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sábado, 11 de março de 2017

Quando os denunciantes dizem a verdade são traidores. Quando o governo mente é política (estatuadesal)

 

(Carey Wedler, in Theantimedia.org, 08/03,2017, Tradução de Estátua de Sal)
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Imediatamente após o Wikileaks ter libertado milhares de documentos revelando a extensão da vigilância da CIA e das práticas de hackers, o governo pediu uma investigação - não sobre a razão porque a CIA acumulou tanto poder, mas sim sobre quem expôs as suas políticas de intrusão.
"Uma investigação criminal federal está sendo aberta sobre a publicação pelo WikiLeaks de documentos que detalham supostas operações de hacking da CIA, segundo vários funcionários dos EUA", informou a CNN.
De acordo com o Usa Today:
"O inquérito, de acordo com fonte governamental, procurará determinar se a divulgação representou uma violação do exterior ou um vazamento do interior da organização. Uma revisão separada tentará avaliar os danos causados por tal divulgação, disse o oficial. "
Mesmo o representante democrata, Ted Lieu, que tem exortado a que denunciantes surjam para denunciar irregularidades do governo Trump, afastou o foco daquilo que os documentos expuseram e deu toda a importância a questionar como tal poderia ter acontecido.
"Estou profundamente perturbado com a alegação de que a CIA perdeu o seu arsenal de ferramentas de hacking", disse ele ao pedir uma investigação. "As consequências podem ser devastadoras. Peço uma investigação imediata no Congresso. Precisamos saber se a CIA perdeu o controle das suas ferramentas de hacking, quem pode ter essas ferramentas e como podemos agora proteger a privacidade dos americanos ".
De acordo com as declarações de Lieu, o problema não é necessariamente que a CIA esteja a espiar os americanos e  a invadir através da tecnologia a vida de pessoas inocentes sem o seu consentimento. É que a CIA tem utilizado mal as suas ferramentas de espionagem e, ao fazê-lo, colocou em risco a privacidade dos americanos colocando as ferramentas supostamente ao alcance  de "atores maus". O problema então não é a agência ter sido corrupta ao violar os direitos básicos de privacidade dos cidadãos, mas não ter sido suficientemente competente para manter a sua corrupção em segredo.
É neste estado que se encontra a narrativa acerca dos denunciantes nos Estados Unidos. Os denunciantes dão um passo em frente para denunciar atos ilegais por parte do governo - algo que o governo alega apoiar - e, imediatamente, as instituições e os meios de comunicação afastam o debate sobre o delito denunciado, e concentram a sua atenção na libertação ilícita de segredos.
Pondo de lado o fato que, de acordo com a popular mitologia americana, violar a lei é um dever patriótico, as reações do governo e dos políticos são hipócritas como é habitual.
Quando Chelsea Manning revelou a evidência dos condenáveis crimes dos EUA na guerra do Iraque,  que levaram soldados a atacar diretamente a equipa de jornalistas da Reuters, a resposta não foi investigar quem permitiu esses crimes (de fato, um manual do Pentágono posterior descrevia casos em que seria permissível matar jornalistas; esta versão do manual só foi retirada depois de protestos de repórteres). Em vez disso, Manning foi submetido a um tribunal militar que emitiu várias sentenças de prisão perpétua, uma punição cruel e inusitada revertida somente nos últimos dias de governo do presidente Obama, no meio das suas tentativas de salvar a sua pecaminosa governação do seu record de ataque aos direitos humanos, à transparência e ao registo de denunciantes.
