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terça-feira, 3 de julho de 2018

Geringonça. PCP diz que “o mito acabou” e aguarda encontro com Costa

CRISTINA RITA03/07/2018 12:40

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Comunistas endurecem o discurso sobre o acordo e o Orçamento. O primeiro-ministro ripostou: investe-se no IP3, mas não há dinheiro para “evoluções” salariais

“Termina um mito de que era possível fazer a quadratura do círculo de corresponder à reposição de direitos (...) e aceitar a submissão aos ditames da União Europeia e do euro”. A frase do secretário-geral do PCP, Jerónimo de Sousa, depois de dois dias de reunião do comité central, traduz-se no registo mais duro dos comunistas sobre o acordo com o PS, o “exame comum”, como lhe prefere chamar o PCP.

O líder do PCP não tinha ontem data e hora marcada para se encontrar com o primeiro-ministro e iniciar a negociação do Orçamento de 2019 ao mais alto nível. Talvez ainda seja esta semana, apurou o i – um detalhe que em política é sintomático do distanciamento entre as esquerdas. O Bloco de Esquerda já falou com Costa no passado dia 19, mas os comunistas ficaram na lista de espera. E o chefe de governo repisou ontem a ideia de que não há dinheiro para se fazer tudo. Para o efeito usou a requalificação do IP3, que liga Viseu e Coimbra.

“Quando estamos a decidir fazer esta obra estamos a decidir não fazer evoluções nas carreiras ou vencimentos.” A declaração do primeiro-ministro é clara. Não vai ceder aos argumentos do PCP ou do Bloco sobre o descongelamento integral de nove anos das carreiras dos docentes. O custo da intervenção no IP3 são 134 milhões de euros, e sem espaço para a introdução de portagens.

O primeiro-ministro insistiu: “É preciso ter em conta que, quando decidimos fazer esta obra, significa que estamos, simultaneamente, a decidir não fazer outra obra.” O aviso tinha um destinatário: os sindicatos de professores. Os recursos são limitados, mas o PS parece estar apostado numa nova bandeira, a do investimento público.

Mais a sul, o líder parlamentar, Carlos César, fez o discurso de que o Alentejo tem ficado em segundo plano e que o momento é de inverter a tendência.

Nas jornadas parlamentares, que terminam hoje na Pousada do Alqueva, César confessou o objetivo das visitas aos concelhos de Beja e Évora: “Viemos para aprender e apreender. Saímos daqui com a convicção do que é prioritário.” Os socialistas prometem pressionar o executivo a incluir Beja no mapa do plano nacional de investimentos, o projeto sobre o qual o chefe de governo já pediu uma maioria de dois terços no parlamento, facto que irritou Os Verdes no último debate quinzenal com António Costa.

Memórias do pec IV

No PS, o discurso de crise política tem um preço e uma memória. Em 2011, com o chumbo do PEC iv, do então primeiro-ministro José Sócrates, abriu-se a porta a eleições antecipadas e a esquerda foi penalizada por ajudar o PSD e o CDS a derrubarem o executivo. Os riscos são elevados, apesar de a História não se repetir. Este fim de semana, o ministro do Trabalho deu corpo à voz corrente de vários parlamentares. “Hoje, os eleitores são muito exigentes a esse respeito e estão à espera de que esta legislatura termine, e termine nesta lógica de compromissos”, declarou Vieira da Silva ao “DN”.

No dia em que o primeiro- -ministro voltou a dizer que não haverá dinheiro para se fazer tudo, a coordenadora do Bloco de Esquerda atacou o executivo. “É pouco prudente que o governo esteja à espera da muleta do PSD para quebrar o compromisso”, defendeu Catarina Martins, aludindo à situação dos professores.

pacote laboraL Os comunistas apelaram ao protesto no dia 6 de julho, data da discussão no parlamento sobre o pacote de medidas de alterações legislativas laborais, e, hoje, o Bloco senta à mesma mesa Carvalho da Silva, antigo líder da CGTP, a coordenadora do BE e o deputado José Soeiro para discutir a “valorização laboral”.

