Translate

Mostrar mensagens com a etiqueta Ética. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta Ética. Mostrar todas as mensagens

terça-feira, 11 de julho de 2017

Galpgate: ou há moral ou comem todos



por estatuadesal
(Daniel Oliveira, in Expresso Diário, 11/07/2017)
Autor
                       Daniel Oliveira
(Daniel Oliveira partilha e amplifica a indignação que já aqui tínhamos manifestado num texto que publicámos - e para o qual ele remete -, quanto à dupla bitola que o Ministério Público usa quando acusa agora os políticos, tendo os senhores procuradores em tempos beneficiado do patrocínios de empresas privadas para realizarem os seus congressos.
Estátua de Sal, 11/07/2017)

Já aqui escrevi que há um lado positivo no chamado, talvez com algum exagero, Galpgate: os decisores perceberem que as regras, no que toca à relação com empresas sobre as quais tomam decisões, são estritas. Porque o secretário de Estado aceitar uma viagem e um bilhete para a bola não afeta nada as decisões que tem de tomar, mas revela uma intimidade que tem de ser inibidora. Por isso não, não concordo com a posição de muitos quando tratam este caso como absurdo. O nacional-porreirismo não é uma forma de corrupção mas é sinal de relaxamento ético que facilmente torna as relações institucionais excessivamente informais.
Escrever isto não é defender que os três secretários de Estado cometeram um crime, como parece acreditar o Ministério Público. Tenho mesmo dificuldade em imaginar onde vão desencantar o dito crime. Espero que estejam seguros do caminho que estão a trilhar ou será inevitável que cresça a ideia de que há, em alguns sectores da justiça, uma má vontade com uma parte dos políticos. Porque era evidente que a partir do momento em que Jorge Costa Oliveira, João Vasconcelos e Rocha Andrade fossem constituídos arguidos não poderiam ficar no governo. A antecipação é, aliás, das poucas coisas inteligentes que o governo fez este mês.
Apesar de ter muitas dúvidas sobre a criminalização do comportamento eticamente condenável dos secretários de Estado mas de achar que a moralização da vida política passa por reforçar o cordão que separa o poder político e poder económico, é fundamental perceber se há uma perseguição judicial e ética seletiva. Porque se há, o assunto passa a ser esse.
Quanto à questão judicial, quero perceber se o atual e o próximo líderes parlamentares do PSD também vão ser constituídos arguidos ou continuar a ser investigados. Os que apareceram na bancada VIP, que as empresas costumam reservar, não tendo por isso seguramente comprado aquele bilhete. Que viajaram pela agência de Joaquim Oliveira, que trabalha para a Federação Portuguesa de Futebol, mas juram ter sido eles a comprar o bilhete. Não me levem a mal, mas quando uma coisa parece ser exatamente igual a outra e dá sinais de ter sido corrigida depois de rebentar a bronca não me chegam formalismos, quero investigações sérias. Enquanto isto era apenas um escândalo mediático aceitavam-se justificações pouco credíveis. Se é para ser crime, exijo, como cidadão, que todos sejam investigados.
Quanto à perseguição ética, nem saberia por onde começar. A razão pela qual a comunicação social, em contraste com o que tem sido habitual, está relativamente sóbria em relação a este tema é simples: a generalidade dos órgãos de comunicação social aceitam viagens e outro tipo de ofertas de empresas sobre as quais escrevem. Os mais sérios declaram-no no fim dos artigos, quando essas viagens ou ofertas servem para fazer trabalhos, os outros não. Vão os jornais que noticiaram esta viagem fazer um levantamento sobre o que é e não é aceitável fazer na sua própria casa? Interditar a aceitação de qualquer viagem se não tiver como fim um trabalho específico? Debater se mesmo para fazer reportagens devem aceitar viagens pagas por instituições privadas? E públicas? A minha ida às convenções Democrata e Republicana, para escrever vários trabalhos para o Expresso, foi financiada pela FLAD (uma instituição pública que tem essa função nos seus objetivos) e isso estava declarado nos trabalhos publicados. Não sei se aceitaria fazê-lo se o financiamento fosse privado e sei que nunca aceitei qualquer tipo de oferta ou viagem que não fosse institucional (para o órgão de comunicação em que trabalhasse) e exclusivamente para fins de trabalho. Mas gostava que houvesse um debate entre os jornalistas para serem claras as fronteiras e cada um não agir segundo os seus próprios limites éticos. Querem os jornalistas, enquanto classe, definir regras e dá-las a conhecer? Ou a clareza das regras é só para os políticos?
Se o problema é, como parece ser, um conflito de interesses, apesar de não levantar questões legais, tenho de perguntar se o conflito de interesses e falha ética não se aplicam ao patrocínio de atividades dos próprios magistrados do Ministério Público por empresas que podem ter – e muitas delas têm – importantes processos a correr na justiça. É que, tal como nos recorda o blogue Estátua de Sal (https://estatuadesal.com/2017/07/10/e-nao-houve-recebimento-indevido-de-vantagens/), o Sindicato dos Magistrados do Ministério Público viu o seu IX Congresso, em 2012, patrocinado pelo Banco Espírito Santo, Montepio Geral, BPI e CGD, só para me ficar pela banca. Isso afeta a independência dos magistrados associados ou dirigentes do sindicato? Tanto como a ida de Rocha Andrade a França.
Mas se é para sermos puristas comem todos: os líderes parlamentares (atual e próximo) do PSD que aceitaram bilhetes e foram a correr pagar quando a coisa se soube, os órgãos de comunicação social que têm como hábito aceitar viagens pagas e os magistrados Ministério Público que aceita patrocínios de empresas para os congressos do seu sindicato quando os seus associados estão envolvidos em processos contra essas empresas. Estão todos dispostos a seguir este novo caminho de moralização ou a ética é só para os “malandros dos políticos socialistas”?

