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quarta-feira, 4 de abril de 2018

Conselho Nacional de Rio quase sem críticos e com Marcelo à espreita

4/4/2018, 8:20

Com Santana na televisão e Montenegro com um jantar marcado para o dia seguinte, o Conselho Nacional de Rio quase não teve críticos. Mas Marcelo andou à espreita, e fez Rio mudar de hotel.

LUSA

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Era o primeiro Conselho Nacional de Rui Rio e a cidade escolhida para acolher a reunião dos sociais-democratas tinha sido a cidade do Porto. O hotel inicialmente pensado era o Sheraton, onde Rui Rio celebrou a noite da vitória eleitoral a 13 de janeiro, mas… não seria aí. Um pequeno contratempo fez com que, na nota enviada à comunicação social na véspera da reunião, o hotel assinalado fosse outro: o Crowne Plaza, que fica literalmente ao lado do primeiro. A mudança passou despercebida e o tamanho da sala serviu de justificação. Mas a justificação pode muito bem ter tido outro nome, e um nome próprio: Marcelo.

Eram perto das 23h quando, entre os jornalistas, corre a informação de que o Presidente da República tinha sido avistado à porta, na rua entre os dois hotéis. À Antena 1, Marcelo viria mesmo a confirmar a “coincidência”. Estava no Porto, hospedado no Sheraton, para ir esta quarta-feira visitar um estabelecimento prisional em Matosinhos, e justificou a passagem à porta do hotel onde decorre o Conselho Nacional do PSD como “o passeio do costume”. Coincidência? Diz-se que em política não há coincidências, mas Marcelo diria que “neste caso foi”.

O facto é que cada um ficou no seu hotel, ainda que a escassos metros de distância. O que não foi coincidência foi a presença de Pedro Santana Lopes no seu espaço de comentário na SIC entre as 21h30 e as 22h, precisamente à mesma hora em que Rui Rio estava a fazer a sua intervenção de fundo aos conselheiros nacionais. Santana Lopes tem assento naquele órgão, tendo inclusive encabeçado a lista de Rui Rio, mas trocou o órgão próprio de discussão do partido pelo palco televisivo. Questionado sobre essa “troca” no final dos trabalhos, já depois das 2h da manhã, Rui Rio recusou-se a comentar, limitando-se a sorrir. Paulo Mota Pinto, contudo, falou aos jornalistas enquanto presidente da mesa do Conselho Nacional e esclareceria que não fora avisado por Santana Lopes da sua ausência. “Se [Santana] deu alguma explicação para não vir? A mim e à Mesa do Congresso não”, disse apenas, recusando-se igualmente a fazer “interpretações” sobre o assunto.

Certo é que, a partir de Carnaxide, Santana poupou-se (desta vez) nas críticas ao líder do partido. Pediu que fossem dadas condições a Rui Rio para explicar o projeto que tem para o PSD e o país, e comparou-o a Cavaco Silva por se querer “distanciar do modelo tradicional de funcionamento partidário, daquilo a que chama de corte de Lisboa. Está a querer demonstrar que o país não é só Lisboa, e ainda bem”, disse. O elogio passou, mas nem por isso Santana Lopes foi ao Porto ocupar o seu lugar de conselheiro.

Rangel pede “oposição mais dura”, mas Conselho Nacional dos críticos segue dentro de momentos…

Nem Santana Lopes, nem Luís Montenegro (que ainda é deputado, pelo que podia ter participado na reunião), nem tão pouco Hugo Soares. Os críticos não se ouviram naquele que foi o primeiro momento de “análise da situação política” de Rui Rio. Hugo Soares, o ex-líder parlamentar preterido pelo novo líder do partido, até foi à reunião no Porto, mas não se inscreveu para falar: saiu antes do final dos trabalhos, justificando que ainda tinha de ir para Lisboa. É que para esta quarta-feira à noite está marcado o jantar de despedida de Luís Montenegro, que vai abandonar o Parlamento ficando apenas no espaço mediático como comentador, e esse sim será o Conselho Nacional dos críticos.

O verdadeiro Conselho Nacional vai ser amanhã ao jantar”, comentava ao Observador um participante no encontro, desalinhado com a atual direção, que descreveu a intervenção do presidente do partido como “básica”, “sem nada de novo”, mostrando um Rui Rio “cheio de certezas sobre si mesmo”. Críticas feitas, contudo, em surdina, porque, dentro de portas, a única voz apontada como tendo feito “sugestões de ajustes na tática” foi a de Paulo Rangel.

