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domingo, 4 de março de 2018

Mau tempo. Chuva, vento e até um tornado

MARTA CERQUEIRA

04/03/2018 20:28

O mau tempo não tem dado tréguas ao país e parece que veio para ficar. Só no Algarve, a Proteção Civil registou mais de 50 ocorrências.

Os últimos dias têm sido marcados por imagens de mau tempo. São aviões que não levantam da Madeira, um Portinho de Arrábida sem acessos, marginais cortadas, escolas encerradas e hoje, um Algarve varrido por um mini tornado.
Apesar da Proteção Civil ter categorizado o tornado como sendo de baixa intensidade, foi suficiente para provocar estragos e deixar em alerta a população.
Nas cidades de Faro e Olhão, houve registo de cortes de eletricidade e árvores caídas. O muro do estádio do Moncarapachense colapsou e caiu em cima de viaturas estacionadas no local. Na Estrada Nacional 2, vidros, telhas e painéis publicitários atingiram viaturas que foram forçadas a parar e há relatos de zonas que ficaram sem eletricidade e telecomunicações.
No shopping Fórum Algarve há registo de vidros partidos na zona da restauração e de cadeiras arrastadas pelo vento. Apesar do susto, que levou a que as pessoas se refugiassem dentro de lojas, não houve registo de feridos e o shopping continuou aberto, ainda que com algumas zonas interditas.
Ao final da tarde de ontem o presidente da camara de Faro deu conta ainda de que o tornado desalojou uma comunidade cigana de cem pessoas, que estavam numa das estradas de acesso à cidade. Além desta comunidade, cujo realojamento está a ser tratado pelos serviços de Ação Social da Câmara, há ainda a registar dois desalojados na freguesia do Montenegro – um casal que, entretanto, já foi realojado numa estalagem na Praia de Faro -, e uma mulher, que vai ficar instalada na casa de familiares.
Este é o segundo tornado a atingir a região esta semana. Na última quarta-feira, houve registos de pelo menos dez barcos virados, vidros de carros estilhaçados e uma esplanada destruída. O mau tempo obrigou ao encerramento de praticamente todas as barras marítimas.

De norte a sul E até nas ilhas. Aliás, na Madeira, o mau tempo fez com que oito mil passageiros ficassem retidos na ilha. Só no sábado, 58 voos, entre chegadas e partidas, foram cancelados devido ao vento forte que ultrapassaram muitas vezes os cem quilómetros/hora. Ontem, o movimento do aeroporto voltou à normalidade, mas devido à quantidade de pessoas acima da prevista para sair da ilha, há quem esteja há mais de uma semana à espera de oportunidade para voar.
No continente, a Proteção Civil registou 28 ocorrências na madrugada de ontem, com os distritos de Coimbra e Lisboa a serem os mais afetados. Entre as ocorrências registadas estão quedas de árvores, deslizamentos de terra ou queda de estruturas (caso de quedas painéis informativos e postes).

Mau tempo continua O vento e chuva não vão dar tréguas. Para amanhã, o Instituto Português do Mar e da Atmosfera prevê vento, precipitação, por vezes em forma de granizo, e trovoada. A agitação marítima vai manter-se com ondas que podem atingir os cinco metros no litoral centro e sul do país.
Até sexta-feira a chuva será constante em quase todo o país e espera-se, mais para o final da semana, uma ligeira subida da temperatura. Até lá, a chuva prevista, pode ser neve acima do mil metros.

Sonangol. Isabel dos Santos reage a acusações de má gestão da petrolífera angolana

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4/3/18


03/2018 21:20

Carlos Saturnino denunciou, na passada quarta-feira, a realização de uma transferência de cerca de 38 milhões de dólares (31,1 milhões de euros), por parte da administração de Isabel dos Santos. A Procuradoria-Geral da República de Angola revelou, após as acusações feitas à filha de José Eduardo dos Santos, que tinha sido instaurado um inquérito para investigar a gestão da antiga administração.

Carlos Saturnino, o novo líder da petrolífera angolana, apresentou na passada quarta-feira, dia 28 de fevereiro, as contas da empresa e revelou que a dívida é de quase 4,9 mil milhões de dólares.

O presidente do conselho de administração da Sonangol adiantou, em conferência de imprensa, os resultados preliminares da auditoria realizada às contas da empresa pública de petróleos angolana, que começou em dezembro e ainda não está concluída, indicando que a dívida atual é de cerca de 4,9 mil milhões de dólares.

