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sábado, 23 de setembro de 2017

Para os meninos e para as meninas



por estatuadesal
(José Pacheco Pereira, in Sábado, 17/09/2017)
JPP
Pacheco Pereira
Não contem comigo para ter de fazer as prevenções do costume, destinadas a comprovar que não sou machista. Quero a plena emancipação das mulheres e tenho uma ideia do que o impede e dos obstáculos enormes que existem.

A recente polémica, muito ainda da silly season, sobre livros de exercícios escolares "para os meninos e para as meninas" revela um dos problemas de uma parte da esquerda que se dedicou ao policiamento do "politicamente correcto" e àquilo a que chama "causas fracturantes". Essa parte da esquerda une o Bloco a uma minoria significativa do PS, que envolveu o Governo num processo absurdo de excitação política acerca de nada, ou quase nada.

O sublime a que temos direito



por estatuadesal
(António Guerreiro, in Público, 22/09/2017)
Guerreiro
António Guerreiro
As catástrofes naturais anunciadas com hora marcada, como é o caso dos furacões, provocando o êxodo temporário de populações urbanas, são sempre uma “decepção”. O mundo inteiro prepara-se para o espectáculo da destruição radical, actualizam-se as narrativas e representações do Dilúvio, o tom milenarista e teológico sobe a um elevado nível de amplitude, abrem-se instruções ao processo da teodiceia, como fez Voltaire, no século XVIII, depois do terramoto de Lisboa de 1755, mas tudo acaba mais ou menos em cálculos para as seguradoras, nos países ricos, e em prolongamentos da catástrofe regular e permanente, nos países pobres.

Ontem e hoje



por estatuadesal
(José Faustino, in Facebook, 20/09/2017)
1964_2017
Ano 1964:
Depois de passar 15 dias com a família atrelada numa caravana puxada por um Fiat 600 pela costa de Portugal, ou passar esses 15 dias na praia do Castelo do Queijo, terminam as férias. No dia seguinte vai-se trabalhar e os miúdos para as aulas.
Ano 2017:
Depois de voltar de Cancún de uma viagem com tudo pago, terminam as férias. As pessoas sofrem de distúrbios de sono, depressão, seborreia e caganeira.

segunda-feira, 18 de setembro de 2017

A propaganda da direita católica



por estatuadesal
(Joseph Praetorius, in Facebook, 15/09/2017)
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Joseph Praetorius
Há truques na propaganda da direita católica para os quais me falta a paciência.
Às vezes, confesso, basta que se pronunciem os daquela gente para eu tomar a posição contrária. Foi assim quando Zapatero aprovou o “casamento homossexual”. Sempre achei tal coisa um disparate. O Estado não deve celebrar ritos matrimoniais por não lhe incumbir a guarda de quaisquer altares, sendo a sua tarefa meramente registral quanto às decisões de vida em comum, quando lhe peçam tal registo (por razões fiscais e sucessórias entre muitas outras). Bastou a ousada e intrusiva sordidez do bispo de Ávila a “condenar”, para me parecer politicamente indeclinável enfiar-lhe o dito “casamento homossexual” pela cabeça abaixo.
Continua a parecer-me um disparate. Mas onde tais bocas se abram é aplicar-lhes a rebarbadora aos dentes que mostrem. Os cristãos que vivam de outro modo. Isso basta e tem de bastar à moral cristã, desde que essa liberdade não seja posta em causa.

sexta-feira, 15 de setembro de 2017

Como se reconhece um fascista



por estatuadesal

(António Guerreiro, in Público, 15/09/2017)

Guerreiro

António Guerreiro

Confirmei na semana passada a existência de um exemplar da espécie: chama-se Henrique Raposo e é cronista do Expresso.


No nosso tempo, não é fácil reconhecer um fascista: porque eles não ousam dizer o seu nome ou nem sequer sabem que o são; porque um antifascismo demasiado espontâneo provocou uma inflação demagógica dessa classificação e retirou-lhe todo o rigor.