Ainda não é certo se o PSD votará a favor das propostas do governo ou se optará pela abstenção. A decisão deve ser tomada esta quinta-feira, dia 5, com a hipótese de se fazerem algumas propostas de alteração. E tudo depende da estratégia que os socialistas adotarem: se as alterações mudarem o acordo de concertação social, então, o PSD não passará cheques em branco aos socialistas.

Agora, tudo depende da geometria parlamentar. Basta que os partidos à direita do PS se abstenham para assegurar a aprovação dos diplomas, num dia que servirá para medir o nível de tensão entre os partidos que sustentam o executivo.

As negociações para o Orçamento do Estado de 2019 ainda não entraram no detalhe de propostas concretas, mas os comunistas sublinham que não aceitam pressões nem do Presidente da República nem do primeiro-ministro para votarem favoravelmente o documento.

No Bloco de Esquerda, o discurso varia entre a cautela e o ataque. “O que está a acontecer neste primeiro semestre de 2018? António Costa perdeu a estrelinha, demonstrou que as suas escolhas são mero jogo político. E dá razão ao Bloco de Esquerda: a ausência histórica de entendimentos à esquerda não foi defeito da esquerda. Foi feitio do PS. E só aconteceram em 2015 porque a esquerda teve força para os impor e o PS não teve força para lhes resistir. O mel com que a esquerda era tratada passou recentemente a fel”, escreveu Pedro Filipe Soares, líder parlamentar, num artigo de opinião no “DN”. Entre os bloquistas, o sentimento é o de esperar para ver até onde vai António Costa e se há a tentação de obrigar o Bloco ou o PCP a romperem a corda.

Costa garante que a geringonça vai continuar

Miguel SilvaLUÍS CLARO03/07/2018 13:53

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“Queremos continuar este caminho com a companhia que temos”, disse o secretário-geral do PS

António Costa dedicou boa parte do seu discurso, no encerramento das jornadas parlamentares do PS, ao acordo entre os socialistas e os partidos à sua esquerda. O secretário-geral do PS garantiu que “quando se está bem acompanhado não se deseja mudar de companhia”.

Costa quis aliviar o clima de tensão e defendeu que o acordo à esquerda deve ser renovado. “Queremos continuar este caminho com a companhia que temos porque nos sentimos bem acompanhados”, disse.

O líder socialista pediu “estabilidade” e alertou que a proximidade das eleições legislativas não deve afetar as negociações do Orçamento. “Não será por ser ano de eleições que vamos pôr em causa tudo aquilo que conseguimos”.

Costa referiu, porém, que o PS é “essencial” para que a geringonça exista e “funcione”.

Acordo entre Merkel e Seehofer adia crise política na Alemanha

Andreia Martins - RTP03 Jul, 2018, 11:51 / atualizado em 03 Jul, 2018, 12:16 | Mundo

Acordo entre Merkel e Seehofer adia crise política na Alemanha

O acordo entre a CDU e a CSU prevê a rejeição de requerentes de asilo que estejam registados noutro país da União Europeia. | Hannibal Hanschke - Reuters

A chanceler alemã e o líder bávaro alcançaram um entendimento sobre as políticas migratórias que prevê a criação de “centros de trânsito” para conter a migração secundária. O documento tenta salvar a coligação de Governo e impede para já a demissão do ministro alemão do Interior, mas a sua aprovação depende agora da palavra final do SPD e de um novo acordo com os vizinhos austríacos.

É uma aparante cedência por parte da chanceler alemã que evita um cenário imediato de crise política no executivo alemão. Depois de várias semanas de confronto, Angela Merkel, da CDU (União Democrática Cristã), e Horst Seehofer, líder da CSU (União Social Cristã), chegaram a um entendimento sobre a questão migratória.