Quando Edward Snowden revelou a extensão da vigilância em massa, sem mandato, da NSA a cidadãos americanos e milhões de outros em todo o mundo, a resposta do governo não foi investigar em primeiro lugar a razão desses programas existirem. Em vez disso, os EUA fizeram uma perseguição mundial ao denunciante, e ordenaram que o avião do presidente boliviano, Evo Morales, fosse forçado a aterrar, na esperança de apanhar o denunciante. E o Congresso aprovou de seguida a decepcionante lei "EUA Freedom Act", que legalizou a vigilância contínua.
Edward Snowden permanece no exílio, e os políticos do establishment apelidam-no repetidamente de traidor por ter exposto os crimes do seu governo. Alguns, incluindo o diretor da CIA de Trump, Mike Pompeo, pediram sua execução. A vigilância em massa continua, e o próprio presidente Trump está a tentar conter esses poderes, ao mesmo tempo que acusa o ex-presidente Obama por supostamente o ter espiado.
E assim por diante. O mesmo aconteceu com John Kiriakou, Thomas Drake, William Binney e Jeffrey Sterling. O governo é denunciado por transgressões  e abusos e os governantes, ao invés de tentarem provar serem representantes do povo e remediarem essas transgressões, apontam o dedo às denúncias e desviam-se do essencial, ao mesmo tempo em que se recusam a pôr em causa ao poder injusto que é revelado as agência de informações possuírem.
Muitas pessoas já estão conscientes de que o governo faz pouco por elas, e de facto não trabalha para as servir, (a confiança dos americanos nos líderes políticos  e no governo, em geral, é assustadoramente baixa). Em vez disso, agentes e agências governamentais operam para aumentar e concentrar os seus próprios interesses e poder. É por isso que as penas previstas na lei contra a morte de funcionários do governo são mais rigorosas do que contra a morte de civis. É por isso que roubar o governo é considerado mais escandaloso para o Estado do que roubar um civil. O governo considera os "crimes" cometidos contra si próprio merecedores da maior sanção, mas muitas vezes não consegue levar a justiça aos assuntos da sociedade civil, satisfazendo as pretensões das pessoas que materializam o seu suporte financeiro através dos impostos que pagam.
Desse modo, o Estado nem sequer tenta mostrar arrependimento pelas suas políticas violadoras, mesmo quando elas são expostas e espalhadas pelos meios de comunicação social para que o mundo veja. Em vez disso, com a ajuda da corporação dos media, o debate é deslocado para saber se a WikiLeaks é uma organização criminosa, ou se Edward Snowden é ou não um traidor.
Como disse o secretário de imprensa da Casa Branca, Sean Spicer, sobre os vazamentos:
"Esse é o tipo de divulgação que mina nosso país, a nossa segurança. Este alegado vazamento deve preocupar todos os americanos pelo seu impacto na segurança nacional. ... Qualquer pessoa que revele informações classificadas será responsabilizada e punida de acordo com as sanções máximas previstas  na lei. "
Enquanto isso, é suposto que temos que aceitar as investigações que o governo faz sobre si próprio e sobre as suas próprias acções, que (surpresa!). Normalmente tais investigações  encontram pouco ou nenhum desvio no comportamento das agências governamentais, o que, muitas vezes, consolida e amplia os poderes e actos clandestinos postos a nu pelos denunciantes.
 