Com algumas precauções, confirmei na semana passada a existência de um exemplar da espécie: chama-se Henrique Raposo e é cronista do Expresso. Na sua coluna, começava por glorificar a caça como ritual de feição mística, remetendo a morte do animal para a esfera da cerimónia sacrificial, impregnada de elementos culturais. Este discurso é aquele que serviu o culto da guerra. Enriquecida com elementos de um erotismo negro, a cerimónia sacrificial da morte esteve no centro de uma estranha comunidade onde se encontraram nos anos 30 do século passado, em torno de uma revista chamada Acéphale, nomes importantes da literatura francesa: Bataille, Leiris, Caillois, Klossowski e outros. Segundo o testemunho deste último, Walter Benjamin, que tinha acabado de chegar ao exílio parisiense, assistiu a uma dessas reuniões do grupo e comentou: “Vous travaillez pour le fascisme.

Na versão kitsch e pindérica de Henrique Raposo (mas não é o kitsch ideológico uma característica do fascismo?) o culto da morte exprime-se desta maneira: “Há qualquer coisa de belo num tiro que é o encontro entre a trajectória da bala e a trajectória da presa; colocar a bala ou chumbo naquele milionésimo de segundo em que as duas linhas, a do tiro e a da presa, se encontram é um desafio belo”.

O critério de reconhecimento do fascismo, disse uma vez Deleuze, é este: “Alguém que diz ‘viva a morte!’ é um fascista.” Raposo não satisfaz todos os critérios de definição de um fascista, mas está dotado do afecto fascista que encontra beleza na morte. É verdade que se trata da morte de animais e não de homens, mas a máquina antropológica do humanismo (que Raposo defende de maneira acérrima), aquela que exacerba a diferença zoo-antropológica, é exactamente o mesmo dispositivo que serviu para exterminar os judeus.

O melhor vem a seguir. Henrique Raposo desenvolve a sua ideia de uma mística da caça e da morte do animal como um sacrifício onde se manifesta a categoria estética da beleza. E fazendo o elogio de umas declarações do cozinheiro Ljubmir Stanisic, sentencia: “Ljubmir Stanisic e Anthony Bourdain [são] cozinheiros que não pedem desculpa por serem homens, heterossexuais e carnívoros.”

Na sequência lógica do grito necrófilo vem a virilidade ostensiva, a afecção fascista do pensamento viril. O fascista “tem colhões” e gosta de os mostrar. Isto é suficiente para definir um pequeno fascista. Ele só se torna um pouco maior quando usa continuadamente a estratégia do espantalho universal, isto é, a estratégia que consiste em fundir as grandes questões políticas, sociais e morais (o fascista é sempre hipermoral) nos problemas privados e da vizinhança. Trata-se de categorizar os grandes sujeitos colectivos a partir de pessoas singulares. Chama-se a isto o pathos da totalidade. Uma pequena vila do Alentejo, uma periferia urbana ou o senhor José da oficina fornecem então a Henrique Raposo a universalidade de uma visão do mundo. E só não digo Weltanschauung porque é uma palavra demasiado fascista para o nosso pequeno fascista, que começou a semana a fazer um mea culpa por causa de na semana anterior ter levado demasiado longe a sua estratégia do espantalho universal da pedofilia (o espantalho eram, então, os educadores de infância masculinos). Ora, um fascista, ao contrário do pequeno fascista que apresenta algumas afecções da estrutura psicológica do fascismo, nunca se arrepende.
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segunda-feira, 4 de setembro de 2017

A ideologia de Cavaco

01/09/2017 por João Mendes



Houve um tempo em que ideologia falou mais alto que a realidade. Cavaco Silva, um daqueles saudosistas que, à semelhança do outro indivíduo que figura na imagem em cima, fez uso de um partido para o qual se estava nas tintas, apenas para se perpetuar no poder, defendia, no longínquo ano de 1992, que a Europa não era para toda a vida, fazendo jus à ideologia isolacionista na qual se sentia orgulhosamente integrado, e cujos sabujos condecorou como heróis de guerra. Agora, dá o ar da sua graça em Castelo de Vide, dando lições de europeísmo a quem teve pachorra para o ouvir.
O regresso do Cavaco-vivo, para fechar a silly season com chave de ouro, é sempre de saudar. Para que nunca nos esqueçamos do que a casa gasta. E assenta-lhe, que nem uma luva, ser cabeça-de-cartaz na universidade de brincar do PSD. Vá lá que agora não temos que o ouvir na TV, a apelar aos portugueses para confiar num banco falido, para uns dias depois se desmentir e fazer figura de parvo. Pena que ainda vamos pagar durante muitos anos a porcaria que este indivíduo e respectiva entourage andaram a fazer, com o alto patrocínio dos mais fraudulentos bancos deste país, que tanto contribuíram para a dívida que não pára de crescer, e que hoje gozam dos proveitos das suas aventuras no cavaquistão da Coelha. Por falar em cavaquistão da Coelha, será que Cavaco já pagou o que deve ao fisco? Ou continuará a viver a realidade ideológica de um caloteiro?