Na mesma conferência, Saturnino aproveitou para tecer duras críticas à gestão de Isabel dos Santos, pelo facto de terem sido gastos, entre novembro de 2016 e novembro de 2017, 135 milhões de dólares em consultorias, tendo sublinhado que detetou “a existência de um número elevado de conflitos judiciais e arbitrais”.

A filha do antigo Presidente de Angola, José Eduardo dos Santos, já reagiu, em comunicado, às acusações feitas pelo novo presidente do conselho de administração da petrolífera angolana, revelando que  foi com "espanto" que acompanhou todas as acusações "proferidas na Conferência de Imprensa da Sonangol 2018".

"Não posso deixar de demonstrar a minha total indignação com a forma como, sob o título de “Constatações/Factos” foram feitas acusações e insinuações graves, algumas das quais caluniosas, contra a minha honra e contra o trabalho sério, profissional e competente que a equipa do anterior Conselho de Administração desenvolveu ao longo de 18 meses.", refere Isabel dos Santos.

Além disso, a antiga presidente do conselho de administração afirmou que "após apenas 4 slides muito genéricos e superficiais sobre a performance da empresa e do sector petrolífero em Angola, a conferência de imprensa rapidamente deixou de se concentrar naquilo que deveria ser o seu propósito: analisar a empresa, e detalhar o plano de reestruturação da Sonangol e do sector, que tanto necessitam, dando continuidade ao processo de transformação e reestruturação iniciado pelo anterior CA, e conforme instruído pelo Executivo.", acrescentou, referindo ainda que houve um "ataque directo ao anterior Conselho.

Isabel dos Santos explica na mesma nota que não vai deixar passar as acusações em branco, e que irá tomar devidas medidas. "Gostaria de lhe deixar claro que não deixarei de tomar todas as medidas, e encetar todas as providências legais, adequadas e necessárias à protecção do meu bom nome e defesa dos meus direitos."

A filha de José Eduardo dos Santos, ao longo do comunicado, referiu algumas das acusações feitas por Carlos Saturnino, e fez questão de dizer que "as acusações e insinuações proferidas, além de falsas, servem para atiçar um clima de instabilidade e desconfiança, que prejudica a Sonangol, e desvia as atenções daquilo que certamente é a preocupação fundamental".

"O investimento realizado em consultoria foi o mais baixo até a data, e traduziu-se em valor acrescentado, e com impacto concreto na rentabilidade da Sonangol, tendo sido identificadas mais de 400 iniciativas de redução de custos (programa Sonalight) e mais de 50 iniciativas de aumento de receitas (programa Sonaplus), as quais conjuntamente permitiram melhorar os resultados da Sonangol em USD 2.2 bi.", explica a antiga administradora.

"As tentativas de Carlos Saturnino de reescrever a história são consequência, no meu entender, de um retorno em força da cultura de irresponsabilidade e desonestidade que afundaram a Sonagol em primeiro lugar. O grau de agressividade e as campanhas difamatórias reproduzidas, e em perfeita coordenação com os órgãos de imprensa da oposição, e com as oficinas de manipulação das redes sociais, demostram que há um verdadeiro nervosismo em alguns meios.", continua Isabel dos Santos.

No final do comunicado, a filha do antigo líder de Angola indica ainda que existe "uma campanha generalizada e politizada" contra si, explicando que tudo não passará de um "retorno de interesses das pessoas que enriqueceram bilhões à custa da Sonangol".

"O problema da Sonangol não é e nunca foi Isabel dos Santos, mas sim a irresponsabilidade da gestão e das entidades que beneficiarão de contratos leoninos e ganharam milhões, e hoje esperam poder continuar a gozar e viver desta prevaricação.", termina a filha do antigo Presidente de Angola.

Marques Mendes: "É um erro enorme" PSD e CDS concorrerem sozinhos às eleições

Luís Marques Mendes

Luís Marques Mendes

04 de março de 2018, às 21:20

As notas da semana de Marques Mendes nos seus comentários na SIC. O comentador fala sobre o crescimento da economia, o momento positivo de António Costa, o congresso do CDS, a reviravolta no Montepio e a Cimeira Portugal/Angola.

