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quarta-feira, 19 de julho de 2017

Europa, a hipócrita



por estatuadesal
(Marco Capitão Ferreira, in Expresso Diário, 19/07/2017)
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Comissário Europeu passou por Portugal. Sem o destaque de outros tempos – facto em si mesmo notável, desde logo porque quase ninguém o anota – veio tecer loas ao crescimento esperado para a Economia Portuguesa. 2,5%. Número redondinho, que supera a última previsão da mesma Comissão nuns modestos 30 ou 40%. Coisa pouca. Sobre isso, claro, nem uma palavra.
E nem uma palavra sobre como Portugal tem caminhado, sim, mas contra, repito, contra todas as recomendações da Comissão. Só loas ao trabalho feito. Como se, e se tivermos uma súbita amnésia ainda acreditamos, a Comissão fosse co-autora do mesmo. Não foi. Não é.
A Comissão queria mais austeridade. Nós reduzimos.
A Comissão achava que era boa ideia ameaçar Portugal em público com sanções a ver se os mercados davam uma ajuda. Ia resultando. Mas ignorámos mais essa pressão e os números acabaram por descer.
A Comissão admoestou a ideia de aumentar o Salário Mínimo Nacional porque ia gerar desemprego. Que esse mesmo desemprego tenha não só caído como caído bem mais depressa do que o previsto é um pormenor.
Esta Europa não é bombeiro, é incendiário. Não apaga. Ateia. Não deita água. Sopra gasolina.
Esta Europa é hipócrita. Nisto. Nos refugiados. Na forma como está a tratar o Brexit como se fosse um problema para contabilistas e burocratas. No enterrar da cabeça na areia quanto ao que se está a passar na Hungria ou na Polónia. Em tanta outra coisa.
A Europa é, hoje, a maior opositora do projeto europeu. Como se chegou aqui é o menos importante. Como se sai daqui é a única coisa que interessa. Porque pior que esta Europa só mesmo nenhuma Europa. Por enquanto.
O nosso caminho, com as suas imperfeições, os seus equívocos, os seus erros, é um contributo para uma Europa um pouquinho menos má. É um contributo modesto, decerto, mas muito maior do que o nosso tamanho na Europa. Pode ser da época do ano, mas sinto-me tentado a um muito moderado optimismo.

sábado, 15 de julho de 2017

Macromania



por estatuadesal
(Francisco Louçã, in Público, 14/07/2017)
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A macromania é um dos iô-iôs mais demonstrativos da meteorologia política europeia. Há umas semanas, os euro-institucionalistas anunciavam a catástrofe iminente e declaravam-se sem meios de a esconjurar: em poucos dias, ou em poucas semanas, segundo as versões, a União entraria na sua derrocada moral ou no abismo sem regresso, sendo irreversível o “esboroamento” e as “crises sufocantes”. Agora, bastou uma parada solene nos Campos Elísios no dia da tomada da Bastilha e ao lado de Trump e Merkel, e temos de novo a redenção à vista.
Desde a vitória eleitoral de Macron em França, esse discurso salvífico foi relançado com um alívio indisfarçado. Maria João Rodrigues, uma europeísta experiente, anunciava no Expresso que “finalmente – ao fim de oito anos – surge alguma luz ao fundo do túnel da zona euro”, e retomava o menu já conhecido, toca a completar a União Bancária. Aqui no PÚBLICO, um escritor austríaco, Robert Menasse, explicava como foi crítico da União e se converteu, deliciado, compreendendo que é preciso matar a democracia nacional para haver ordem europeia. Todo este triunfalismo e mesmo o atrevimento vem da vitória de Macron.
Ele é o homem de que a Europa precisa, ele é o homem da parceria com a Alemanha, ele é o homem das soluções. Será mesmo? Permitam-me a desconfiança, é que já me deram este golpe, com Hollande foi exactamente este guião. Será agora o resultado diferente?

