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quinta-feira, 12 de julho de 2018

Manuel Alegre: “Santos Silva está a passar uma certidão de óbito à geringonça”

  por estatuadesal

O histórico do PS diz que o n.º 2 do Governo está a colocar questões impossíveis aos parceiros do Executivo e, nesse sentido, a inviabilizar a atual solução governativa.

Fonte: Expresso | Manuel Alegre: “Santos Silva está a passar uma certidão de óbito à geringonça”

O BCE, a inflação e o diabo nos detalhes

  por estatuadesal

(Alexandre Abreu, in Expresso Diário, 12/07/2018)

abreu

(Excelente análise do papel do BCE na gestão macroeconómica da zona Euro, e dos seus limites, impostos pelos Tratados.

Com o prejuízo que tais limites causam aos países mais frágeis, como Portugal, fica a pergunta se os nossos dirigentes políticos que os assinaram o fizeram por ignorância total de conhecimentos básicos de macroeconomia ou porque Portugal, à época, já não era um país soberano e, qual analfabeto, só lhe restava assinar de cruz por não saber ler.

Comentário da Estátua, 12/11/2018)


O mandato do Banco Central Europeu, estabelecido no Artigo 127 do Tratado de Lisboa, consiste prioritariamente na manutenção da estabilidade de preços e, apenas secundariamente, na prossecução de um conjunto de outros objectivos em que se inclui o pleno emprego. Isto é em si mesmo ilustrativo do viés restritivo e conservador do Tratado de Lisboa, que atribui primazia à preservação do valor do dinheiro relativamente à promoção do emprego. Contrasta, aliás, com o chamado mandato ‘dual’ da Reserva Federal norte-americana, que atribui igual importância aos objectivos de promoção do emprego e controlo da inflação.

Este mandato do BCE tem como consequência que a adopção de medidas de estímulo macroeconómico por via monetária, incluindo através da compra de activos não-convencionais, o chamado Quantitative Easing, tem como limite o aparecimento de uma dinâmica inflacionária. A partir do momento em que esta surge, o BCE vê-se obrigado a carregar no travão, ou pelo menos a deixar de acelerar – independentemente dos níveis de desemprego e de crescimento económico ou, no caso do QE, da dependência da sustentabilidade da dívida soberana dos diferentes países relativamente à sua aquisição pelo banco central.

Tudo isto faz com que a definição de estabilidade de preços assuma grande importância. No caso do BCE, esta foi definida em 1998 pelo Conselho de Governadores como ‘um aumento homólogo do Índice Harmonizado de Preços no Consumidor (IHPC) para a zona euro abaixo de 2%’. Ou seja, o BCE guia-se pela chamada inflação global (‘headline inflation’) que, em Junho de 2018, atingiu precisamente o valor de 1,97% após um longo período bastante abaixo de 2%.

Sucede, porém, que, na zona euro, a chamada inflação ‘de base’ (ou ‘core inflation’, que retira à inflação global o efeito da variação dos preços da energia e dos alimentos, mais voláteis e sujeitos a choques independentes da dinâmica da economia) mantém-se em 0,96%, uma vez que a maior parte do aumento do IHPC no último ano é explicado pelo aumento homólogo de 8% do preço dos produtos energéticos, nomeadamente o aumento do preço do petróleo. Desde Janeiro deste ano, a inflação global subiu de 1,36% para 1,97%, mas a inflação de base até desceu, de 1,00% para 0,96%.

O BCE está assim prestes a embater no limite por si próprio imposto para a adopção de uma política monetária expansiva, o que não deixará de afectar a recompra dos activos abrangidos pelo QE à medida que estes forem vencendo. Seguramente, o argumento do IHPC nos 2% não deixará de ser mobilizado pelos ‘falcões’ dentro do BCE e na Alemanha para exigir uma orientação de política monetária mais restritiva e deflacionária.

Só que esta inflação de 2% não se deve à política monetária ter chegado a um ponto em que é completamente ineficaz e apenas gera aumento de preços; pelo contrário, o aumento de preços é fundamentalmente de origem externa e devido à evolução dos preços da energia.

Devido às minudências do mandato do BCE, o aumento do preço do petróleo acaba assim por desferir um duplo golpe: afecta directamente o poder de compra dos consumidores e a estrutura de custos das empresas, e indirectamente a actividade económica por via das restrições que impõe à política monetária. No caso de estados altamente endividados como o português, o golpe é triplo, pois por esta mesma via da inflação induzida e do mandato do BCE constrange ainda a aquisição por este último dos títulos de dívida pública no mercado secundário, pressionando em alta os juros no mercado primário.