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ECONOMIA A CRESCER

  1. O INE divulgou esta semana os dados do crescimento da economia em 2017 (2,7%). O que há a dizer de mais importante?

a) Primeiro: um excelente resultado. O melhor crescimento desde o ano 2000.

b) Segundo: um crescimento saudável e sustentado, porque alicerçado no investimento e nas exportações.

c) Terceiro: como dizia o Jornal de Negócios, numa síntese muito feliz, "Temos um Governo de esquerda que põe a economia a crescer com a receita da direita". Isto porque o modelo de crescimento fundado no investimento e nas exportações era o modelo de Passos Coelho e não o modelo prometido por António Costa.

d) Quarto: para além do mérito dos portugueses, devemos agradecer à Europa esta onda de crescimento – é que não é só Portugal a crescer. É toda a União Europeia. E a maioria dos países da UE até cresce mais que Portugal.

  1. Mesmo assim, se tivéssemos que atribuir um Óscar, eu diria que a economia portuguesa merece o Óscar do Melhor Filme em 2017. Não é um best seller mas é um filme de sucesso.

COSTA EM ALTA

  1. Esta foi mais uma boa semana para António Costa. O PM está em alta.

a) Está em alta na governação – Por causa dos bons resultados da economia e do emprego;

b) Está em alta na luta política – Não tem uma oposição que lhe cause verdadeiras dores de cabeça;

c) Está em alta em relação aos seus parceiros de coligação – Tem-nos controlados;

d) Está em alta por causa dos acordos a fazer com o PSD – Vai ficar como o líder moderado que dialoga com todos, à esquerda e à direita;

e) Está em alta porque o PSD e o CDS se preparam para lhe dar uma bênção eleitoral – irem em listas separadas às próximas eleições.

  1. O PSD e o CDS deram esta semana o sinal de que concorrerão separados às eleições.
  • Isto é um erro enorme. Desta forma, o PS tem as eleições ganhas. Só falta saber se tem maioria absoluta.
  • Se fossem coligados, PSD e CDS poderiam ter, no mínimo, 40% dos votos e ter um élan para poderem tentar a maioria. Separados, dificilmente o PS perde o 1º lugar.
  • Se fossem coligados, PSD e CDS teriam sempre, com os mesmos votos, mais deputados do que terão concorrendo separadamente – o sistema eleitoral beneficia os blocos maiores
  • Como diz António Capucho, um especialista em leis eleitorais e apoiante de Rio, concorrer em separado é perder para o PS.
  • Conclusão: decididamente, António Costa é um homem com sorte. Em noite de Óscares, justificava o Óscar de Melhor Actor Principal – une a geringonça; mete no bolso os seus parceiros; dialoga com todos; e beneficiado crescimento da economia apesar de pouco ter feito para isso.


O DEBATE NEGRÃO/COSTA

Esta semana houve dois momentos relevantes na relação do PSD com o Governo – o debate Costa/Negrão e o início do diálogo em matéria de fundos e descentralização.

  1. Debate quinzenal – Foi o baptismo de Fernando Negrão.

a) Na forma, o líder parlamentar do PSD não esteve brilhante. Tem um estilo civilizado e não trauliteiro. Mas falta-lhe acutilância e combatividade.

b) No conteúdo, esteve bem. Surpreendeu ao escolher como tema forte a questão do Montepio (e em política surpresa é sempre positiva); colocou António Costa à defesa (o tema é incómodo para o Governo); e ainda ameaçou com um inquérito parlamentar se o negócio avançar.

  1. Acordos Governo/PSD – Foi o pontapé de saída para o diálogo.

Apesar de muito criticado por esta relação de diálogo com o Governo, acho que por aí as críticas a Rui Rio são injustas:

a) Primeiro, porque acordos PS/PSD em matéria de Fundos Estruturais e Descentralização não têm novidade. Já sucederam no passado.

b) Segundo, porque são óbvios e naturais. A descentralização deve ser vista como uma questão de regime; e, quanto aos fundos, uma posição conjunta dos dois partidos dá mais força a Portugal para em Bruxelas negociar um novo envelope financeiro de 25 mil milhões de euros de Fundos para os próximos anos.