domingo, 3 de setembro de 2017

Paulo Rangel, o pregador falhado



por estatuadesal
(Estátua de Sal, 01/09/2017)
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Esta coisa da Universidade de Verão do PSD é uma espécie de cartola de mágico de onde pode sair tudo em qualquer momento: coelhos, cavacos, rangeis e todos os outros génios do mal, à excepção do diabo que está em greve, por solidariedade com os trabalhadores da AutoEuropa.
Desta vez saiu, Rangel, o Paulo, pregador de vocação falhada. Não tem pose, não tem voz, restando-lhe apenas o dedinho curto com que ameaça os portugueses com as penas do inferno por darem crédito às "esquerdas radicais", expressão da qual abusa mas que roubou sem vergonha à D. Cristas que tem a patente registada.
E que aprenderam os jotinhas durante tão terrível prelecção? Pelos vistos não aprenderam grande coisa nem ligaram muito ao assunto. Alguns estavam a navegar no Facebook enquanto Rangel rangia a bom ranger. como se pôde ver nas televisões. Os jotas não estão lá para aprender nada de relevante mas para herdarem os contactos da rede clientelar laranja, os quais os poderão alcandorar no futuro a uma sinecura dourada.
Rangel rangeu e foi triste de ver. Um apoiante do governo pafioso que mais cortou no investimento, nos salários - públicos e privados -, e nos serviços públicos, vir agora acusar o actual governo de cortar no Estado Social, e dizer que todos os desastres recentes, os fogos, os mortos de Pedrogão, as armas de Tancos, as greves, os suicídios (os que aconteceram e os que não aconteceram), se devem a cortes na despesa pública feitos pela actual governação.
Onde estava Rangel quando Gaspar implementou o mais brutal aumento de impostos de que há memória em Portugal - atrevo-me a dizer -, desde o tempo de D. Afonso Henriques? Onde estava Rangel quando os orçamentos eram chumbados sistematicamente pelo Tribunal Constitucional, por não se conformarem com a lei e serem um roubo descarado a céu aberto aos portugueses? Onde estava Rangel quando Passos até os subsídios de desemprego queria taxar com impostos?
Pois eu digo-vos onde estava. Estava a lamber as botas de Passos Coelho (para não dizer a lamber outra coisa), de forma a entrar nas listas de deputados ao Parlamento Europeu, onde não há austeridade nas regalias e nos ordenados principescos desses eleitos, eleitos para não fazerem nada que se veja, mas apenas para criarem um palco onde se simula a democracia, enganando assim os povos da Europa.
Diz Rangel que não há Estado Social mas sim o "estado salarial" de António Costa. (Ver aqui). Que o PS dá com uma mão e tira com a outra. E eu digo, ó Rangel, até podes ter razão. Mas olha, sempre é melhor dar com a mão esquerda e tirar um pouco menos com a direita do que tirar com as duas mãos como o governo pafioso fez sem rebuço nem vergonha.
O problema da direita radical, de onde Rangel é oriundo, é que fica com azia e dores de cabeça sempre que vislumbra uma política que beneficie os salários dos mais carenciados. Trata-se de uma visão fascista da sociedade onde existem os eleitos, aos quais tudo deve ser dado por mérito de divino berço - e onde ele e os seus comparsas se incluem, claro -, e os pobres coitados aos quais é legítimo espoliar, explorar, espezinhar, porque são seres inferiores, animais de carga que só existem para servir a elite dos bem-nascidos. Esta é a ideologia de Rangel e de toda a direita que ele encarna e que tenta pregar aos quatro ventos com a sua exasperante vozinha de cana rachada.
Para Rangel, os eleitos tem o direito de se empaturrar com os recursos da sociedade, ficando refastelados até ao vómito. O que restar, as migalhas sobrantes, essas que sejam então distribuídas pela plebe faminta. E conseguem dormir descansados o sono dos justos, porque os pobres, para eles, não são gente, e não nasceram para terem o direito a ser felizes, tal como não se chora pelo boi quando se come um bom bife da vazia (os que comem).
É este o ideário da direita, de Rangel, e do actual PSD. Eles sim, radicais, déspotas iluminados por um pensamento retrógrado e fascizante. Foi este pensamento que os guiou enquanto foram governo. Como o bolo era curto, e como aos eleitos nada podia faltar, a solução, como sempre, foi a de cortar no bolo (leia-se nos salários e pensões) dos mais fracos. E fizeram-no sem dó nem piedade.
E quando o actual governo, apesar de timidamente - devido ao poder dos rangeis da Europa dos eurocratas, que pensam exactamente da mesma forma -, se atreve a inverter tais políticas, saltam cavacos, coelhos e rangeis desse ninho de lacraus, dessa escola de vícios, que é a dita Universidade de Verão.
Porque eles sabem que o bolo não estica por artes mágicas, e que cada euro que é restituído a quem trabalha é um euro a menos no bolso dos bem-aventurados do costume. É por isso que Rangel e Cristas falam em "esquerda radical".
Porque a esquerda "não radical", para Rangel, seria aquela que em vez de pugnar pela alteração do quadro jurídico e institucional que afecta e determina a repartição do rendimento e os direitos de quem trabalha, se limita a pedir esmola à porta das Misericórdias, contentando-se com as sobras da Dona Jonet. E para esse peditório, podemos sempre contar com Rangel e quejandos, como bons cristãos que se gabam de ser.