Como dizem os ingleses, o diabo está nos detalhes.

Brasil: qualquer semelhança com um Estado de Direito é pura coincidência

  por estatuadesal

(Daniel Oliveira, in Expresso Diário, 11/07/2018)

Daniel

Daniel Oliveira

No último domingo o juiz desembargador Rogério Favreto, do TRF-4, mandou soltar Lula da Silva, respondendo positivamente a um pedido de habeas corpus. Esta decisão nada teve a ver com qualquer avaliação da culpa ou inocência do ex-presidente. O juiz apenas respondeu positivamente a três peticionários que são deputados do PT por considerar, e bem, que Lula está ilegalmente preso, já que a Constituição da República diz que “ninguém será considerado culpado até trânsito em julgado de sentença penal condenatória”, o que não é o seu caso.

Umas horas depois, o juiz Sérgio Moro (que no estanho funcionamento do sistema judicial brasileiro consegue estar presente em todos os momentos deste processo) determinou que o desembargador de plantão não teria competência para conceder a liberdade e que a decisão tinha de passar para o juiz Greban Neto, também do TRF-4. Greban, relator dos processos Lava Jato, avocou para si a competência do habeas corpus e determinou que não fosse cumprida a decisão de Favreto. Favreto voltou a emitir novo despacho, reafirmando a sua decisão, mas a libertação foi anulada pelo presidente do TRF-4.

Dados importantes: Favreto tem ligações ao PT (a relação próxima entre partidos e magistrados parece ser banal no Brasil); contrariou a avaliação do Supremo Tribunal Federal (que de uma forma igualmente atabalhoada aceitou a prisão depois de condenação em segunda instância, contrariando de forma descarada o que está expresso na Constituição); e o juiz Greban Neto, que teria o poder de reverter a decisão de Favreto, tinha de esperar pelo momento em que este deixasse de estar de turno (a informalidade com que o fez deveu-se a uma mera gestão dos efeitos mediáticos de uma libertação de Lula).

Em resumo: no mesmo dia, um juiz de plantão próximo do PT aceitou um pedido de habeas corpus, contrariando uma decisão claramente inconstitucional do Supremo; outro juiz que aparece em todos os momentos do processo contra Lula decidiu irregularmente que esta decisão não era para cumprir; um terceiro juiz do mesmo tribunal, que estava de férias, interrompeu-as e anulou a decisão do primeiro; este reafirmou a sua decisão; e o presidente, qual chefe deles todos, anulou a decisão do juiz que estava de serviço. Tudo isto se passou num domingo, sem recursos, regras processuais claras ou burocracias. Qualquer semelhança do funcionamento da justiça brasileira com o sistema judicial de um Estado de Direito é, neste momento, pura coincidência. Tudo o que se passa nos tribunais brasileiros e que tenha a ver com Lula está no domínio do combate político.

DUAS COISAS QUE PARECEM ÓBVIAS:

A primeira é que há um esforço hercúleo para que o processo do ex-presidente Lula da Silva nunca saia do raio de influência de uma mesma pessoa, desde a acusação até às eleições. E isso é, no Brasil ou em qualquer parte do mundo, um enorme perigo. Ao olhar para tudo o que tem acontecido, é impossível não constatar o empenho político e pessoal de Sérgio Moro, que anda pelo mundo a exibir-se como estrela mediática e dirige-se aos brasileiros como se fosse um militante, na condenação deste réu. Não discuto aqui a justeza da decisão tomada pelo desembargador Rogério Favreto. Tudo indica que também ele agiu por motivação política. Mas em Estados de Direito magistrados não anulam decisões de outros sem darem os devidos passos processuais. E muito menos interrompem férias para reverter, em horas, a decisão de um juiz de turno porque não gostaram dela ou a consideram ilegítima. A informalidade é o oposto da justiça.

A segunda é que a total insegurança jurídica que se vive no Brasil resulta da instrumentalização política do sistema judiciário e facilita essa instrumentalização política. A grande conquista de Sérgio Moro não foi, ao contrário do que a sua postura justicialista prometia, a moralização da democracia brasileira. Foi o caos judicial, a partidarização da justiça e um país sem os instrumentos do Estado de Direito a funcionarem regularmente. O resultado é que nenhuma instituição do Estado brasileiro é hoje respeitada. Quando isso acontece, sabemos o que vem depois: perante o caos, o Brasil está à beira de um golpe de Estado. E a militância irresponsável de magistrados transformados em estrelas políticas tem uma enorme responsabilidade nesta destruição da jovem democracia brasileira.