sábado, 1 de julho de 2017

A União Bancária Europeia é uma ficção



por estatuadesal
(Paul Grauwe, in Expresso, 01/07/2017)
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                      Paul Grauwe
Para ativar o mecanismo de solidariedade europeia no sector bancário, é preciso confiar que não se abuse desse mecanismo. Esta confiança não existe.
A banca italiana tem problemas há muito tempo. Isto deve-se quase integralmente a uma economia que está estagnada, se não em declínio, resultando no incumprimento de muitas empresas e no facto de os bancos terem em carteira muito crédito malparado.
Os problemas concentram-se agora em dois bancos de Veneto, no nordeste de Itália. Esta região é o coração industrial do país, com muitas PME de êxito em tempos normais mas que perdem hoje competitividade principalmente porque a economia italiana não está bem.
Em 2012, a União Bancária Europeia foi estabelecida para abordar em conjunto crises verificadas num ou mais países. A intenção era pôr fim ao ‘abraço de morte’ entre bancos e Estados, que pode ser explicado da seguinte maneira: Quando um banco começa a falhar num país, é quase inevitável que, no caso de um grande banco, o Governo avance para salvar esse banco. Isto é inevitável porque a falência de um grande banco pode ter um efeito de dominó e provocar problemas de liquidez e solvência em mais bancos e levar a economia para uma recessão. Mas essa operação de resgate custa dinheiro que tem de ser avançado pelo Governo. E a dívida soberana aumenta. O que começou como uma crise bancária pode transformar-se numa crise das finanças públicas do país que sofre essa crise bancária.
A União Bancária foi criada para quebrar este círculo vicioso. Uma crise bancária num país seria resolvida em conjunto, de forma que o custo da resolução da crise bancária fosse distribuído por toda a zona euro. É o que acontece por exemplo nos Estados Unidos da América. A resolução da crise bancária americana de 2008 que se concentrava em Wall Street foi paga por todos os contribuintes americanos e não apenas pelos de Nova Iorque.
É hoje evidente que a União Bancária na zona euro não funcionou. A crise bancária de Veneto foi resolvida pelo Governo italiano e serão os contribuintes italianos e mais ninguém a pagar por isso. Porque é que a União Bancária não funcionou?
A minha resposta é que houve quem não quisesse que funcionasse como estava previsto. Uma união bancária pressupõe que os países estejam preparados para ajudar outros países em alturas de crise. Para ativar esse mecanismo de solidariedade, é preciso confiar que não se abuse desse mecanismo. Esta confiança não existe.
Para compensar essa falta de confiança, foi introduzido o princípio do bail-in. Este estipula que quando um banco experimenta problemas, os custos devem ser suportados à cabeça não só pelos acionistas mas também pelos depositantes e credores, antes de o Governo usar dinheiro dos impostos para aliviar as dívidas desse banco.
À primeira vista isto é um princípio atraente. Não tem de ser sempre o contribuinte a pagar para salvar os bancos. O problema com este princípio, no entanto, é que não consegue perceber a essência de uma crise bancária. Quando um banco tem problemas, depositantes e credores tentam fugir para evitar perdas. Contudo, esta resposta de fuga torna a crise do banco ainda mais provável e força o Governo a agir para evitar estragos ainda maiores.
Este princípio do resgate interno foi introduzido na União Bancária não para evitar que os contribuintes em geral tenham de pagar, mas para escudar os contribuintes do Norte da zona euro, especialmente os alemães, do risco de terem de pagar o resgate de bancos fora dos seus países. Não haja dúvidas de que se o Deutsche Bank tiver problemas, o Governo alemão usará o dinheiro dos contribuintes para salvar o banco. Mas já não dará esse passo se o banco ameaçado for um banco italiano.
A minha conclusão é que a União Bancária na zona euro é na verdade uma ficção. Enquanto não houver vontade de considerar um problema num país como um problema partilhado por outros países, a União Bancária será sempre uma ficção.