Os detalhes ainda não são totalmente conhecidos, mas sabe-se que este inclui a criação de “centros de trânsito”, à imagem de zonas de segurança em aeroportos internacionais onde se faz o controlo alfandegário e de passaportes. Na prática, estes centros não serão considerados território alemão, o que fará com que seja mais fácil deportar migrantes, refere a agência Reuters.

O acordo prevê também recusar a entrada de requerentes de asilo junto à fronteira com a Áustria caso estes estejam registados noutro país da União Europeia. 

As medidas pretendem, desta forma, conter as “migrações secundárias”, ou seja, o movimento de migrantes dentro do Espaço Schengen, uma vez que muitos chegam a outros países europeus acabam por escolher a Alemanha como destino. 

O entendimento chegou cinco horas depois de uma reunião realizada esta segunda-feira, em que Angela Merkel, no poder há mais de 12 anos, tentou evitar a demissão iminente do seu ministro do Interior. Horst Seehofer chegou mesmo a ameaçar bater com a porta no último domingo, dando três dias à chanceler para propor novas medidas satisfatórias. Ao fim de 24 horas, havia um acordo selado entre os dois líderes. 

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“O espírito de parceria na União Europeia é preservado e, ao mesmo tempo, estamos a dar um passo importante para impor ordem e controlar a migração secundária. Encontrámos um bom compromisso após duras negociações e dias difíceis”, disse a chanceler aos jornalistas.

Por sua vez, o ministro do Interior, que ocupa igualmente a liderança da CSU – partido bávaro aliado da CDU há quase 70 anos – assumiu estar satisfeito com um “acordo claro” que visa “conter a imigração ilegal na fronteira entre a Alemanha e a Áustria”.

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A questão migratória foi um ponto de enorme tensão nas últimas semanas entre as duas forças políticas irmãs que não concorrem uma contra a outra em eleições desde 1949 e chegou a colocar em risco a estabilidade do Governo de Angela Merkel.

Vários responsáveis da CSU arrastaram o tema da migração para o topo da agenda mediática, assumindo perante o seu eleitorado uma posição bastante mais rígida sobre os migrantes, quando faltam menos de quatro meses para as eleições na Baviera, onde a AfD (Alternativa para a Alemanha, partido de extrema-direita) tem registado um crescimento significativo em sondagens recentes que ameaça a maioria absoluta dos conservadores aliados de Merkel. 

Enquanto o ministro do Interior defende, desde o início do mandato, em março deste ano, a rejeição de migrantes registados noutros países europeus junto das fronteiras alemãs, a chanceler tem optado por dar prioridade a uma solução ao nível europeu no âmbito das questões migratórias, como a que foi alcançada na última sexta-feira, durante a recente cimeira europeia.

O que diz o SPD?

Com este novo acordo, Angela Merkel cede à agenda do ministro para garantir a sobrevivência do Governo. Mas há outro parceiro nesta equação que poderá não facilitar a nova posição conjunta da CDU e CSU. Os social-democratas do SPD, que também fazem parte da “grande coligação” que governa a Alemanha, querem ver esclarecidos vários pontos deste acordo.

“Ainda há muitas questões que precisam de ser clarificadas. Vamos demorar o tempo que precisarmos para tomar uma decisão”, disse esta terça-feira a presidente do partido, Andrea Nahles, citada pela imprensa alemã.

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Até que seja dado o aval pelo SPD, o Governo de Merkel continua em risco de colapso, uma vez que os social-democratas assumem uma posição bastante mais flexível na temática das migrações. 

No domingo, o partido tinha delineado um plano em cinco pontos para fazer face à questão migratória, onde se opõe a qualquer “ação unilateral para recusar pessoas em fronteiras nacionais, dentro da União Europeia”. 

Independentemente da direção escolhida pelo SPD, a revista Der Spiegelconsidera, em editorial, que o que se passou na noite de domingo, com a ameaça de demissão de Hosrt Seehofer, deixou marcas irreparáveis na política alemã. Para a publicação germânica, a chanceler conseguiu o que era exigido pela CSU na cimeira europeia, e a insistência na questão migratória por parte do ministro do Interior pode ter consequências para o país em termos políticos. 