Ovar, 11 de Março de 2017
Álvaro Teixeira

quarta-feira, 8 de março de 2017

A tourada (estátuadesal)

 

(Por Estátua de Sal, 08/03/2017)
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          Passos, o bandarilheiro
O Pan e outros grupos de cidadãos, preocupam-se com a defesa dos animais e com o sofrimento dos touros e propõem e defendem que se acabem com as touradas por estas serem uma manifestação de selvajaria primária. O tema gera sempre alguma controvérsia, porque há sempre argumentos para todos os gostos e as touradas ainda vão perdurando, para mal dos touros.
E de tal forma perduram que hoje a tourada saiu, levada em ombros pelo PSD, do Campo Pequeno para a Assembleia da República. Foi no debate quinzenal com o primeiro ministro, ao qual assisti na íntegra nas televisões. O que se passou então?
Pedro Passos Coelho considerou ser um insulto pessoal que António Costa tivesse ligado a não divulgação da lista de transferências para offshores - da lavra até ver, de Paulo Núncio -, e do não escrutínio fiscal de parte dessas transferências, a uma falha da sua governação. Pelo que se insurgiu por Costa não lhe apresentar desculpas. Costa retorquiu que o insultado tinha sido ele, que foi caracterizado por Passos como sendo vil, reles e soez, logo ele sim, teria que receber um pedido de desculpas. Tudo isto, num ambiente de grande pateada e sururu, com a bancada do PSD em alvoroço, mais parecendo uma turma de putos imberbes da escola primária em desatino completo.
E as duas faenas seguintes foram de almanaque. Coelho pede a palavra para defesa da honra.  E que disse Coelho? Nada de jeito. Que criticar politicamente a sua péssima governação é um ataque à honra. Extraordinário. A minha pergunta é como é que se pode defender aquilo que não se tem. O Coelho parecia o D. Quixote a terçar armas em prol de moinhos de vento. Quer Passos convencer-nos que roubou os portugueses, cortou salários e pensões, e que o fez com muita honra. Lindo. É como um carteirista dizer que nos roubou a carteira e que se nos insurgirmos e o criticarmos estamos a atacar a sua honra de bom profissional do ramo. Perante este mundo bizarro e deprimente que a direita serve em directo ao país na Assembleia da República, acho mais urgente varrer de vez Passos da cena política, do que acabar com as touradas, desculpem-me lá os touros.
De seguida veio Montenegro, e também pede a palavra para defesa da honra, não dele próprio, mas da bancada do PSD que ele dirige, porque Costa tinha dito que os deputados do PSD andam ressabiados. Eu esta, confesso, deve ir para os anais. A honra da bancada não sei bem o que seja, já que eu julgava que a honra seria um atributo pessoal, do carácter e da personalidade de cada um e não um atributo colegial. Mas enfim. E que diz Montenegro em sua defesa? Nada de jeito. Conclui apenas que o primeiro ministro é mal educado. Sim, com todas as letras, Montenegro chamou mal educado ao primeiro ministro.
Costa, o único a quem já chamaram, mentiroso, vil, soez e agora mal educado, e que nunca ripostou de forma sequer aproximada a tais mimos, vejam bem, tem uma paciência de santo para conseguir aturar a cáfila que (des)governou o país durante quatro anos. Quando a direita acha que criticar as suas políticas é um ataque à honra e quando acha que atacar a honra de terceiros é um ataque às políticas, estamos perante um caso de doença aguda do foro psiquiátrico a necessitar de internamento urgente. Transfira-se pois a bancada do PSD em peso, de São Bento para o Júlio de Matos.
A direita anda, portanto, perdida nas sua diarreia mental. Depois de ter feito penar os portugueses ainda queria que o país lhe agradecesse pelos sofrimentos. Queria, e julgava que tinha a seus pés, um país de masoquistas e de bois mansos, que depois das bandarilhas no lombo ainda iria lamber a ponta da espada de Passos Coelho envergando traje de luzes, e armado em grande toureiro.
Enganou-se. Os portugueses recusaram os ferros de Passos Coelho e fizeram-no morder o pó da arena. E o personagem, mesmo perante todas as evidências, ainda continua a não querer acreditar que foi corneado pelo país e que só lhe resta ser levado em maca para fora do palco para ser tratado urgentemente.
 
Ovar, 8 de março de 2017
Álvaro Teixeira

terça-feira, 7 de março de 2017

Deputados do CDS Aveiro perguntam porque não foram iniciadas as obras do litoral do distrito que representam

“As frentes marítimas das praias do concelho de Ovar, são casos identificados com maior prioridade de intervenção”.

Os deputados do CDS eleitos por Aveiro, João Pinho de Almeida e António Carlos Monteiro, querem saber qual o motivo pelo qual ainda não foram iniciadas as obras anunciadas para o litoral do distrito de Aveiro, nomeadamente nas praias de Esmoriz, Cortegaça e Furadouro, concelho de Ovar.