  1. Problema central do PSD – Ausência de oposição

Posto isto, o problema central do PSD não está no Grupo Parlamentar nem nos acordos com o Governo. Está, sim, na falta de oposição ao Governo.

a) Rio já foi eleito há quase dois meses. Quase dois meses depois, o PSD continua sem fazer oposição: não há uma agenda de oposição; uma iniciativa de oposição; uma causa de oposição ao Governo. A ausência do PSD no debate nacional sobre a saúde é paradigmático.

b) Depois do Congresso, o PSD devia estar virado para fora. Afinal, está virado para dentro. Devia estar politicamente ao ataque. Está à defesa e a discutir mercearia política.

c) E isto tem 3 riscos fortes:

  • O risco de divisão interna (só com acção se faz a unidade);
  • O risco de perder para o CDS a liderança da oposição;
  • O risco de o PSD ficar eleitoralmente ensanduichado – perder votos à direita para o CDS e ao centro para o PS.

d) Em matéria de Óscares, o PSD só merecia o Óscar dos Efeitos Especiais – É Elina Fraga; é a guerra com os deputados; ping-pong das críticas internas. Não dá votos mas gera efeito especial.

O CONGRESSO DO CDS

  1. O Congresso do CDS do próximo fim de semana surge num dos melhores momentos de sempre do partido:

a) O CDS não sofreu tanto quanto o PSD o desgaste de ter estado no Governo;

b) O CDS ultrapassou com mais facilidade do que se pensava a saída de Portas;

c) O CDS está unido e motivado;

d) O CDS sente que tem espaço para crescer.

  1. Assunção Cristas tem um grande mérito neste balanço.

a) Teve um acto de coragem que lhe rendeu votos e prestígio – a candidatura a Lisboa. Ganhou estatuto.

b) Tem uma imagem que só joga a seu favor – imagem de simpatia, ambição e capacidade de trabalho.

c) Não tem anti-corpos no PSD, o que lhe permite conquistar votos no PSD com mais facilidade do que sucedia com Paulo Portas.

d) Há 2 anos era considerada uma líder de transição. Dois anos depois, está consagrada como líder.

  1. O que vai ser o Congresso? Sem nunca falar no PSD, vai ser um Congresso para marcar diferenças em relação ao PSD. Assunção Cristas quer:

a) Mostrar que o CDS está unido (por contraste com o PSD);

b) Mostrar que o CDS lidera a oposição (por contraste com o PSD);

c) Mostrar que o CDS foi quem mais iniciativas de oposição apresentou no Parlamento (por contraste com o PSD);

d) Mostrar que o CDS tem uma alternativa para o futuro (por contraste com o PSD);

e) Definir que o CDS concorrerá em listas separadas às eleições europeias e legislativas (para se autonomizar do PSD);

f) E até surpreender – Assunção Cristas está a tentar colocar nos órgãos nacionais 50% de mulheres. Ou seja, metade homens, metade, mulheres.

  1. Numa palavra, em noite de Óscares, eu diria que Assunção Cristas justificaria o Óscar da Melhor Actriz Principal. Com um senão: a sua estratégia de concorrer separada do PSD é uma notável ajuda para o PS ganhar as eleições.

REVIRAVOLTA NO MONTEPIO

  1. Há 2 meses eu disse aqui que, se a Misericórdia de Lisboa comprasse 10% do capital do Montepio por 200 milhões de euros (o plano que então estava em cima da mesa), o caso acabaria num inquérito parlamentar e numa investigação judicial, por suspeitas de gestão danosa.
  1. Dois meses depois, já não vai ser necessária nem investigação judicial nem inquérito parlamentar. Houve uma reviravolta no processo e a Misericórdia foi obrigada a recuar. Três sinais dessa reviravolta:

a) A decisão, segundo o Provedor, era para ser tomada em Janeiro. Estamos em Março e ainda não há decisão, porque tudo mudou.

b) A avaliação do Montepio feita pelo Haitong ficou muito abaixo dos 2 mil milhões. Tão abaixo que a Misericórdia escondeu o valor exacto.

c) A indicação de Manuel Teixeira para Administrador Não Executivo é outro sinal de que a operação inicial não se faz. Se se fizesse, a Misericórdia teria um Administrador, sim, mas Executivo.

  1. Agora, o propósito é salvar a face. Como?

a) Fazendo a Misericórdia de Lisboa entrar mas com uma participação muito mais modesta;

b) Fazendo a Misericórdia de Lisboa entrar mas em conjunto com outras Misericórdias, as quais podem entrar mas com participações meramente simbólicas (mil euros é a hipótese em cima da mesa).

c) Em conclusão: uma má notícia para o Governo, que estava empenhadíssimo neste negócio. Uma boa notícia para o país.