Na decisão do SPD, a ser conhecida nas próximas horas após reunião com os restantes parceiros de coligação, poderá pesar o comportamento do partido nas mais recentes sondagens, uma vez que a recusa do acordo entre CDU e CSU poderá precipitar a queda do Governo. 

Os dados mais recentes não são animadores perante um cenário eventual de eleições federais antecipadas, até porque as sondagens continuam a colocar os social-democratas abaixo dos 20 por cento, muito próximo da AfD, que ultrapassa nesta altura os 16 por cento.

E a Europa?

Pelo que já se sabe do acordo celebrado na segunda-feira entre Merkel e Seehofer, a abertura de “centros de trânsito” nas fronteiras alemãs poderá ter repercussões imediatas para outros países circundantes.  

Ao final da manhã, o presidente da Comissão Europeia afirmava que o acordo vai ser analisado por peritos europeus, mas que "à primeira vista" parecia estar em linha com as leis europeias.

"Ainda não estudei po acordo em detalhe. (...) Pedi aos serviços jurídicos que o analisem, mas parece-me estar alinhado com a lei", disse Jean-Claude Juncker numa declaração aos jornalistas em Estrasburgo.

Quem também já está a escrutinar este entendimento é a Áustria. O país vizinho, que faz fronteira com a região sul da Alemanha, disse esta manhã que está “pronto” a proteger as suas próprias fronteiras, caso o acordo firmado entre a CDU e a CSU seja implementado. 

“Se este acordo se tornar na posição oficial do Governo alemão, vamos tomar medidas para prevenir as consequências negativas para a Áustria e para a sua população”, frisou o chanceler austríaco, Sebastian Kurz, numa declaração conhecida esta manhã. 

Viena pede ao Governo de Merkel que “esclareça a sua posição”, mas garante que “o Governo está pronto para tomar as medidas necessárias para proteger as nossas fronteiras”, refere o comunicado conjunto do executivo austríaco citado pelas agências internacionais.

O acordo firmado entre CDU e CSU prevê que o Governo alemão procure um entendimento bilateral com a Áustria sobre o que fazer no caso de outros países da União Europeia se recusarem a aceitar de volta os requerentes de asilo registados nos seus países.

Verbas para a NATO. Portugal entre países criticados por Trump

Cristina Sambado - RTP03 Jul, 2018, 08:51 / atualizado em 03 Jul, 2018, 11:28 | Mundo

Verbas para a NATO. Portugal entre países criticados por Trump

Donald Trump recebeu Marcelo Rebelo de Sousa na Casa Branca a 27 de junho | Jonathan Ernst - Reuters

O Presidente dos Estados Unidos escreveu cartas a líderes de países-membros da NATO, incluindo Portugal, a queixar-se, uma vez mais, de contribuições insuficientes para a Aliança Atlântica. Donald Trump avisa ainda que Washington está a perder a paciência com o que considera ser o fracasso em cumprir obrigações partilhadas de segurança.

