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terça-feira, 2 de junho de 2020

Manual de instruções para desconfinamentos (nada) banais

Curto

02 JUNHO 2020

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Bom dia,
Pode ser apenas impressão, mas parece que, nos últimos dias, a mensagem dos políticos e das autoridades de saúde não está a chegar com clareza. A época balnear ainda não abriu, as regras de segurança não estão a funcionar e já as praias estão cheias de milhares de portugueses. Ao mesmo tempo, multiplicam-se os comportamentos arriscados e a polícia é obrigada a intervir. Estamos apenas no arranque da terceira fase de desconfinamento, não é ainda a normalidade total.
Os centros comerciais reabriram, como conta a reportagem do Expresso no Porto, e apesar das regras limitadas os clientes parecem estar a aderir. Mesmo na zona de Lisboa, onde ainda não houve reabertura total por causa da subida dos contágios, o movimento é elevado e espera-se que possa haver um regresso à normalidade já na sexta feira.
Nas Lojas do Cidadão, a afluência foi muita e os nervos em franja também. O cidadão deslocou-se à loja mas o atendimento era feito apenas por marcação. Também já há ginásios e é possível voltar a fazer tatuagens.
Na Madeira, mais à frente no desconfinamento, os espaços de diversão nocturna vão regressar e o Expresso esteve na primeira discoteca que vai reabrir em Portugal. “Isto também é uma questão de saúde mental” , diz um dos empresários do setor.
Em Lisboa, não há bares e discotecas mas ontem houve concerto no Campo Pequeno: “Deixem o Pimba em paz” de Manuela Azevedo e Bruno Nogueira. Até António Costa lá esteve.
A economia está a reabrir mas a crise continua e é bem visível. A Concertação Social discute hoje o plano de estabilização económica, numa reunião em videoconferência que conta com a participação do ministro da Economia, Siza Vieira, e da ministra do Trabalho, Ana Mendes Godinho. Até agora, a Autoridade para as Condições do Trabalho só detetou nove irregularidades no lay-off.
A maioria dos portugueses (61% é a favor da utilização de apps para controlar a covid-19, de acordo com uma sondagem da Pitagórica que faz manchete esta terça-feira no Jornal de Notícias.
Para não se perder em tantas regras e alterações, o melhor é consultar o guia que o Expresso preparou. Confira também os últimos dados da covid-19 e toda a informação em direto: são mais 200 infetados, o valor mais baixo numa semana, e mais 14 mortos. E, claro, as infografias que o Expresso atualiza diariamente há quase três meses sobre a evolução da doença em Portugal e no mundo.

Tensão e violência em 40 cidades dos EUA

De  Nara Madeira  •  Últimas notícias: 01/06/2020 - 08:57

Tensão e violência em 40 cidades dos EUA

Direitos de autor Matt Dunham/Copyright 2020 The Associated Press. All rights reserved

Mais de 1400 pessoas detidas em seis dias de protestos violentos em agora, pelo menos, 40 cidades dos EUA, "instigados" pelo assassinato de George Floyd, há uma semana, por um polícia.

De Boston a São Francisco, centenas de pessoas ignoraram a ordem de recolher obrigatório.

Em Washington DC a polícia usou gás lacrimogéneo para dispersar a multidão.

Os protestos chegaram, uma vez mais, à porta da residência oficial do presidente dos EUA. Donald Trump que abriu guerra contra os Antifa, um movimento de esquerda antifascista e quer que este seja declarado como organização terrorista.

Um pouco por todo o país diz-se que sem justiça não haverá paz. Clama-se pelo fim da violência contra as minorias, também em Nova Iorque.

Mas no meio dos protestos há quem aproveite para semear o caos - lojas saqueadas e vandalizadas, etc. - dando argumentos à administração Trump para considerar "os instigadores de cinco noites de tumultos" como "terroristas".

Trump, de quem alguns esperam um discurso à Nação mas para apaziguar as hostes, através das redes sociais exige o restabelecimento, imediato, da lei e da ordem e quer que seja pedida a intervenção da Guarda Nacional.

Foi em Mineápolis, no estado do Minnesota, que tudo começou. Foi também aqui que no domingo um camião se lançou, aparentemente de forma deliberada, contra a multidão mas sem fazer feridos.