A CIMEIRA PORTUGAL/ANGOLA

  1. Segundo O Expresso, o Presidente da República vai apadrinhar uma importante cimeira empresarial Portugal/Angola. É uma boa iniciativa e um bom sinal. Isto significa que a relação entre Portugal e Angola está mais calma e mais desanuviada, a caminhar para a normalidade.
  1. E isto é tão mais importante quanto:

a) Angola está a viver uma mudança política enorme, onde se nota, por exemplo, uma grande abertura no sector da comunicação social;

b) Angola está a iniciar um grande processo de mudança no plano económico. Um exemplo: amanhã entra em vigor uma lei histórica para favorecer o investimento estrangeiro. Até agora, um estrangeiro que quisesse investir em Angola tinha obrigatoriamente de ter um sócio angolano, com um mínimo de 35% do capital. A partir de agora, essa exigência acaba. Uma boa notícia para os empresários portugueses;

c) Angola está a ganhar credibilidade na comunidade internacional, em grande medida fruto do novo ciclo político que foi aberto com a presidência de João Lourenço;

d) Em Angola vê-se na população uma atmosfera de grande esperança e de muita expectativa.

e) Os grandes líderes europeus têm encontros agendados com o Presidente Angolano – o Presidente do governo espanhol; o Presidente da República de França e a Chanceler alemã.

  1. Se todos querem acompanhar de perto a nova Angola que está em construção, Portugal, por maioria de razão, não deverá desperdiçar este novo leque de oportunidades que se abre em Angola.

Os problemas da desigualdade de riqueza poderiam colocar um travão ao crescimento

Por Sam Fleming sam fleming

Financial Times, em 4 de dezembro de 2017 e reproduzido por Gonzalo Raffo Infonews

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Os republicanos estão a propor um sistema sob o qual os Estados Unidos poderiam em geral não tributar os lucros fiscais de empresas americanas obtidos em qualquer país estrangeiro© Bloomberg

Mesmo que as bolsas nos Estados tenham falado bem alto na segunda-feira, em resposta à aprovação pelo Senado do projeto-lei sobre os impostos, muitos analistas expressaram um profundo ceticismo sobre a ideia de que a revisão fiscal vai transformar uma economia que já está a funcionar perto do pleno emprego.

Kent Smetters, um antigo funcionário da administração Bush que supervisiona o modelo Penn Wharton Budget, disse que espera no máximo um aumento de 0,1 pontos percentuais sobre as taxas anuais de crescimento ao longo de 10 anos como resultado desta legislação. O impacto de longo prazo sobre a tendência de crescimento será desprezível, acrescentou, porque a dívida adicional acumulada como resultado da perda de receitas pesa sobre a economia. “Não é um impulso significativo“, disse ele.

Politicamente não há dúvida de que a aprovação da lei fiscal é feita numa altura altamente oportuna. Os Estados Unidos tiveram dois registos sucessivos de crescimento anual do PIB a uma taxa de 3 por cento ou mais, e o modelo FED de Atlanta aponta mesmo para um crescimento de 3,5 por cento para o quarto trimestre de ano.

Supondo que a legislação é aprovada pelas duas Câmaras, isto vai efetivamente colocar os republicanos em posição de adotar a retoma como sendo da sua responsabilidade, apontando para as suas alterações fiscais como o combustível para o crescimento contínuo e potencialmente impulsionador para as suas perspetivas nas eleições intercalares de 2018. Kevin Hassett, o Presidente do Conselho de Consultores Económicos, disse ao Financial Times, antes do acordo no Senado avançar, que reforma fiscal significativa significava “no mínimo, a possibilidade de o crescimento sustentável à taxa de 3 por cento ter um enorme aumento”.

Mas os republicanos também terão de assumir a responsabilidade pelo alargamento dos défices, com o Committee for a Responsible Federal Budget a projetar que a legislação tributária e as despesas públicas atualmente na agenda poderiam impulsionar os EUA para défices na ordem de milhões de milhões, logo em 2019. E o pacote de medidas, sem dúvida, não responde sequer aos desafios económicos a longo prazo, entre os quais o crescimento da dívida pública, incluindo o alargamento da desigualdade, os maus resultados do sistema educativo e o lento crescimento da força de trabalho.