Segundo o jornal The New York Times, os destinatários da missiva foram, entre outros, o Governo português, a chanceler alemã, Angela Merkel, o primeiro-ministro do Canadá, Justin Trudeau, e o novo chefe do Executivo espanhol, Pedro Sánchez.
Nas missivas, enviadas em junho, Donald Trump questiona repetidamente a contribuição dos países da Aliança Atlântica e afirma que os restantes membro da NATO se estão a aproveitar financeiramente dos Estados Unidos.
O Presidente norte-americano refere ainda que em 2017 expressou queixas em privado e em público para pressionar os países da NATO a contribuírem com dois por cento do Produto Interno Bruto (PIB) para a defesa comum. As cartas foram conhecidas uma semana antes da cimeira da NATO, que vai decorrer entre os dias 11 e 12 de julho, em Bruxelas.
Há muito que os presidentes norte-americanos se queixam da falta de partilha dos encargos por parte dos países-membros da NATO. No entanto, Trump leva as críticas mais longe e alega que alguns dos aliados são essencialmente “mortos” que não conseguem pagar as dívidas à Aliança Atlântica.
Segundo o New York Times,Trump frisa também que os pagamentos não foram “suficientes”, acrescentando que, na sequência deste quadro, os Estados Unidos podem vir a reconsiderar a “presença militar” a nível mundial.
“Como discutimos durante a sua visita em abril, verifica-se uma frustração que é crescente nos Estados Unidos em relação a alguns aliados que não deram o passo seguinte, tal como o prometido”, afirma o Presidente norte-americano na carta enviada à chanceler alemã, Angela Merkel, citada pelo mesmo jornal.
“Os Estados Unidos continuam a contribuir com mais recursos para a defesa da Europa numa altura em que a economia europeia se encontra bem. Isto não é sustentável para nós”, sublinha Trump.
“A crescente frustração não se limita ao nosso Governo. O Congresso dos Estados Unidos também está preocupado”, acrescenta.
Após a cimeira da NATO, Trump vai encontrar-se com o homólogo russo, Vladimir Putin, em Helsínquia, na Finlândia.
Além dos governos de Portugal, Espanha, Alemanha e Canadá, a carta foi também enviada aos executivos da Noruega, Bélgica, Itália, Holanda, Itália e Luxemburgo.
A Administração Trump já tinha analisado a retirada, em larga escala, das forças norte-americanas da Alemanha, depois de o Presidente norte-americano ter expressado surpresa pelo facto de 35 mil soldados norte-americanos reclamarem que os países da NATO não estavam a contribuir com o suficiente.
Na missiva enviada a Merkel, o Presidente norte-americano afirma que “a continuação das despesas alemãs com a defesa mina a segurança da Aliança Atlântica e fornece, aos outros aliados, a possibilidade de também não cumprirem os seus compromissos de despesas militares, porque veem a Alemanha como um modelo”.
“No entanto, será cada vez mais difícil justificar perante os cidadãos norte-americanos o motivo pelo qual alguns países não partilham a obrigação de segurança coletiva da NATO, enquanto os soldados norte-americanos continuam a sacrificar as suas vidas ou voltam gravemente feridos”, acrescenta Trump na carta enviada a Merkel. Desde que foi eleito, o sucessor de Barack Obama tem-se queixado de que Washington gasta demasiados recursos com a NATO e tem reportado esta situação, de forma reiterada, aos aliados.
Durante a campanha eleitoral, Trump chegou mesmo a considerar a NATO como uma “organização obsoleta”.
Durante uma recente visita de Angela Merkel a Washington, o Presidente afirmou que “a NATO é maravilhosa, mas ajuda mais a Europa que os Estados Unidos”.
“Por que motivo somos nós a pagar a maior parte dos custos?”, questionou.
O New York Times, recorda que Trump reclama há muito tempo que os Estados Unidos são tratados com desleixo por organizações multilaterais das quais são membros, como por exemplo a Organização Mundial do Comércio.
Na Europa, as cartas de Donald Trump foram recebidas com um certo grau de preocupação devido à possibilidade do Presidente norte-americano estar preparado para impor consequências aos aliados - como fez com a imposição de tarifas alfandegárias - no caso de não preencherem o pedido.
Não se sabe ao certo quantas cartas foram enviadas por Trump, mas fonte diplomática revelou ao New York Times que terá sido pelo menos uma dúzia.
A Casa Branca não quis comentar a correspondência presidencial, mas um funcionário que falou sob condição de anonimato afirmou que Trump está comprometido com a NATO e agora espera que os aliados “assumam a sua parte nas obrigações comuns com a defesa”.