quinta-feira, 31 de agosto de 2017

O regresso do cavaco-vivo

30/08/2017 por António Fernando Nabais



A universidade de Verão de Castelo de Vide está para o Ensino Superior como as notas do Monopólio estão para o dinheiro, o que quer dizer que as aulas que ali decorrem não são, portanto, aulas, concluindo-se, portanto, que os docentes não são professores e que os alunos, portanto, os alunos, dizia eu, não estão ali para aprender. Pronto, confesso: é um rodízio de comícios.
Cavaco Silva foi um dos “professores” convidados e, de modo coerente, confirmou aquilo que de pior tem em si, que é, afinal, o melhor que pode dar ao mundo. O político que fingiu, durante anos, não ser político deu mais uma lição de vacuidade, o que, afinal, faz sentido na universidade de Verão de Castelo de Vide.
Cavaco regozijou-se com a perda de pio do socialismo e criticou, mais uma vez, um alegado anti-europeísmo , o que confirma o primarismo clubístico que está no cerne na sua visão do mundo, feita de ódios e nunca de análises, por muito que ponha um ar professoral.
Interessa-me, apesar de tudo, realçar, no cavacal discurso, a oposição entre realidade e ideologia. Para Cavaco, a ideologia é uma coisa má, insensata, especialmente se socialista (fica-se, até, com a impressão de que a ideologia só existe à esquerda, porque a direita é tão virtuosa que só pode ser realista). A esquerda, intoxicada de ideologia, acaba, segundo Cavaco, por ser contrariada pela realidade e a realidade só pode ser governada à direita, levando a que o socialismo perca, assim, o pio.
No entanto, é a ideologia defendida por Cavaco que dá cabo da realidade, da realidade dos cidadãos, dos trabalhadores, dos desfavorecidos. No fundo, a ideologia de Cavaco resume-se de maneira muito simples: o mundo, os países ou o Estado existem para servir as multinacionais e os grandes grupos financeiros, o que deve levar a que, entre outros aspectos, os direitos laborais ou os salários sejam sacrificados em nome de outros deuses. Cavaco é, naturalmente, um entre muitos, como Luís Montenegro ou Pires de Lima: as pessoas são preocupações menores das ideologias; a realidade dispensa pessoas.
Saúdo e saudarei sempre os reaparecimentos de Cavaco, porque é importante não esquecer quem contribuiu para a ruína dos portugueses, o que, de resto, lhe é indiferente, porque está convencido de que salvou o país. Não deixa de ser ridículo, mesmo que o riso seja amargo.