Segundo relatos feitos ao Observador, o eurodeputado que foi eleito conselheiro nacional pela lista de Rio e Santana não levantou muito a voz mas pediu que o PSD marcasse a diferença face ao PS. Pediu mais oposição, “uma oposição mais dura”; disse que o PSD “devia criticar mais” e “aparecer mais” e pediu que o partido, depois de ter manifestado “uma postura aberta e construtiva” face aos assuntos de “interesse nacional”, partisse agora para uma segunda fase, de maior ataque.

A postura de credibilidade e de oposição construtiva já passou para a opinião pública, agora temos de divergir mais”, disse Paulo Rangel segundo fontes ouvidas pelo Observador, elegendo a saúde, a segurança e proteção civil e a habitação como temas prioritários para centrar o ataque ao Governo. Temas não muito diferentes dos escolhidos por Rui Rio: incêndios, saúde e o negócio Montepio/Santa Casa, que, não sendo unânime, é um tema que Rio não vai abdicar. Quanto à forma como estes temas vão ser trabalhados, Rio elegeu o grupo parlamentar como o local por excelência para a oposição engrossar a voz.

”Clara manifestação de unidade”

O discurso de Rio aos conselheiros, de resto, foi descrito ao Observador como tendo sido uma compilação de tudo o que tem dito nas últimas semanas nos vários fóruns: defendeu o ex-secretário-geral Feliciano Barreiras Duarte, disse que as eleições só se ganham se outros as perderem, apontou fragilidades do Governo naquelas três áreas principais e afastou uma vez mais a ideia de um bloco central. “Credibilidade” é a palavra-chave de Rio para fazer boa figura junto dos eleitores.

Sobre o tão falado Conselho Estratégico Nacional, Rio não levou novidades aos conselheiros. Nem tão pouco confirmou os nomes que nos últimos dias têm sido avançados pela comunicação social — limitou-se a lembrar que os únicos nomes certos são aqueles que foram anunciados pela sua própria voz: David Justino, o presidente, e Arlindo Cunha, para a Agricultura. “Ninguém fez nenhuma intervenção a questionar qualquer nome”, garantiu o presidente da mesa, Mota Pinto, aos jornalistas. Nomes como Ângelo Correia, Silva Peneda, Correia de Jesus ou Luís Filipe Pereira, estão a ser dados como certos, tendo alguns sido confirmados pelos próprios, mas “não foram discutidos nem debatidos”. Pelo menos dentro de portas e a viva voz, porque nos corredores, várias eram as vozes críticas que questionavam a “imagem” que passava a ausência de renovação, e o ressuscitar de figuras muito próximas do cavaquismo.

Mas nem isso, segundo Mota Pinto e outras fontes contactadas pelo Observador, foi motivo de discussão acesa. Já perto das 2h da manhã, Mota Pinto descreveria o espírito da reunião como “uma clara manifestação de unidade”. “Foi um debate com muitas ideias e contributos, com um elevado nível, houve muitas intervenções no sentido de dar conselhos, mas tudo no espírito de grande unidade”, disse.

A verdade é que o ambiente na sala “Guimarães” do hotel Crowne Plaza, vizinho do Sheraton, também não era propício a confrontação. É que, “pela primeira vez”, segundo relatou um participante, a sala foi dividida fisicamente em três setores: os membros eleitos, com poder de voto, os participantes (onde se incluem as inerências, como é o caso dos deputados), e os observadores. À chegada cada um era conduzido para a porta respetiva, estando os três setores separados por uma corda vermelha. “Caiu muito mal”, dizia ao Observador um participante desalinhado.