Ladrões de Bicicletas


Não há alternativa

Posted: 03 Jul 2018 02:57 AM PDT

O The Guardian apoda o vencedor das eleições presidenciais mexicanas, André Manuel López Obrador, de “nacionalista de esquerda”. O que é crítica para uns, é elogio para outros: lá como cá, as questões nacional e social não podem nunca deixar de ser concretamente articuladas; cá como lá, é preciso reconquistar margem de manobra para políticas nacionais de desenvolvimento, o que passa no mínimo por renegociar os acordos de comércio dito livre. A esquerda que pode ganhar é a que quer aprender a falar a língua nacional-popular.
Apesar de todos os obstáculos colocados numa sociedade brutalmente desigual e violenta, demasiado próxima dos EUA, com um Estado fragilizado pela corrupção ou pelos efeitos da NAFTA, e de alguns compromissos duvidosos com forças sociais e políticas duvidosas, a sua eleição à terceira tentativa é uma excelente notícia para as classes subalternas mexicanas, surgindo ainda para mais num contexto geral, latino-americano, de recuo das forças da esquerda nacional-popular. Esta esquerda pode também recuar, mas é a única que pode avançar de novo.
Num artigo informativo no Le Monde diplomatique do mês passado, René Lambert resumia o dificílimo estado mexicano de coisas, usando uma fórmula de aplicação mais geral perante o poder por conquistar: “a tentação da esperança”. Não há alternativa a essa tentação.

Carrocel infernal

Posted: 02 Jul 2018 03:11 AM PDT

Imagens do filme Starwars - The Phantom Menace (1999)

Na semana passada, fui buscar o carro ao mecânico.
Eu já estava pronto para pagar, mas o mecânico adiava o momento. Conversava sobre tudo e não se resolvia a transacção. Pressenti que alguma coisa se passava e deixei a conversa fluir. Tudo se transformou num longo desabafo de uma hora.
O que segue é o relato resumido, mas que dá, um pouco, a ideia do impasse económico em que nos encontramos, com um semi-regime de austeridade, sem que se encare os problemas de frente.
Dizia o mecânico:
- Desde que me conheço que trabalho. Tenho 67 anos e mais de 50 anos de oficina. Trabalhei muitas horas, fiz muitas directas. Era preciso. Ainda tenho força, mas a cabeça... Já me esqueço de muitas coisas. Eu até ficava mais anos, mas estou aqui, estou a fechar isto.
- Mas o que se passa?