sábado, 17 de junho de 2017

O dia em que Schäuble e Dombrovskis engoliram um grande sapo



por estatuadesal
(Nicolau Santos, in Expresso Diário, 16/06/2017)
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Portugal sai hoje formalmente do Procedimento por Défice Excessivo, para onde tinha entrado em 2009. Por parte de alguns dos principais parceiros no Ecofin do ministro das Finanças, Mário Centeno, choveram os elogios. Wolfgang Schäuble, o homólogo alemão, diz que este facto (e o pedido de pagamento antecipado de 10 mil milhões ao FMI) prova que “o programa de assistência a Portugal é uma história de sucesso”. E o vice-presidente da Comissão Europeia, “Valdis Dombrovskis, disse ver “com satisfação que os ministros das Finanças tenham aprovado a nossa recomendação para a saída de Portugal do Procedimento por Défice Excessivo. Hoje é o dia para celebrar. Amanhã é o dia para continuar o trabalho árduo”.
Se a hipocrisia matasse, Schäuble e Dombrovskis deveriam ter caído fulminados logo que fizeram estas afirmações. É que ninguém esquece – eu, pelo menos, não me esqueço; e para os esquecidos há sempre o recurso ao Facebook – as sucessivas declarações de Schäuble sobre Portugal, dizendo que o país ia no bom caminho com o anterior Governo mas que com o Governo PS e a mudança de orientação política, estava preocupado com a eventualidade de Lisboa ter de pedir um segundo resgate (em 30/6/2016 e 15/3/2017). Disse-o não uma mas duas vezes, sempre que lhe perguntavam qual era a situação do Deutsche Bank (que era péssima na altura). Dombrovskis também foi sempre muito duro com o Governo do PS e os dois puseram sucessivamente em causa a capacidade de Portugal cumprir os seus compromissos europeus, em particular as metas orçamentais, com uma política económica diferente da seguida pelo executivo de Pedro Passos Coelho e de Paulo Portas.
Mas não foram só eles. Outros responsáveis alemães, como Klaus Regling, presidente do Mecanismo Europeu de Estabilidade ou o comissário europeu Günther Oettinger falaram sobre a hipótese de Portugal precisar de um novo resgate (“Não sei qual é a probabilidade, mas é maior do que 0%”, disse Oettinger em 3/10/2016).
E é por isso que os aplausos e os sorrisos de hoje só podem esconder uma enorme estupefação sobre como foi possível, com uma orientação económica bem diferente daquela porque sempre pugnaram (falta ao ramalhete o inefável presidente do Eurogrupo, Jeroen Dijsselbloen) e com um governo de centro/esquerda, apoiado por bloquistas e comunistas, atingir resultados orçamentais únicos na história do país, os melhores em 42 anos de democracia.
É que afinal todos eles foram desmentidos pelos factos: não havia só um caminho, a famosa TINA (There Is No Alternative, que sempre defenderam. A lavagem ao cérebro que nos tentaram fazer, a intimidação constante, a chantagem sucessiva, a pressão diária que fizeram afinal esboroou-se perante a realidade: era possível chegar a melhores resultados por outra via e com muito menor dor social do que aquela que nos impuseram durante cinco anos.
Ninguém se esquece os tratos de polé a que Mário Centeno foi sujeito quando chegou ao Eurogrupo. Ninguém esquece a forma sobranceira com que as suas propostas e a orientação que imprimiu à política económica foram tratadas durante longos meses. Ninguém esquece os avisos, os remoques, os alertas que lhe foram lançados, bem como as subtis ameaças, as cinzentas intimidações, o desprezo glacial.
Hoje é um grande dia para Portugal e para os portugueses. É também um grande dia para o Governo e para Mário Centeno. São eles que vão ficar para a História como o Governo e o ministro que conseguiram alcançar o défice mais baixo em 42 anos de democracia, 2%, um valor que se preparam para reduzir ainda este ano e no próximo; e são eles que ficam para a História como o Governo e o ministro que retiraram Portugal do Procedimento por Défice Excessivo, depois de nele termos caído em 2009.
Podem-se arranjar mil explicações, invocar milhentas atenuantes, mas factos são factos. E contra factos objetivos, palpáveis, não há argumentos.
O que falta agora é que outros representantes internacionais da hipocrisia, as agências de rating, venham reconhecer que a notação que atribuem atualmente à dívida emitida pela República (“lixo”) é totalmente inadequada à atual situação e que a subam rapidamente. Esta mesma semana, Portugal emitiu dívida a 10 anos abaixo dos 3% (2,8%), o que prova que mesmo os mercados reconhecem a melhoria consistente da situação económica portuguesa. O que falta para que, mesmo rangendo os dentes e cruzando os dedos, melhorem a notação da dívida portuguesa?