quinta-feira, 1 de junho de 2017

“Delacção premiada” – Vergonha do Mundo desenvolvido


por estatuadesal

(Nuno Godinho de Matos, in Facebook, 31/05/2017)
godinho_de_matos

De repente surgiu uma maré de defesa da “delacção premiada”. Porquê? O que virá a caminho, que só será conhecimento dos legisladores e dos diferentes grupos de pressão interessados na solução? Ou seja, o Ministério Público e as polícias?
Então a investigação criminal já conta com: escutas das comunicações; acesso aos dados das empresas de telecomunicações; imagens das gravações de vídeo espalhadas por toda a parte; Polícia Judiciária, com todos os seus meios – que não são poucos - cooperação com polícias congéneres; seguir os nossos movimentos, 24 horas por dia; filmar as nossas acções com câmaras de longo alcance; toda a panóplia de possibilidades do laboratório de polícia cientifica; mas, apesar de todo este poder organizado e pago por todos os contribuintes, não chega.
Querem poder pagar aos possíveis criminosos prontos a traírem os seus iguais, para confirmarem as interpretações sobre os factos que, eventualmente, tenham detectado.
A “delacção premiada” é, no dealbar deste século, o que existe de mais torpe, insidioso, pulha e desqualificado que uma inteligência humana pode conceber, para montar uma instrução penal.
Desde uma data anterior à história, os seres humanos tem praticado a tortura, como método de alcançar a “verdade”, no que, então, surgia como meio investigatório de condutas recriminadas pela maioria.
Durante a inquisição, a tortura era pública, para gaudio dos que gostavam de assistir ao quebrar dos ossos dos seus semelhantes, por, alegadamente, serem hereges.
A prática do “garrote”, provocava a alegria das multidões, quando os olhos do seviciado saltavam das cavidades oculares.
A barbaridade era total. Contudo, tinha uma imensa qualidade: era bruta, tosca, infame, nauseante, impossível de ser vista por um ser minimamente educado e sensível.
Mas era a época! Nesse tempo, aquele comportamento, era possível e provocava a satisfação das massas.
Hoje, a tortura é postergada por tudo quanto é texto referente aos direitos do ser humano e, ainda bem que assim é. Contudo, a tortura, se comparada com a “delacção premiada”, não passa de uma brincadeira de bébés, legitima, nobre e aceitável.
Na “delacção premiada” o Estado paga com um tratamento de favor, o criminoso que, por seu interesse pessoal, decide trair os seus iguais. Por exemplo, levantando os mandatos de captura internacionais, contra um arguido que acusa e incrimina os seus coarguidos, permitindo-lhe, assim, voltar a viajar em primeira classe, nas carreiras dos voos internacionais, para continuar a fazer os seus negócios, à volta do Mundo.
Durante mais de 18 séculos convivemos com a tortura. Agora, vamos passar a conviver com a compra da traição, por parte de um criminoso, que quer comprar um estatuto de preferência.
Na opinião que sou capaz de expressar, o Estado que assim agir, não é um Estado, nem uma República, nem mesmo um bando de criminosos. É, isso sim, uma choldra, uma indignidade, uma realidade odienta e uma prática que torna os investigadores tão criminosos como os investigados.
Porém, dado que estarmos no século XXI, aceita-se tal prática, tal como já se aplaudiu a tortura! De facto, o melhor é morrer.
Nuno.