Se alguém acreditava que estávamos perante um processo judicial normal, com garantias de independência e defesa para os acusados, o caricato episódio do último fim de semana confirma a ingenuidade dessa ilusão. Há muito que a justiça brasileira se deixou engolir pelo confronto político e passou, graças à vaidade de alguns magistrados, a ser um instrumento partidário.

No Brasil, o Estado de Direito está em coma. Falta a intervenção militar para desligar definitivamente a democracia da máquina que a mantém artificialmente viva.

Salamandra

  por estatuadesal

(Dieter Dellinger, 11/07/2018)

salamandra

Depois de andar a ver a série belga "Salamander" convenço-me que em Portugal também pode eventualmente existir uma organização secreta que mete mandantes e pagantes de incendiários com gente de alta finança como o dono da Cofina, Celtejo e mais duas fábricas de pasta de papel, pessoal da justiça, polícia, exército, banqueiros, políticos da direita, etc.
A quantidade de incendiários e incêndios foi demasiado grande para que não haja uma organização por detrás e que manda ou dela fazem parte a maior parte dos responsáveis de comunicação social, incluindo, talvez, alguns da RTP/RDP estatais.
Convém ligar as palavras de políticos da oposição com noticiário do Correio da Manhã que deve estar no centro dessa organização criminosa em conjunto mesmo com procuradores e juízes, isto como hipótese.
A forma frouxa como a magistratura encara o crime de fogo posto parece indicar a pertença a algo de secreto, pelo menos de algumas pessoas.
Posso estar errado, mas convém saber o que escrevem certos jornais e O Observador e fazer ligações.

A prova mais evidente da existência de uma organização criminosa de conquista do poder é, sem dúvida, aquilo que parece ser uma ligação do Juiz Carlos Alexandre e/ou os procuradores ao Correio da Manhã.

Só no âmbito de uma projeto criminoso é que podia vir tanta coisa para a rua e outras, em número e valores milhares de vezes superior, ficarem fechadas nas gavetas. Refiro-me, entre muitas outras coisas, à transferência de 10 mil milhões de euros do BES para o Panamá com a conivência de secretários de Estado do governo anterior e até do BP que nada divulgaram em termos estatísticos como manda a legislação em vigor.
Enfim, podem ser coincidências, mas acho que são muitas para não estarem interligadas.

Trumpestade em Bruxelas

Trumpestade em Bruxelas

A generalidade do “populismo” ocidental – incluindo o de Donald Trump – associa a globalização em que vivemos a uma elite separada da realidade, e pensa que o remédio está em voltar a um mítico realismo em que cada um cuida de si.

Uma vasta plêiade de comentaristas que foram até hoje tidos como porta-vozes do establishment pró-Atlântico (veja-se a capa do Economist de 07/07) vinha há já várias semanas a assinalar com imensa preocupação a cimeira de Julho em Bruxelas da “Organização do Atlântico Norte”, pelos riscos de esta levar ao fim das relações transatlânticas tais como as conhecemos até hoje.

A cimeira começou com um pequeno-almoço do presidente norte-americano com o secretário-geral da organização, em que através das imagens difundidas pela comunicação social pudemos ver um dos mais contundentes mas certeiros comentários a que eu já assisti na vida:

… tenho a dizer que acho muito triste quando a Alemanha faz um enorme negócio de petróleo e gás com a Rússia, quando era suposto que estivesse a conter a Rússia, e a Alemanha fica a pagar todos os anos muitos biliões de dólares à Rússia, e portanto nós estamos a proteger a Alemanha, nós estamos a proteger a França, nós estamos a proteger todos estes países, e vários entre eles resolvem fazer um gasoduto com a Rússia (…)

… E eu penso que isto é muito inapropriado, que um antigo chanceler da Alemanha [Gerhard Schröder] seja o presidente da companhia do gasoduto que fornece o gás, e que fará com que a Alemanha venha a depender em 70% do gás natural russo. Por isso diga-me, acha isto aceitável? Eu tenho protestado contra isto desde que entrei em funções e acho que isto nunca deveria ter sido permitido, porque a Alemanha fica completamente sob controlo russo. Acho que temos de falar à Alemanha disto.

… Ainda por cima, a Alemanha paga um pouco mais de 1%, enquanto os EUA pagam 4.2% de um PIB muito maior. Também acho isto inaceitável!”

Estamos naturalmente perante uma lógica de discurso directo despido de eufemismos e circunvalações a que a as elites político-burocráticas não estavam de forma alguma habituadas, mas que exprime de forma clara o que pensam muitos norte-americanos e europeus da situação em que hoje vivemos.