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Em duas perguntas enviadas aos ministros do Mar e do Ambiente, os deputados do CDS questionam quando será feita uma análise detalhada das vantagens e desvantagens das soluções preconizadas, bem como de análises custo-benefício, de análises multicritérios e de estudos de avaliação ambiental baseados na modelação da dinâmica local costeira, tendo em vista introduzir racionalidade e sustentabilidade às ações preconizadas no Litoral XXI.

João Pinho de Almeida e António Carlos Monteiro querem também saber qual o teor do projeto e que garantias é que o mesmo apresenta de dar resposta consolidada e efetiva à proteção desta área da orla costeira do distrito de Aveiro e qual é a data prevista para o arranque da obra.

Os deputados do CDS questionam ainda se os dois ministérios estão a trabalhar em articulação no sentido de encontrar solução para este problema, em concreto, e de que modo estão a fazê-lo.

Na noite de 27 para 28, e durante o dia de 28 de fevereiro p.p., o mar voltou a galgar os muros e andou próximo das habitações no Furadouro e em Esmoriz, colocando pessoas e bens, mais uma vez, em risco e à mercê da natureza.

O Litoral português apresenta um valor natural, económico e cultural ímpar, cuja importância é amplamente reconhecida, mas inverter os problemas que o assolam é difícil, uma vez que a sua regeneração é um processo complexo e demorado.

Em consequência dos temporais do primeiro trimestre de 2014, foi constituído o Grupo de Trabalho para o Litoral (GTL) com o objetivo de “desenvolver uma reflexão aprofundada sobre as zonas costeiras”, e definir “um conjunto de medidas que permitam, no médio prazo, alterar a exposição ao risco, incluindo nessa reflexão o desenvolvimento sustentável em cenários de alterações climáticas”.

Coordenado pelo Prof. Doutor Filipe Duarte Santos, em dezembro de 2014, o GTL apresentou o relatório final, intitulado “Gestão da Zona Costeira. O Desafio da Mudança”, apresentando uma síntese do conhecimento sobre a dinâmica da faixa costeira de Portugal continental em situação de referência e em cenários de alteração climática.

As praias a sul de Espinho e da Figueira da Foz e a Costa da Caparica foram referenciados como os locais mais críticos do país em termos de risco de inundação.

Os casos mais urgentes observam-se em Paramos (Espinho), Esmoriz e Furadouro Sul (Ovar), Costa Nova Sul (Ílhavo), Vagueira (Vagos), Cova-Gala (Figueira da Foz) e Costa de Caparica (Almada). Outros casos críticos incluem Paramos Sul (Espinho), Furadouro Norte (Ovar), Barra e Costa Nova Norte (Ílhavo), Praia de Mira (Mira), Costa de Lavos e Leirosa (Figueira da Foz), Pedrogão (Leiria) e Vieira de Leiria (Marinha Grande).

As frentes marítimas das praias do concelho de Ovar, são casos identificados com maior prioridade de intervenção.

Em função do relatório do GTL, o Governo PSD/CDS-PP anunciou, no início de 2015, a intenção de, até 2050, investir 750 milhões de euros no combate à erosão costeira, privilegiando o equilíbrio sedimentar, ou seja, a reposição da deriva de sedimentos (areias), que deixou de acontecer na nossa costa, de norte para sul, com as várias construções – barragens, portos, molhes e outras barreiras – que, no mar, interrompem esse fluxo.

No entanto, o atual Governo não promoveu, até à data, qualquer estudo de nenhuma natureza que permita atestar as referidas vantagens e comprovar a sua viabilidade.

Apesar disso, em julho de 2016, foi apresentado no Espaço Museológico da praia da Vagueira, em Vagos, o “Litoral XXI – Governança e Plano de Ação”, que contou com as presenças da Ministra do Mar e do Ministro do Ambiente. Este programa preconizava “um novo modelo para a requalificação costeira”.

No documento era anunciado que, “no âmbito da proteção do litoral”, seria “implementado o novo modelo de governação”, reforçando “uma abordagem integrada e coerente do litoral”, através da definição de um “conjunto de ações anuais e plurianuais a desenvolver para defender a integridade da linha de costa e para valorizar a zona costeira”.