- Estou farto. É tudo muito complicado. As pessoas vêm aqui e todas pedem descontos. E a gente faz o que pode porque sabe que não têm dinheiro. Pedem pagamentos a prestações e aceitamo-los. Eu já disse ao meu filho... Ele andou na faculdade de Educação Fisica, fez mestrado, ainda foi professor secundário, mas eram uns horários aqui, outros ali. Pagava mais de gasóleo do que ganhava como professor. Veio para aqui. Mas já lhe disse: "Arranja alguma coisa que só dependa de ti. Já viste como foi a minha vida, o apoio que te dei e como estamos. Não dá". Dizem que isto está melhor, mas não está.
- Porquê?
- Porque é tudo a jogar contra. É como as grandes superfícies que dão cabo dos lugares e mercearias. As companhias de seguro têm as suas oficinas e oferecem logo ao cliente um carro de substituição. Depois, o cliente acaba por perceber a porcaria de trabalho que lhe fizeram, mas já é tarde. Os carros são cada vez mais complexos e têm de ser tratados pelas marcas. Há oficinas a fechar. E quando vierem os carros eléctricos vai ser geral. E depois não encontro mão-de-obra. Não querem. Vêm para aqui e nem querem aprender. Tive aqui uns estagiários daquelas acções de formação do IEFP. Não deu: não sabem nada e nem querem saber. Disseram-me logo que vinham só por uma semana porque tinham o subsídio de desemprego suspenso e não lhes convinha. Não arranjo mão-de-obra. Antes cada oficina tinha aprendizes que começavam e iam crescendo aqui. Chegávamos a ter uns tantos. Mas agora não dá. Eles não querem. E veja lá: Portugal esteve como esteve, depois o Passos Coelho - nem sei como - lá foi endireitando as coisas, mas agora estão todos a pedir cada vez mais coisas e sabe-se lá o que vai acontecer.
Nem discuti esse suposto papel positivo da política de austeridade, que em parte explica os problemas do mecânico. Pensei como a comunicação social acaba por marcar o que as pessoas pensam e como ainda transmitem essa medo de que tudo vai rebentar de novo. Como se nada tivesse sido aprendido: 1) esqueceu-se já a enorme depressão causada pela austeridade e que acabou interrompida pela própria troica; 2) esqueceu-se o aumento substancial da divida pública após a intervenção da troica e que tornou o país ainda mais fragilizado face aos ditos mercados financeiros, porque a dívida é simplesmente impagável... 3) E pior: esqueceu-se que essa fragilidade não vai lá com pouparmos mais do pouco que se tem, porque nunca será suficiente. Se as taxas de juro subirem vários pontos percentuais, nada será sustentável! 
Devo ter feito, pois, algum esgar porque ele reagiu de imediato.
- Eu não sei qual é a sua política. A minha é o trabalho.
- Mas - disse eu - se as coisas estivessem melhor, se pudesse cobrar mais aos clientes, já poderia pagar salários maiores e assim talvez os aprendizes quisessem ficar para trabalhar...
- Ah sim! Isso sim, talvez. Mas não é possível. Ninguém pode pagar mais e percebe-se que não têm dinheiro. E depois é só cairem em cima de nós. Olhe, há umas semanas tive aí uma inspecção. Vieram todos: era a Autoridade Tributária, a ASAE e mais não sei quem. Entraram por aí, sentaram-se nos computadores. Eu pensava que mandava nisto e que isto era meu! Mas afinal não era. E é só exigir coisas. Complicam. É só complicações. É para isto, é para aquilo. Tive de pagar 2 mil euros por causa de um filtro por causa das emissões das pinturas. Ná. Eu fecho portas. Mando tudo à fava. Vou para uma terra que tenho, oito mil metros quadrados ali para Palmela.
- Vai fazer o quê?
- Não vou fazer nada. Planto umas coisas e deixo-me ficar. Já estou cansado. Foram muitos anos. Mas se eu visse que valia a pena ia ficando, mas assim, não! Prefiro ir-me embora.
Um miúdo equipado com uma camisola de jogador dava pontapés numa bola contra a parede da oficina. O mecânico enxutou-o, para que fosse jogar para outro lado. O miúdo tinha o cabelo muito curto e sorria. Ficámos os dois em silêncio.
- Desculpe o desabafo, mas às vezes também precisamos. Se calhar, isto é pensar o pior e depois as coisas não são assim tão más. Mas já não vou saber.
Paguei, despedimo-nos. Um aperto forte, de uma mão forte.
Quando se olha para esta descrição parece que vivemos num carrocel que roda, infindável e sem apelo, para o precipício. A austeridade mantém-se e vai encarquilhando o tecido económico que vai desistindo e que, por isso, acentua o seus efeitos. O Estado parece trabalhar para a construção de um biombo decorativo em que faz de conta que se aplicam as melhores e mais modernas regras - muitas delas positivas, vindas da Europa - sem que a outra parte do Estado, a do Estado visionário, precaveja os seus efeitos perversos ou sem que haja uma política pública de relançamento económico.
Parece que o país está preso à Europa, ela também desequilibrada, desigual e que acentua as dificuldades entre países, mesmo através dos seus sumarentos fundos estruturais cuja distribuição social está para ser estudada. E estes efeitos todos jogam na diminuição dos agentes económicos que, por acaso, jogam a favor de unidades de maior envergadura que passam a ter condições para fixar os preços de mercado, os preços de mão-de-obra e o volume dos lucros, que se transferem para os accionistas ou para fundações de fins louváveis, mas cuja finalidade é – como todos sabemos – outra. E que, sobre as quais, o Estado não tem qualquer coragem de mexer...
“Eles dizem que está tudo bem, mas não está”.