Uma cidade em ebulição que levou o governador a pedir a intervenção da Guarda Nacional mesmo antes de Trump. Desde que George Floyd - desarmado, algemado - foi morto por um polícia que colocou o joelho sobre o seu pescoço e que não cedeu aos seus pedidos para parar porque não conseguia respirar, que Mineápolis não dorme. O agente será julgado por homicídio.

segunda-feira, 1 de junho de 2020

No saguão do teletrabalho

Posted: 31 May 2020 02:45 AM PDT

«Está em curso uma discussão sobre o teletrabalho muito suportada por opiniões superficiais, sem reflexão acerca do contexto económico, social e político em que vamos viver, sem suporte em estudo científico e empírico indispensáveis.

São, em grande medida, pronunciamentos embalados pelo fascínio da tecnologia e algumas tentativas de credibilizar objetivos particulares de curto prazo. O assunto é sério, tem de ser estudado, nas suas vantagens e inconvenientes, tomando a experiência forçada de muitos milhares de trabalhadores, mas muito para além do observável nessa experimentação.

Em pouco tempo emergiram vantagens e inconvenientes. Questões muito delicadas ao nível do uso do tempo, um dos bens fundamentais sobre o qual não podemos perder o controlo. Há que distinguir, e criar barreiras, entre tempo de trabalho e tempo pessoal para a vida plena em todas as suas dimensões. Concomitantemente, tornaram-se evidentes as dificuldades de gestão do espaço doméstico e a tendência para sacrificar condições de vida de elementos da família em favor da prestação de trabalho de outrem.

Num tempo em que tanto se fala da necessidade de trabalho em equipa, se constata a necessidade de maior socialização, em que é preciso reforçar o coletivo contra o individualismo exacerbado e, quando é imberbe a regulação e regulamentação do teletrabalho, há muito a estudar para que o seu incremento não venha a ser mais prisão, amputação das liberdades e fragilização da democracia. E como estruturar bem a gestão de equipas à distância? E quais os impactos na distribuição territorial dos/as trabalhadores/as e suas implicações?

Vamos viver (já estamos) um tempo em que imensas pessoas têm menores rendimentos e o elevado desemprego coloca os trabalhadores numa situação de fragilidade: os desempregados forçados a aceitarem trabalho sem poderem proteger-se minimamente; e quase todos os outros mais expostos a chantagens, porque há um exército de mão de obra disponível. Por outro lado, como se vai confirmando a cada dia que passa, o choque da pandemia só foi simétrico no susto inicial: as desigualdades e as vulnerabilidades estão a agravar-se e os poderes a desequilibrarem-se em desfavor dos trabalhadores.

A utilização do teletrabalho vai ser influenciada até pela geopolítica, num quadro de incremento da automação, debaixo de falsos determinismos tecnológicos, e com as plataformas digitais e outras a tentarem camuflar dependências hierárquicas e funcionais, gerando a ilusão de estarmos perante uma proliferação de "atividades" ocasionais substitutivas do emprego.

E como vai ser feita a desincrustação da crise nos planos sociopolítico e institucional? O Estado e as instituições vão sair com mais força? As instituições de intermediação e regulação imprescindíveis em democracia, como os sindicatos, vão ser defendidas e reforçadas nas suas missões ou desvalorizadas?

É preciso fazer-se a caraterização funcional das diversas profissões, analisar mudanças para a organização do trabalho na perspetiva patronal mas, de igual modo, do ponto de vista do trabalhador. Este estudo não pode substituir aquele que identifique as exigências e limites no espaço privado. O perigo de se desvalorizar o teletrabalho é real. E ele não pode tornar-se trampolim de transferência de responsabilidades.»

Manuel Carvalho da Silva

Christo morreu, os EUA estão a ferro e fogo e já está tudo em pulgas para voltar aos centros comerciais

Curto

Martim Silva

Martim Silva

Diretor-Adjunto

01 JUNHO 2020

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Detroit EUA

Bom dia,
Este é o seu Expresso Curto deste primeiro dia da semana e primeiro dia do mês de Junho (Dia da Criança) e primeiro dia da terceira fase de desconfinamento da pandemia.
Venha daí comigo,
A expressão a ferro e fogo pode ser um cliché mas muitas vezes os clichés ajudam-nos a perceber, ainda que a traço grosso, o que se passa.
Há dias que em várias cidades dos Estados Unidos se sucedem os protestos populares, misturados por vezes com pilhagens, confrontos com a polícia, violência e destruição de bens, depois da morte do afro-americano George Floyd às mãos da polícia (cuja brutalidade ficou testemunhada em imagens).