Referia-se ainda que, “durante o próximo ano”, [2017], “proceder-se-á à elaboração dos Programas da Orla Costeira e instrumentos de ordenamento do espaço marítimo nacional (Plano de Situação) ” e “serão iniciadas ações de proteção do litoral nas zonas onde é mais preocupante a necessidade de dar resposta à proteção da orla costeira”.

“Em toda a Europa, o litoral português é o mais frágil dos territórios”, afirmou à data o Ministro do Ambiente.

 

Ovar, 7 de março de 2017

Ovar Novos Rumos

À polícia o que é desta Justiça (estatuadesal)

 

(Valupi, in Blog Aspirina B, 06/03/2017)
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Joana Marques Vidal anunciou a abertura de um inquérito por “eventual violação do segredo de justiça” resultante da publicação de supostas declarações de Ricardo Salgado e Hélder Bataglia ao serem interrogados pelas autoridades. Que se irá passar a seguir? Se o passado servir para prever o futuro, nada de nadinha de nada. Ocasião para fazer perguntas:
– Quantos inquéritos já foram abertos por violação do segredo de justiça na história do Procuradoria-Geral da República?
– Onde é que se podem consultar os resultados? Existe tratamento estatístico dos resultados?
– Quantos inquéritos conseguiram identificar os responsáveis pelas violações?
– Se algum inquérito alguma vez conseguiu identificar algum responsável, ele chegou a ser punido? Se sim, de que forma?
Esta problemática não tem no sistema político, na arena partidária e na comunicação social qualquer paladino, apesar dos fogachos deste e daquela. A sociedade portuguesa convive amansada e risonha com este tipo de crimes. Aliás, esta particular actividade criminosa está institucionalmente aceite como vantajosa para os poderes fácticos, pois algumas das violações são de imediato integradas – ou seja, lavadas, como se faz ao dinheiro ilegal – no ecossistema mediático. É assim que vemos o Ricardo Araújo Pereira ou o Paulo Baldaia, para dar dois exemplos que chegam e sobram, a usar o resultado dos crimes alheios nas suas actividades profissionais, sancionando-os como social e culturalmente legítimos. Ou seja, há muita gente a ganhar dinheiro com a actividade criminosa dos criminosos que pertencem aos quadros da Justiça portuguesa.
Quando calha falar-se do assunto e na conversa aparece um representante dos magistrados do Ministério Público, ouvimos sempre a cassete onde a culpa é das vítimas, através dos malandros dos advogados, e onde os procuradores é que ficam a sofrer, coitadinhos, por causa desses segredos derramados na via pública. Claro que tal também pode acontecer, mas o problema não está aí seja pela quantidade ou relevância. O que está em causa é uma prática onde aqueles a quem pagamos para defender e aplicar a Lei a estarem a infringir impunemente. Isto é, não só os crimes são cometidos por agentes de Justiça mas ainda por cima acabamos a ser gozados por quem devia estar na linha da frente do combate ao que é um escândalo que põe em causa o Estado de direito.
Porque é simples: se os crimes de violação do segredo de justiça se repetem sistematicamente – como a “Operação Marquês” é disso o exemplo supremo – então os criminosos em causa sabem-se completamente protegidos para repetir quando e como quiserem as acções ilegais. E se cometem estes crimes tão públicos, os quais igualmente envolvem a cumplicidade de jornalistas, sem o mínimo receio de serem apanhados, que outros crimes não cometerão lá onde nem sequer precisam de ajuda de colaboradores externos e a coberto dos holofotes mediáticos?
Perante esta realidade, que talvez até tenha repercussões em matérias de segurança nacional, assistir ao silêncio dos nossos representantes políticos, da chamada “imprensa de referência” e da sociedade em geral resulta numa lucidez implacável onde todos os poderes estruturantes da vida comunitária surgem unidos numa coreografia farsante e torpe.
 