No final, depois de quase cinco horas de debate interno, os rioistas respiraram de alívio. Paulo Mota Pinto sublinharia várias vezes aos jornalistas que houve uma “clara manifestação de unidade”, mesmo entre os que não apoiaram Rio nas diretas, e que houve conselhos e sugestões dadas pelos intervenientes, mas “sempre no espírito construtivo”. “Registo o elevado nível dos contributos dados”, insistiria Mota Pinto na declaração final aos jornalistas, sublinhando a mesma ideia de formas diferentes: “Não houve nenhum tema de cisão”, “houve muitos contributos”, mas “uma grande unidade na estratégia do partido”. Rui Rio, por sua vez, ainda deixou que os jornalistas se aproximassem para pedir umas declarações finais de balanço do seu primeiro Conselho Nacional, mas acabaria por não dizer nada aos microfones. A primeira pergunta foi sobre a ausência de Santana, mas a resposta seria apenas um sorriso e, já está: “Não vou comentar”.

À saída, outra fonte comentava em surdina o tom pacífico em que tinha decorrido a primeira grande reunião do PSD da era Rio: “Eles sabem que não vale a pena… têm de ser construtivos”. Eles? Os críticos. Mas para esses, o Conselho Nacional segue dentro de momentos. Ao jantar, em Lisboa.

Ladrões de Bicicletas


Apresentação em Faro a 6 de abril

Posted: 03 Apr 2018 06:00 PM PDT

«Fazia falta um livro como este. Um livro que analisasse a economia portuguesa de um ponto de vista diferente do pensamento dominante na União Europeia. Um livro que respondesse e desmontasse várias das premissas a que esse pensamento dominante tem recorrido para sustentar a sua narrativa da crise. Um livro que nos dissesse que não foram os portugueses os culpados pelo pedido de ajuda internacional em 2011. Um livro que nos mostrasse que esta foi uma crise diferente, que a estrutura produtiva nacional não saiu fortalecida dela e que não nos devemos iludir com as bases em que assenta o crescimento de 2,6% em 2017. Enfim, fazia falta um livro como este, que contivesse uma análise global (económica, social...) dos efeitos da crise e que não se limitasse a olhar apenas para os resultados financeiros do programa de ajustamento. Este é um livro corajoso e imprescindível, para quem quer dispor de outro olhar sobre o que efetivamente aconteceu em Portugal desde o início do séc. XX - e deseja conhecer a resposta à pergunta crucial que José Reis coloca: para que serve um país pobre?»
Do prefácio de Nicolau Santos ao recente livro de José Reis, A Economia Portuguesa - Formas de economia política numa periferia persistente (1960-2017), que será apresentado em Faro na próxima sexta-feira, 6 de abril, por Adriano Pimpão, professor e ex-Reitor da Universidade do Algarve, e Hugo Pinto, investigador do CES (Coimbra) e professor na Faculdade de Economia da Universidade do Algarve. A sessão de apresentação realiza-se na FNAC de Faro, a partir das 21h30. Estão todos convidados, apareçam.

Passar à frente

Posted: 03 Apr 2018 03:43 AM PDT

Do filme "Heat", de Michael Mann (1995)

Este não é um post, mas uma adenda ao artigo do João Rodrigues de hoje. É apenas uma chamada de atenção para uma questão altamente pertinente colocada pelo presidente do IPO de Lisboa, num bom artigo da Alexandra Campos, no Público de hoje.
Francisco Ramos alerta - mais uma vez! A anterior foi há quase dois anos! - para a urgência de regras de tratamento dos doentes com cancro que vêm do sector privado - "despejados" do sector privado - quando se acabou o dinheiro dos pacientes ou quando as companhias seguradoras deixam de pagar os cuidados dos pacientes com seguros privados. 
O problema não é tratá-los. Mas é o facto de, como esses doentes em muitos casos já iniciaram tratamentos, não se lhes pode interromper esses cuidados e, por isso, havendo limitações orçamentais - impostas por uma filosofia económica estúpida e criminosa - têm de passar à frente dos doentes do Serviço Nacional de Saúde...
Este caso é exemplar das consequências da ausência de uma visão integrada dos problemas e do que dá a inércia de empurrar com a barriga os problemas conhecidos. Tudo para não fazer perigar desconhecidos equilíbrios. Neste caso, trata-se da separação de águas entre o sector privado e o público que importa ser feita e que está em discussão pública.
Francisco Ramos foi secretário de Estado da Saúde em diversos governos socialistas, de ministros como Maria de Belém Roseira, Correia de Campos, Ana Jorge. Talvez fosse pertinente perguntar-lhe o que impediu, nessa altura, de traçar esta separação das águas. O Partido Socialista tem de ter um pensamento próprio e entender que tem de fazer opções claras e transparentes, coerentes e visionárias. Porque não fazer opções, é uma opção que favorece alguns interesses, mas que fará pagar bem caro aos portugueses, mesmo com a própria vida. E em última instância ao próprio PS, a um PS que faça a diferença nesta sociedade, e à esquerda nacional.