Os protestos chegam mesmo às portas da Casa Branca. O tom inflamado do Presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, tem ajudado a colocar gasolina na fogueira, com as suas sucessivas declarações incendiárias e classificação redutora dos manifestantes.

Aqui deixo alguns links úteis para seguir o que se passa nos Estados Unidos:
Donald Trump classifica movimento antifascista como organização terrorista

Polícia de Nova Iorque: Trump diz que não há ninguém melhor, imagens provam o contrário
Não se pode excluir que caso de Floyd beneficie Trump
Pelo menos 345 detidos e 33 polícias feridos nas manifestações em Nova Iorque

Polícia anuncia segunda pessoa morta a tiro em Indianápolis

Polícia de Mineápolis descobre cadáver perto de carro queimado em motins
George Floyd e o polícia que o matou trabalharam como vigilantes no mesmo clube noturno
As manifestações já se alargaram a fora dos EUA, por exemplo aqui e aqui.

Mudando de tema,
Morreu ontem em Nova Iorque o artista de origem búlgara Christo, que ficou mundialmente famoso como as suas obras que consistiam em embrulhar (literalmente) edifícios e monumenos – considerava que a arte nos espaços públicos devia estar exposta e acessível a todos. Entre as mais famosas criações estão o embrulho do Reichstag, em Berlim, ou da Pont Neuf, em Paris. Para este ano, estava previsto o mesmo para o Arco do Triunfo, em Paris, e os responsáveis já garantiram que apesar da morte do artista a ideia é que a iniciativa não seja travada.
O sol e o calor levaram este fim de semana, como já tinha acontecido sete dias antes, muitos portugueses à praia. O calor, por um lado, e o desconfinamento, por outro, ajudam a que a vontade de sair de casa seja grande.
Na Costa da Caparica, um jovem de 22 morreu, tendo sido encontrado a flutuar de barriga para baixo numa das praias a sul de Lisboa.
Deixo a pergunta: que sentido faz num país como Portugal, com 800 quilómetros de costa e quase tanto de praias, em que os portugueses são literalmente loucos por areia e mar, que as épocas balneares e a vigilância não coincidam com aquilo que leva as pessoas ao mar, o bom tempo?
Estamos com temperaturas acima dos 30 graus. Mas a época balnear começa dia 6. Não há forma de alguém pensar neste assunto?
Hoje é o Dia1 da Fase3 do desconfinamento. Há novas regras nos centros comerciais, com excepções na zona de Lisboa, reabertura dos ginásios, dos jardins de infância (ainda a meio gás), dos espectáculos, concertos e cinemas, das Lojas do Cidadão, entre outras medidas (como o regresso das lojas de tatuagens e salões de beleza). Ao longo do dia, pode acompanhar no site do Expresso as reportagens e notícias que a nossa equipa está a preparar para si.
Aqui tem a listagem completa das medidas a que deve tomar atenção, porque vão de alguma forma ser sentidas por todos nós.
Também no teletrabalho há novas regras a partir de hoje. Mas o que já todos percebemos é que depois desta pandemia o mais provável é que para muitos a forma de trabalhar não mais seja a mesma. Leia o que escrevemos sobre o assunto.
Este fim de semana, assistiu-se à reabertura dos locais de culto e Marcelo não só foi à missa como esteve na mesquista de Lisboa.

domingo, 31 de maio de 2020

Para podermos respirar

Posted: 30 May 2020 03:36 AM PDT

«”Não consigo respirar”. O grito, como é sabido, não é de nenhuma vítima da Covid-19, mas sim de George Floyd, o cidadão negro, afro-americano, de 46 anos, que foi executado barbaramente por um polícia em Minneapolis. A frase foi repetida dezenas de vezes, em estado de aflição, enquanto o polícia continuava a esmagar com o joelho imperturbável a garganta de Floyd. Ao contrário do que escreveu alguma imprensa, o polícia não se “ajoelhou no seu pescoço”. Asfixiou-o deliberadamente. Floyd não morreu por isso em nenhum “incidente”. Perante os apelos dos transeuntes para que o deixassem respirar e a passividade criminosa dos restantes agentes policiais, que recusaram prestar qualquer assistência a uma pessoa que estava a ser assassinada, George foi linchado por quem tem, supostamente, a missão de proteger os cidadãos.