quinta-feira, 15 de junho de 2017

Schauble, o cínico


(Por Estátua de Sal, 15/06/2017)
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Dizia o outro, o Portas, que quando a troika se foi embora Portugal tinha deixado de ser um protectorado e até tinha um relógio a contar os minutos que faltavam para dizer adeus aos capatazes. Pois bem, nada mais falso.
Tal é a nossa situação de dependência que até para pagarmos as dívidas temos que pedir autorização. Portugal quer pagar  antecipadamente 10000 milhões de euros ao FMI, de um total de 12000 milhões que ainda lhes devemos, porque os juros do FMI são bens mais altos que os da restante dívida. Para isso temos que pedir autorização á Europa, ao Eurogrupo, ao Schaüble e, pasme-se, a autorização tem que ser votada no parlamento alemão! Querem maior prova de dependência? (Ver notícia aqui).
Eu achava que a solidariedade europeia não precisava de ir a votos. Mas não é assim. A razão é que, pagando mais cedo ao FMI, a probabilidade de pagarmos mais tarde os empréstimos da Europa aumenta, e eles, coitados também querem receber o deles a tempo e horas. Percebe-se.
O que já é menos aceitável é o Schaüble apanhar a boleia deste pagamento antecipado para vir dizer que o resgate a Portugal foi um sucesso. Depois da queda do PIB em vários pontos percentuais, do desemprego em massa, da emigração forçada, da pobreza e da miséria a trepar, o macaco do Schaüble vem dizer que foi tudo um grande sucesso.
Só um cínico encartado poderia sair-se com uma tirada de tal estirpe. No fundo, a mensagem subliminar que ele quer passar é que o Passos e a Marilú, e o governo anterior que ele apadrinhou, governaram tão bem que até conseguimos pagar as dívidas antecipadamente.
Ou seja, quem quer pagar e enfrentar os credores de cabeça erguida deve seguir sem pestanejar as ordens do Schaüble. Logo, o Costa que se cuide e não levante muito a garimpa, sob pena do ministro alemão não nos permitir, não contrair novos empréstimos, mas sim pagarmos os que já contraímos!

quarta-feira, 31 de maio de 2017

As contas públicas sofrem da síndrome de Estocolmo?