Fonte: Aventar

segunda-feira, 24 de julho de 2017

É preciso queimar os jornalistas?



por estatuadesal
(António Guerreiro, in Público, 21/07/2017)
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Numa das suas edições da semana passada, o jornal francês Libération ocupou a primeira página com uma questão provocatória, colocada a propósito de um debate sobre o jornalismo que decorreu na cidade de Autun: Faut-il brûler les journalistes?, “é necessário queimar os jornalistas?”. E fazia um diagnóstico da situação, enumerando algumas razões fundamentais que levaram ao descrédito em que caiu uma profissão outrora respeitada, bem patente numa série de neologismos insultuosos que os franceses inventaram para nomear os jornalistas: merdias, journalops, presstiputes. E as figuras mediáticas que estão sempre na televisão, em debates e como comentadores, são chamados panélistes (porque integram “painéis”). Este ambiente onde se cultiva a suspeita e o desprezo pelo jornalismo e pelo sistema mediático, muito especialmente pela numerosa oligarquia que tem a seu cargo o comentário político e o editorialismo, está instalado em Portugal. A diferença em relação à França é que por cá os jornalistas não ousam colocar a questão publicamente e assimilaram com força de lei este mandamento: “Não farás auto-crítica: o jornalismo é ofício de auto-celebração”. É hoje bem visível que a insurreição contra o poder jornalístico, a que o Libération se referia, está bem activa em Portugal e não consiste apenas numa atitude arrogante das elites intelectuais. Mas a situação portuguesa tem as suas especificidade: sobre a ausência ou a rarefacção de alguns géneros jornalísticos tradicionais, ergueu-se a opinião e o comentário políticos, uma multidão de gente que transita da esfera política para o jornalismo e vice-versa, e começa o dia no jornal, passa à tarde pela rádio e está à noite na televisão. Este sistema conduz ao discurso histérico e à ausência de diversidade intelectual, muitas vezes confundido com a falta de pluralismo político, mas mais grave do que este porque está muito mais naturalizado e dissimulado. E é, além disso, responsável por uma esterilização da esfera pública mediática.

sexta-feira, 21 de julho de 2017

Imprensa e os “Truques”: um poder de pés de barro, em crise e acossado


(Daniel Oliveira in Expresso Diário, 21/07/2017)
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Caro Daniel Oliveira
O teu texto aponta sintomas mas não vai ás causas do mal. Quanto maior for a concentração da riqueza nas mãos de uma minoria a nível global, fenómeno que é cada mais intenso, menos lugar haverá para a existência de instâncias independentes, sejam partidos ou outras formas de representação política, sejam meios de comunicação social. A razão é simples: numa economia de mercado só há concorrência quando o número de compradores e de vendedores for suficientemente grande (atomicidade) para que nenhum deles possa determinar o funcionamento do mercado, nomeadamente dos preços. Se concentramos o poder de compra, logo de financiamento, nas mãos de uma minoria, qualquer instância de mediação fica subordinada a essa minoria. Só há orgãos de comunicação social com alguma independência quando a sua sustentação depende de um conjunto de leitores tão diverso e alargado que nenhum grupo lhes poderá determinar a orientação, já que têm que atender a um conjunto amplo e multifacetado de destinatários. Com o incremento da desigualdade na repartição do rendimento, o público leitor capaz de ser o sustentáculo dos meios de comunicação social é cada vez menor, para já não falar das mutações tecnológicas.
Mas há uma questão que ignoras e que também justifica a reacção exarcebada da comunicação social contra as redes sociais e contra a internet. Durante décadas a comunicação social foi usada de forma oculta para manipular a opinião pública, e nem sempre de forma ingénua (vide a grande mentira sobre a guerra do Iraque e as armas químicas do Sadam).
Ou seja, a comunicação social "respeitável", tinha o monopólio das "fake news", e também elas faziam parte do seu "core business". Neste momento perdeu esse monopólio. E quando se passa de monopólio para um mercado de concorrência, o trauma é sempre enorme.
Estátua de Sal, 21/07/2017