“Não consigo respirar”. Foi também este o grito, repetido desesperadamente mais de uma dezena de vezes, por Eric Garner, cidadão negro que tinha 43 anos quando foi estrangulado ate à morte, durante mais de 15 segundos, em julho de 2014, por um agente da polícia de Nova Iorque, também ele um homem branco. O caso, seis anos antes numa outra cidade, e que terminou sem qualquer condenação do homicida, tem todas as afinidades possíveis com o de Minneapolis. E mostra como nada parece ter mudado para todos aqueles que não podem sentir-se seguros se a polícia estiver por perto.

Enquanto tantos se mobilizam, um pouco por todo o mundo, para combater um vírus que nos impede de respirar, para que haja ventiladores capazes de salvar vidas, há outras vidas e outros corpos que são tratados como se não tivessem direito a viver. Como se o poder pudesse dispor deles e eliminá-los.

A asfixia dos negros não vem, como se sabe, de agora. Estes episódios estão longe de ser acontecimentos isolados. Muito menos são tristes coincidências. São, de facto, a expressão da política do racismo estrutural, que é brutal nos Estados Unidos, mas não só. Estas histórias, que nos revoltam por dentro, existem porque foram conhecidas, porque alguém filmou e nós as testemunhámos. Imaginem agora quando não há ninguém a registar o que acontece, quando é no silêncio e na impunidade absoluta que estes assassinatos acontecem. Quantos não existem, todos os dias? Quanta violência racista é perpetrada sem que nunca ninguém seja condenado por isso? Sabemos bem, em Portugal também. É preciso lembrar Alfragide, por exemplo?

É por isso que me declaro solidário com quem manifesta a sua indignação e a sua repulsa, que são também minhas, contra esse racismo larvar que atira migrantes e negros e pobres para as periferias das cidades e dos empregos mal pagos, para as vias desvalorizadas do ensino e para os transportes cheios e expostos à doença, para as prisões e para os bairros com poucas condições. Para a violência estrutural às mãos das instituições.

Em Minneapolis, esta revolta é já um potente grito coletivo e multirracial que ocupou as ruas, com gente de várias comunidades e pertenças, com igrejas solidárias a abrirem as suas portas para abrigar os manifestantes durante os ataques de gás lacrimogênio da polícia, com comerciantes a anunciar o seu repúdio pelo que aconteceu, com gestos importantes como o de Joan Gabriel, presidente da Universidade de Minnesota, que anunciou, numa carta pública, o corte de todos os contratos com o Departamento de Polícia de Minneapolis e o cancelamento de qualquer pareceria para a segurança de concertos, palestras ou outros eventos daquela instituição.

Está visto, é certo, que vai ser preciso muito mais luta para que as coisas mudem. Hoje mesmo, Omar Jimenez, um repórter negro da CNN que tem coberto as manifestações naquela cidade, foi detido pela polícia em pleno direto televisivo. As imagens deixam qualquer um perplexo – a mim, pelo menos, deixaram-me boquiaberto. Depois de tudo o que se tem passado, Jimenez é levado pela polícia sem que se perceba porquê: “Por que estou preso?”, pergunta em direto. A polícia divulgou mais tarde a sua explicação: o repórter e a equipa haviam sido detidos por não se terem afastados quando receberam essa ordem. A câmara televisiva, caída no chão, continuou a transmitir as imagens em direto.

Os olhos do mundo estão em Minneapolis, porque Minneapolis é em muitos lugares do mundo. George Floyd é hoje o símbolo das vítimas deste vírus insuportável que torna as nossas sociedades irrespiráveis. O racismo mata, de muitas maneiras. E será só pela nossa luta sem tréguas e sem hesitações que poderá ser erradicado.»

José Soeiro