A Câmara e o Senado enfrentam agora a difícil tarefa de conciliar as suas duas versões da legislação, à medida que se precipitam para obter um projeto de lei sobre a mesa do Presidente até ao final do ano. Mas o aumento da probabilidade de a lei sobre os impostos ser aprovada está a levar os analistas a aumentarem as suas previsões de crescimento para o curto prazo.

Alec Phillips, um analista da Goldman Sachs, disse que a redução da receita tributária vale cerca de 0,6 ponto percentual do produto interno bruto em 2018 e de 1,1 ponto percentual do PIB em 2019. Olhando para o quanto disto vai ser realmente gasto, e, portanto, transformar-se em PIB adicional, traduz-se num aumento de 0,3 de ponto percentual para 2018 no PIB e num aumento de 0,3 ponto percentual no PIB para 2019, disse ele. “Depois disso, a dimensão do corte de impostos estabiliza e começa a declinar um pouco, por isso não estimamos nenhum aumento adicional ao PIB em 2020.”

Os principais benefícios de que se vangloria a Casa Branca resultam da redução das taxas de imposto individuais e do corte da taxa de imposto sobre as empresas que desce de 35 por cento para 20 por cento, que os seus economistas esperam que se venha a traduzir em maior investimento e, portanto, num aumento dos salários. O presidente Donald Trump na segunda-feira teve o crédito total dos mercados bolsistas em alta quando ele brandiu os cortes de impostos, declarando no Twitter que “os empregos estão fortemente de volta”.

A decisão do Senado em atrasar o corte na taxa sobre as empresas para 2019, permitindo às empresas imediatamente deduzir os investimentos de capital de 2018, poderia ainda induzir as empresas a uma maior dinamização dos investimentos no próximo ano, de acordo com Scott Greenberg da Tax Foundation. Isto porque as empresas estariam em condições de deduzir o custo total contra uma taxa de 35 por cento e os lucros do investimento seriam mais tarde tributados em 20 por cento. Ele descreve o efeito como um “grande negócio” no curto prazo, embora nem todos os analistas esperem um grande aumento do PIB a partir da medida fiscal aprovada.

A longo prazo, os efeitos da fatura fiscal são muito mais ambíguos. Jason Furman que presidiu o Conselho de conselheiros económicos de Barack Obama e que está agora na Harvard Kennedy School, disse que a dívida mais elevada iria impor gradualmente um contrapeso no funcionamento da economia para além do próximo ano. Ele disse também que iria defender a reforma tributária sobre as empresas, mas “assegurar-me-ia que esta compensa e que não abre novas brechas na lei [ou seja, novas escapatórias ao seu cumprimento]”.

Além disso, a análise das iterações anteriores da revisão fiscal sugeriu que os benefícios seriam distorcidos a favor dos mais ricos da América, em parte porque as participações de capital das empresas estão concentradas nos grupos mais ricos. Em 2027, quando os cortes fiscais individuais tiverem expirado, mais de 60 por cento dos benefícios ter-se-ão concentrado a favor do Top 1 por cento dos assalariados de mais altos rendimentos, segundo o Centro de Política Fiscal. Nessa altura, os impostos aumentariam modestamente para o grupo de baixos rendimentos, muito pouco para os grupos de rendimento médio e diminuiriam para os grupos de rendimento mais elevado.

Janet Yellen, a presidente da Reserva Federal, descreveu a crescente desigualdade como “perturbadora” e sugeriu que, se o rendimento  estiver a ser transferido para os grupos mais ricos, isso poderia diminuir o crescimento global da despesa agregada.

“Eu não acho que vá ser um grande benefício e intensifica seriamente o problema da desigualdade de riqueza”, disse Bill Cline, economista do Peterson Institute for International Economics. Ele diz que os principais beneficiários do pacote provavelmente serão os detentores de ações das grandes empresas e os 1% de rendimentos mais elevados. O défice orçamental esperado de US $ 1 milhão de milhões nos próximos 10 anos como resultado do plano poderia induzir alguns legisladores a defenderem cortes nas despesas sociais, o que poderia prejudicar ainda mais os que estão mal, acrescentou ele.