Ovar, 7 de março de 2017
Álvaro Teixeira

Carlos Costa tem de se demitir (estatuadesal)

 

(Daniel Oliveira, in Expresso Diário, 06/03/2017Autor Daniel Oliveira
Apesar de conseguir dar um retrato mais completo e compreensível de todo o caso do BES e de lhe acrescentar alguns novos pormenores, a investigação de Pedro Coelho, jornalista da SIC que já fora responsável pelo trabalho sobre o BPN, não nos dá novidades em relação a todas as suspeitas que tínhamos. Dá-nos provas definitivas sobre a incúria consciente de Carlos Costa e sobre as suas responsabilidades diretas no desfecho que o caso teve. E isso faz toda a diferença.
Que Carlos Costa sabia tudo o que era necessário saber para intervir de forma pronta e determinada, não precisaríamos desta excelente reportagem para confirmar. Todos os dados são, quanto a isto, evidentes há muito tempo. O estado do Grupo Espírito Santo e o efeito que estava a ter no BES eram um segredo de polichinelo. Um segredo de tal forma público que o BPI o descreveu, preto no banco, em agosto de 2013, num documento dirigido ao regulador. Que as contas do “polvo” do Espírito Santo eram uma fraude também. Que a capitalização do GES era feita às custas da destruição do banco, contaminando a área financeira com a área não financeira, igualmente. Mas mesmo perante todos os alertas, vindos de fontes nacionais e externas, Carlos Costa ficou quieto. E enquanto observava sem agir, avisava sem impedir, muitos clientes do BES, sem qualquer experiência de investimento, eram transformados em investidores à força no buraco sem fundo da Rio Forte.
Na Comissão de Inquérito ao caso BES, Carlos Costa explicou a sua perturbante apatia: “No fim de 2013 o Banco de Portugal não dispunha de factos demonstrados que dentro do quadro então aplicável permitissem abrir um processo formal de verificação de idoneidade” de Ricardo Salgado. E o governador jurava não tinha retirado a idoneidade apenas porque “os condicionamentos legais” não o permitiam. “Se pudesse faria? Há muito tempo.” Já na altura citara pareceres de dois juízes que explicavam que ele não podia agir e foi, poucos dias depois, desmentido por um deles. Pedro Maia garantia que o parecer dizia exatamente o oposto.
Agora, através desta reportagem, sabemos que foram os próprios serviços do Banco de Portugal que lhe disseram que tinha todos os instrumentos para afastar Ricardo Salgado. Uma nota informativa dos técnicos da instituição garantia-lhe, em novembro de 2013, que ele não tinha de esperar que o banqueiro fosse condenado pela justiça ou cometesse qualquer ilícito. A reavaliação da idoneidade podia ter uma função preventiva. Ao contrário do que afirmou aos deputados, Carlos Costa tinha poderes para além da mera pressão. E sabia-o.
É provável que a razão para a inação de Carlos Costa tenha sido a apontada pela deputada Mariana Mortágua: ele via os administradores dos bancos em geral e do BES em particular como “colegas”, não como regulados. E isso criava uma cumplicidade que permitiu a Ricardo Salgado arruinar o BES para tentar salvar o seu grupo, enganar e roubar milhares de clientes e deixar uma fatura de milhares de milhões de euros para o Estado português. Tudo nas barbas do regulador.
Carlos Costa teve acesso a todos os sinais de perigo. E tinha os instrumentos para agir. Sabíamos tudo isto antes de ver “Assalto ao Castelo”. Agora sabemos que ignorou os seus próprios serviços.
Temos as provas que faltavam para saber que as suas omissões foram conscientes e premeditadas. Depois de tanta incompetência e incúria, o governo anterior decidiu agradecer a cumplicidade política que sempre demonstrou e reconduzi-lo no cargo.
É inamovível. Mas a sua permanência como governador do Banco de Portugal afeta a credibilidade do regulador, do sistema financeiro nacional e do país. Em relação ao mal que já provocou, pouco podemos fazer. Resta impedir que continue. Pressionando para que se demita.
 
Ovar, 7 de Março de 2017
Álvaro Teixeira