domingo, 5 de março de 2017

Ética e combate à evasão fiscal - estatuadesal

 

(In Blog O Jumento, 04/03/2017)
evasao

Uma das reacções dos partidos da direita ao escândalo das transferências para as offshores foi a tentativa de promover Paulo Núncio como um herói nacional pelo combate à evasão fiscal. O próprio director-geral da DGCI e depois da AT, que exerceu funções durante a maior parte do mandato fez o elogio dos resultados quando foi ouvido no parlamento, chegou mesmo a exibir um PC com um gráfico invisível, onde se demonstrava que os resultados nos impostos eram superiores aos da evolução da economia.
É verdade que os resultados das receitas fiscais ficaram acima da evolução da economia, a questão agora é saber se este “milagre” terá resultado das decisões de gestão do DG, dos dotes político-partidários de Paulo Núncio ou de outros factores. É um facto que uma boa parte desses resultados resultam do e-Fatura, projecto que não foi invenção nem do DG, nem do governante. Curiosamente o e-Fatura poderia ter ido mais longe na promoção do combate à evasão fiscal, mas talvez tenha faltado a coragem.
Mas a grande verdade é que o aumento da receita fiscal, indicador de sucesso para dirigentes e governantes em tempos de crise, esconde outra realidade,  combate à evasão fiscal, que devia promover a justiça e a equidade fiscal podem esconder uma realidade perversa, ao aumento das receitas fiscais em resultado do combate à evasão fiscal não corresponde necessariamente mais equidade e justiça fiscal.
O aumento das receitas fiscais ocorre nos dois impostos onde mais subiram as taxas, IRC e IVA, o sucesso nas receitas não resulta apenas dos dotes do DG e da visão do governante. O governo aumentou os impostos mais suportados pelos menos ricos e mais fáceis de cobrar. Não é preciso o e-Fatura para cobrar o IVA sobre a electricidade, e muito menos para ajudar a cobrar imposto automóvel ou ISP.
Não há registo de um grande sucesso na cobrança do IRC, imposto que devia baixar, como meio de promover a desvalorização fiscal. Também não há notícia de grandes sucessos na detecção de fraudes fiscais. Compreende-se, é mais fácil cobrar impostos a pobres do que a ricos, os pobres não tugem nem mugem, não recorrem aos tribunais e são fáceis de assustar por uma estratégia de terror fiscal.
Uma das medidas mais significativas deste período foi o aumento para 5.000€ do patamar a partir do qual se pode recorre das decisões do fisco para os tribunais. Isto significa que se  um pobre se sentisse lesado e na possibilidade remota de recorrer dessa decisão o seu juiz seria o director-geral,  ou seja, o chefe máximo de quem cometeu o erro. Isto significa que durante o mandato de Paulo Núncio, para além de pouco se fazer para cobrar impostos aos ricos, chegou-se ao cúmulo de reservar os juízes independentes da máquina fiscal aos ricos, enriquecendo escritórios de advogados e empaturrando os tribunais com receitas por cobrar, que foram compensadas com uma maior perseguição fiscal aos menos ricos, influentes e poderosos.
A máquina fiscal impôs-se pela modernização resultante de grandes investimentos feitos antes desta geração de políticos e dirigentes, beneficiou da modernização da economia, mas também tirou proveito do medo dos contribuintes. Há dois tipos de contribuintes, os ricos que não receiam a máquina fiscal e que podem recorrer aos juízes, e os pobres que estão nas mãos das decisões dos chefes dos serviços de finanças e que foram perseguidos de todas as formas possíveis.
Numa democracia ao aumento da eficácia do fisco deveria ser acompanhada pelo aplauso de quem cumpre com os seus deveres de cidadania e vê um Estado a actuar com equidade e justiça. Não foi isso que Paulo Núncio implantou ou mandou implantar, foi criada uma máquina que se impões aos pobres pelo medo, que fez vista grossa aos ricos e que ao mesmo tempo que ganhou credibilidade técnica, perdeu a consideração dos cidadãos. É o preço de se ignorar valores como a ética a justiça e a equidade, na gestão do Estado.
 
Ovar, 5 de Março de 2017
Álvaro Teixeira