estatuadesal

(Ricardo Cabral, in Público, 31/05/2017)
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O“bom” desempenho das contas públicas e da economia nacional ganhou finalmente protagonismo internacional: a Comissão Europeia recomendou a saída do procedimento por défices excessivos; Schäuble, Draghi e Moscovici deram destaque ao tema; vários meios de comunicação social internacionais procuram “descobrir” o segredo do governo português.
Em paralelo, diversos responsáveis do governo têm dado indicações sobre as suas perspectivas, algo diferentes, para a estratégia orçamental do governo no curto/médio prazo. De salientar as entrevistas do primeiro ministro ao jornal alemão Handelsblatt, do ministro das finanças à RTP3 e do ministro do planeamento e das infra-estruturas à Rádio Renascença e ao Público.
O Handelblatt deu títulos diferentes à entrevista a António Costa: na versão em inglês “ignorar a Alemanha deu certo”; na versão em alemão, “encontramos um caminho melhor”. Essa mensagem chave da entrevista do primeiro ministro foi bem conseguida e importante. Fica implícito que a estratégia de austeridade da zona euro, preconizada principalmente pelo ministro das finanças da Alemanha, era errada e que há alternativas melhores. Que repor rendimentos contribui para o crescimento do investimento e para o crescimento económico.
Todavia essa mensagem parece estar em contradição com as mensagens das entrevistas tanto do ministro das finanças, como do ministro do planeamento e das infra-estruturas. Para estes,  os objectivos fundamentais da estratégia orçamental do governo seriam: a subida do rating da República e a redução da dívida pública. Defendem que eventuais folgas orçamentais devem ser utilizadas para reduzir a dívida: de acordo com Mário Centeno, em 10 anos, nas condições actuais, seria possível reduzir a dívida pública para 100% do PIB.
A mensagem de Mário Centeno e Pedro Marques tem muitos apoiantes, alguns dos quais defendem que não existe outro caminho possível – a nossa conhecida tese TINA[1].
É, aparentemente, uma mensagem prudente: o governo não se deixaria ficar eufórico pelos bons resultados orçamentais, porque pretenderia que os desequilíbrios e o procedimento por défices excessivos nunca mais regressassem, o que passaria por continuar a conter a despesa e reduzir o défice.
Mas, por paradoxal que possa parecer, essa é uma mensagem populista, porque se utiliza uma característica que é valorizada pela maior parte das pessoas – a prudência –, para justificar uma política económica, conservadora, de austeridade, que vai muito além dos objectivos traçados inicialmente.
Afigura-se que o governo está a mudar de estratégia económica, ao arrepio do seu programa eleitoral (mesmo antes dos acordos com os partidos à sua esquerda). Parece-se mais com a estratégia de consolidação orçamental do anterior governo, e pode mesmo ir além desta se a execução for melhor do que o governo estima, como se pode constatar no quadro abaixo. A diferença significativa em relação à política do governo anterior, reconheça-se, é a aposta que continua a ser feita na reposição dos rendimentos dos portugueses, sobretudo, dos segmentos da população com menores rendimentos.
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Abandonar a estratégia económica que tão bons resultados trouxe em 2016 – estratégia, na altura, muito criticada, interna e sobretudo externamente, em particular, pela Comissão Europeia (CE), membros do Eurogrupo e agências de rating – não é uma boa opção, porque:
Primeiro, depois da pressão de Bruxelas sobre o primeiro orçamento apresentado para 2016, o governo cedeu, comprometendo-se com um défice de 2,2% do PIB para 2016, abaixo dos 2,8% do PIB previstos no programa de governo do PS. Contudo, o acordo foi que a Comissão Europeia aceitaria um défice até 2,5% do PIB. A execução de 2016 correu melhor do que esperado, por um lado, devido ao desempenho da economia mas, por outro lado, devido a prudência excessiva nas estimativas de receitas/despesas por parte do governo, porque o défice final foi de 2% do PIB.
Em 2017, se o crescimento económico se mantiver às taxas observadas no primeiro trimestre, estimo que o saldo orçamental será positivo, próximo de 0% do PIB, muito melhor do que estimado pelo governo (défice de 1,5% do PIB). Ora é um erro não somente elaborar orçamentos com previsões excessivamente optimistas, como elaborar orçamentos com previsões excessivamente prudentes. Compete ao governo realizar previsões tão realistas quanto possível, para que possa planear a utilização dos recursos financeiros ao seu dispor, da forma mais eficaz, em benefício da economia e dos cidadãos.
Segundo, governo, IGCP e várias outras entidades públicas nacionais parecem padecer da síndrome de Estocolmo. Parecem identificar-se mais com os credores e agências de rating (e outras autoridades europeias), procurando “satisfazer os seus desejos e mantê-los contentes”, do que com a sua condição de agentes de um Estado soberano devedor. Parece ainda contraproducente, e até um pouco humilhante, todo o “jawboning” de governantes nacionais, e não só, a solicitar uma subida de rating ainda este ano.
É necessário ter presente que é missão do governo garantir o desenvolvimento sustentado do país e a melhoria das condições de vida dos portugueses. Por isso, se espera que o governo não se transforme no adepto mais recente da tese da disciplina orçamental virtuosa, no preciso momento em que essa tese cai em descrédito internacionalmente.