Cinquentenário - Martin Luther KingQuinta

Quinta Emenda

Tenho o direito de ficar calado. Mas não fico!

Eduardo Louro

  • 04.04.18

Martin Luther King Jr.

Um cinquentenário é sempre um acontecimento, comemorar 50 anos é sempre mais que assinalar uma simples efeméride. Se, no século passado, a década de 60 foi uma das mais ricas, 1968 foi um dos mais palpitantes anos da década e deixou muito para comemorar. Por isso 2018 tem muito cinquentenário para comemorar.

Começa com o do assassinato de Martin Luther King, que tinha um sonho - "I have a dream"!

O sonho de que um dia os filhos de antigos escravos pudessem “partilhar a mesma mesa em fraternidade” com os filhos de antigos donos de escravos, o sonho da convivência entre brancos e negros sob a mesma bandeira, a mesma lei e com as mesmas oportunidades.

Martin Luther King, Nobel da Paz em 1964, foi morto às 6 da tarde de 4 de Abril de 1968, quando discursava à varanda do quarto 306 do Lorraine Hotel, em Memphis, no Tennessee, pelas balas disparadas por um racista - James Earl Ray.  O seu sonho, não!

Esse continua vivo, como viva continua a sua mensagem contra o racismo, a pobreza e a violência, meio século depois, num testamento de esperança aberto há poucos dias atrás em Washington, pela sua bisneta, Yolanda Renne King, de 9 anos.

terça-feira, 3 de abril de 2018

O EFEITO CENTENO

O EFEITO CENTENO

por estatuadesal

(In Blog O Jumento, 03/04/2018)

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Portugal tem um problema com Mário Centeno desde que ele apareceu na vida política portuguesa, liderando um grupo de economistas que elaboraram os cenários macroeconómicos. Logo aí a sua presença incomodou, o PSD tentou arranjar outro Centeno mas não conseguiu, depois sugeriu que o Conselho de Finanças Públicas avaliasse as propostas do PS e a própria Teodora Cardoso achou-se em condições de ser mestre-escola da democracia. Aliás, a fixação de Teodora em Mário Centeno prolongou-se no tempo e sempre que se pronuncia não esconde a esperança ou desejo de ver o ministro das Finanças espalhar-se.

A primeira estratégia do PSD em relação a Centeno foi a de tentar ridicularizar o novo ministro. Para a história da primeira ida de Centeno ao Parlamento fica a notícia de que Passos riu até às lágrimas. O artista falhado conseguiu um bom desempenho artístico, ainda que dois anos depois tenha saído do Parlamento com vontade de chorar a sério e sem encenações cínicas.

Nem mesmo Marcelo resistiu ao perfume de Mário Centeno e depois de andar a fazer previsões otimistas, antecipando-se sistematicamente aos anúncios do ministro, achou que estava na hora de pegar na palmatória e meter o ministro na linha. Segundo a comunicação social terá chamado Lobo Xavier a Belém e este ter-lhe-á dado a ler os SMS entre Centeno e o Domingos. É um momento insólito na democracia portuguesa, dizer-se que um Presidente a ler mensagens privadas de um ministro, ignorando os mais elementares valores constitucionais. O certo é que Marcelo não desmentiu as notícias.

A mania de tentar ridicularizar Mário Centeno não foi um exclusivo de Passos Coelho. Há muito que é tradição no PSD substituir o debate político sério por tentativas de ridicularizar os adversários, tique que vem dos tempos dessa coisa fina que foi Cavaco Silva; desde então que todas as figuras do PS ou são gays ou são picaretas falantes. Marques Mendes, uma espécie de “garganta funda do regime” meteu-se em cima de um banquinho para parecer alguém e divertiu-se a dizer uma piada nova, que a notícia de que Centeno poderia vir a presidir ao Eurogrupo só poderia ser uma mentira de 1.º de Abril. Viu-se.

