos financeiros e portanto para enriquecer quem já tinha um tesouro.
Segundo os cálculos do FMI, nas economias mais desenvolvidas, e nas últimas três décadas, o rendimento per capita dos 1% mais afortunados cresceu três vezes mais depressa do que o do resto da população. Resultado: nestes países mais ricos, os 99% de baixo ganharam mais 48% nesse período, mas os 1% triplicaram o seu rendimento (como assinalado no gráfico). Nos últimos dois anos mais se agravou esta desigualdade, que é o primeiro efeito da bonança.
Gráfico
O segundo efeito é a dívida. Rolamos sobre dívida. Como se escreve num relatório do FMI, “a dívida lubrifica as rodas da economia. Permite aos indivíduos fazer grandes investimentos hoje, como comprar uma casa ou ir para a universidade, comprometendo parte dos seus rendimentos futuros. Isso está certo em teoria. Mas como a crise financeira global demonstrou, o rápido crescimento da dívida das famílias, e em especial as hipotecas, pode ser perigoso.” Ponha perigoso nisso. Neste mundo bipolar, a dívida dirige a economia e portanto inflaciona o risco de uma crise financeira (o delicioso termo profissional é uma “correcção técnica do mercado”), já para não incluir no menu dos perigos algum tweet de Trump ou um bombardeamento algures.
O terceiro efeito deste maná de dinheiro fácil é que reforça a vulnerabilidade de quem sofreu a crise e privilegia os seus beneficiários, porque assim são as suas regras. Revelou Draghi recentemente que, em 2012-2016, o BCE lucrou 7800 milhões de euros em juros e ganhos de capital com a dívida grega. Esse lucro é depois repartido entre os bancos centrais de acordo com a proporção de cada um no capital do BCE (ou seja, a Alemanha ganha mais e, se a Grécia esperava o repatriamento de algum desse dinheiro, enganou-se, porque até isso lhe foi cortado).
O BCE também lucrou 5200 milhões com a dívida portuguesa, mas nesse caso uma parte foi entregue ao Banco de Portugal (é a origem dos célebres dividendos a pagar pelo banco ao Tesouro) – e outra aos outros bancos.
A Alemanha é entretanto beneficiada com a compra de 400 mil milhões da sua dívida a juros negativos ou quase zero e o BCE fica a perder com essa operação – mas a Alemanha monetariza parte da sua emissão de dívida e a Europa sofre esta economia predatória. Não foi revelado se a nota de 100 euros entregue a Schauble conta para tal montante.
NB- O texto mais curioso sobre Neto de Moura, o juiz que cita a pena de morte da mulher adúltera, é de JM Tavares. Claro que ele se rebola de indignação contra o juiz, que é “cavernícola”, mas o que o irrita mesmo é que alguém lembre que a conversa da discriminação das mulheres é uma cultura: antiga, como expressa nas tribos do Antigo Testamento, e moderna, como expressa nas leis que até ao século XX davam a mulher como coisa do homem. Vai daí, inventa uma novela gira sobre a predestinação do juiz, que se tivesse brincado com vestidos cor de rosa em bonecas não cederia à pulsão da tal pena de morte. O que vale é que Tavares pede logo desculpa a quem o lê, acrescentando, com a condescendência de um barão à lareira: “aquilo que pessoas como eu ou o Ricardo (é o Araújo Pereira) afirmam” é que não queremos cá “picuinhices estapafúrdias” (a sua própria novela sobre os vestidos das bonecas). Ainda bem que Tavares segue “o Ricardo” e pensa como ele. É um alívio. Se não fosse a protecção “do Ricardo” só sobrava a coitada da pilhéria.





A SEMANA “HORRIBILIS” DE MARCELO


Estátua de Sal

por estatuadesal
(In Blog O Jumento, 28/10/2017)
Marcelo e o Jumento
Esta foi a semana horribilis de Marcelo Rebelo de Sousa, um turn point do seu mandato presidencial, Marcelo não será mais o político unânime que pretendia ser. Pressionado pelo seu próprio erro de se deixar envolver na campanha pela liderança do PSD, ao lado de um candidato pouco credível e contra outro candidato com quem não tem boas relações, Marcelo precisa de distrair as atenções da direita atacando a esquerda.
Os incêndios foram a oportunidade, sabendo que o governo ia adotar medidas e substituir a ministra da Administração Interna, Marcelo deu o seu golpe de mágica, antecipou-se invocou poderes constitucionais que não tem e fez como fazia o Hugo Chavez, mandou demitir uma ministra e deu ordens ao governo no meio de uma conversa com os portugueses.
Invocando a Constituição e dizendo que a estava cumprindo e fazendo cumprir chamou a si a competência de definir programas governamentais e definir prioridades das decisões governamentais. Do dia para a noite o Presidente passou a ter poderes de exceção, pode decidir a demissão de ministros a meio de comunicações televisivas e definir parâmetros para os programas governamentais. O governo deve esquecer o seu programa, aprovado no parlamento, para a um ritmo quase semanal definir novas metas erráticas, deve ainda decidir medidas a longo praz em dossiers cujo ministro foi demitido em direto a partir de Oliveira do Hospital.
Marcelo fez uma abordagem da Constituição a partir daquilo que ele julga ser o poder que em vez de resultar do texto constitucional decorre da sua popularidade, medida por sondagens encomendadas por jornais. A exigência de demissão de um ministro, a exigência de medidas que consubstanciam um programa a longo prazo, ao estabelecer prioridades para a ação do governo sem respeitar o programa que o parlamento aprovou ou sem que as mesmas sejam debatidas no parlamento, são gestos que podem ser interpretados como violações grosseiras da Constituição.
É o parlamento que aprova o programa do governo, é o parlamento que pode adotar resoluções que constituem orientações programáticas para a sua ação. O presidente não tem tais poderes, tem um poder de fazer cumprir a Constituição, mas isso não significa dar ordens a um governo que responde perante o parlamento. Pode sim questionar a constitucionalidade das decisões do governo, mas a verdade é que as decisões e gestos do Presidente da República dependem da Constituição e da interpretação da Constituição. Quem em Portugal interpreta a Constituição não é o Presidente, mesmo que seja professor de direito, mas sim o Tribunal Constitucional.
Marcelo nunca mais vai ter a confiança que teve junto de muitos eleitores, percebeu-se que a sua gestão de afetos não passa de uma estratégia populista que só poderá levar à invenção de um Perón de Celorico. Perdeu a confiança da direita depois de tratar Passos da forma que se viu, perdeu a confiança de uma parte do seu partido ao ter uma relação gastronómica com Santana Lopes, perdeu a confiança da esquerda ao comportar-se de forma que pode ser considerada de grosseira nesta semana.