Texto disponível em http://gonzaloraffoinfonews.blogspot.pt/2018/01/fears-over-debt-load-take-shine-off-tax.html

A VISÃO MARCELISTA DA DITADURA – JOÃO VARELA GOMES (1924/2018)

por estatuadesal

(Por Soares Novais, in a Viagem dos Argonautas, 04/03/2018)

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O presidente Marcelo, sempre lesto a falar sobre tudo, demorou 48 horas a apresentar condolências à família de João Varela Gomes – “O primeiro capitão de Abril”. Em escassas três linhas, o filho do escolhido por Salazar para ser governador-geral de Moçambique invocou “a sua militância cívica, em particular, a sua consistente luta contra a ditadura constitucionalizada antes do 25 de Abril de 1974”, pois assim redefine Marcelo o fascismo português.

Marcelo, como se vê, disse coisa pouca sobre uma figura central do combate à ditadura. O coronel João Varela Gomes (93 anos) foi um revolucionário, um consequente militante antifascista, um militar com biblioteca, um cidadão singular.

Cresci a ouvir falar dele e da sua luta sem tréguas ao Estado Novo, mas só o conheci pessoalmente em Maio, Maduro Maio de 2006.

Por essa altura preparava a edição de “Vasco sempre” e José Viale-Moutinho, que assumiu a coordenação desse livro-tributo a Vasco Gonçalves, foi quem me proporcionou esse encontro com “o primeiro capitão de Abril”, um dos conspiradores da Sé (1959) e o herói militar do assalto ao Quartel de Beja (1) (1961).

João Varela Gomes recebeu-nos na sua modesta casa, no aristocrático Bairro da Lapa. A conversa com Varela Gomes, e sua mulher Maria Eugénia (2), (e)terna cúmplice de todos os combates, prolongou-se por várias horas e foi, para mim, uma lição de vida.

Perseguido, preso, torturado, expulso do Exército antes do 25 de Abril, João Varela Gomes partiu para o exílio quando “o mês de Novembro aqui chegou”; e abriu alas para o regresso dos velhos Donos Disto Tudo (DDT). A eles e aos novos DDT que hoje mandam no país.

Uns e outros, tal como a rapaziada do Caldas, odiavam João Varela Gomes e nunca lhe perdoaram o seu combate por uma sociedade livre dos vampiros que “comem tudo e não deixam nada”; e, também, nunca esqueceram o facto de Varela Gomes, à frente de um exército constituído por centenas de operários da Sorefame, ter retirado o nome de Salazar da ponte sobre o Tejo e de lhe ter atribuído o nome de “Ponte 25 de Abril”.

Por isso, anteontem, na Assembleia da República, o CDS/PP rejeitou o voto de pesar proposto pelos partidos de esquerda. Estou certo que João Varela Gomes aplaudiria a rejeição de tal gente.

________

(1) Manuel Serra foi o líder civil do Golpe de Beja. Após o seu falhanço, o Estado Novo sentou no banco dos réus 86 combatentes antifascistas. Serra foi defendido pelo advogado Francisco Sousa Tavares. Manuel Serra destacou-se com dirigente da Juventude Operária Católica e protagonizou, a seguir à Revolta da Sé, uma espectacular fuga da Embaixada de Cuba, vestido de padre. Após o 25 de Abril aderiu ao Partido Socialista, a convite de Mário Soares. Todavia, depois de ter obtido 44% dos votos dos congressistas no I Congresso do PS em liberdade, ao apresentar uma lista à Comissão Nacional contra a proposta de Soares, acabou por abandonar o partido em Dezembro de 1974. Fundou a Frente Socialista Popular que não vingou. Acabou por abandonar a vida política activa. Morreu a 1 de Fevereiro de 2010, em Setúbal. Tinha a seu lado sua mulher, a advogada Marinela Coelho. Conheci-o no “Verão Quente” e fiquei fascinado pelo brilho quase adolescente dos olhos de um homem bom que hoje está injustamente esquecido.

(2) O ano de 2016 foi particularmente trágico para João Varela Gomes. O seu filho Paulo (Varela Gomes), escritor, critico de arte, professor universitário, cronista, apresentador de documentários televisivos, morreu a 30 de Abril, com cancro, e a 22 de Novembro faleceu a sua companheira. Maria Eugénia foi uma figura marcante da resistência antifascista e da solidariedade com os presos políticos.