Quando não havia como criticar os resultados orçamentais de Mário Centeno alguém se lembrou das cativações, um instrumento orçamental que sempre foi usado. Mas agora era o argumento para acusar Mário Centeno de todos os males, desde o assalto a Tancos por não haver dinheiro para tapar o buraco na rede, aos incêndios por falte de dinheiro na Proteção Civil, passando pela legionella e tudo o mais que sucedeu. Nem a Catarina Martins resistiu à tentação de se armar em esperta protestando contra as cativações.

O ridículo chegou ao ponto de Centeno começar a ser usado por colegas de Governo quando confrontados com problemas nos debates parlamentares. O Adalberto da Saúde quando confrontado com o atraso num concurso de contratação de médicos foi lesto na explicação, a culpa era o Centeno. Mas como o Centeno soma e segue foi o mesmo Adalberto que assegurou que no governo são todos Centenos, só não explicou se estava a falar dos gostos futebolísticos, da competência ou do rigor orçamental. O certo é que a moda pegou e logo a seguir aparece a Ana Catarina Mendes a dizer que gostara de ver Centeno no próximo governo.

Entre as brumas da memória


Dica (738)

Posted: 03 Apr 2018 01:38 PM PDT

India isn't building a military to take on China (Mihir Sharma)

«Only one country seems eager to deal with the ramifications of China’s rise: India. Across dozens of world capitals, confidence is repeatedly expressed that India will seek, in the decades to come, to balance China. And in no capital is this sentiment expressed more loudly than India’s own.»

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02.04.1976 - a primeira Constituição depois de Abril

Posted: 03 Apr 2018 10:10 AM PDT

A Constituição da República Portuguesa foi aprovada em 02.04.1976 por todos os partidos, à excepção do CDS: os seus 16 deputados votaram contra. Uma espinha espetada na garganta de muitos, que, apesar de todas as revisões que já tiveram lugar, gostariam de apagar muito daquilo que se conseguiu salvaguardar até hoje.

Nesse mesmo dia teve início a campanha para a primeira eleição de deputados à Assembleia da República, que viria a ter lugar a 25 de Abril.

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Bem a propósito de tantas coisas...

Posted: 03 Apr 2018 05:08 AM PDT

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A opção cultural

Posted: 03 Apr 2018 02:08 AM PDT

«"Les Demoiselles d'Avignon", de Picasso, inaugurou o modernismo na pintura há pouco mais de um século. O quadro de Picasso foi uma ruptura entre o passado e o presente. O modernismo foi, nas artes, a vitória da forma sobre o conteúdo. Inspirou, sem o saber, o olhar da política nacional sobre a cultura. Tudo é forma, nada é conteúdo. Os resultados dos apoios da DG Artes à área do teatro exemplificam como funciona o pronto-a-vestir em que se transformou o arbítrio do gosto aliado à celebrada burocracia bafienta que costuma decidir as propostas. O amor à cultura, que sucessivos políticos professam antes das eleições, esbate-se rapidamente com o tempo. Até porque a cultura deixou de garantir conforto moral a quem quer liderar um país. Uma "selfie" ao lado de um craque de futebol garante mais exposição mediática do que uma foto com os melhores actores ou dramaturgos nacionais. A cultura é, há muito, um sector desvalorizado em Portugal. É quase uma nostalgia pouco perdoável. A culpa não é só dos políticos: é de toda a sociedade. Basta olhar para a comunicação social portuguesa e ver que espaço se dá à cultura. A cultura tornou-se um fóssil.

Agora é recordada porque os monumentos maltratados atraem turistas. E o turismo, sabe-se, é agora o Harry Potter do país. Ninguém parece pensar que a criação cultural interligada com o património existente funciona como as duas faces da moeda de desenvolvimento e modernidade de uma nação. São locomotivas de uma sociedade mais criativa e, por isso, capaz de abrir novas avenidas sociais e económicas. Custa a perceber, no meio desta transformação da cultura num parque temático decadente, o que ainda motiva o ministro da Cultura a manter-se no cargo. A não ser que goste de ser uma versão nacional de um modelo do museu de cera de Madame Tussauds. Mas cada um escolhe o seu lugar no mundo. A opção cultural há muito que desapareceu de uma sociedade portuguesa que empobreceu na sua alma. As decisões da DG Artes são apenas o triste epílogo de tudo isso.»

Fernando Sobral