Como é costume, não faltaram as críticas ao vocabulário curto e aos pontapés na sintaxe e na gramática do presidente norte-americano, acima de tudo porque não foi possível às nossas elites rebater a essência das palavras de Trump.

A oposição a Trump investiu todo o seu capital na acusação do conluio de Trump com Putin e fica por isso desarmada quando este põe a nu o conluio dessa mesma oposição com a Rússia.

  1. O agudizar da crise

A reconstrução da Europa pelo plano Marshall e pelas instituições europeias que dele surgiram, o sistema político e de defesa que permitiu essa reconstrução, realidades que estão quase a assinalar sete décadas, estão em tensão crescente há muitos anos.

Se, no início, a parte norte americana compreendeu plenamente o esforço feito, com o passar do tempo foi cada vez menos entendendo que o esforço de defesa e as principais responsabilidades de manutenção do sistema ficassem a cargo dos EUA, enquanto a Europa aproveitava as condições para gerir uma política diplomática e comercial apenas orientada pelos seus interesses.

Do lado europeu, houve sempre a tendência para minimizar o significado do esforço americano; porque o plano Marshall desenvolvia produção americana e habituava os europeus à ‘manteiga de amendoim’, porque o complexo militar-industrial assegurava o crescimento económico americano; porque a consagração do dólar como moeda internacional traz grandes vantagens ao seu emissor; porque talvez os vizinhos russos não fossem assim tão maus; etc.

Tirando a “manteiga de amendoim”, ou seja, a minimização da importância do plano Marshall, há alguma verdade no que se diz na Europa, havendo naturalmente espaço para se encontrarem equilíbrios.

A queda da cortina de ferro veio encorajar os que pensam que o sistema transatlântico económico e de segurança deixou de fazer sentido, se não se desse o caso de com Putin, a Rússia ter voltado à sua vocação imperial, de o Jihadismo querer acabar com tudo o que o Ocidente representa e de, finalmente, a China se ter tornado num colosso mundial a que só é possível de responder no quadro transatlântico.

A emergência da Alemanha reunificada como centro incontestado da “Nova Europa” colocou no entanto novos desafios que exacerbaram as divergências que vinham do passado. Tornando-se a principal herdeira do ‘consenso de Washington’ dos anos setenta, a doutrina alemã do “ordoliberalismo” recuperou o mercantilismo europeu do século XVIII.

Nada ilustrou melhor esse facto que a crise ucraniana provocada por uma iniciativa comercial europeia de inspiração alemã que oferecia aos ucranianos um acesso praticamente livre ao mercado europeu.

Para a Rússia, tratava-se de uma provocação, de uma disputa a um território que ela considerava estar no seu espaço de influência e, claro, quando os ucranianos se revoltaram contra o diktat de Putin, ele nada mais viu do que uma conspiração ocidental, e reagiu em consequência.

A Alemanha (e aliás as instituições europeias e transatlânticas) não percebeu nada do que deveria ser óbvio e ficou totalmente surpreendida com a reacção russa. Pior, apesar de ter aceite algumas sanções, não pôs em causa negócios como os petrolíferos para sustentar a sua defesa.

Tal como Donald Trump diz, a única coisa que impede o avanço russo são as muitas divisões americanas estacionadas na Europa (na Alemanha, na Polónia e no Báltico), sendo inaceitável que a Alemanha faça negócios com o adversário e mantenha as suas forças armadas em estado de quase inoperacionalidade.

  1. O que está em jogo?

A generalidade do “populismo” ocidental – incluindo o de Donald Trump – associa a globalização em que vivemos a uma elite separada da realidade, e pensa que o remédio está em voltar a um mítico realismo em que cada um cuida de si.

Nesta perspectiva, não se trata de reequilibrar a aliança atlântica, ou de reformar a união europeia, mas acabar com ambas. Nada poderá satisfazer mais todos os inimigos do Ocidente e dos seus valores e revelar-se mais destrutivo para todos nós, incluindo os EUA, do que a materialização desta perspectiva.

Quem por outro lado pretende defender o “status quo” a todo o custo, organizações europeias e transatlânticas não reformadas, está a laborar num erro de consequências equivalentes, porque a deriva das nossas instituições as torna incapazes de responder aos desafios que temos perante nós.

Penso por isso que estamos a andar no fio da navalha, e que precisamos de quem seja capaz de nos dirigir para reformas profundas sem perder de vista a razão de ser dos valores e princípios que nos devem unir. Precisamos por isso de aproveitar esta “trumpestade” para repensar profundamente as instituições que nos governam.